Candidata à nova fronteira petrolífera brasileira, a margem equatorial - área que vai do Amapá ao Rio Grande do Norte e inclui as bacias marítimas da Foz do Amazonas, Pará-Maranhão, Barreirinhas, Ceará e Potiguar - tem previsão de receber, este ano, US$ 1,09 bilhão para a fase de exploração, segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Apesar da controvérsia sobre a atividade em uma região ecologicamente sensível e que vem mostrando divergências entre as áreas ambiental e energética do governo, esse valor representa mais da metade do total de US$ 1,96 bilhão previsto para a fase de exploração de petróleo em 2024 no país. Os números, de janeiro, não levam em conta a segunda etapa, de desenvolvimento e produção.
Estados banhados pela margem têm boas expectativas. Para o presidente da Federação das Indústrias do Pará (Fiepa), Alex Dias Carvalho, a atividade petrolífera deverá movimentar a economia, ampliando oportunidades para fornecedores locais, na maioria pequenos e médios negócios, gerando emprego e renda. “Também deverão ocorrer incrementos em infraestrutura e logística para atender às necessidades da operação e o crescimento das atividades portuárias e marítimas”, afirma ele.
Com aumento da arrecadação de impostos, além da geração de royalties, o executivo espera benefícios socioeconômicos, em especial para as cidades que compõem o arquipélago do Marajó, onde estão cidades com os piores Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) do país. A Fiepa também espera a criação de centros de estudos e pesquisa para a formação de profissionais locais, técnicos e pesquisadores.
A Petrobras, empresa com maior presença na margem equatorial, com 17 blocos, prevê investir na região US$ 3,1 bilhões entre 2024 e 2028, segundo seu plano estratégico. Os recursos irão para projetos de pesquisa e investigação do potencial petrolífero, com a perfuração de poços. Há 34 blocos, ainda na fase de exploração, sob concessão na área, segundo a ANP. Estão nas bacias de Barreirinhas (11), da Foz do Amazonas (9), Potiguar (9) e do Pará-Maranhão (5).
A margem equatorial se tornou a “menina dos olhos” do setor de óleo de gás a partir das descobertas na Guiana, há cerca de uma década. Desde então, o país já incorporou 11 bilhões de barris em reservas. O vizinho Suriname encontrou cerca de 4 bilhões de barris. Somados, os volumes superam as reservas provadas brasileiras, de 14,8 bilhões de barris segundo o Anuário Estatístico Brasileiro do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis da ANP, de 2023.
Em apresentação feita em junho passado para a Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, a superintendente de promoção de licitações da ANP, Marina Abelha, mostrou que a margem equatorial “apresenta diversas oportunidades exploratórias em modelo geológico similar” à Guiana e Suriname. E as perspectivas de volume apontam para cerca de 16 bilhões de barris de petróleo.
Os ativos da Petrobras na região estão distribuídos pelas bacias Foz do Amazonas, Pará-Maranhão, Barreirinhas e Potiguar, todos em fase de pesquisa. Em outubro, a estatal obteve o sinal verde do Ibama para a perfuração de dois poços na bacia Potiguar. O primeiro, concluído no fim de janeiro, mostrou indícios de hidrocarbonetos, mas os dados são ainda inconclusivos quanto à viabilidade econômica. O segundo poço tem conclusão prevista para o terceiro trimestre.
Ambientalistas rejeitam projeto por riscos de vazamento de óleo e aumento de emissões
Em maio de 2023, a Petrobras protocolou pedido para que o Ibama reconsidere sua posição negativa em relação à perfuração de um poço no bloco FZA-M-59, na Foz do Amazonas. A empresa aguarda a decisão. O Ibama diz que não tem prazo para concluir a análise. Um estudo da estatal, mencionado pelo ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, indica potencial de 5,6 bilhões de barris só nesse bloco, o que elevaria em 37% as reservas nacionais provadas.
Até agora, segundo o Ibama, só a Bacia Potiguar obteve licença para perfurar. Outras empresas com blocos na margem aguardam licenças, cujas análises estão em vários estágios. A Shell é um exemplo, com nove blocos na margem equatorial, dos quais opera sete. A região ainda tem a presença de petroleiras como Enauta, PetroRio, 3R, entre outras, que têm de um a três blocos.
A exploração na margem, porém, é rejeitada por ambientalistas e pesquisadores, por riscos de vazamento de óleo e aumento das emissões de gases do efeito estufa. O porta-voz do Greenpeace no Brasil, Marcelo Laterman, diz que a região tem questões sensíveis em aspectos variados, como ambientais, geopolíticos e locais. Como o Brasil busca retomar protagonismo global na agenda ambiental e climática, avalia, uma nova fronteira de petróleo em área ambientalmente sensível e perto da sede da COP30 “é uma contradição que pode transformar o país de líder em vilão”. A dinâmica das correntes marinhas e costeiras da região, pouco conhecida, é outra questão delicada, diz, uma vez que pode tornar imensuráveis os impactos de eventuais vazamentos.
Ricardo Fujii, especialista em conservação do WWF-Brasil, afirma que as emissões provenientes do petróleo da foz do Amazonas são estimadas em 1,7 bilhão de toneladas, uma “contribuição relevante no aquecimento global”.
Já o sócio da KPMG Anderson Dutra defende a exploração na região. “É um ativo bom que pode atrair investimentos para desenvolver uma área erma no país”, afirma. E, apesar de haver áreas de proteção indígena na nova fronteira petrolífera, ele acredita que a regulação pode ser flexível. “É preciso levar em conta que a região tem uma certa complexidade”, diz.