A geração solar por meio de usinas fotovoltaicas, que hoje responde por 4,6% da capacidade instalada do Sistema Interligado Nacional (SIN), deve ampliar a participação para 8% em 2027, estima o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Este ano, a expectativa do setor é que a geração distribuída (GD) injete no sistema em torno de 8 gigawatts (GW), o equivalente a uma hidrelétrica de Tucuruí. Esse aumento na oferta de energia renovável é bem-vindo, mas traz desafios técnicos, regulatórios e de infraestrutura.
Um dos gargalos é o descompasso entre o tempo de conclusão dos projetos de geração, de três anos, e os de transmissão, de até cinco anos. “O norte de Minas Gerais e o oeste da Bahia são pontos críticos, com projetos em volume superior à capacidade de transmissão atual e mesmo à projetada”, diz o diretor-geral do ONS, Luiz Carlos Ciocchi. “Houve leilão de transmissão para escoar 9 GW, mas a perspectiva de geração para essas localidades já é o dobro disso.” O órgão gestor propôs ao governo e à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a realização de um leilão da margem de transmissão.
Outro desafio é a intermitência das fontes solar e eólica, que requer o uso de modelos preditivos sofisticados para equilibrar oferta e demanda de energia. “Reconhecemos a força da geração solar e estamos aprimorando nossos processos de planejamento, programação e operação em tempo real”, acrescenta o executivo. “O ONS não será um impedimento para a evolução do setor elétrico brasileiro, seremos sempre um habilitador dessas mudanças.”
Em 2022, a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), uma das maiores do país, recebeu mais de 160 mil solicitações para conexão por GD. Esse número foi 35% superior ao de 2021, em função da “corrida do ouro” dos interessados em obter autorizações de geração com benefícios nas tarifas de uso da rede. Em março, a empresa precisou suspender as análises por 15 dias até adotar uma solução: passou a fazer a liberação imediata para micro GD (telhados solares) e uma análise técnica para mini GD.
“Conseguimos atender 93% dos clientes dentro do prazo”, informa o diretor de distribuição da empresa mineira, Marney Tadeu. “Como somos pioneiros em GD no Brasil, é natural que os primeiros esgotamentos aconteçam em nossa área de concessão”, diz. Ele acrescenta que a Cemig está implantando um robusto plano de investimentos, que prevê alocar R$ 18,4 bilhões na distribuição até 2027, para possibilitar a ligação de cargas reprimidas e melhorar a confiabilidade do fornecimento.
A rápida expansão das fontes renováveis vai demandar sistemas de armazenamento que deem mais flexibilidade ao sistema, observa o professor Nivalde de Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Gesel/UFRJ). Ele lembra que a questão também afeta outros países: “Em 2040, já vai sobrar energia durante o dia na Europa”. Para o pesquisador, o novo cenário requer soluções a serem melhor estudadas, como as baterias e as usinas hidrelétricas reversíveis, que bombeiam a água de volta ao reservatório para uso posterior.
O presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Marcos Madureira, avalia que os desafios técnicos vêm sendo bem encaminhados e que o principal problema é político. “O subsídio elevado à geração distribuída está causando um aumento na conta dos demais consumidores brasileiros”, afirma. “Ele deveria ter diminuído junto com o custo dos investimentos, que caiu 80% nos últimos dez anos”. Na visão da Abradee, todos os usuários da rede devem ser responsáveis pelos seus custos.
“Um estudo da EPE [Empresa de Pesquisa Energética] demonstrou que é possível triplicar a geração de energia renovável sem sobressaltos para a operação”, ressalta o presidente executivo da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), Rodrigo Sauaia. Ele avalia que este será o melhor ano para as grandes usinas, porque a fonte solar esteve presente em seis dos sete leilões de energia renovável realizados desde 2019. “Hoje, essa é a forma mais barata de gerar energia no Brasil e em vários países”, afirma.
Sauaia aponta dois grandes desafios: aprimorar as regras para os sistemas isolados, de modo que as baterias possam ser uma opção competitiva; e reduzir a tributação sobre esses dispositivos, que chega a 70% - bem maior que a tributação do tabaco, por exemplo. “Temos conversado com o governo federal e com órgãos reguladores, buscando destravar o potencial bilionário desse mercado para o Brasil”, afirma.