O cenário é animador para o algodão brasileiro. Na estimativa da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), a produção em pluma da safra 2022/23 deve chegar a 3,069 milhões de toneladas, alta de 19,8% em relação à safra anterior, que rendeu 2,55 milhões de toneladas, de acordo com dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Essa marca ultrapassa os 3 milhões de toneladas na temporada 2019/20. O incremento na oferta de algodão em relação à safra 2021/22 foi alcançado graças ao avanço de 2,2% da área de cultivo e aumento de 14,1% na produtividade.
O otimismo se sobrepõe às dificuldades, como a fraca demanda mundial por algodão e derivados, apontada por Alexandre Schenkel, presidente da Abrapa. “Estamos encerrando um período comercial (2022/23) complicado, porque os altos níveis de inflação para os consumidores europeus e americanos e as baixas margens das fábricas de fiação levaram a quedas significativas no consumo global, que se refletiu em baixas nos preços da pluma no mercado internacional”, destaca. Segundo ele, a safra brasileira maior que é esperada, com algodão de mais qualidade, será importante para a recuperação do consumo no período comercial 2023/24, que começa em agosto, diz.
Com área plantada de 1,65 milhão de hectares, produtividade média em torno de 1.827 kg por hectare, considerando o consumo interno de pluma na casa das 710 mil toneladas e produção total superior a 3 milhões de toneladas, a exportação acaba sendo o destino de grande parte do produto nacional. O país ocupa a segunda posição no ranking das exportações, com 20% de todo o algodão exportado no mundo. Dados da Abrapa indicam que foram cerca de 1,68 milhão toneladas de pluma exportadas em 2021/22, com receita de US$ 3,2 bilhões. Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic) registram que até maio de 2023 foram exportadas 364,2 mil toneladas. Na safra 2022/23, podem alcançar 2,2 milhões de toneladas, mais 22% ante o ciclo anterior. O mercado asiático importa 99% da produção brasileira, sendo China (27%), Vietnã (16%), Turquia (13%) e Bangladesh (12%) os principais destinos, seguidos do Paquistão, Indonésia, Malásia, Coreia do Sul, Índia e Tailândia.
“O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) projeta um aumento na safra de 25,47 milhões de toneladas, um aumento de 7,2%”, afirma Schenkel, lembrando ainda que a China projeta uma estimativa de consumo de 8,1 milhões de toneladas (alta de 2,7%). “A expectativa indica o retorno do apetite nas aquisições dos compradores ao algodão para a nova safra”, estima o presidente da Abrapa.
Segundo Tiago Pereira, analista técnico da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), é esperado um aquecimento na demanda na safra 2022/23, nos mercados interno e externo, com continuação da bonança na safra seguinte. “A plantação de algodão é cara: hoje tem custo em torno de R$ 19 mil o hectare, sendo que na safra 2020/21 girava em R$ 10 mil”, afirma. Ainda assim, diz ele, pagando quase o dobro do preço para plantar, a “lucratividade do produtor poderá crescer, sendo que um dos fatores é o aumento de qualidade do produto nacional, que já conta com 42% do volume certificado pelo padrão Better Cotton Initiative (BCI)”. Esse certificado valida as boas práticas na cadeia produtiva de 80 países.
O aumento da demanda no mercado externo é a aposta do produtor Walter Horita, que cultiva 40 mil hectares de algodão na região de Barreiras, oeste da Bahia, Estado que tem área plantada de 312 mil hectares e produção estimada em 2022/23 na casa das 596 mil toneladas, segundo a Abrapa. Ele já colheu 30% da lavoura e espera um recorde de produtividade, com rendimento de 5.550 kg por hectare. “O clima nos favoreceu, do plantio à colheita”, diz Horita. Na safra passada, no entanto, ele teve rendimento menor, de 4.350 kg por hectare. “Mas a média dos últimos cinco anos ficou em torno das 300 arrobas (4.500 kg)”, afirma. De 70% a 80% da sua produção segue para a exportação, via trading. “Precisamos, no entanto, ficar alertas à entrada de grandes fundos de investimentos no mercado de commodities. Eles compram ou vendem em quantidades colossais, o que desestabiliza as negociações”, analisa Horita. “Se conseguirmos manter a cotação internacional em US$ 0,80 libra/peso por kg, podemos seguir ganhando em torno de 25%, em média”, calcula. “Se cair, começaremos a procurar alternativas”, ressalta.
O algodão é produzido, também, em quantidades menores, no Mato Grosso do Sul, Goiás, Paraná, Minas Gerais, Maranhão, São Paulo, Piauí, Tocantins, Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte e Rondônia. De acordo com a Conab, com ligeiras diferenças em razão das condições de topografia e clima entre as regiões, as safras de algodão seguem com boas perspectivas de produtividade.
No Centro-Oeste, Milton Garbugio, que planta 3 mil hectares de algodão em Campo Verde, no Estado do Mato Grosso, maior produtor nacional – com plantio de 1,18 milhão de hectares e colheita de 2,2 milhões de toneladas –, afirma que “as lavouras estão ótimas”, mas não espera grande lucratividade. Na safra passada, ele diz ter conseguido vender seu algodão por até R$ 170 a arroba e, neste ano, enxerga um preço máximo de R$ 125. “Vendi 60% da safra antecipadamente, para cobrir os custos, e a lucratividade tem caído. Fazendo as contas, acredito que vamos conseguir vender pela média de R$ 115 a arroba, e já estamos gastando R$ 110 para produzir, ou seja, quase elas por elas”, diz.