Considerado essencial para a transição energética e para atender a indústria de tecnologia na fabricação de baterias, ligas metálicas, cerâmica e vidro e na produção de fármacos, o lítio chegou em novembro à cotação recorde de US$ 84 mil por tonelada. No Brasil, um dos países com maior potencial de extração, retirou da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) o controle sobre o mineral em julho de 2022, liberando sua exportação e as de seus derivados.
Esses fatores geraram uma corrida de projetos para exploração na região batizada pelo governo de Minas Gerais como Vale do Lítio, composta por 14 cidades do médio Vale do Jequitinhonha. A área reúne cerca de 45 depósitos do mineral, segundo estudos do Serviço Geológico do Brasil. Dados levantados pelo Observatório dos Vales e do Semiárido Mineiro, vinculado à Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), mostram que foram registrados, de 2021 a 2023, 370 processos minerais, sendo 188 somente de janeiro a abril de 2023.
Para o governo mineiro, a região pode se desenvolver com a exploração. “Queremos que o Vale do Jequitinhonha se transforme no vale da tecnologia para a produção de baterias e demais produtos de valor agregado”, disse o governador Romeu Zema em maio, no lançamento do Vale do Lítio. A geógrafa e professora da UFVJM Aline Weber Sulzbacher, porém, avalia que as comunidades locais, segundo ela com forte cultura de agricultura sustentável, podem não se beneficiar. “Desde a década de 1960, temos a prova concreta de que grandes empreendimentos que se propõem ao desenvolvimento, inclusive de geração de energia limpa, não resultaram em desenvolvimento local. O aumento desses processos minerários gera uma insegurança jurídica e dos territórios em toda a região, muito mais do que resultados econômicos”, diz.
O governo mineiro afirma que já foram confirmados investimentos de mais de R$ 5 bilhões para a região, com potencial de criar mais de 3.000 empregos. As projeções até 2030 situam-se entre R$ 20 bilhões e R$ 30 bilhões em investimentos. Os interessados incluem as nacionais Sigma Lithium e Companhia Brasileira de Lítio (CBL), a americana Atlas Lithium, a australiana Latin Resources, a canadense Lithium Ionic e a holandesa AMG Critical Materials, que já opera como AMG Brasil no limite dos municípios de Nazareno e São Tiago.
A Lithium Ionic opera no Brasil como MG Lit e desenvolve projetos numa área de 14,18 hectares no nordeste mineiro. Já a AMG tem mina a céu aberto de pegmatito, rocha da qual extraiu cassiterita para produção de estanho e tântalo para a indústria eletrônica. No rejeito dessas extrações, passou a investir em P&D para construir, a partir de 2011, uma rota para o lítio, obtendo o concentrado de espodumênio ou concentrado de lítio. A empresa está investindo US$ 50 milhões, que vão elevar a capacidade de produção de 90 mil para 130 mil toneladas.
Fabiano Costa, CEO da AMG, explica que a produção do concentrado é direcionada a clientes chineses para conversão em carbonato e hidróxido de lítio de grau técnico e posterior envio para uma subsidiária na Alemanha, que faz o beneficiamento final com conversão para hidróxido grau de bateria. “Agora já temos aprovado outro investimento de US$ 250 milhões, com financiamento do banco de desenvolvimento alemão KFW, para termos uma planta química semelhante à da Alemanha no Brasil, verticalizando a produção em Nazareno e São Tiago. E avaliamos todas as oportunidades de exploração do lítio no Brasil, incluindo o Vale do Lítio e o Nordeste”, afirma o CEO da AMG.
A verticalização já é realidade na CBL, pioneira no Brasil, explorando o lítio há 35 anos com extração em Itinga e beneficiamento em Araçuaí. Vinícius Alvarenga, CEO da companhia, afirma que a empresa opera da extração à produção de carbonato e hidróxido de lítio, matérias-primas finais de baterias e remédios. “Usamos a lavra subterrânea nas rochas que contêm o lítio de forma automatizada, com baixa pegada de carbono e monitoramento microssísmico ao longo das galerias. Nas unidades de Itinga e Araçuaí, produzimos 45 mil toneladas por ano. A única planta química fora da China é a da CBL, a mais antiga em operação do mundo”, afirma Alvarenga.
A Sigma Lithium anunciou investimentos de R$ 3 bilhões em uma planta de alta tecnologia para obtenção de um produto com alto grau de pureza para a produção de baterias. No início de agosto, informou ter atingido as metas de produção planejadas para o segundo trimestre na unidade industrial Greentech, no Vale do Jequitinhonha, e segue o planejamento para produzir, até dezembro, 130 mil toneladas de concentrado de lítio. Os próximos embarques previstos são de 15 mil toneladas de lítio verde no fim de agosto, 30 mil toneladas de ultrafinos em meados de setembro e outras 18 mil toneladas de lítio verde no fim de setembro.