A diferenciação entre registro digital de ativos não fungíveis (NFTs, em inglês) e a representação digital de um bem (token) é tão sutil quanto a exclusividade de uma nota de R$ 100 impressa com algum errinho. As notas intercambiáveis, fungíveis e de mesmo valor, corresponderiam ao token, enquanto aquela nota singular se torna não fungível, dada sua especificação.
“Sempre que um token puder ser diferenciado por características dentro dele, ou metadados, se torna um NFT”, descreve Luiz Otavio, CEO da Dux. Ele entrou no mundo das criptomoedas em 2016 e passou por artes e games, durante a explosão dos jogos que remuneram usuários. Captou US$ 1,5 milhão em rodada liderada pela Animoca Brands em 2021, quando reuniu uma das dez maiores guildas (grupos de jogadores) do mundo, com mais de 30 mil gamers, que empregavam personagens digitais “emprestados” para gerar renda, dividida com a empresa.
Com a queda do mercado, o modelo gerou prejuízo, mas rendeu capacitação tecnológica. O novo modelo de negócios mira simplificação da tecnologia, com carteira digital capaz de enviar NFTs ou tokens por e-mail sem necessidade de aplicativos, reduzindo para menos da metade os 15 passos hoje necessários para negociação dos ativos.
Estudo da Dux indica que o Brasil tem hoje um ecossistema maduro e mais de 5 milhões de usuários de NFTs. Um caso em desenvolvimento na casa é um programa de fidelidade para um grupo de franquias com 25 marcas - a maior delas com mais de 350 unidades. Além da interoperabilidade entre as marcas, com autogestão pelo usuário, um segundo passo seria a captação de investimentos pulverizada por aquisição de NFTs ou tokens.
A rede de franquias de massagem Buddha Spa está lançando um programa de fidelidade baseado em NFTs. “A tecnologia proporciona segurança e gestão de processos eficiente, ágil e menos custosa”, diz o CEO Gustavo Albanesi. Um aplicativo criado pela goBlockchain permitirá aos usuários acessar serviços, descontos e parcerias exclusivos e remunerados pela moeda Buddha, já negociada na corretora Foxbit.
Sistema semelhante rendeu redução de 15% no custo de aquisição de clientes e aumento de 30% no número de interessados (leads), oriundos de artigos e do blog centrado nos NFTs lançados pelo hotel Solar do Imperador, em Porto Seguro (BA). A base é a coleção “Brasil e suas Belezas do Nordeste”, com obras do artista plástico Agman Duarte, cuja aquisição rende diárias, experiências com parceiros de turismo na cidade, descontos, cortesias e investimentos na comunidade local.
Os NFTs são negociados na criptomoeda Etherium em markeplaces como Binance e Opensea. Em julho, perto de cem clientes chegaram ao hotel a partir do blog, somando 280 noites de hospedagem. Segundo o diretor do hotel, Charbel Tauil, os R$ 15 mil investidos no projeto devem render R$ 300 mil anuais.
A Globo lançou NFTs relacionados à programação televisiva, para manter o telespectador conectado e experimentar novos modelos de geração de conteúdo. Uma das primeiras iniciativas foi atrelada ao reality show “The Masked Singer”, com 6.100 NFTs colecionáveis, dos quais 1.100 pagos. O canal de streaming Globoplay criou uma coleção relacionada à novela “Todas as Flores”. Assinantes convidados por WhatsApp a participar de teste de personalidade receberam NFTs do personagem com quem se identificavam e acesso a vídeo antecipado da segunda temporada. A série “Xuxa, o Documentário” ganhou 60 figurinhas digitais colecionáveis. As mais valiosas incluem experiência única e presencial com a artista.
A Pepita Global foi por caminho diferente e criou NFT que representa o processo de rastreabilidade de extração de ouro, com meta de se tornar ferramenta de investimento descentralizado para impulsionar a operação de mineradoras parceiras e, no futuro, atrelar os tokens a entrega de ouro. O projeto prevê 28,8 milhões de unidades, das quais 72 mil foram colocadas a venda com valor inicial de US$ 22 (cerca de R$ 110), cerca de um terço do valor da grama de ouro. Mas o CEO Rodrigo Mentor explica que a só rastreabilidade, certificada por parceiros, já está se tornando um valor em alta na área de commodities que sofrem com ilegalidades, como o ouro.