O advogado-geral da União, Jorge Messias, afirmou que o governo vai defender, no Supremo Tribunal Federal (STF), a inconstitucionalidade da lei que institui o marco temporal para demarcação de terras indígenas. A nova norma foi promulgada nessa quinta-feira pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
A tese do marco temporal, defendida por ruralistas, prevê que os povos indígenas só podem reivindicar terras que tradicionalmente já ocupavam em 5 de outubro de 1988, dia em que a atual Constituição passou a valer.
Ao Valor, Messias afirmou que o governo ainda estuda qual estratégia jurídica adotar: se vai apresentar uma ação na Corte para questionar a aprovação do projeto ou apenas se manifestar em processos que chegarão ao STF. “O importante é que a nossa posição é firme pela inconstitucionalidade”, disse.
Em setembro, o Supremo decidiu derrubar a tese do marco temporal. O placar foi 9 a 2. O Congresso, no entanto, reagiu e aprovou um projeto de lei para que esse fosse o parâmetro adotado para o reconhecimento de novos territórios dos povos tradicionais.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou o trecho que previa o marco temporal, mas o veto foi derrubado pelos parlamentares. Após um acordo entre a base governista e a bancada ruralista, alguns pontos vetados foram mantidos. Com isso, a lei promulgada deixou de fora pontos polêmicos, entre eles o que tentava flexibilizar o contato com povos isolados e o que buscava permitir a plantação de transgênicos nos territórios já demarcados.
Apesar de a decisão de rejeitar a tese ter sido tomada há poucos meses pelo Supremo, o tema terá que ser novamente discutido pelos ministros. Ainda na quinta-feira, três partidos — PP, Republicanos e PL — entraram com uma ação na Corte pedindo a validação da lei aprovada.
O decano Gilmar Mendes foi sorteado relator do caso. Ele foi um dos que votaram para derrubar o marco temporal, mas fez diversas ressalvas em seu voto, questionando, por exemplo, qual seria o “limite” para que os indígenas reivindicassem terras no país.
Na ação, as legendas criticaram o fato de a Corte ter discutido o tema ao mesmo tempo que o Congresso, “preferindo não aguardar a posição do Parlamento”. Por isso, afirmaram, a lei já nasceu “no meio de grande disputa política e de questionamentos quanto à sua constitucionalidade”.
“Diante desse cenário, é bastante provável e previsível que se instale discussão jurisdicional quanto à validade da nova lei após a derrubada dos vetos, inclusive no âmbito do próprio STF, por meio da propositura de ações individuais e ações do controle concentrado de constitucionalidade”, afirmaram.
Segundo destacado na ação, a nova lei “foi um ato político de reafirmação da competência constitucional e legislativa do Congresso Nacional”.
Os partidos também apontaram que “tem se tornado excessivamente comum que a forças políticas minoritárias e derrotadas no processo político-democrático realizado no Congresso Nacional busquem salvação jurisdicional”.
Afirmaram ainda que os ministros do Supremo alteraram o entendimento adotado durante o julgamento sobre a terra indígena Raposa Serra do Sol, em 2009. Na ocasião, porém, a Corte Suprema analisou apenas o caso específico, sem repercussão geral.
![“O importante é que nossa posição é firme pela inconstitucionalidade”, disse o advogado-geral da União, Jorge Messias — Foto: José Cruz/Agência Brasil](https://s2-valor.glbimg.com/_JGVURuQDPDGCJoPpXyIjBskr2s=/0x0:4500x2988/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2023/n/E/V8lnnoQKef1udSTp1Bsw/jorge-messias.jpg)