Florestas
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Por Sérgio Adeodato — Para o Valor, de São Paulo


Serra Vermelha, no Piauí: expansão agrícola no Estado pressiona a última fronteira virgem da Mata Atlântica — Foto: André Pessoa/Divulgação
Serra Vermelha, no Piauí: expansão agrícola no Estado pressiona a última fronteira virgem da Mata Atlântica — Foto: André Pessoa/Divulgação

Com 823 mil hectares, o Parque Nacional da Serra das Confusões, a maior área protegida deste tipo do Nordeste, no sul do Piauí, está no centro de conflitos que fazem jus ao nome. As atenções giram em torno de um rincão vizinho, a serra Vermelha - um pedaço intocado da Mata Atlântica, incrustrado no Semiárido, sob pressão da mais nova fronteira agrícola que se expande a partir do Matopiba, na divisa entre Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Estava tudo pronto para a proteção legal daquela floresta, incluída na expansão do parque que seria oficializada no Dia Mundial do Meio Ambiente, em junho, mas a medida acabou retirada de última hora do pacote ambiental anunciado pelo presidente Lula porque o governo piauiense não deu anuência ao projeto.

O episódio, atribuído por ambientalistas a pressões políticas de parlamentares do Piauí, abre novo capítulo de uma antiga disputa entre conservação ambiental e desenvolvimento econômico, quando o mundo busca conciliar os dois vetores. “No atual cenário de mudança climática, com ameaça à biodiversidade e meios de subsistência, não existe argumento político ou de interesse econômico que justifique a destruição da serra Vermelha”, afirma Wigold Schäffer, conselheiro da Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (Apremavi) que acompanha desde o início o movimento para proteção do lugar.

Após flagrante de fornos que transformavam a Mata Atlântica em carvão, em 2010, houve um acordo para incorporar 312 mil hectares da serra Vermelha ao Parque Nacional da Serra das Confusões, com pagamento de R$ 150 milhões pelo governo federal ao Piauí por compensação pela proteção da área, sem uso agropecuário, em região marcada pela pobreza. No entanto, os 100 mil ha de alta importância biológica que estavam sendo explorados por uma empresa de energia ficaram de fora da medida, o que levou a Justiça Federal a não reconhecer o acordo e dar seguimento a uma ação do Ministério Público Federal (MPF).

Em 2016, em audiência de conciliação, as partes concordaram em retomar a conservação de toda a serra, mas não houve avanços. Na sentença final, em 2022, a juíza federal Marina Rocha Mendes intimou o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) a resolver a questão em 180 dias. “Prefeitos locais querem a área para soja e poucos piauienses sabem sobre a importância biológica da região para o desenvolvimento econômico”, diz Tânia Martins, coordenadora geral da Rede Ambiental do Piauí (Reapi).

Em março, após a mudança na gestão federal, o movimento ambientalista selou acordo com o Ministério do Meio Ambiente para incorporar o restante da serra ao parque, em vez de criar uma nova área de proteção. Após a negativa piauiense em junho, nova petição foi ajuizada pelo MPF para se chegar a uma conciliação. “Há comprovação científica suficiente para a preservação da área”, afirma o procurador Tranvanvan Feitosa.

A serra Vermelha, na transição entre Caatinga e Cerrado, guarda florestas tropicais relictuais, na forma como existiam remotamente antes da diferenciação entre os dois biomas. A área compõe o mapa oficial para aplicação da Lei da Mata Atlântica. Segundo Márcia Hirota, presidente da Fundação SOS Mata Atlântica, a serra tem alto potencial de capital natural, principalmente na cadeia do turismo conciliada com a produção de alimentos, uma vez que ao lado se localiza a infraestrutura de nível internacional do Parque Nacional Serra da Capivara, maior polo de pinturas rupestres do planeta. “É oportunidade de um novo modelo para o desenvolvimento territorial”, enfatiza Hirota. Com a possível ampliação, Serra das Confusões poderá se tornar o maior parque brasileiro da Mata Atlântica.

A existência do bioma com restrição tem sido objeto de polêmica no Piauí, que busca avançar no agronegócio. O secretário estadual do Meio Ambiente, Daniel Oliveira, diz que o governo tem respeitado a aplicação legal do mapa oficial da Mata Atlântica, mas aponta divergências sobre essas florestas em outras referências oficiais. No caso de Serra das Confusões, constatou-se que a ampliação do parque poderá gerar impactos sociais relevantes relacionados a questões fundiárias, afirma o secretário.

O Ministério do Meio Ambiente diz que a proposta de ampliação do parque é prioritária e que realiza reuniões com a Casa Civil e o governo do Piauí para finalizar o processo. A conservação da serra Vermelha como parte do Parque da Serra das Confusões, segundo a pasta, promoverá emprego e renda com desenvolvimento baseado na natureza como alternativa à expansão de atividades agropecuárias. De 2021 a 2022, o Piauí desmatou 282 ha no bioma, segundo o Atlas da Mata Atlântica. Ao mesmo tempo, o Matopiba tem mapeados 5,1 milhões de ha desmatamento com a expansão agrícola.

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