Coloque mulheres na proteção das florestas e as árvores crescerão mais fortes. Esta é a conclusão de um projeto pioneiro de 30 anos que elevou mulheres ao topo das florestas comunitárias do Nepal - e abriu o caminho delas para a política local e nacional.
Três décadas escolhendo mulheres para liderança produziram florestas mais saudáveis e trabalhadores mais felizes, diz Nabaraj Pudasaini, secretário-adjunto do departamento de florestas e conservação do solo do governo. “Em comparação a outras florestas comunitárias do país, as administradas por mulheres estão se saindo extraordinariamente bem”, diz ele. “As mulheres passam mais tempo na floresta do que os homens e portanto têm um amor mais profundo e um maior entendimento dela. Elas são honestas, transparentes e mantêm boas relações com os aldeões, de modo que se tornaram um sucesso”, acrescenta.
Apsara Chapagain é uma exemplo dessa tendência de mulheres como melhores guardas-florestais. Ela foi a primeira a presidir a Federação dos Usuários Comunitários Florestais do Nepal (Fecofun, na sigla em inglês), órgão que promove os direitos comunitários sobre as terras locais. Após comandar a Fecofun de 2010 a 2015, Chapagain é hoje vice-presidente da Assembleia da província de Bagmati, uma das sete do país. Aos 51 anos, ela credita sua ascensão na política ao trabalho na proteção das árvores e defesa das mulheres. “Trabalhamos para mostrar o caminho para o Estado”, diz Chapagain, cujo período em que passou no movimento florestal a ensinou a comandar equipes, presidir reuniões e tomar decisões em benefício da comunidade. “Nenhuma instituição do Estado pode ignorar a contribuição da Fecofun”, acrescenta.
Com florestas tropicais e temperadas cobrindo cerca de 40% da nação himalaia, a saúde de suas árvores é fundamental para a prosperidade do Nepal e de seus cerca de 29 milhões de habitantes. As florestas comunitárias foram estabelecidas em 1995 para o uso mais sustentável das terras e ajudar a reduzir a pobreza local. Desde então, a área florestal passou de 29% para 44%, segundo o Ministério das Florestas e do Meio Ambiente. A Fecofun representa hoje 3 milhões de nepaleses que trabalham nas florestas em 22.145 grupos. Destes, mil são liderados por mulheres; o restante é dividido igualmente por gênero.
Popular Gentle, um especialista em florestas comunitárias, diz que a Fecofun foi pioneira ao garantir a representação igualitária das mulheres, grupos étnicos e todas as castas. Ele diz que o governo observou seu sucesso e seguiu seu exemplo, incorporando a política da entidade para garantir que mulheres assumam um terço das funções em todos os aspectos do Estado. A Fecofun foi ainda mais ambiciosa, garantindo metade de seus empregos para mulheres em uma cláusula implementada em 1996 e que levou muitas delas à política.
Bharati Pathak, que deixou o cargo de presidente da Fecofun em junho, diz que o programa permitiu participação e empoderamento feminino para mulheres que antes não podiam sair de casa. A sociedade nepalesa é patriarcal, com as mulheres em grande parte confinadas a cuidar da família e do lar.
Quase 29% das nepalesas são economicamente ativas - 53% dos homens -, e as trabalhadoras têm maior probabilidade de ter empregos precários, segundo o Banco Mundial. Pathak - que passou 15 anos no comitê central da Fecofun - foi tesoureira, secretária-geral e presidente. Agora atuando como membro da Assembleia de Bagmati, ela faz parte de um grupo de pioneiras florestais que se tornaram políticas. Na eleição de novembro, mais de 40 ativistas florestais comunitários - sendo 30 mulheres - conseguiram assentos na Câmara dos Deputados e nas sete assembleias provinciais do Nepal. A representação feminina na política nepalesa é de 33%.
Elas são essenciais para o cultivo e preservação das florestas do país - e também para promover uma maior inclusão nas instituições estatais, diz Sindhu Dhungana, secretário-adjunto do Ministério das Florestas e do Meio Ambiente. “O programa florestal comunitário do Nepal pode servir de modelo para o mundo”, diz. Segundo ele, mulheres plantaram árvores, impediram a conversão para pasto, cercaram florestas e educaram aldeões sobre conservação da terra.
Uma dessas mulheres, Nanda Kuwar, 50, preside a floresta comunitária Madhumalati, no oeste do Nepal, desde 2014. Quando assumiu, a floresta era esparsa e estava sob ameaça por especulação imobiliária, pecuária e agricultura. A primeira tarefa de Kuwar foi lançar uma campanha para incentivar a população a plantar mais mata - iniciativa que a deixou exposta à fúria de um incorporador imobiliário que a atacou com uma foice. “O sangue escorria da minha mão”, lembra ela. “Ver as árvores da floresta me faz esquecer a dor.”
A Floresta Comunitária de Mulheres Mangal Tal, no distrito de Mawalparasi, no centro-oeste do país, é um exemplo de resgate ambiental liderado por nepalesas. Havia invasão de aldeões que cultivavam arroz e criavam vacas - e quando os homens locais não conseguiram detê-las, as mulheres entraram em cena e assumiram o comando, diz Kamal Pariyar, porta-voz da Fecofun em Nawalparasi. Uma comissão de mulheres cercou a área e plantou árvores. Hoje os visitantes precisam pagar ingressos, e a renda é revertida para as famílias mais pobres, priorizando aquelas chefiadas por mulheres. “Quando as mulheres assumiram a liderança há 15 anos, elas acabaram com as invasões”, diz Pariyar. “Elas fizeram todas as famílias entender a importância da floresta.”