Formada em economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e mestre pela PUC-Rio, Natalie Victal é economista-chefe da SulAmérica Investimentos há dois anos e responsável pela elaboração do cenário econômico tomado como base por diferentes áreas da companhia. Possui dez anos de experiência em gestoras de recursos e análise econômica, lidera uma equipe de quatro pessoas e sua ambição é ser um pequeno exemplo do que a igualdade de oportunidade pode gerar.
Mulher negra, defende que seu caminho é resultado de uma “corrida de revezamento” em que família, amigos e mentores foram os primeiros a lhe “passarem o bastão”, numa posição que permitiu que seguisse de forma determinada. Mas nota que muitas meninas não se veem representadas nas profissões do mercado financeiro. “Fiz economia, que é um curso masculino, no fim dos anos 2000 e as mulheres eram um terço das turmas, o que foi diminuindo, especialmente no campo vinculado ao mercado financeiro. Quando fui para PUC-Rio fazer o mestrado em macroeconomia era a única mulher da turma e todos os professores eram homens”, conta Victal.
Ela, Juliana Laham, diretora de investimentos do Bradesco Global Private Bank, e Carolina Giovanella, fundadora e CEO da Portofino Multi Family Office, são exceções em um universo majoritariamente masculino. Dados do Think Tank Official Monetary and Financial Institutions Forum (Omfif) apontam que mulheres ocupam apenas 35% dos cargos em conselhos dos 50 maiores bancos comerciais do mundo. Em cargos de liderança, esse índice cai para 19%, com somente 16% de CEOs mulheres.
Quando o assunto é finanças, no Brasil a desigualdade é maior. Se no mundo as mulheres equivalem a 18% dos profissionais certificados pela Chartered Financial Analyst (CFA), título fundamental para atuar no mercado financeiro, no Brasil, segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), apenas 7% dos gestores com a certificação são mulheres. E há 21% de consultoras de investimento cadastradas na Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Outro ponto que agrava esse desequilíbrio é a desigualdade salarial e as políticas de bônus. “As mulheres sofrem penalidades salariais e de progressão profissional até quando resolvem ser mães”, afirma Claudia Yoshinaga, coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV Eaesp. Ela diz que mesmo com a lei aprovada no ano passado estabelecendo que homens e mulheres em cargos semelhantes têm que receber o mesmo salário, um estudo da FGV que coordenou mostra que a maior parte da remuneração no mercado financeiro vem de bônus, que em muitos casos são reduzidos quando as profissionais têm que se ausentar na licença-maternidade ou para cuidar dos filhos.
Mulheres também enfrentam dificuldades para crescer profissionalmente. Em cargos mais elevados, ocupam apenas 7% das posições. Em relação aos salários, a diferença diminui só quando elas estão no topo, como sócias ou diretoras. São os casos de Laham, do Bradesco, e de Giovanella, da Portofino. A diretora de investimentos do Bradesco conta que teve dificuldades quando mudou da área da tesouraria para o private.
“Na tesouraria a linguagem é mais direta. Quando vai para pessoa física e private bank, a conduta é outra, e a forma como se coloca é diferente. As pessoas tinham dificuldade de compreender como eu falava”, conta. Laham era considerada agressiva porque era direta na linguagem. “Na realidade eu era assertiva e o ambiente era muito masculino, eu não conseguia atingir o público que eu queria, tanto interno quanto externo”, observa.
A executiva passou por coaching para se adaptar à nova realidade - uma das orientações era para não chorar na frente dos outros e tratar as emoções com o psicólogo. “Eu aprendi a separar emoção da racionalidade do trabalho. Aprendi técnicas, e esse aprendizado marcou um pedaço da minha carreira”, afirma.
Giovanella, que entrou no mercado de gestão de recursos para administrar o patrimônio da família e hoje tem R$ 22 bilhões sob a sua tutela, tenta ampliar a participação feminina no setor. “Há dificuldade de encontrar mulheres em posição de liderança nesta área. O nosso papel dentro das famílias é o de cuidar de patrimônio, e acho que tem tudo a ver com o perfil feminino”, diz. A gestora, entre os cinco maiores family offices do país - o único liderado por uma mulher -, tem estatísticas diferentes da indústria. Hoje, 35% de seus colaboradores são mulheres, assim como 30% da liderança e da base de sócios.
A executiva lamenta ainda haver quem precise ser convencido a acreditar em um negócio liderado por uma mulher - mas vem ganhando território. “Tenho que ir mostrando resultados por meio de muito trabalho. E estou conseguindo. Em quatro anos queremos ser a maior [gestora de family office] do país”.