Investimento de R$ 30 bi ao ano vai exigir mix de fontes

Concessionárias também buscam recursos externos, com fundos de pensão e investidores comprometidos com valores ESG

Por Toni Sciarretta — Para o Valor, de São Paulo


João Lopes, CFO da Iguá: após o leilão da Cedae, empresa recebeu R$ 600 milhões do Canada Pension Plan (CPP) e R$ 2,4 bilhões em aportes dos sócios — Foto: Divulgação

Com necessidade de investimento da ordem de R$ 30 bilhões por ano até 2033, o setor de saneamento já conta com um mix de fontes de financiamento para levantar essa soma expressiva e reduzir a tradicional dependência dos bancos públicos. O pacote inclui mercado de capitais, debêntures de infraestrutura, linhas ESG, atração de bancos comerciais e multilaterais, sem descartar o apoio dos bancos de fomento.

Uma das fontes que já mostra seu potencial são as debêntures incentivadas de infraestrutura. De janeiro até 20 de maio deste ano, já foram aprovadas emissões de R$ 3,02 bilhões por meio desses títulos, o que já supera o volume de R$ 2,99 bilhões captado em todo o ano passado, segundo o Ministério do Desenvolvimento Regional.

Para este ano, a Secretaria Nacional de Saneamento prevê a aprovação de mais de R$ 10 bilhões em debêntures de infraestrutura. Os papéis têm isenção de Imposto de Renda para pessoa física e precisam do crivo do governo. “A carteira de debêntures em saneamento vem aumentando bruscamente. Entre os desafios, está atrair o interesse de novas classes de investidores, nacionais e internacionais, como os grandes fundos de pensão”, diz o secretário de saneamento, Pedro Maranhão.

Nos bancos de investimento, a previsão é que as captações acelerem entre o fim deste ano e o início de 2023, com a redução da volatilidade devido ao aumento de juros e após a definição eleitoral. Prevendo um momento mais difícil em 2022, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e os bancos desenharam uma estrutura de financiamento por meio de empréstimo-ponte de até quatro anos para que as concessionárias que participaram dos leilões consigam atravessar esse período sem precisar captar recursos em condições desfavoráveis.

O Itaú BBA, um dos maiores no segmento, já tem mandatos contratados para viabilizar 14 projetos de infraestrutura, a maioria de saneamento. O banco estima que as concessionárias de saneamento vão precisar levantar R$ 42 bilhões nos próximos três anos para fazer frente às necessidades de investimento já contratadas. Segundo Rogério Yamashita, chefe da área de project finance de saneamento do Itaú, metade desses recursos virão de bancos públicos - BNDES, Caixa Econômica Federal e BNB (Banco do Nordeste) -, mas o restante terá que vir de outras fontes.

“Nunca vi um pipeline tão virtuoso como temos hoje. Nós temos 14 mandatos para projetos de assessoria que já foram contratados e que precisam ser viabilizados. E mais de 20 leilões de ativos devem ocorrer nos próximos dois anos. São projetos longos, de 35 anos, que é o horizonte de prazo adequado para infraestrutura. Vamos precisar de um mix importante de mercado de capitais, banco de fomento, atração de bancos comerciais e multilaterais seja com debêntures de infraestrutura, linhas ESG, balanço de bancos e multilaterais”, diz.

As concessionárias privadas também buscam recursos no exterior, onde estão os maiores financiadores de saneamento, como fundos soberanos e de pensão. Esses investidores buscam ativos resilientes, com receitas estáveis, que usem tecnologia conhecida, independam da conjuntura e permitam conciliar ganhos com desembolsos previstos em longo prazo.

Maior companhia privada de saneamento, a Aegea captou US$ 500 milhões com a emissão de um bônus de sete anos ligado ao cumprimento de metas de sustentabilidade no final de abril. Foi a primeira captação desse tipo feita por uma empresa brasileira de saneamento. O instrumento tem alta demanda de investidores institucionais estrangeiros e desponta como opção para as empresas que abraçarem a causa ESG.

Para viabilizar a captação, a Aegea se comprometeu a reduzir em 15% o consumo de energia no tratamento de esgoto e a ter pelo menos 45% de mulheres e 27% de negros nos cargos de liderança até 2030. Se não cumprir, o título tem um acréscimo de 0,25 ponto percentual na remuneração, que saiu a 7% ao ano. “Essa captação foi muito oportuna para manter nosso balanço adequado às nossas necessidades de investimentos. Estamos em um setor de capital intensivo e preferimos fazer essa operação agora a esperar um momento de maior necessidade”, diz André Pires, CFO da empresa.

Para expandir os serviços, as empresas também poderão acessar investidores por meio de oferta inicial de ações (IPO) e venda de participações. Em 2021, a Iguá desistiu de um IPO após receber R$ 600 milhões do Canada Pension Plan (CPP). Após o leilão da Cedae, recebeu outro aporte de R$ 2,4 bilhões dos sócios. Segundo João Lopes, CFO da Iguá, desde então a empresa está preparada para um IPO, mas neste momento não tem necessidade de capital nesse tipo de operação.

Já a Aegea, também constantemente citada para um possível IPO, recebeu um aporte de R$ 1,3 bilhão da Itaúsa, que ficou com 10,2% da empresa junto com o fundo soberano de Singapura (19,1%) e a Equipav (70,7%). O aporte ocorreu pouco antes do leilão da Cedae, quando a empresa ficou com três dos lotes mais importantes oferecidos no Rio.

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