Indispensáveis no enfrentamento de doenças que demandam cirurgias e cuidados intensivos, os hospitais perdem essa condição à medida que os pacientes se estabilizam e podem continuar o tratamento em casa com a ajuda de enfermeiros ou cuidadores, sob supervisão médica a distância. Embora pareça óbvia, essa constatação só começou a ser percebida nos anos 1980, nos Estados Unidos, e passou a ser seguida no Brasil pouco antes da virada do milênio. Não se trata de uma alta hospitalar antecipada, mas de uma transição humanizada, conhecida como home care ou, em bom português, como desospitalização.
“Desde que bem realizado, [o home care] é um processo com inúmeras vantagens. Permite que o paciente se recupere num ambiente mais confortável, ao lado dos familiares, e evita o risco de uma infecção hospitalar. Além disso, reduz os custos do hospital, ao liberar um leito e trocar uma equipe de dez profissionais envolvidos no tratamento do paciente por um ou dois cuidadores deslocados para a residência dele”, afirma o radiologista Giovanni Cerri, do Hospital das Clínicas de São Paulo.
Com tantos benefícios, a desospitalização é uma tendência mundial que cresce à medida que o avanço tecnológico facilita a monitoração remota do paciente e o uso de equipamentos menos volumosos para a realização de exames em domicílio. “Isso vale principalmente para pessoas com doenças crônicas, que podem, depois de estabilizados, continuar o tratamento em casa. Um paciente que tenha sofrido um AVC [Acidente Vascular Cerebral], por exemplo, não precisa mais ficar meses internado. Pode fazer a fisioterapia em casa”, afirma Cerri.
O momento de fazer a desospitalização, no entanto, precisa ser muito bem definido entre a equipe médica, o paciente e os familiares que apoiarão a recuperação em casa. Há familiares que resistem em fazer essa transição por não terem tempo disponível para prestar a atenção exigida, uma vez que não podem abandonar o emprego, ou porque se sentem inseguros em abandonar a estrutura do hospital, ou ainda que alegam não conseguir o suporte necessário por parte do plano de saúde da família ou do Sistema Único de Saúde (SUS).
Os bons resultados da desospitalização, de qualquer modo, têm quebrado resistências ao longo do tempo, indicando se tratar de uma tendência sem volta no Brasil e no mundo, ante o envelhecimento da população e a prevalência de doenças crônicas sobre as agudas - especialmente entre idosos, mais suscetíveis a casos de diabetes, hipertensão, hepatite e câncer. De acordo com o Instituto Brasileira de Geografia e Estatística (IBGE), a proporção de brasileiros com 60 anos ou mais passou de 4,9% em 1950 para 14% em 2020 e vai crescer em ritmo ainda mais forte nos próximos anos.
Para garantir melhor qualidade de saúde a esse contingente de pessoas maduras, a desospitalização será fundamental, mas não suficiente. “É preciso aumentar o investimento em saúde preventiva, que hoje é de apenas 11% do que é destinado ao setor. É a prevenção que vai adiar a primeira hospitalização”, observa Bruno Porto, da PwC.