O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) enfrentou nessa quinta-feira o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e deixou claro que tem posições contrárias às dele em uma tensa reunião do PL para discutir a posição do partido sobre a reforma tributária. Em certo momento, Bolsonaro chegou a afirmar que Tarcísio, que se disse favorável a 95% do texto, “não tem experiência política”. E disse que, se a legenda se unir, “não vota nada”.
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O governador de São Paulo encontrou um clima hostil na reunião, em Brasília. Em vídeos do encontro que circulam nas redes sociais, ele defendeu diversas vezes que era importante que a direita não perdesse “a narrativa” de aprovar a reforma tributária. Porém, foi interrompido várias vezes em sua fala, inclusive pelo próprio Bolsonaro.
“O esforço que nós estamos fazendo é para construir a melhor proposta. Agora, uma pergunta que eu estou colocando para todo mundo aqui: nós vamos perder a narrativa da reforma tributária?”, disse Tarcísio, em dado momento da reunião, antes de ser interrompido por Bolsonaro.
Veja vídeo da reunião do PL:
Bolsonaro defendeu algumas vezes que seja dado mais tempo para que os parlamentares analisem a proposta, posição contrária à do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
“Não dá para a gente fazer a toque de caixa. Eu vi ontem na televisão o Arthur Lira, me dou muito bem com ele, falando ‘olha, a proposta está concluída por volta das 18 horas, mais de 100 páginas’”, disse o ex-presidente. “Com todo o respeito, muitos de nós, eu também, eu não consigo ler essa proposta, entendê-la, sem um bom técnico do meu lado. É a mesma coisa [com] vocês. É isso que ele está expondo para vocês aqui. Eu passei 28 anos dentro do Parlamento. Nunca se chegou a uma conclusão sobre a reforma tributária.”
Bolsonaro disse ainda que “nós temos que ter alguns dias a mais para chegar num consenso” sobre o texto.
De volta ao microfone, Tarcísio insistiu na questão da “narrativa”.
“Nós não podemos perder a narrativa, eu acho que a direita não pode perder a narrativa de ser favorável a uma reforma tributária. Porque, se não, a reforma tributária acaba sendo aprovada e quem aprovou?, questionou. “A grande questão é construir um bom texto, pessoal.”
Mas o governador foi novamente interrompido por Bolsonaro.
“Pessoal, se o PL estiver unido, não aprova nada”, disse, sob aplausos da plateia.
Tarcísio, então, voltou a falar.
“Deixa eu só deixar uma coisa clara aqui: não estou defendendo votação no dia de hoje [quinta-feira], não”, disse, sendo mais uma vez interrompido, agora pela plateia. “O que eu estou querendo explicar, e eu estou vindo aqui explicar com a maior humildade do mundo, é que eu acho arriscado para a direita abrir mão da reforma tributária.”
Após ser apupado, o governador concluiu: “Tudo bem, gente, se vocês acham que a reforma tributária não é importante, não votem, pô!”
Outra hostilidade aberta a Tarcísio flagrada por celulares durante a reunião partiu do deputado Ricardo Salles (PL-SP). Ex-ministro do Meio Ambiente, Salles é da ala ideológica do bolsonarismo, que detém cerca de dois terços da bancada de 99 deputados do PL na Câmara. Ele, além disso, antagoniza em São Paulo com Tarcísio, que foi ministro da Infraestrutura na gestão Bolsonaro.
“É muito mais fácil fazer estrada do que combater a esquerda”, disse Salles.
Tarcísio, que já se disse contrário à reforma em tramitação no Congresso, mudou de posição após conversas com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o relator na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Na quarta-feira, ao lado de Haddad, ele disse que não iria transformar seus pedidos por mudanças no texto em “cavalo de batalha”.
O alinhamento de Tarcísio revoltou a base bolsonarista, que há dias vem chamando a proposta de “a reforma tributária de Lula”, apontando um suposto maior controle federal sobre os impostos e a possibilidade de aumento da carga tributária, muitas vezes com base em dados sem nenhuma comprovação.
O ex-secretário de Comunicação Social e advogado de Bolsonaro, Fabio Wajgarten, deu uma alfinetada em Tarcísio no Twitter, ao defender que Bolsonaro “está mais forte do que nunca” e que o resto “é 95% desprezível”.
“Ao contrário do que parte da mídia disse nas últimas 24 horas o PR [presidente da República] Jair Bolsonaro está mais FORTE do que nunca. Filhos, base, aliados de primeira hora, amigos próximos e distantes FECHADOS com ele. Isso que IMPORTA o resto é 95% desprezível”, escreveu.