Política
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Por Cristiane Agostine — São Paulo

Eleito com o respaldo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), atuou em três frentes em seu primeiro ano de governo para tentar ampliar sua base de apoio e consolidar-se como um dos principais nomes da direita para 2026.

Em gestos ao centro, Tarcísio avançou na agenda de privatizações e concessões, a principal marca do início de seu mandato no Estado, e descolou-se do radicalismo e negacionismo de seu padrinho político. Aos bolsonaristas, o governador deu o comando da segurança pública, apostou na política “linha dura” na área e encampou bandeiras da direita, como as escolas cívico-militares. Ao mesmo tempo, manteve uma relação pragmática com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e com o PT, em busca de recursos para obras que poderão projetá-lo nacionalmente.

A tentativa de conciliar diferentes interesses, no entanto, tem gerado desgastes com bolsonaristas e com o próprio ex-presidente. No mês passado, Bolsonaro criticou publicamente seu aliado político, ao dizer que “não está tudo certo” na relação com Tarcísio e que “jamais faria certas coisas” que o governador “faz com a esquerda”.

Tarcísio definiu a privatização da Sabesp como prioridade de seu governo e conseguiu, no início de dezembro, o aval dos deputados estaduais para vender a empresa de água e saneamento, depois de uma tramitação rápida na Assembleia Legislativa, de apenas 50 dias. Três dias após sancionar a lei, mudou o discurso de que a desestatização iria reduzir o valor da conta de água e afirmou que a tarifa vai subir mesmo depois da privatização.

A venda da Sabesp, prevista para ser concluída até meados de 2024, é vista por aliados de Tarcísio como um ativo eleitoral para tentar atrair a centro-direita. Com a inelegibilidade de Bolsonaro até 2030, o governador é tido como um possível herdeiro do espólio eleitoral do ex-presidente e tenta construir uma frente de apoio mais ampla do que seu padrinho político teve na Presidência.

“É um marco da força política do governador, que vem se articulando politicamente e conversando com os deputados”, disse a secretária Natália Resende (Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística), responsável pela privatização da Sabesp. “Mostra que a articulação política foi muito bem-sucedida. Para além de técnico, Tarcísio mostra que é gestor e político.”

O governador disse que a venda da Sabesp é só o começo de uma série de privatizações e concessões que pretende fazer, apesar das greves de servidores e sindicatos contra as desestatizações. As próximas da lista são a Emae (empresa de águas e energia), rodovias do litoral e as linhas do Metrô e da CPTM – mesmo depois das recorrentes panes nas linhas 8 e 9 da CPTM, concedidas para a ViaMobilidade.

Em 2024, o governo planeja avançar ainda com a concessão dos projetos do trem entre São Paulo e Campinas e do túnel entre Santos e Guarujá, além das Parcerias Público Privadas (PPPs) para gerir a Fundação Casa (antiga Febem) e para construir escolas.

Para o líder da federação PT-PCdoB-PV, Paulo Fiorilo, Tarcísio tentou mostrar no primeiro ano da gestão “que vai entregar o Estado” à iniciativa privada. “É a marca dele, entreguista. É a única bandeira dele.”

Apesar de conseguir aprovar em dezembro os principais projetos enviados à Assembleia, como a venda da Sabesp e a reforma administrativa, o governador enfrentou dificuldades ao longo do ano para passar até mesmo projetos mais simples, e viu um grupo de deputados bolsonaristas criar um bloco “independente”, com ao menos sete dos 19 parlamentares do PL — partido de Bolsonaro, com a maior bancada da Assembleia.

Entre as principais demandas dos parlamentares, estão mais cargos no governo e a liberação de mais emendas. Foi justamente depois de indicar que liberaria mais verba — e começar a pagar — que as propostas avançaram e o governador conseguiu aprovar quase 70% dos projetos enviados ao Legislativo. A promessa de liberar R$ 11 milhões em emendas voluntárias foi turbinada para R$ 20 milhões às vésperas da aprovação do projeto que trata da venda da Sabesp, segundo os deputados.

“O início da gestão foi tumultuado. Tinha uma expectativa dos deputados que não foi suprida e criou-se um mal-estar”, disse Gilmaci Santos (Republicanos), vice-presidente da Assembleia. “Mas Tarcísio ‘pegou o boi pelo chifre’ e tornou-se um articulador político”, afirmou o aliado.

Os bolsonaristas do bloco “independente” ainda demonstram desconfiança em relação a Tarcísio e pretendem manter a pressão sobre o governo. “É um bloco que tem condições de definir votações na Assembleia e de apresentar pleitos ao governador”, disse Lucas Bove (PL), um dos “independentes”. “[Esperamos] que ao longo dos próximos anos ocorra a tão sonhada guinada à direita.”

A aliança de Tarcísio com o bolsonarismo tem sido testada desde sua eleição. O governador é pressionado por Bolsonaro e aliados do ex-presidente a “radicalizar”.

Antes de assumir o governo, o ex-ministro de Bolsonaro foi criticado por dizer que nunca foi um “bolsonarista raiz” e que não entraria em uma “guerra ideológica”. Ao ver os atos golpistas de 8 de janeiro, em Brasília, afirmou que não permitiria no Estado as cenas de violência comandadas por bolsonaristas, e reforçou a segurança de prédios públicos. Tarcísio cumpriu a decisão judicial de retirar os acampados em frente ao Comando Militar do Sudeste, na capital, mas não usou a polícia contra os apoiadores do ex-presidente.

A relação com o governo Lula serviu de munição para bolsonaristas contra Tarcísio. Em janeiro, o governador teve três encontros com o presidente em Brasília, além de reuniões com ministros. Em fevereiro, foi criticado por aparecer ao lado de Lula, em parceria para auxiliar as vítimas dos desmoronamentos causados pelas chuvas no litoral. O auge das críticas se deu quando o governador defendeu a reforma tributária em Brasília, em julho, ao lado do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e disse apoiar o texto do governo. Tarcísio foi vaiado por integrantes do PL e criticado por Bolsonaro. A “parceria” com Haddad é atacada até hoje pelo ex-presidente.

Em outro encontro criticado por bolsonaristas, Tarcísio se reuniu neste mês com Lula e o vice-presidente Geraldo Alckmin, em Brasília, em ato do governo federal para anunciar R$ 10 bilhões para o Estado por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Além do diálogo com o governo federal, bolsonaristas criticam medidas da gestão que enxergam como “esquerdistas”, como a criação do feriado estadual do dia da consciência negra, a liberação do uso de um parque para uma feira do MST e a regulamentação da lei que garante o fornecimento gratuito de remédio à base de cannabis medicinal.

Integrantes de partidos de direita e de esquerda, no entanto, discordam da avaliação de bolsonaristas sobre o atual governo. “A gestão do Tarcísio é de direita. É bem mais à direita do que a do PSDB”, disse Gilmaci Santos, do Republicanos. “É de direita, mas não dá para radicalizar.”

Ex-presidente do PT-SP, o deputado Emídio de Souza avaliou que a atual gestão “deu uma guinada à direita muito forte” em relação às gestões tucanas. “Tarcísio tentou adotar um ritmo próprio no começo do governo, mas foi pressionado a adotar a agenda bolsonarista”, disse. “Avançou na agenda das privatizações e é uma gestão genuinamente bolsonarista”, afirmou o petista.

Outro foco do atrito de aliados de Bolsonaro com a gestão Tarcísio é o secretário de Governo e presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, que faz a ponte não só com a Assembleia, mas também com prefeitos e o governo federal. Parlamentares reclamam da concentração de poderes do secretário em relação a cargos e emendas.

No governo, Kassab avançou sobre o espólio deixado pelo PSDB no Estado e multiplicou por sete o número de prefeitos filiados ao seu partido, o PSD, desde dezembro de 2022. Em um ano, passou de 46 prefeituras para ao menos 329 (51% do total), gerando revolta em partidos da base, como o PL, Republicanos, PP e MDB. A ação gerou revolta em partidos da base, como o PL, Republicanos, PP e MDB.

Segurança

Apesar das reclamações, não faltaram gestos e ações do governador à base bolsonarista no Estado. A proximidade do governo Tarcísio com o grupo do ex-presidente foi reforçada na segurança pública, principalmente pelo aval a setores da extrema-direita da polícia paulista.

O secretário da Pasta, Guilherme Derrite (PL), foi indicado pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PL) e é defensor da “linha dura” na segurança. Eleito deputado federal e capitão da reserva, Derrite já afirmou que é “vergonhoso” um policial não ter ao menos três homicídios no currículo, e foi retirado da Rota, grupo de elite da Polícia Militar paulista, por conta do grande número de mortes em serviço.

No início da gestão, Tarcísio deu aumento salarial médio de 20% aos policiais, em percentual maior do que aos demais servidores, de 6%, e congelou o programa das câmeras corporais por PMs. O governo não comprou mais câmeras nem pretende comprar no próximo ano, apesar de estudos mostrarem que a medida melhora o desempenho policial, diminui a letalidade e ajuda a coibir abusos.

Uma das principais bandeiras do governo na Segurança foi a “Operação Escudo”, em julho, e tornou-se a ação mais letal da PM no Estado desde o Massacre do Carandiru, em 1992. A ação policial foi deflagrada na Baixada Santista depois da morte de um soldado da Rota e que deixou ao menos 28 mortos. O governo disse que a operação foi para combater o crime organizado e o tráfico de drogas. O Ministério Público, a Defensoria Pública e a Ouvidoria da Polícia investigam as mortes, em meio a denúncias de abusos e tortura.

Com a operação, Tarcísio demonstrou sintonia com os bolsonaristas na área. Militar da reserva, o governador elogiou a atuação da polícia e disse que “não existe combate ao crime sem efeito colateral”. Para Derrite, as mortes ocorreram “por escolha” das pessoas assassinadas.

Depois da operação, a cúpula da segurança comemorou a decisão do Tribunal de Justiça, deste mês, que desobriga os policiais a usarem câmeras nos uniformes em operações após ataques. Entidades alertam sobre os riscos de desmonte da política das câmeras corporais, que apresenta resultados positivos, e destacam que as mortes cometidas por PMs em serviço cresceram 86% no terceiro trimestre deste ano em relação a 2022. Entre janeiro e outubro, a morte por policiais aumentou 38%.

Apesar de se alinhar com os bolsonaristas na área, Tarcísio disse estar insatisfeito com os resultados na Segurança depois de um ano de gestão. O governo enfrentou problemas no combate à cracolândia e registrou o aumento do número de furtos e roubos de celulares na cidade de São Paulo, especialmente na região central.

Mais agrados aos bolsonaristas

Além dos gestos a bolsonaristas na segurança, o governador fez diversos agrados a Bolsonaro e seus aliados em outras áreas. Anistiou as multas aplicadas a quem descumpriu regras sanitárias na pandemia, “perdoando” a dívida de R$ 1,1 milhão do ex-presidente; nomeou como assessor especial o irmão da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, Diego Dourado, que se transformou em um articulador político informal; hospedou Bolsonaro na sede do governo paulista; acelerou o processo de regularização de terras devolutas, com desconto de até 90% para os ocupantes, em lei questionada pelo PT e MST por supostamente beneficiar grandes fazendeiros; nomeou na Secretaria de Agricultura o produtor rural Guilherme Piai, cabo eleitoral de Bolsonaro e Tarcísio, na única troca no primeiro escalão. O governador promulgou até mesmo uma homenagem ao torturador coronel Erasmo Dias, um dos expoentes da ditadura militar, em lei do ex-deputado bolsonarista Frederico D’Avila.

Nas últimas semanas, depois da crítica pública de Bolsonaro, o governador reforçou o alinhamento a bolsonaristas: foi à posse do presidente da Argentina, Javier Milei, em uma caravana com o ex-presidente; reuniu-se com o bloco “independente” da Assembleia e posou para foto fazendo gesto de “arma” com os dedos; prometeu atender pedidos de recursos e cargos e de defender bandeiras caras aos conservadores. Entre elas, a implementação de escolas cívico-militares, anunciada pelo governador em Brasília, ao lado de Bolsonaro, no dia da votação do projeto da Sabesp. Tarcísio reforçou ainda seu alinhamento eleitoral com o ex-presidente e afirmou que só apoiará a reeleição do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), se Bolsonaro também o apoiar.

E para 2024 o governador anunciou que pretende começar o ano com novos acenos ao bolsonarismo, ao definir como prioridade na Assembleia a aprovação do projeto que regulamenta e cria escolas cívico-militares no Estado e o que regulamenta a polícia penal.

Educação e saúde

No Legislativo, Tarcísio buscará ainda aprovar no início de 2024 a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que pode tirar até R$ 9,6 bilhões da Educação no Estado. A medida prevê a redução o investimento mínimo em Educação de 30% para 25%. Os outros 5% poderão ser usados em Saúde ou até mesmo para Educação.

Ao fazer o balanço do primeiro ano da gestão, Tarcísio destacou a implementação do vestibular seriado para a USP, Unesp e Unicamp, no chamado “Provão paulista”, com 15,3 mil vagas para alunos da rede estadual.

No entanto, não comentou problemas na Educação, como a proposta do secretário da Pasta, Renato Feder, de deixar de usar o material didático e pedagógico impresso, comprados com recursos do Ministério da Educação, para adotar um programa de educação 100% digital. Outra polêmica na área foi a determinação de compra de 200 milhões de livros digitais sem licitação. Em meio a críticas, o governo recuou das duas propostas. A gestão foi marcada ainda pela distribuição de material digital com erros. Tarcísio manteve Feder, mas demitiu o coordenador pedagógico da Pasta, Renato Dias.

A gestão também foi alvo de críticas depois que foram divulgados contratos com as empresas das quais Feder e o secretário da Saúde, Eleuses Paiva, têm participação. O governo negou irregularidades nos contratos com a empresa de Feder, mas proibiu novas contratações. No caso da empresa de Eleuses Paiva, o contrato foi rescindido.

Ao fim do primeiro ano do cargo, Tarcísio anunciou ainda o aumento da tarifa do Metrô e da CPTM, de R$ 4,40 para R$ 5, depois de três anos da tarifa congelada.

Nova direita

Pesquisadora da nova direita, a doutora em Ciência Política pela USP Camila Rocha avaliou que Tarcísio tenta fazer aquilo que seu antecessor no cargo, João Doria, não conseguiu: dialogar com o bolsonarismo, mas sem ser “engolido” por ele. “O governador tenta manter uma certa dose de autonomia”, disse. “Ele não é radical, mas depende do apoio político do bolsonarismo e do eleitorado de Bolsonaro”, afirmou Camila, que é pesquisadora do Cebrap. “Ele tenta se equilibrar. Em alguns momentos, terá de ceder ao bolsonarismo. Em outros, não. Esse processo de ganhar independência pode ser longo”.

Nas pesquisas que fez com eleitores do interior do Estado que votaram em Bolsonaro, Camila disse ter ouvido que uma das características mais citadas é a imagem de “gestor”, “sério”, “discreto” e “não radicalizado”. “Essas características lembram o perfil dos tucanos”, disse, em referência aos sete mandatos do PSDB teve no Estado.

Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, entre o vice-presidente Geraldo Alckmin e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva — Foto:  Ricardo Stuckert / PR
Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, entre o vice-presidente Geraldo Alckmin e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva — Foto: Ricardo Stuckert / PR
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