Brazil China Meeting
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Por Vitor Paolozzi — Para o Valor, de João Pessoa


Evandro Carvalho: “Não há mais aquele azedume diplomático que havia com Bolsonaro” — Foto: Divulgação
Evandro Carvalho: “Não há mais aquele azedume diplomático que havia com Bolsonaro” — Foto: Divulgação

Um ano após a posse de Luiz Inácio Lula da Silva, as relações entre Brasil e China encontram-se em um patamar melhor do que durante o governo de Jair Bolsonaro. Porém, para Evandro Menezes de Carvalho, professor e coordenador do Núcleo de Estudos Brasil-China da Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas (FGV Direito Rio), isso não basta. Segundo Carvalho, o Brasil age apenas de maneira reativa e, pior, não tem uma visão estratégica de como conduzir sua principal parceria comercial.

“A melhoria das relações políticas poderia significar uma escolha pelo governo brasileiro de projetos estratégicos para o desenvolvimento nacional, afirma. “A China não aparece em canto nenhum nessa equação”, diz Carvalho, que desde 2013 vive entre o Brasil e a China, onde atualmente é pesquisador visitante sênior no Institute for Global Cooperation and Understanding (iGCU), da Universidade de Pequim. Leia trechos da entrevista.

Valor: O que mudou entre Brasil e China após um ano de governo Lula?

Evandro Menezes de Carvalho: Durante o governo Bolsonaro, as relações comerciais, baseadas na venda de commodities brasileiras, ficaram praticamente inabaláveis, tanto que houve crescimento. Mas outras áreas que poderiam ser desenvolvidas tiveram um certo prejuízo. O governo Bolsonaro achava que seria um problema de segurança nacional produtos da Huawei serem comprados pelas empresas de comunicação. Isso obviamente gerou um problema sério, porque colocou em suspeição a credibilidade da Huawei.

O que mudou? A relação política. Não há mais aquele azedume diplomático que havia com a presença do Bolsonaro. Lula é percebido pelo governo chinês como um amigo da China.

Valor: O que mais o Brasil poderia mudar na relação com a China?

Carvalho: A melhoria das relações políticas poderia significar uma escolha pelo governo brasileiro de projetos estratégicos para o desenvolvimento nacional, olhando para o que a China conseguiu no seu processo de desenvolvimento. No início dos anos 1980, a China era o Nordeste brasileiro da época. É como se o Nordeste brasileiro se tornasse a segunda maior economia do mundo.

Não vejo ainda um grande projeto estratégico na relação bilateral. Um projeto do qual você diga: “Isso, se der certo, pode ser decisivo, pode significar um salto de qualidade na economia nacional”. A China não aparece em canto nenhum nessa equação. Esse tempo todo o Brasil tem assumido uma postura muito mais reativa. Não olha para a China com a devida atenção.

Valor: Quais deveriam ser as prioridades do Brasil?

Carvalho: Direcionar esforços e uma política pública para os centros de pesquisa da área de tecnologia. Estimular parcerias com a China no campo da pesquisa. Envolver centros de pesquisa do Brasil em áreas estratégicas em parcerias importantes, mas sempre em conexão com as empresas brasileiras, sejam públicas ou privadas.

Há poucas parcerias brasileiras com chineses que possam resultar em ganhos a longo prazo para o Brasil. Não é só você ter um investimento chinês na área de energia no Brasil, mas parcerias com os chineses que possam inclusive levar à geração de novas patentes, onde o Brasil também seria proprietário, de produtos conjuntos que pudessem explorar o mercado internacional. Na visita do Lula aqui [em abril de 2023], assinaram um memorando sobre o fortalecimento, cooperação e investimentos na economia digital. Vai depender de pôr em marcha esse memorando.

Valor: O que o Brasil pode aprender com a China?

Carvalho: Os centros de pesquisa na China competem entre si. Os governos das províncias competem entre si. E as empresas também. Mas, em alguma medida, é como se estivessem olhando na mesma direção. Quando tem um determinado objetivo, o governo procura essas parcerias com empresas ou estimula essa relação com empresas, mas junto também com centros de pesquisa. Essa interação a gente vê muito pouco no Brasil.

Eu também fico preocupado com a baixa presença de empresas brasileiras na China. Há muitas grandes empresas chinesas no Brasil hoje. Essas empresas estudam a geografia, a população, a legislação. Então a China passa a ter uma inteligência sobre o Brasil muito superior àquela que o Brasil tem sobre a China.

Valor: E por que há essa baixa presença brasileira?

Carvalho: Naturalmente, exige um investimento muito pesado. Os custos são altos para ir para o exterior, colocar sua sede, colocar sua marca, disputar mercado na China, um mercado ultracompetitivo, que também tem uma legislação complexa. Muitas das empresas chinesas no Brasil são públicas e têm aporte de investimento chinês, o que dá uma vantagem muito grande para elas. E aí, novamente, é preciso que o governo brasileiro saiba o que quer para poder inclusive dizer para os chineses numa negociação: “Para entrar na Iniciativa do Cinturão e Rota [programa chinês de investimentos em infraestrutura em mais de 150 países] tem uma condição: ‘A gente quer empresa lá.’”

Valor: As empresas que foram para a China sofrem muito com problemas jurídicos?

Carvalho: Com certeza. Mas o governo chinês tem de fato procurado aprimorar o sistema jurídico. Cada vez mais eu vejo, por parte do governo chinês, uma preocupação de que essa governança do país seja muito orientada com base na lei. E isso tem a ver, sobretudo, com a ideia de eficiência do Estado. As empresas vão precisar de uma assessoria jurídica, de um escritório chinês. Muitas vezes as coisas se confundem entre o que é direito e aquilo que vai ser uma decisão administrativa de um governo local. Você tem que ter as relações políticas necessárias. Então, diria: nada muito diferente do que a gente vê no Brasil.

Valor: Quais são os principais pontos de atrito nas relações dos dois países hoje?

Carvalho: Teve recentemente uma do aço, por conta de questões tarifárias. Mas esses conflitos são normais quando você tem uma relação comercial. E devem ser resolvidos com base no direito de comércio internacional, às vezes levando a questão para a própria Organização Mundial do Comércio. E eu acho que existe um relativo mal-estar: acho que claramente a China não entende por que o Brasil não quer entrar na Iniciativa do Cinturão e Rota. Eles tinham uma expectativa de que o Brasil pudesse participar e o Brasil simplesmente mantém-se à distância.

Valor: Em que áreas o Brasil pode se tornar indispensável à China?

Carvalho: O Brasil tem uma certa expertise em algumas doenças tropicais. Toda essa parte interessa à China porque eles estão vendo o aumento da temperatura por força das mudanças climáticas. A área de bioeconomia pode interessar muito aos chineses também. Eu pergunto aos meus alunos: “Qual é o Estado mais rico do Brasil?”. Todo mundo diz São Paulo. Eu digo: “Não. Está lá no Norte, onde está a Amazônia.” Ali está a nossa maior riqueza. Existe aí um campo interessante de parcerias envolvendo pesquisa de remédios, até de cosméticos, a partir do bioma local, que pode interessar aos chineses.

Valor: Existe ainda muito desconhecimento sobre a China no Brasil. Pequim tem investido o suficiente no seu “soft power” [a capacidade de influenciar outros países por meio das ideias, e não pela coerção ou força]?

Carvalho: Há um esforço visível dos chineses em querer serem melhor aceitos na comunidade internacional. Mas tem coisas em que a China não conseguiu ainda avançar. Quando a gente olha os eventos chineses no Brasil, vê muita ênfase na cultura tradicional. Só que, quando você olha para a produção artística contemporânea na China, ela é incrivelmente maravilhosa. Posso dar uma lista de bandas de rock e de jazz que são sensacionais. Você vai em exposições de arte contemporânea e é impressionante. As séries de TV chinesas não ficam atrás das sul-coreanas. Eu não consigo entender por que essa China contemporânea não é melhor trabalhada para ganhar o mundo.

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