No caminho da luta histórica das mulheres pela igualdade de direitos e de participação no mundo dos negócios elas encontraram uma atividade com potencial de ajudar no crescimento pessoal e profissional rompendo barreiras: a mentoria. Essa prática bastante difundida, em que profissionais bem-sucedidos levam seu conhecimento e experiência a outros em fase de crescimento, faz a diferença na carreira profissional de muitas mulheres.
“Acredito que a mentoria ajuda a encarar melhor diferentes experiências que as mulheres enfrentam nos negócios, no trabalho. Coisas novas, como falar em público ou gerir projetos”, diz Chieko Aoki, fundadora e presidente da rede de hotéis Blue Tree e mentora. Para a empresária, as mulheres hoje estão mais aguerridas, mais bem preparadas, mas mesmo assim, quando se tem várias opções, surgem dúvidas quanto ao melhor caminho a seguir - aí a mentoria entra como amparo. Mas ela ressalta que mentorar é muito mais do que dizer o que é certo ou errado; é sim mostrar o que deu certo.
“Conto histórias da vida real. Histórias que deram certo para inspirar as mulheres, e não decidir por elas, porque a decisão sobre qual caminho seguir é sempre do mentorado”, diz Aoki. Ela lembra que quando começou havia poucas mulheres executivas. “Tive de conviver com homens, tive muitas dúvidas, mas é preciso ter humildade para perguntar. Perguntei e assim aprendi muito com eles. Percebi mais tarde que outras mulheres precisavam de ajuda, como eu precisei”.
Leia mais:
- Igualdade de gênero ainda é desafio para negócios
- Cresce presença feminina em associações tradicionais do agro
- Programas impulsionam carreiras e diversidade
- 'Degrau quebrado' atrapalha ascensão para gerência
- Homem divide mais, mas 'jornada invisível' sobrecarrega mulher
- Na ciência, poucas chegam ao topo da profissão
A mineira Marina Máximo, de 38 anos, fundou, em 2019, a Máximo Detalhe, de brindes corporativos. “Entramos no mercado com a proposta de ressignificar o ato de presentear das empresas, fazendo com que o brinde se transformasse em um canal de comunicação da marca. Começamos no varejo, no boca a boca. Acabamos indicados pelos clientes e fomos atender a Johnson & Johnson, o Google, a Amazon ”, conta. De 2020 para 2021, afirma, o crescimento ultrapassou os 1.000%, sem nenhum investimento de marketing. O espaço inicial de 38 m2 foi trocado por um de 400 m2, com dez colaboradores diretos. Também atua com terceirizados. “Percebi que quando se vira empresário se tem o desafio de planejar para crescer de forma sustentável.”
Foi quando, por meio da consultoria EY, seu caminho profissional cruzou com o de Aoki, com quem faz mentoria há menos de um ano. Máximo diz que cansou de aprender só na dor e precisava de uma pessoa que a inspirasse, que trouxesse conhecimentos de forma acolhedora e com toda consciência do que é empreender sob desafios, mas, principalmente, que também fosse mulher. “O mercado ainda é machista”, explica. Hoje, ela atende Natura, Bosch, Bradesco, Disney, Embratel, Meta, entre outras gigantes.
“A mentoria tem um papel crucial no empoderamento, no crescimento profissional das mulheres, porque oferece suporte para o desenvolvimento de habilidades que permitem gerar mais confiança e conhecimento para alcançar seus objetivos”, avalia a consultora de RH Valdirene Cristina Ferreira, head executiva na VF Consultoria de RH e também mentora.
O alcance dessa troca de conhecimento e experiência, segundo a consultora, extrapola o intercâmbio entre mentor e mentorado. “A mentoria hoje também foca no networking, tão importante para o crescimento na carreira, ajudando ainda na questão da diversidade ao ser usada como uma plataforma para mudanças culturais e estruturais dentro das organizações”, completa Ferreira.
Ajudar mulheres a se perceber como empreendedoras ou profissionais competentes através de sua própria experiência como empreendedora faz parte da vida de Luiza Trajano há alguns anos. Atualmente presidente do conselho de administração da rede de varejo Magazine Luiza - depois de ter presidido a empresa por quase 7 dos 33 anos que tem na companhia -, a empresária foi eleita em 2021 uma das 25 mulheres mais influentes do mundo pelo jornal britânico Financial Times. Trajano é fundadora do Grupo Mulheres do Brasil, organização criada em 2013 com foco em ações de políticas inclusivas de mulheres, e que tem na vice-presidência do conselho estatutário Chieko Aoki.
“É importante interagir com mulheres em um momento da carreira ou do empreendimento em que elas precisam da experiência de outra mulher para que sua trajetória seja menos sofrida do que foi a nossa”, defende a empresária. Ela lembra que, há 50 anos, sentiu a desconfiança de sua capacidade empreendedora por ser mulher, mas nunca se intimidou. “Nas reuniões, levantava a mão e dizia ‘vocês precisam me ouvir, têm de me ouvir’”. Hoje, diz, o momento é outro, mas as mulheres ainda precisam de apoio para ocupar espaços iguais aos dos homens. “Não é fácil, mas é possível”, afirma.