Rumo ao interior

Inclusão de populações periféricas é uma das promessas do 5G

Por Ana Luiza Mahlmeister — Para o Valor, de São Paulo


A construção da rede 5G para atender empresas e consumidores finais é comparada a uma maratona. Após o leilão que distribuiu frequências entre operadoras nacionais e regionais, ampliando a competição, começa a corrida pelos serviços. O segmento corporativo, no topo da cadeia, é o mais disputado, além da promessa de diminuir o abismo digital no estrato de mais baixa renda em cidades que hoje não têm acesso sequer à rede 4G.

Leia aqui a íntegra do caderno especial Telecomunicações

O Brasil é o segundo país que mais consumiu fibra óptica nos últimos cinco anos, atrás apenas da China, segundo um estudo da Omdia. Esse cabeamento prévio facilita a construção das redes de quinta geração que dependem de um complexo ecossistema que vai das antenas aos computadores de borda e datacenters que armazenam dados em nuvem.

A infraestrutura do 5G precisa da fibra óptica para conectar as células e garantir a baixa latência - tempo que um pacote de dados leva do servidor original até o destino - e nesse início o maior impacto será nos negócios.

O 5G chegou às capitais e por meio de clusters (polos) alcança também as pequenas cidades no entorno. Depois das capitais e dos 5,5 mil municípios brasileiros, a rede deve atender ainda 7,4 mil localidades com o 4G, ainda hoje não cobertas. Fora das capitais e na zona rural os desafios são maiores. Mesmo com a expansão das redes 2G, 3G e 4G, muitos municípios no Norte e Nordeste não têm rede de acesso (“backhaul”). No Norte, 1,2 mil cidades estão sem conexão, afirma Maximiliano Martinhão, secretário de radiodifusão do Ministério das Comunicações. Com as obrigações assumidas pelas empresas ganhadoras do leilão serão cobertos 3 mil km de rodovias federais com frequência 4G, levando a banda larga para áreas rurais.

Na região Norte, doze mil cabos ópticos sub fluviais vão para os rios da Amazônia, alcançando 181 escolas rurais em dez cidades, com investimentos de R$ 3,1 bilhões. A instalação de 12 km de cabos de fibras ópticas cobre uma população de mais de 10 milhões de pessoas na região. O Programa Norte Conectado prevê a construção de oito infovias coordenadas pelo Ministério das Comunicações e pela Rede Nacional de Pesquisa (RNP). A Infovia 00 interligou Macapá (AP) a Alenquer, no oeste do Pará. Mais seis serão concluídas e as sete serão operadas por um consórcio de empresas escolhidas por meio de edital, enquanto uma oitava ficará a cargo do Ministério da Defesa.

Nos primeiros dois anos essas empresas usarão a infraestrutura da RNP, ficando responsáveis pela venda dos serviços para 58 cidades, segundo Eduardo Grizendi diretor de engenharia e operações da RNP, rede para educação e pesquisa vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). A Infovia 00 lançou 700 km de cabo submarino de janeiro a junho de 2022.

O satélite também entra na equação. A Winity, vencedora do lote nacional de 700 MHz no leilão, fez uma parceria com a operadora de satélites Hughes para dois projetos de internet comunitária. Segundo o presidente da Winity, Sergio Bekeierman, os pilotos serão construídos em áreas rurais de um município no Maranhão e outro, no Piauí. O sinal comunitário tem suporte da rede de acesso fornecido pelo satélite da Hughes usando a infraestrutura como serviço (“as a service”). Hoje, o modelo de internet comunitária está disponível em 130 localidades e o compartilhamento de infraestrutura pode beneficiar 19 mil sites de áreas não cobertas ou não atendidas por redes.

O Brasil soma 43,7 milhões de acessos em banda larga fixa e 261,3 milhões de acessos móveis. Das residências que usam banda larga fixa, 50% são atendidas pelos mais de 20 mil provedores regionais e ampliar esse porcentual conectado é um grande desafio para os próximos anos, afirma Atilio Rulli, vice-presidente de relações públicas da Huawei. O Brasil tem 261 milhões de celulares ou 1,2 aparelho por habitante e 1,6 por habitante se contar os tablets (mais 360 milhões) principalmente das classes A e B; e 0,1 entre as classes C e D. “Com incentivos certos para essa faixa de renda esse número poderia crescer, a exemplo do que aconteceu no avanço da bancarização com o lançamento do Pix”, afirma Rulli.

Em menos de um ano o 5G chegou em todas as capitais, com a limpeza da faixa de frequência - antes ocupadas pelas parabólicas de TV - realizada em apenas dois meses. Estimativa da Anatel e das operadoras é que a rede vai gerar US$ 1 trilhão em serviços e milhões de empregos até 2035.

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE, 83% dos lares brasileiros têm banda larga. “No último ano a velocidade média da internet passou de 55 Mbps para 123 Mbps, com mais de 10 mil operadoras regionais levando banda larga a pequenos municípios, mercado que vai crescer ainda mais com a operação das redes neutras”, estima Felipe Garcia, diretor de marketing da Nokia. No interior do país mais de 10 mil localidades não têm conexão, assim como 79% na área rural. Um consórcio de empresas formado em 2019 criou a Conectar Agro, que interligou 7 milhões de hectares, 140 escolas públicas e 31 unidades básicas de saúde com 4G na frequência de 700 MHz.

José Roberto Nogueira, presidente da Brisanet, estima que os serviços com 5G só alcançarão a massa de consumidores em cinco ou seis anos a partir de ganho de escala dos terminais e queda de preço dos aparelhos para a faixa de R$ 800 e R$ 700. A conectividade sem fio deve beneficiar comunidades que hoje não têm fibra. A Brisanet negocia com operadoras de infraestrutura de redes neutras para lançar serviços em duas a três cidades, em uma primeira etapa. “Nos três primeiros anos da operação do 5G, mesmo para o mercado corporativo, o alto custo dos sensores para a internet das coisas e terminais podem barrar a expansão da rede”, avalia.

Segundo Rodrigo Dienstmann, presidente da Ericsson, a companhia aposta no mercado de redes dedicadas e vai trabalhar com integradores para atender aplicações industriais. Em 2022, 25% das vendas da Ericsson foram de equipamentos 5G e a previsão é dobrar esse montante.

Para ganhar tração os serviços em 5G dependem de um ecossistema de empresas, incluindo os provedores de nuvem, datacenters e computação de borda. As operadoras de redes neutras, com ativos de fibras adquiridos das teles, oferecem infraestrutura para que os provedores de serviços alcancem mais cidades, viabilizando a entrada de novas empresas.

A V.tal, formada a partir da segregação da infraestrutura de fibra óptica da Oi e vendida para o BTG Pactual com conexão em 2,3 mil cidades, fechou contrato com a startup Obvious para oferta de Internet de banda larga fixa, usando infraestrutura de rede neutra. “A Obvious dará suporte e atendimento ao cliente, enquanto a V.tal é responsável pela rede”, explica Cícero Olivieri, vice-presidente de engenharia da V.tal.

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