O Brasil mantém uma relação com os Estados Unidos que demonstra ser inabalável, quando se trata de investimentos diretos. E a China, maior parceira comercial do Brasil, ainda está longe de ameaçar a posição americana, segundo Carolina Moehlecke, professora de relações internacionais da FGV. “O fluxo dos EUA para o Brasil apresenta flutuações ao longo dos anos, respondendo a questões políticas domésticas globais, mas é um vínculo consolidado, não sofre grandes variações”, diz.
Os números são a radiografia desse relacionamento. Dados elaborados pela Câmara Americana de Comércio (Amcham) com informações do Banco Central mostram que em 2023 os EUA investiram cerca de US$ 10 bilhões - ou 25,8% do total de aportes desse tipo vindos do exterior. Os números se referem ao fluxo de participação de capital e não consideram lucros reinvestidos no país. “Pensamos que eles refletem melhor a relação”, diz Fabrizio Panzini, diretor de Políticas Públicas e Relações Governamentais da Amcham. Segundo ele, esse cálculo, em geral, representa reinvestimentos de empresas instaladas aqui, novos investimentos em companhias entrantes no país e empréstimos de matriz para filiais.
Nos últimos cinco anos, a média desses investimentos estrangeiros diretos (IED) dos EUA no Brasil foi de US$ 10,4 bilhões. No quinquênio anterior, a média foi de US$ 8,1 bilhões. Na comparação entre os dois períodos, há um crescimento de 28,4%. “Esses números mostram uma presença americana forte na última década no Brasil”, comenta Panzini. O pico ocorreu em 2021, com US$ 13 bilhões. A participação dos EUA em relação ao total desse tipo de investimentos que entra no Brasil também é crescente. No período de 2014 a 2018, era de 14,7% em média do total desses aportes e chegou a 25,6% em média no quinquênio seguinte. Segundo Moehlecke, a presença chinesa está em torno de 4%. “Os investimentos dos EUA estão ascendentes e ganhando espaço em relação ao total de investimentos estrangeiros no Brasil”, diz Panzini.
Mesmo quando se considera o estoque, a participação americana é marcante. O estoque pode ser considerado como os ativos que as empresas têm no Brasil. Nesse quesito, os EUA são o maior país investidor, com US$ 167 bilhões em estoque, de um total de US$ 1,1 trilhão, ou seja, cerca de 16%. E os aportes são diversificados: 70% em serviços, 15% em indústria e 15% em agricultura. O desempenho também está relacionado ao fato de a presença dos EUA no Brasil ser mais tradicional e longeva, o que também fomenta investimentos. “A China ainda precisaria de muito tempo para chegar ao mesmo nível”, declara Moehlecke.
Panzini lembra que das mil maiores empresas do Brasil, 198 tinham participação de capital estrangeiro. “E, dessas, 23,2% possuem capital dos EUA, o maior estrangeiro. Representam R$ 243 bilhões em receita bruta”, diz ele, que também ressalta a longa trajetória dos investimentos dos EUA no Brasil. “As empresas de capital dos EUA participaram de maneira muito ativa da industrialização brasileira durante o século XX”, ressalta Panzini. “Historicamente, o IDE concentrou-se nos segmentos automóvel, energias renováveis, petróleo e gás, agricultura e infraestruturas”, diz Malcolm Dorson, head da estratégia de mercados emergentes da Global X ETFs, uma gestora americana de ETFs, que acompanha mercados emergentes.
Panzini argumenta que, atualmente, investimento estrangeiro e exportação estão muito ligados, porque grande parte do comércio mundial é feito por multinacionais, numa relação entre matriz e filiais. Em meio a esse cenário, também houve mudança no perfil dos IEDs americanos, indo do industrial para a ênfase no setor de serviços de tecnologia, com TI, saúde e serviços financeiros, além de maior participação das áreas de energia limpa e minerais. Informativo da Embaixada americana no Brasil afirma que todas as startups unicórnios brasileiras receberam investimentos dos Estados Unidos.
O executivo da Amcham projeta que a tecnologia continuará tendo um papel “muito importante”, citando que em 2023 a empresa de data center Cloud HQ, anunciou que fará investimentos de US$ 3 bilhões em data center aqui no Brasil. “Também vejo aumento dos investimentos relacionados à transição energética. A Amazon, por exemplo, fez um investimento de US$ 200 milhões em energia eólica no Rio Grande do Norte.”