![Annabel Thomas: “Os mais jovens se preocupam com a origem do produto e como foram produzidos” — Foto: Divulgação](https://s2-valor.glbimg.com/_PhmBEwx-G9dmfUR2wgV_f7i7k0=/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2023/1/D/6pi86TRQWbqpWEIR3UcQ/foto04rel-101-setorpri-f5.jpg)
Da produção de uísque na Escócia aos cafezais de Minas Gerais, preservar e recuperar a biodiversidade ganha espaço na estratégia das empresas não só para atender exigências legais, mas por razões práticas. Produtos com menor pegada ambiental tendem a ser mais competitivos no mercado global e a conquistar a preferência de consumidores que usam a sustentabilidade como critério de compra. “Especialmente os mais jovens, que realmente preocupam-se com a origem do produto e como foram produzidos. Se a indústria não refletir esses valores, iremos perdê-los”, diz Annabel Thomas, fundadora e CEO da Nc’nean Distillery.
Localizada em Lochaline, costa oeste da Escócia, a Nc’nean é a mais jovem destilaria entre marcas centenárias. Já nasceu sustentável com zero emissões líquidas de carbono nas operações e foi a primeira fabricante de bebidas destiladas no Reino Unido a usar vidro reciclado em 100% de suas embalagens. A Nc’nean Distillery não está sozinha. Nada menos que 140 fabricantes de uísque na Escócia anunciaram que vão zerar suas emissões de carbono, até 2040, antecipando, voluntariamente, em dez anos as metas anunciadas pelo Reino Unido e em cinco anos as escocesas.
A suíça Nestlé lançou, em 2011, um plano global para ajudar produtores de café a tornarem suas técnicas de cultivo mais sustentáveis, com foco na economia regenerativa. O conceito é novo, mas as práticas são antigas, como diversidade de culturas, plantio de árvores e, principalmente, solo naturalmente coberto para manter os micronutrientes da terra.
Segundo a head de ESG para café e bebidas da Nestlé Brasil, Taissara Abdala Martins, a meta é ter pelo menos 30% de suas compras provenientes da agricultura regenerativa até 2025 e que, até 2030, metade das 1,5 mil fazendas fornecedoras da companhia façam parte do programa. Hoje são 35, espalhadas por São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo. “Estamos na nossa segunda safra de café colhido nessas fazendas e só em emissões a redução foi de 70%. Isso mostra que produzir com respeito à biodiversidade não é coisa de literatura nem sonho”, afirma ela.
Já a Votorantim Cimentos tem um projeto de proteção de nascentes onde foi detectado o risco de escassez hídrica e outro que transforma as minas de calcários e agregados em lagos artificiais, à medida em que deixam de ser produtivas. A companhia também está implementando o Sistema Agroflorestal (SAF) nas reservas ambientais onde atua. A empresa anda incentiva projetos com o conceito de bioeconomia para manter a floresta em pé, diz o diretor global de sustentabilidade, relações institucionais, desenvolvimento de produto e engenharia, Álvaro Lorenz. Foi lançado um edital para escolha de cinco projetos no Pará, Tocantins e Amazonas, como o de uma escola itinerante de agroecologia que ensina de técnicas de rotação de cultura a efeitos das queimadas no solo. Cada um recebe R$ 65 mil.
Em Minas Gerais a aposta é em ações para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. A Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) anunciou investimentos de R$ 34 milhões em um centro de descarbonização. “A meta é ter dados suficientes para comparar nossas empresas com as de outros países”, afirma Flávio Roscoe, presidente da entidade. “Antigamente, quando se falava em competitividade, era só preço. Hoje, é preço e pegada ambiental”.
Nem sempre, porém, ações de preservação ambiental demandam grandes investimentos. A catarinense Portobello, fabricante de pisos e revestimentos, foi buscar em Alagoas a matéria-prima de uma nova linha de revestimentos, a Solar, que usa casca do molusco sururu, pescado na lagoa Mundaú, vizinha a Maceió. As cerca de 450 famílias que vivem da atividade descartam de 200 a 300 toneladas de cascas por mês, segundo o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Sustentabilidade (Ibas). Ao usar esse material, a Portobello resolve a questão do lixo ambiental e melhora a renda da comunidade. “Os resultados são tão positivos que já estamos ampliando a linha para novos revestimentos”, afirma Scheila Orlandi, coordenadora de sustentabilidade da companhia.
No Amazonas, uma associação de 700 balseiros começa a utilizar nos próximos meses uma tecnologia que transforma os gases poluentes emitidos pelos motores em energia. Batizado de GLR Tech, o filtro já está em uso por uma siderurgia e uma fabricante de alimentos, e conta com registro de patente em dez países. “É a primeira tecnologia que transforma fumaça em energia”, diz Felipe Burman, CEO da startup GRL, que recebeu aporte de R$ 2 milhões para desenvolver o produto. No caso dos balseiros do Amazonas, o benefício é duplo: além de retirar gases poluentes do ar, eles vão usar a tecnologia para mover as balsas, reduzindo o consumo de diesel.