As enchentes no Rio Grande do Sul tiveram forte impacto sobre a indústria da moda. Dos 22 mil fabricantes de roupas e acessórios do Estado, entre 11 mil e 13 mil foram diretamente atingidos e muitos deles, depois de estarem parados já há praticamente dois meses, só devem começar a normalizar a produção a partir de agosto, de acordo com estimativas do Sindicato das Indústrias do Vestuário do Estado do Rio Grande do Sul (Sivergs).
Os prejuízos com danos em máquinas e instalações e com a queda de faturamento em relação aos R$ 3 bilhões de 2023 ainda estão sendo apurados, mas, conforme a Secretaria da Fazenda do Estado, somente em maio o volume de vendas - incluindo também a indústria têxtil gaúcha - caiu 17,2% (R$ 125 milhões) na comparação com o mesmo período do ano passado.
No varejo, a Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Rio Grande do Sul (FCDL-RS) calcula que 12,5 mil dos 75 mil estabelecimentos que vendem roupas, acessórios e calçados e empregam cerca de 370 mil pessoas no Estado foram impactados de alguma forma, com perdas parciais ou totais de estoques, mobiliário, equipamentos e áreas físicas. A entidade estima o prejuízo, preliminarmente, em torno de R$ 1,2 bilhão.
O presidente da federação, Vitor Augusto Koch, diz que apenas no quarto trimestre deste ano o segmento deverá retomar os níveis de vendas anteriores à enchente nas regiões atingidas. Ele espera “celeridade” na liberação de medidas de socorro governamentais e apoio dos fornecedores na concessão de prazos maiores de pagamento e renegociação de dívidas.
Em compensação, quem tem mais fôlego no varejo ajudou a indústria. A Lojas Renner, com sede em Porto Alegre, adiantou pagamentos a fornecedores de confecções e calçados atingidos, direcionou a eles novos pedidos para aumentar a demanda de curto prazo e recebeu antecipadamente produtos que já estavam prontos, explica o CEO, Fabio Faccio. A varejista, que tem uma rede de fornecimento espalhada por todo o país, também doou itens como cestas básicas e produtos de limpeza para cerca de 700 funcionários de mais de dez empresas parceiras no Estado e, em Porto Alegre, financiou o aluguel de barcos para resgatar costureiras da cooperativa Justa Trama, que produz roupas e acessórios com algodão agroecológico para marcas da companhia.
Na indústria de confecções, com cerca de 31 mil empregos diretos e contratação de 38 mil microempreendedores individuais, há relatos de demissões, mas os números precisos ainda são desconhecidos. Segundo o vice-presidente do Sivergs, Sílvio Colombo, as empresas mais atingidas estão descapitalizadas e a maioria não tem como oferecer as garantias exigidas, por exemplo, pelo Pronampe Emergencial Para Micro e Pequenas Empresas do Rio Grande do Sul, que conta com subsídio de 40% em empréstimos de até R$ 150 mil.
Em Cachoeirinha, na região metropolitana de Porto Alegre, a Confecção Declari, de vestuário feminino, parou de produzir no dia 3 de maio, quando chegou a ficar debaixo de 1,5 m de água, e só voltou a operar exatamente um mês depois, quando concluiu a limpeza, substituiu mobiliário e consertou máquinas e equipamentos. Nesse período, o prejuízo somou cerca de R$ 500 mil e só não foi maior porque houve tempo de levar produtos prontos e a maior parte dos 500 rolos de tecido em estoque para o segundo andar.
Conforme a empresária Darlene Lopes Alves, sócia da confecção junto com o marido Mário César, a empresa produz de 30 mil a 40 mil peças por ano e no início da enchente 60% da coleção de inverno deste ano já havia sido entregue. Os produtos salvos e confeccionados depois da volta ao trabalho, no entanto, foram colocados a venda com desconto de 30% porque o prazo de envio para a estação já havia encerrado. Roupas remanescentes do inverno de 2023 foram oferecidas pela metade do preço. Mesmo assim, a empresa manteve os 20 funcionários e pretende retomar o nível normal de operação em agosto.
A estamparia A. Mascarello - localizada no bairro Floresta, em Porto Alegre, onde a inundação passou de 1,6 m -, tinha capacidade de imprimir até 3 mil m de tecido por mês. Agora, estima prejuízo de aproximadamente R$ 2 milhões entre instalações, matérias-primas e equipamentos. A operação deve ser retomada gradualmente, o que significa mais R$ 500 mil em perdas de faturamento desde o início de maio, calcula o empresário Daniel Garcia de Garcia, sócio da esposa Amanda Mascarello, que só a partir do ano que vem espera recuperar o mesmo nível de faturamento de 2023.
O vice-presidente do Sivergs, Sílvio Colombo, dono da Mareblu, de moda praia e fitness, amargou dois meses sem faturamento devido à inundação da empresa no bairro Navegantes, em Porto Alegre. Com 12 funcionários e mais de 30 microempreendedores contratados, a fabricante produzia em média 15 mil peças por ano e também espera retomar gradualmente as operações. Ao mesmo tempo em que ainda faz as contas dos prejuízos sofridos entre instalações e equipamentos, tenta convencer os clientes a receberem os produtos da próxima coleção com pelo menos 45 dias de atraso.