Quem nunca se perguntou qual é o seu propósito no trabalho? Nos últimos anos, falar sobre isso tornou-se quase um mantra corporativo. É um tema que inunda os discursos de executivos, consultores, educadores, está em todo o lugar. Encontrar um trabalho alinhado às suas motivações mais nobres como ser humano é quase uma obrigação para o profissional atual.
O que parece ser positivo do ponto de vista do planeta, da humanidade e até individual, uma vez que amplia o horizonte de quem exerce uma função rotineira todos os dias, no entanto, corre o risco de se materializar em mais uma doença do mundo do trabalho. É a chamada “ansiedade do propósito”. Um tipo de transtorno emocional que vem acometendo especialmente a nova geração que está iniciando a carreira e que é sempre identificada como a mais preocupada com a busca por um propósito.
O fenômeno da “ansiedade do propósito” não é novo. A pesquisadora Larissa Rainey vem falando disso há alguns anos. Ela o define como a experiência de emoções negativas relacionadas diretamente com a procura de um propósito, que podem ser associadas a sofrimentos psicológicos, como preocupação, medo, estresse, frustração e até ciúme. Sabe aquele cara que se gaba por ter um emprego cheio de significado e impacto social e que está 100% realizado com o que faz? Bem, essa é a parte da síndrome relacionada ao ciúme, à inveja.
Mas a questão é bem mais complexa. Afinal, o que significa propósito? Existem muitas definições. Os psicólogos Patrick McKnight e Todd Kashdan, da Universidade George Mason, o descrevem como uma bússola que fornece direção para a vida, com metas contínuas às quais podemos aspirar. Eles explicam que o propósito se baseia em uma ordem superior de processamento cognitivo do córtex cerebral, o que significa que não é impulsionado por uma motivação primitiva, como se alimentar, ter prazer ou buscar segurança. Essas motivações nos levam a pensar em “como” sobreviver, já o propósito nos faz querer saber o “porquê” de viver.
Daniel Goleman, um dos autores mais importantes no tema da inteligência emocional, diz que a “ansiedade do propósito” resume a dúvida e a angústia que muitas pessoas sentem quando lutam para descobrir um significado, um sentido, no que fazem e como e onde podem fazer uma diferença significativa com aquilo. Ele diz que esse tipo de questionamento e sensação de falta de sentido sempre esteve mais associado à crise da meia idade, mas agora os jovens também estão sendo afetados por essa inquietação. Goleman ressalta que a nova geração enfrenta a pressão econômica do mercado de trabalho para que trabalhe cada vez mais e, ao mesmo tempo, convive com as redes sociais que retratam de uma forma exagerada o que significa viver da melhor maneira possível.
Não existe solução milagrosa para acabar com a “ansiedade do propósito”, mas Rainey dá algumas dicas que podem ajudar a aliviar essa angústia. A primeira é evitar comparações sociais. Lembra do ciúme? Pois bem, em vez de invejar pessoas ao seu lado que parecem ter encontrado a sua vocação, pratique a autorreflexão para compreender as suas motivações intrínsecas e explore as questões internas que alimentam a sua curiosidade. Esqueça também a opinião dos outros sobre o que você considera significativo e valioso na sua vida.
Outra recomendação da pesquisadora é parar de buscar um caminho linear para o sucesso. Muitas vezes, nos agarramos desesperadamente a uma escada de objetivos, onde cada passo seguinte está definido. Ela lembra que a distância entre a vida e a morte é extensa, portanto, podem aparecer muitas oportunidades pelo caminho. A dica aqui é: aprenda mais sobre você e explore diferentes trajetos.
Um terceiro ponto, segundo Rainey, é praticar a experimentação. Mesmo que você ainda não saiba qual é o seu propósito na vida, você pode tomar medidas para investigar possíveis fontes de propósito. Assim como um cientista, crie experimentos curtos onde você possa trabalhar em um novo projeto, conhecer novas pessoas ou aprender uma nova habilidade. Ela recomenda tentar documentar o processo e observar como ele fez você se sentir, para que possa continuar adaptando seus experimentos até encontrar uma direção que pareça estimulante e gratificante.
Emily Esfahani Smith, do Hoover Institution, centro de pesquisas localizado na Universidade de Stanford e autora do livro “The Power of Meaning”, viajou pelo mundo para investigar o que chama de os quatro pilares do significado: pertencer, propósito, storytelling e transcendência. Ela chegou à conclusão que para a maior parte das pessoas o propósito soa como algo grandioso e inclui ambições como acabar com a fome no mundo ou a crise climática, mas que ele não precisaria necessariamente ser isso. É possível encontrar propósito sendo um bom pai ou mãe para uma criança, criando um ambiente mais amigável no escritório ou tornando a vida de um animal mais feliz, diz ela. Ser uma pessoa ética, justa e disposta a ajudar os outros me parece um bom começo.
Stela Campos é editora de Carreira
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