Há cinco anos, a Agrodan, maior exportadora de manga do país, com faturamento anual de R$ 150 milhões, enfrentava um grande desafio para sincronizar melhor produção e vendas. Era preciso prever melhor o volume das colheitas em suas sete fazendas, na Bahia e em Pernambuco. “A informação era extremamente importante para o departamento comercial, mas não conseguíamos estimativas precisas”, conta o engenheiro agrônomo da empresa, Marcelo Amaral. Para pôr fim ao problema, ele foi incumbido pelo presidente e sócio da empresa, Paulo Dantas, de buscar soluções pelo mundo afora.
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A primeira parte da equação foi resolvida graças a um sensor americano de raios infravermelhos próximos que, combinado a sensores de temperatura e algoritmos providenciados por Amaral, detecta com até três meses de antecedência quando as frutas estarão prontas para deixar o pé. Na busca da solução para a segunda parte da equação, o profissional foi enviado para cursar um mestrado na Universidade Central de Queensland, na Austrália. Lá, desenvolveu com outros profissionais uma máquina, ainda não comercializada, para contagem e previsão do tamanho das mangas a partir de filmagens. Casos como esses são cada vez mais comuns da porteira para dentro. Com o impacto de avanços tecnológico, muda também o mercado de trabalho no campo. De um lado, cai o nível de emprego. Do outro, sobem os salários e o grau de escolaridade da mão de obra ocupada.
Atualmente a agropecuária emprega 8,7 milhões de pessoas. Há uma década, em 2012, eram 10,3 milhões - 17% a mais, segundo números do IBGE compilados pelo Centro de Estudos Avançados de Economia Aplicada (Cepea), da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo. “Parte relevante da tecnologia é poupadora de trabalho, como a mecanização e automação, que, junto com fatores como a atratividade dos empregos urbanos, contribuem para a redução da mão de obra no campo”, diz a pesquisadora do Cepea e professora do departamento de economia da Esalq, Nicole Rennó Castro.
Também vem mudando o grau de escolaridade da mão de obra da agropecuária. “Com o avanço tecnológico, cresce a demanda por trabalhadores mais qualificados”, afirma a pesquisadora. Segundo os dados compilados pelo Cepea, nos dez anos encerrados neste primeiro semestre, a parcela de trabalhadores do setor com ensino médio completo saltou de 9,4% para 20,3%. Para aqueles que, como Amaral, da Agrodan, têm diploma universitário, o contingente subiu de 1,2% para 3,4%. No rumo oposto, a parcela da mão de obra sem instrução caiu de 14,4% para 8,1%.
Do fundamental completo ao superior incompleto, o ritmo de crescimento no grau de instrução no campo supera o da média nacional da população ocupada, mas, em termos absolutos, os números do campo ainda ficam a dever para a população urbana. Na agropecuária, quase metade da população ocupada (48,9%) não tem o ensino fundamental completo - mais que o dobro dos 19,1% da média da população
No novo cenário, cresce a especialização dos profissionais. “Antigamente as fazendas geralmente tinham um gerente que fazia tudo: dirigia trator, vendia, controlava custos. Hoje é comum haver dois profissionais - um para a atividade agropecuária e outro da gestão comercial e de finanças”, diz o coordenador do núcleo econômico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Renato Conchon.
Mesmo mais abaixo na hierarquia, formação específica é frequentemente necessária. É o caso, por exemplo, dos tratoristas. “Hoje não basta saber dirigir trator, é preciso entender de GPS e ter noções básicas de mecânica e informática para utilizar os equipamentos a bordo”, afirma Conchon.
A necessidade de maior especialização somada à maior demanda por certos profissionais resulta em salários mais altos. No município de Rio Verde, em Goiás, por exemplo, os ganhos médios dos tratoristas saltaram de R$ 2.427 na safra 2018/2019 para R$ 3.468 no período 2021/22 - aumento de 42,9%.
Nos últimos anos vem crescendo a contratação de trabalhadores na mecanização agropecuária por conta do maior número de tratores, que está relacionado ao aumento da área irrigada e ampliação do número de propriedades que plantam duas ou três safras por ano, diz o especialista da CNA. Neste cenário, as contratações de profissionais de mecanização agropecuária, como tratoristas, operadores de colheitadeiras e máquinas de beneficiamento saltaram de 3.287 em 2020 (9% das contratações da agropecuária) para 16.174 (14,7%) nos primeiros oito meses deste ano, segundo dados do Ministério do Trabalho compilados pela CNA.
Entre os trabalhadores da agropecuária em geral, nos últimos dez anos os rendimentos mensais tiveram aumento real de 17,2%, enquanto houve queda de 0,6% na média da população brasileira. Ainda assim, o ganho médio do campo é menor: R$ 1.695 reais ante média nacional de R$ 2567.