Revista Energia
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Torres, da Abrapch: precificação de atributos para garantir competitividade — Foto: Alisson Rodrigues/Divulgação
Torres, da Abrapch: precificação de atributos para garantir competitividade — Foto: Alisson Rodrigues/Divulgação

Únicas responsáveis, durante várias décadas, pelo perfil sustentável da matriz energética brasileira, as hidrelétricas vêm perdendo espaço nos últimos anos para as geradoras solares e eólicas. Continuam sendo a espinha dorsal do sistema elétrico, respondendo por 55% da energia consumida no país, segundo o relatório mais recente da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), mas seu protagonismo já foi bem maior – nos anos 90, essa forma de geração de energia tinha uma participação que chegava perto dos 90%.

“As hidrelétricas deixaram de ser prioritárias por vários motivos. São mais caras do que outras fontes renováveis, levam mais tempo para ser implantadas e passaram a enfrentar mais restrições depois dos impactos ambientais causados principalmente pela Usina de Belo Monte, no Pará”, enumera o especialista em energia Paulo Vicente Alves, da Fundação Dom Cabral (FDC).

De fato, desde que entrou em operação em 2016, Belo Monte tem-se transformado numa usina de problemas. Acusada de desviar grande parte da vazão do rio Xingu para o reservatório, reduzir drasticamente a oferta de peixes para a população local, inundar grandes áreas de floresta nativa e facilitar o desmatamento de terras indígenas protegidas, a obra virou referência de projeto mal planejado.

A Norte Energia, que opera Belo Monte, rejeita as críticas. Em nota institucional, a empresa afirma que essas denúncias têm como base o projeto original, que foi mudado justamente para mitigar ao máximo esses impactos, o que levou à construção de um reservatório de apenas 478 km2 (bem menor do que o previsto originalmente, de 8 mil km2) e ao investimento de R$ 7 bilhões em compensações socioambientais na região – incluindo indenizações a pescadores e até a reconstrução de toda a rede de água e esgoto de Altamira (PA), em razão da elevação do nível do Xingu.

Seja como for, poucas usinas, mesmo as de pequeno porte, com capacidade de gerar até 50 megawatts (MW) de energia, foram inauguradas no Brasil depois disso. “As pequenas hidrelétricas, que produzem muito mais efeitos positivos do que negativos ao ambiente, estão enfrentando sérias dificuldades para se viabilizar, por causa da demonização provocada pelos erros de projeto de grandes usinas na região Norte. Isso é um enorme equívoco”, reclama Charles Lenzi, presidente da Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa (Abragel).

Segundo Lenzi, existem 631 projetos de pequenas centrais hidrelétricas – conhecidas pelas siglas CGH, quando geram até 5 MW, e PCH, quando a geração é de no máximo 50 MW – já aprovados pela Aneel, mas à espera de licenciamento ambiental ou de algum desembaraço burocrático. Se estivessem em funcionamento, poderiam acrescentar 10 mil MW à matriz energética brasileira, cuja capacidade supera a marca dos 200 mil MW.

“O país não pode adiar mais a expansão das hidrelétricas, porque é a força das águas que garante o abastecimento de energia quando as geradoras solares e eólicas deixam de operar por falta de sol ou de vento”, diz Lenzi. Ele estima em R$ 120 bilhões o investimento potencial nas pequenas centrais hidrelétricas que estão com os projetos parados, embora já estejam aprovados.

Alves, da FDC: falta de investimento é consequência da superoferta — Foto: Divulgação
Alves, da FDC: falta de investimento é consequência da superoferta — Foto: Divulgação

Em defesa das PCHs, o presidente da Abragel alinha ainda uma série de vantagens adicionais trazidas por elas, como o aumento da renda média dos municípios onde estão localizadas, o uso dos reservatórios para consumo humano e irrigação, a construção com tecnologia 100% nacional e a vida útil de cerca de cem anos dessas pequenas centrais, muito acima do que se espera das geradoras solares e eólicas. “Além disso, a iniciativa privada se encarrega da construção, gerando empregos aqui no Brasil, e não nos países exportadores de painéis solares e turbinas eólicas, e transfere o ativo para a União após 30 anos de uso”, acrescenta.

Alessandra Torres, presidente da Associação Brasileira de PCHs e CGHs (Abrapch), destaca que as vantagens oferecidas ao país pelas pequenas centrais hidrelétricas são tão importantes e evidentes que esses atributos deveriam ser precificados para garantir a competitividade desse segmento nos leilões do mercado livre de energia.

“As usinas solares e eólicas, que são fontes intermitentes, deveriam custear o uso das hidrelétricas quando não há sol ou vento, bem como a expansão da transmissão, que onera as tarifas dos consumidores”, afirma ela. “A precificação das geradoras solares e eólicas não leva em conta a necessidade de ampliação do sistema de transmissão. As hidrelétricas, em especial as PCHs, que já nascem dentro do sistema de distribuição e consumo, constroem as suas próprias linhas de transmissão, proporcionando menores perdas de energia no sistema com linhas mais curtas”, explica.

Alves, da FDC, discorda dessa visão. “A entrada em operação de usinas solares e eólicas mudou o mercado de energia e o papel das hidrelétricas, que deixaram de ser as fontes preferenciais para se tornarem as garantidoras do sistema quando as fontes mais baratas não estiverem acessíveis. A falta de investimento em novas usinas hidrelétricas é uma consequência natural, até porque hoje existe uma superoferta de energia hídrica”, pondera.

Países que ainda dependem em larga escala de combustíveis fósseis para a geração de energia, como a China, têm todo o interesse, lembra Alves, de investir em todas as fontes renováveis possíveis, incluindo hidrelétricas – este, porém, não é o caso do Brasil.

“A transição para fontes limpas de energia vem acelerando desde a crise americana de 2008, quando o petróleo chegou a US$ 140 o barril, mas cada país precisou encontrar seu próprio caminho para construir uma nova matriz energética. Os Estados Unidos, por exemplo, se livraram da importação do petróleo ao investir na exploração do gás de xisto. O Brasil, que já possuía uma base importante de hidreletricidade, abriu caminho para o investimento em geradoras solares e eólicas e tem boas perspectivas na produção de hidrogênio verde, seja para substituir o diesel aqui dentro, seja, principalmente, para exportá-lo como amônia, em forma líquida. Vale reforçar ainda que o principal motivo dos países empenhados na transição energética para fontes renováveis é econômico, e não ambiental”, afirma.

Lenzi, da Abragel: 631 projetos de pequenas centrais aprovados estão parados — Foto: Hugo Rila/Divulgação
Lenzi, da Abragel: 631 projetos de pequenas centrais aprovados estão parados — Foto: Hugo Rila/Divulgação

É a busca de novas fontes de energia e de minérios, observa Alves, que também está por trás da atual corrida espacial. “País nenhum está lançando foguetes para oferecer turismo no espaço, mas sim para preparar a futura instalação de painéis solares na órbita do Equador e explorar os abundantes minérios existentes na Lua e no cinturão de asteroides”, observa o especialista da Fundação Dom Cabral.

Um painel solar com área de um km quadrado flutuando acima do Equador, calcula Alves, será capaz de gerar o equivalente a duas turbinas de Itaipu, ou 1,4 mil MW, com mínimas interrupções, uma vez que poderá captar a luz solar em 98% do tempo.

“Falta encontrar um meio de transmitir toda essa energia para a Terra, provavelmente com o uso de laser, um desafio que poderá ser superado nos próximos vinte anos. O Brasil, que tem parte do território na linha do Equador, é candidato a sediar uma futura estação para receber essa energia, associando-se a um dos países que estão mais adiantados nessa prospecção, que são os Estados Unidos, o Japão e a China”, prevê.

Enquanto esse futuro não chega, a multinacional francesa Engie, maior geradora privada de energia hidrelétrica no Brasil, também passou a investir mais em geradoras solares e eólicas nos últimos anos. “A energia hidrelétrica é fundamental para garantir a segurança do sistema interligado nacional, mas sua expansão depende de uma revisão das regras para viabilizar economicamente as novas usinas e a repotencialização das atuais”, alerta Gil Maranhão, diretor de sustentabilidade da empresa e membro eleito do Brasil no conselho de administração da Associação Internacional de Hidrelétricas (IHA).

Em fevereiro passado, representantes do setor hidrelétrico elaboraram uma carta aberta com recomendações que contemplam a modernização e a retomada de projetos de novas usinas. O documento foi encaminhado ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira. Em março, os presidentes da Abragel e da Abrapch reforçaram essa reivindicação em audiência com o secretário-geral do ministério, Arthur Cerqueira. “Saímos de lá com a sensação de que nossos argumentos foram bem recebidos e podem levar a uma correção de rota na política energética do governo”, espera Torres, da Abrapch.

O que não falta, segundo Maranhão, são oportunidades mapeadas de novas usinas no Brasil, de vários tipos, tamanhos e locais. “Além das que estão com estudos em desenvolvimento, há as que podem ser expandidas com motorização adicional e outras cujos projetos já foram desenvolvidos, mas estão paralisados por inviabilidade financeira”, relata.

A Agência Internacional de Energia Renovável (Irena), lembra Maranhão, propõe dobrar para 2,5 mil gigawatts (GW) – o mesmo que 2,5 milhões de MW – a capacidade mundial de geração de energia hidrelétrica até 2050 para ajudar a cumprir a meta de limitar o aquecimento global em 1,5 ºC. A própria Irena, porém, admite a dificuldade de alcançar essa expansão, ao informar que apenas 4% dos investimentos mundiais em fontes renováveis foram para hidrelétricas no período entre 2013 e 2018.

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