Por Assis Moreira

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Lula tem como dar o exemplo na taxação de super-ricos

No G20 no Brasil, uma proposta para taxar bilionários não terá consenso

Por , Valor — Genebra


Lula tem como dar o exemplo na taxação de super-ricos Divulgação/Arma

Os Estados Unidos já avisaram que vão rejeitar no G20 a proposta do Brasil de taxação dos super-ricos em pelo menos 2% de seu patrimônio anualmente. Significa que não haverá consenso para o plano avançar sob a presidência brasileira desse grupo das maiores economias do mundo.

Mas o presidente Lula pode, se quiser, dar o exemplo e simbolicamente tentar fazer essa taxação no Brasil sem esperar por um acordo global.

Ao apresentar na terça-feira o estudo de sustentação técnica para a proposta da presidência do Brasil no G20 de taxar os bilionários do mundo, o economista francês Gabriel Zucman observou que a cooperação internacional é fundamental para evitar o risco de os bilionários ocultarem sua renda e enviarem o dinheiro para países que tributam menos sobre as receitas.

No entanto, Zucman destacou que o padrão que propõe é flexível e pode ser implementado pelos países em grupo ou individualmente, através de mecanismos domésticos de taxação como, por exemplo, o imposto estimado sobre uma noção ampla de renda ou sobre fortunas.

Alguns analistas acham que, se o governo Lula quiser adotar sozinho a taxação sobre bilionários, deveria se preparar para fuga de fortunas. Mas Zucman indica haver mecanismos para reduzir incentivos para riquezas serem transferidas para o exterior. Por exemplo, a cobrança de uma ‘taxa de saída’’ pela qual o bilionário pagaria sobre sua renda passada (incluindo ganhos não realizados).

Ou seja, é uma decisão política a de ir adiante na taxação de bilionários locais e fazer o que propõe para o mundo todo.

A ideia de taxação de super-ricos tornou-se central na presidência brasileira do G20. Em recente passagem pela Europa, o presidente Lula observou que “nunca antes o mundo teve tantos bilionários. Estamos falando de 3 mil pessoas que detêm quase 15 trilhões de dólares em patrimônio. Isso representa a soma dos PIBs do Japão, da Alemanha, da Índia e do Reino Unido”.

Conforme Lula, esse valor é mais do que se estima ser necessário para os países em desenvolvimento lidarem com a mudança climática. Reclamou que a concentração de renda ‘seria tão absurda que alguns indivíduos possuem seus próprios programas espaciais. Mas as soluções não estão em Marte. É a Terra que precisa de cuidado’.

O G20, para variar, continuará rachado sobre o tema. A França é a favor, a Alemanha parece cética, enquanto os EUA colocam seu peso pela rejeição da proposta. A secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, argumentou que "acreditamos na tributação progressiva. Mas a noção de algum arranjo global comum para tributar bilionários com os lucros redistribuídos de alguma forma - não apoiamos um processo para tentar chegar a isso. Isso é algo com o qual não podemos concordar".

De toda maneira, o governo brasileiro, ao insistir com taxação de super-ricos, reflete algo que vem obtendo cada vez mais apoio também em organizações internacionais em meio à busca de governos por recursos adicionais para cobrir suas despesas de longo prazo, para reduzir desigualdades e enfrentar o envelhecimento da população e transição climática.

Os governos precisam de mais recursos para combater a miséria e a desigualdade — Foto: Alexandre Cassiano/Agência O Globo

A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Economico (OCDE) tem feito estudos sobre taxa de mais valia financeira, imobiliária, herança. Análises apontam espaço considerável para melhora do desenho e eficácia dos impostos sobre o capital para aumentar a receita e reduzir a desigualdade, especialemente com o progresso feito na transparência fiscal internacional.

Uma avaliação é de que será necessário identificar desafios específicos envolvidos na tributação de pessoas físicas com alto patrimonio líquido, especialmente numa economia globalizada.

Também o Fundo Monetário Internacional (FMI) já publicou estudo interno insistindo no fortacimento do imposto de renda pessoal progressivo , e maior uso, por exemplo, dos impostos imobiliários, investindo em registros usando novas tecnologias digitais.

Para a diretora-gerente do FMI, Kristalina Georgieva, fechar as brechas fiscais e garantir que os mais ricos paguem sua parte justa mobilizaria fundos urgentemente necessários para o crescimento sustentável e inclusivo.

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