Revista Energia
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Desde 2001 no comando da padaria Kennedy, em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, a empresária Christiane Franzese acompanhou de perto a ascensão de seu estabelecimento, hoje considerado uma referência em panificação, com premiações que o incluem entre as cem melhores padarias do Brasil. Mas, para manter um ponto com 900 metros quadrados de área construída, 150 funcionários e produção média diária de oito mil pãezinhos, entre outras iguarias, os fornos elétricos precisavam ficar ligados praticamente 24 horas, o que gerava um consumo mensal de energia que chegou a R$ 52 mil.

“Analisei vários caminhos, mas o investimento era alto”, recorda Franzese. Orientada pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) a respeito do cronograma de flexibilização do acesso ao Ambiente de Contratação Livre (ACL), a empresária buscou a comercializadora Auren e, em julho do ano passado, “denunciou” (jargão do setor elétrico equivalente a comunicar) à distribuidora Enel a sua intenção de migrar para o mercado livre de energia, o que passou a valer a partir de 1º de janeiro. “A primeira conta foi de R$ 32 mil, sendo R$ 22 mil da energia contratada e R$ 10 mil da distribuidora, diz a empresária, que já faz planos para o futuro. “Com a economia gerada, penso em investimentos”, afirma.

O caso da padaria é apenas um entre as 5.363 migrações do mercado cativo (aquele em que o consumidor compra energia da distribuidora de sua região) para o ACL registradas no primeiro trimestre deste ano, segundo dados da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), entidade que promove a medição de compra e venda de energia, reunindo geradores, distribuidores, comercializadores e consumidores.

Comparada a igual período de 2023, a demanda pela contratação livre de energia cresceu 257,1%. A razão foi a flexibilização do acesso à livre negociação para todos os consumidores do Grupo A – aqueles conectados em alta tensão (redes de corrente alternada entre 69 kilovolts e 138 kilovolts), o que abrange pequenas indústrias, padarias, supermercados, lavanderias e estabelecimentos similares, que tenham, em média, contas mensais na faixa de R$ 10 mil.

Christiane Franzese, da padaria Kennedy: economia será usada em investimentos — Foto: Rogerio Vieira/Valor
Christiane Franzese, da padaria Kennedy: economia será usada em investimentos — Foto: Rogerio Vieira/Valor

Até 31 de dezembro do ano passado, o acesso só era permitido às empresas que tivessem consumo mínimo exigido de 500 quilowatts (kW), caso de grandes indústrias, hospitais, shopping centers e demais estabelecimentos de grande porte. Hoje, segundo a CCEE, cerca de 42 mil unidades consumidoras estão integradas ao ACL, número que deve aumentar à medida que as empresas cumpram o período legal de seis meses na migração, o que inclui a mudança da respectiva documentação e troca de medidores.

“O mercado livre transforma as relações dos consumidores com a energia elétrica à medida que ganham condições especiais na negociação. Do ponto de vista do setor elétrico, a abertura do mercado representa maior concorrência entre os agentes e, com isso, ganhamos competitividade. Percebemos grande movimentação dos grupos econômicos que atuam no segmento, e até mesmo de fora dele. Nos próximos anos, veremos uma atividade do mercado de comercialização de energia brasileiro que nunca havíamos testemunhado”, afirma Alexandre Ramos, presidente do conselho de administração da CCEE.

Hoje, são 611 comercializadoras cadastradas na CCEE – empresas de todos os portes, que incluem instituições financeiras como BTG Pactual, Santander e XP e tradicionais grupos do setor elétrico, caso da Copel, Cemig, Enel e Engie. Juntas, as 20 maiores empresas posicionadas no ranking da CCEE responderam por 52,7% do volume comercializado em janeiro.

Mas há muito espaço a ser ocupado. “Há mais de cem mil consumidores em potencial. Hoje, o grupo Delta tem mais de mil clientes e queremos fechar o ano com sete mil”, afirma Rafael Maia, CEO da comercializadora varejista Luz, empresa criada pela Delta Energia exclusivamente para atender o público varejista de forma 100% digital. “A linguagem do nosso contrato é simples para atender o varejo. Damos suporte na migração, consultoria, instalamos o medidor digital e oferecemos planejamento energético”, afirma.

Em média, o desconto em relação ao mercado cativo fica entre 25% e 30%, o que depende das tarifas das distribuidoras, que variam conforme o local. Estudo comparativo da comercializadora paulista Migratio junto a 51 distribuidoras em todo o país aponta que a economia pode ser de até 42%.

No Estado de São Paulo, revela o estudo, as tarifas cobradas pelas sete concessionárias de fornecimento de eletricidade variam entre R$ 446,60, no caso da Enel São Paulo, e R$ 574,92 o MWh, no caso da Elektro – a distribuidora com a tarifa mais cara do Estado. Citando o caso da distribuidora CPFL Piratininga, que cobra tarifa de R$ 493,59 por MWh dos consumidores do mercado cativo, a tarifa mensal com o mercado livre pode cair a R$ 309,03, uma economia de 37%.

Mas há situações em que não é vantajosa a migração, alerta Helio Lima, sócio da Migratio. “O processo de irrigação no campo tem incentivos para o uso na madrugada e tais benefícios seriam perdidos na migração. É preciso ainda estar atento ao momento da contratação, já que o preço será travado. Em períodos de estiagem, como ocorreu em 2021, o preço do kWh estava mais caro do que hoje.”

Não foi o caso do supermercado BomMix, de Limeira (SP), que fechou um contrato de três anos com a Migratio. “Chegamos a ter conta de R$ 55 mil, principalmente por causa da tarifa mais alta no horário de pico, entre 17h30 e 20h. Entramos no ACL em janeiro e tivemos uma economia de R$ 23,5 mil nos dois primeiros meses”, revela Arlindo Calsa Filho, diretor comercial do supermercado BomMix.

Alexandre Ramos, da CCEE: consumidor ganha condições especiais de negociação — Foto: Charles Trigueiro/Divulgação
Alexandre Ramos, da CCEE: consumidor ganha condições especiais de negociação — Foto: Charles Trigueiro/Divulgação

Antes mesmo da flexibilização de janeiro, o grupo carioca La Mole, formado por oito restaurantes e sete galpões comerciais, aderiu ao ACL para reduzir a conta, que chegava a R$ 200 mil mensais. “Nossa carga já superava o mínimo exigido. Prospectamos painéis solares e achamos caro. Dentro do mesmo CNPJ, fechamos um contrato de comunhão de cargas com a comercializadora Tyr Energia por cinco anos”, afirma Leonardo Rego, gestor de imóveis comerciais do grupo La Mole. Hoje, diz Rego, a conta gira em torno de R$ 150 mil. “No caso dos restaurantes, não fizemos marketing a respeito, mas a redução da conta tem nos ajudado na locação dos galpões”, afirma.

Com atuação no Estado do Rio de Janeiro, a Tyr Energia deve fechar 2024 com 400 contratos assinados, segundo Eduardo Miranda, sócio-fundador. Citando o recém-falecido psicólogo Daniel Kanneman, Prêmio Nobel de economia, considerado o pai da economia comportamental, Miranda vê o fenômeno da migração como uma mudança de hábito, na qual o consumidor avalia vários fatores, além do simples custo-benefício. “Hoje, focamos muito no nicho de áreas comuns de condomínios residenciais e comerciais, mas anos atrás cheguei a ser expulso por um síndico, que me chamou de mentiroso quando expus os benefícios do mercado livre”, afirma.

Para Rene Abrantes, diretor de relacionamento com clientes da Auren Energia, empresa que ocupa a segunda posição no ranking da CCEE, ainda há questões concorrenciais que precisam de regulamentação. “Há que ter distinção no caso de comercializadoras que pertençam a distribuidoras para não haver concorrência desleal ou risco de vazamento de informações. Devem ser CNPJs distintos”, diz. No fim do ano passado, a Auren firmou uma joint venture com a operadora Vivo para atuar na prospecção de potenciais clientes varejistas.

No início de abril, o governo federal lançou a Medida Provisória (MP) 1.212/2024, com ações de apoio para as energias renováveis no sentido de baratear as tarifas ao consumidor final. Sem entrar no mérito dos impactos para o ACL, Rodrigo Ferreira, presidente-executivo da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel), faz restrições ao atual modelo. “O mercado apresenta algumas distorções, como reserva de mercado e subsídios, que são desnecessários e podem ser revistos com o objetivo de melhorar a eficiência e reduzir o custo para o consumidor. Outra questão relevante é a má alocação de custos e riscos, como o risco hidrológico indevidamente alocado no consumidor.”

As próximas etapas não estão oficialmente definidas, embora haja grande expectativa do setor. Na gestão passada, por ocasião da Consulta Pública no137/2022, ficou acordado que os consumidores atendidos em baixa tensão (com exceção dos residenciais e rurais) seriam contemplados a partir de 1º de janeiro de 2026 e a abertura total viria em janeiro de 2028.

Em dezembro, o governo federal abriu uma nova consulta pública cujas propostas ainda não foram transformadas em portaria. Segundo a assessoria de imprensa do Ministério de Minas e Energia (MME), “cautelas e medidas legislativas são necessárias nessas discussões para oferecer o devido equilíbrio. Para isso, o MME tem se articulado de maneira rotineira com a Aneel e com a CCEE”. O comunicado informa também que “a Aneel está em processo de regulamentação da comercialização varejista sob a ótica da abertura do mercado livre, conforme Consulta Pública nº 28/2023”.

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