A nova fase de expansão do mercado livre de energia do Brasil, prevista para janeiro de 2024, já vem promovendo oportunidades de negócios no país, envolvendo comercializadoras vinculadas a bancos, geradoras, fundos de investimento e empresas de tecnologia. No radar, novos consumidores de alta tensão, que estarão aptos a escolher seu próprio fornecedor de energia elétrica. Hoje essa flexibilidade é permitida, apenas, para aqueles com demanda superior a 500 kW, que respondem por 38% do consumo de energia nacional. Com a ampliação, que abrirá as portas do mercado livre para todos os clientes de alta tensão, como padarias, gráficas, salão de beleza, o potencial subirá para 48%.
Muitas comercializadoras já estão fechando contratos com consumidores que chegarão ao mercado em janeiro de 2024. “No primeiro trimestre de 2023, firmamos 46 contratos. No mesmo período do ano passado, foram três” diz Roberta Godoi, VP de soluções energéticas da Energisa e líder da (re)energisa. O varejo elétrico também entrou na agenda da Engie, que lançou o primeiro e-commerce de energia no mercado livre. A empresa vem fechando contratos para 2024. “Saímos de cem clientes há cinco anos para mais de mil”, Maury Garret, gerente inteligência de mercado da Engie.
A 2W Ecobank, criada especificamente para o Ambiente de Contratação Livre (ACL), é um dos exemplos de negócios que crescem nesse novo cenário, com serviços de energia 100% renovável, sustentabilidade e financeiros. “Os novos consumidores são menos sensíveis a preços e mais a produtos, como crédito e serviço financeiro. Fora do Brasil é muito comum ter crédito mais barato vinculado a metas de sustentabilidade”, diz Claudio Ribeiro, CEO da 2W Ecobank.
Segundo ele, nem sempre o consumidor se mostra motivado a migrar para o mercado livre, porque a redução de custos de energia para uma pequena empresa não chega a ser relevante. Já se a possibilidade vier acompanhada de oferta de crédito vinculada a redução de emissões, como para compra de máquinas mais eficientes no consumo de energia, torna-se mais atrativo. A 2W assinou contrato com Oi a fim de ampliar a venda de soluções para o mercado livre, com foco no varejo.
A digitalização é outro alvo de negócio promovido pelo ACL. Foi com esse objetivo que a Delta Energia, grupo que comercializa 5.000 MW médios por mês - 8% do consumo de energia brasileiro -, criou a Luz em 2022. “Para entrar nesse mercado é preciso ter plataforma 100% digital”, diz Rafael Maia, CEO da Luz, fornecedora digital de energia elétrica. Trata-se de mudança relevante em setor predominantemente analógico. O grupo adquiriu a BestDeal Technologies para desenvolver produtos que permitirão aos clientes a gestão do consumo de energia, discriminado por aparelhos.
“A Delta considera importante estar na abertura do mercado de alta tensão para estar preparada para o mercado de baixa tensão”, diz Luiz Viana, vice-presidente da empresa. Caso o projeto de lei 414, que abre a possibilidade de migração para o mercado livre de todos os consumidores, seja aprovado, serão mais de 80 milhões de consumidores podendo escolher que energia comprará.
A abertura integral do mercado livre para todos os consumidores tem potencial de atrair bilhões de investimentos em publicidade, diz Rodrigo Ferreira, presidente-executivo da Abraceel, associação das comercializadoras. “Veremos algo parecido com o que ocorreu com o setor de telecomunicações. Vamos ver anúncio de venda de energia em jornais”, diz. A isso, Rafael Maia acrescenta: “O consumidor terá relação mais próxima com a energia elétrica e poderá mudar a qualquer momento de uma operadora para outra que trouxer mais benefícios para ele.”
Nesse novo modelo, a confiança na entrega de energia será crucial para a expansão do mercado livre e para as companhias conseguirem fidelizar clientes. A AES Brasil aposta na capacidade de fornecimento. “Nossa capacidade instalada dobrou nos últimos seis anos, passando a 5,2 GW, sendo 50% nas fontes eólica e solar” , diz Rogério Jorge, vice-presidente comercial da empresa.