Revista Energia
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Ciclone causa destruição em Muçum (RS) – setembro de 2023 — Foto: Gustavo Mansur/Palácio Piratini
Ciclone causa destruição em Muçum (RS) – setembro de 2023 — Foto: Gustavo Mansur/Palácio Piratini

Na primeira semana de novembro de 2023, uma tempestade atingiu a região metropolitana de São Paulo. Com ventos superiores a 100 km/h, deixou 3,7 milhões de consumidores sem luz. Passadas 24 horas, mais de dois milhões de pessoas continuavam no escuro. No início do ano, novas chuvas levaram a capital paulista a enfrentar problemas no abastecimento, atingindo a região central, o que levou o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, a analisar o que poderia ser feito em relação à concessionária Enel.

No início de março, em sua tradicional carta aos investidores, o megainvestidor Warren Buffet alertou que o conglomerado Berkshire Hathaway seria cauteloso em colocar dinheiro novo na PacifiCorp, concessionária dos Estados Unidos que atua em seis Estados do país, como Oregon e Califórnia. A gigante está sendo processada pelo governo dos Estados Unidos e consumidores em razão de incêndios em 2020 que destruíram milhares de casas e queimaram mais de 200 mil hectares de terras no Oregon. As vítimas do incêndio pediram mais de US$ 7 bilhões em indenizações, alegando que a concessionária não atuou como deveria para controlar o fogo.

Esses são dois exemplos do cenário que tem levado as mudanças climáticas a ganhar ainda mais relevância no setor elétrico. “Desde a crise hídrica, o tema tem feito comercializadoras, geradoras, transmissoras e distribuidoras buscarem entender mais e compreender se os eventos climáticos extremos serão mais recorrentes e qual seria essa nova recorrência. Temos tido transmissoras que enfrentaram uma queda de torre por ano nos últimos quatro anos e isso não ocorria com essa frequência”, afirma Ana Clara Marques, especialista em clima na Climatempo Energia.

Em 2023, registraram-se na cidade de São Paulo 107 dias com temperatura superior a 30 graus Celsius, acima da média de 82 dias apurada desde 2007, e nove dias com mais de 35 graus, o triplo da média em 16 anos, segundo dados da Climatempo. “Entender os novos padrões é essencial para saber como as empresas precisarão adaptar a operação e seus equipamentos”, diz a meteorologista. Se ventos superiores a 100 km/h se tornam mais frequentes, temperaturas mais elevadas por mais dias podem ter mais impacto sobre o consumo e raios podem aumentar a incidência de incêndios ao redor de linhas de transmissão, será preciso pensar em equipamentos mais resilientes e planejar novos traçados de linhas de transmissão.

A ISA CTEEP contratou a Way Carbon para analisar os efeitos climáticos sobre sua área de concessão até 2050. Responsável por 94% da energia transmitida no Estado de São Paulo, a concessionária pretende mapear as áreas mais sensíveis, entender os potenciais impactos e discutir como se pode criar uma regulação para tratar da resiliência climática. “Temos de entender se pode haver uma reconfiguração do traçado das linhas ou se é preciso ter algum reforço não previsto”, diz o presidente da empresa, Rui Chammas. Atenta aos impactos das mudanças climáticas, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) abriu uma tomada de subsídios sobre a resiliência das redes e os efeitos climáticos (encerrada em abril).

“Os efeitos adversos das mudanças climáticas demandam ativos e redes mais resilientes. O ‘novo anormal’ climático já chegou. Os eventos climáticos extremos que o país sofreu em 2023, como a seca extrema na Amazônia, temperaturas recordes, vendavais na região de São Paulo e inundações na região Sul, não são um ‘soluço’, causado, por exemplo, por um El Niño severo, e sim o ‘novo anormal’ climático. Esta é uma constatação factual do World Weather Attribution, uma colaboração acadêmica global que estuda a atribuição de eventos extremos, cálculos do impacto das mudanças climáticas em eventos meteorológicos extremos, como ondas de calor, secas e tempestades”, observa o presidente da PSR, Luiz Augusto Barroso.

Barroso, da PSR: adaptação de empresas tem de ser imediata — Foto: Leo Pinheiro/Valor
Barroso, da PSR: adaptação de empresas tem de ser imediata — Foto: Leo Pinheiro/Valor

Ele destaca que essa nova realidade climática tem duas consequências para o setor elétrico. A primeira: além dos investimentos em mitigações, há a necessidade de investimentos em adaptação e resiliência. A segunda: os modelos matemáticos de afluência, ventos, temperatura etc. e os critérios de planejamento e operação precisam ser adaptados imediatamente para a nova realidade.

“O desafio é que a decisão sobre a melhor proporção entre ações estruturais, corretivas e de recomposição depende da frequência dos eventos desfavoráveis. Por exemplo, secas ou vendavais. No entanto, o efeito das mudanças climáticas é justamente alterar essas frequências. Por exemplo, a seca de 2020 e 2021 foi equivalente à pior estiagem observada nos últimos 90 anos. Se devido às mudanças climáticas, secas como essa passarem a ocorrer com um intervalo médio de, por exemplo, 15 anos, os modelos de afluências e os critérios de planejamento devem se ajustar à nova realidade. Caso contrário, seremos ‘otimistas’ e causaremos prejuízos aos consumidores”, aponta Barroso.

A nova realidade cria dilemas: mitigar os impactos climáticos implica modernizar e tornar resilientes redes de distribuição e transmissão, sendo que parte delas tem mais de 30 anos. O desafio é fazer esse esforço caber no bolso. Hoje, 12,5% da conta de luz, segundo dados do governo, são subsídios e encargos. Um levantamento da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) apontou que em 2022 o Brasil teve o maior custo residencial com energia elétrica na comparação com 34 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A carga tributária em energia, que acaba no bolso de Estados e União, supera 30%.

Na área de transmissão, estimativas do governo apontam que até 2032 deveriam ser investidos R$ 37,6 bilhões em atualizações. Boa parte das linhas de transmissão que escoam a energia nas regiões Sudeste e Sul tem mais de 50 anos de idade. Levantamento do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) apontou que existiriam 96.740 equipamentos com vida útil regulatória até 2022. Isso não implica que eles precisariam ser imediatamente substituídos até 2022, mas que os equipamentos ficariam completamente depreciados a partir da data. Estariam em substituição cerca de 15% do total, pouco mais de 16 mil equipamentos, mas não há informações precisas sobre a questão.

“Será importante não onerar as tarifas desnecessariamente, para que os consumidores, já muito sacrificados, possam absorver os custos necessários de investimentos em adaptação e resiliência. Isso significa que o planejamento, através de análises de custo-benefício entre as opções tecnológicas, deve evitar que o consumidor pague pelo que não precisa e buscar que se pague o menos possível por aquilo que precisa, e onde há valor para o sistema”, afirma Barroso.

O impacto será também sobre a comercialização de energia e a gestão de risco, uma vez que extremos aumentam as vazões e podem ter interferência sobre regime de ventos ou sobre a irradiação. “Elas também precisarão se adaptar. Se vamos ter mais conservadorismo, isso vai depender da frequência, magnitude e direção dos impactos e da capacidade dos agentes e do sistema gerenciarem o novo perfil de risco. Por exemplo, maior volatilidade de preços cria oportunidades na comercialização, mais riscos e mais responsabilidade para o sistema, que precisará criar mecanismos para garantir a segurança de mercado”, diz Barroso.

Efeitos climáticos mais extremos também têm impacto sobre o consumo. De 2007 a 2023, o ano passado só perdeu para 2014 no registro de temperaturas acima de 30 graus: na cidade de São Paulo, em 2014, 120 dias ficaram acima de 30 graus e 11 acima de 35, enquanto em 2023 foram, respectivamente, 107 e 9 dias. O maior consumo no setor tem sido verificado à tarde, em razão do acionamento de ar-condicionado. Em 15 de março, em uma onda de calor, o ONS registrou a maior demanda instantânea da história: naquele dia, às 14h37, o patamar atingido foi de 102.478 MW. “Temos buscado estudar mais os fenômenos climáticos para nos preparar melhor, com interação maior com a Agência Nacional de Águas e com meteorologistas. A temperatura tem sido variável importante na demanda”, diz o diretor-geral do ONS, Luiz Carlos Ciocchi.

Esse impacto das mudanças climáticas coincide com o avanço de fontes variáveis, como usinas solares e eólicas, e a maior complexidade da operação. Torna ainda mais relevante um sistema de precificação que capture a variabilidade das fontes, a gestão de demanda de consumidores e a maior flexibilidade na operação. Quando o sol para de brilhar no céu, no fim da tarde, se verifica a queda da geração solar e um aumento da carga, já que os mais de dois milhões de instalações de geração distribuída solar deixam de gerar energia e passam a consumir da rede.

No jargão do setor, se assiste a uma rampa, como se milhões de aparelhos de ar-condicionado e chuveiros fossem ligados ao mesmo tempo. Essa rampa hoje está em 25 GW de capacidade. Estima-se que possa chegar a 50 GW em 2027, segundo projeções do ONS. Isso tem influenciado, em dias de calor, aumento de preços da energia no mercado livre no fim da tarde e à noite. “Flexibilidade passa a ser ainda mais importante”, diz Ciocchi.

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