O hidrogênio de baixo carbono a ser produzido no Brasil pode transformar-se em um dos mais competitivos do mundo e atrair 8% dos US$ 350 bilhões de investimentos globais previstos até 2030, segundo a Thymos Energia. Fatores como a farta disponibilidade de energia elétrica renovável (eólica e solar, por exemplo) e a oferta de recursos hídricos sustentam essa tese na produção de H2V, que traz vantagens importantes para a descarbonização da economia.
Entretanto, o hidrogênio verde, que não emite gases poluentes durante a combustão e nem durante o processo de produção, ainda possui um custo bastante elevado, comparativamente a outras tecnologias ou opções energéticas. Cálculos preliminares apontam que produzir um kg de H2V no Brasil custaria entre U$ 6 e US$ 8. Para ser competitivo, esse custo teria de baixar para US$ 1,5 a US$ 2.
“Mas esse é um patamar para exportação. Ou seja, para competir no mercado global. Esses US$ 1,5 a US$ 2 são os preços da molécula colocada no porto de destino”, aponta Rosana Santos, diretora-executiva do Instituto E+ Transição Energética. Na avaliação dela, a diferença, para alcançar a competitividade, seria paulatinamente absorvida pela sociedade brasileira. “Exatamente por isso temos de tentar transformar essa molécula em algo de maior valor agregado, que realmente represente o esforço financeiro da sociedade”, diz.
A energia elétrica pode corresponder de 60% a 80% dos custos de produção do hidrogênio. Por isso, na opinião das empresas, seria necessário reduzir o preço da energia, influenciado por gastos com capex, opex, e tributos. “Os principais fatores que pressionam os valores das eólicas hoje são os custos de transmissão e de ICMS. Se conseguirmos reduzir esses dispêndios, o hidrogênio verde consegue ficar mais competitivo”, afirma Francisco Habib, diretor de engenharia da Casa dos Ventos.
Ele explica que, depois de uma análise minuciosa feita pela companhia, é possível viabilizar projetos de hidrogênio verde em escala industrial e comercializar o energético no país entre US$ 4 e US$ 5 por kg. Para ele, o valor de US$ 2 é um “target” interessante, mas ainda é possível ser competitivo com valores entre US$ 2,5 e US$ 3. Nos Estados Unidos, afirma, a produção do H2V recebe subsídios, com o que o preço pode cair até US$ 3 por kg.
Independentemente desses custos, o otimismo em relação ao futuro do H2V tem relação direta com o fato de ele ser a melhor alternativa para eliminar as emissões de carbono, além de possibilitar o transporte de energia verde por longas distâncias, na avaliação de Bernardo Sacic, diretor de desenvolvimento de novos negócios da AES Brasil. Para a diretora do Instituto E+, o mix energético nacional significativamente renovável em comparação com o do mundo (90% para o setor elétrico e 50% para o energético, comparado com cerca de 20% do resto do mundo) e a disponibilidade de água, embora cada vez mais escassa, são de sobra elementos fundamentais para a economia do hidrogênio.
Santos lembra que, numa primeira fase, somente o Complexo Industrial e Portuário do Pecém, no Ceará, deve abrigar usinas com capacidade entre 10 GW e 12 GW de eletrolizadores. “Mais da metade dessa capacidade já está comprometida com pré-contratos, sendo que o projeto mais avançado é o da mineradora australiana Fortescue, com indicação de investimentos de US$ 5 bilhões”, diz ela.
A Casa dos Ventos também prevê erguer uma planta de hidrogênio verde e amônia no complexo, que, no momento, está em fase de licenciamento. “Temos acordos firmados com parceiros estratégicos com o objetivo de viabilizar a exportação da amônia verde e garantir uma cadeia de suprimentos para a transição energética dos países europeus”, conta Habib.
O executivo diz que a usina terá capacidade de até 2,4 GW de eletrólise, produzindo 960 toneladas de hidrogênio por dia, o que possibilitará a produção de 2,2 milhões de toneladas de amônia por ano. Segundo ele, a empresa tem um memorando de entendimento com a Petrobras e com a TotalEnergies para fomentar a produção de H2V e de outros produtos renováveis. “As três empresas estão trabalhando para estruturar projetos em conjunto”, acrescenta.
A AES Brasil, por sua vez, assinou em fevereiro de 2022 um memorando de entendimento com o governo do Ceará e um pré-contrato com o Porto de Pecém para um estudo de viabilidade de produção de H2V. Com isso, passou a contar com uma área de 80 hectares reservada para a construção de uma planta de grande escala. “Nosso portfólio, com 100% de energia renovável, com hidrelétricas e parques eólicos e solares, atesta uma vocação para produzir hidrogênio verde”, afirma Sacic. “Inicialmente, acreditamos que a produção será de ao menos 2 GW de energia renovável e até 800 mil toneladas de amônia verde por ano”.
Alinhado à estratégia global da companhia, o projeto prevê o início das operações antes de 2030. Ainda este ano, a AES Corporation, empresa que controla a AES Brasil, havia divulgado que pretende investir US$ 20 bilhões na produção de H2V até 2030. E, junto com a Air Products, anunciou recentemente um plano de investimento de cerca de US$ 4 bilhões na construção de uma instalação de produção de hidrogênio verde na cidade de Wilbarger County, no Texas (EUA).
A Agência Internacional de Energia (IEA) estima que a produção anual de H2V pode atingir 38 milhões de toneladas em 2030 se todos os projetos em discussão no mundo forem realizados.