A chinesa Huawei tem apostado em diversificação, aumento substancial dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento e numa boa dose de resiliência para superar os desafios impostos pelas sanções dos Estados Unidos e da Europa, sob alegação de proteção à segurança interna dos países. A companhia tenta abrir novos mercados após as restrições de exportação destruírem seu negócio de smartphones e reduzirem a venda de equipamentos avançados a países desenvolvidos.
Com as sanções, a empresa perdeu cerca de US$ 30 bilhões em receitas em 2021 (que somaram US$ 99,8 bilhões), embora o lucro líquido (US$ 17,8 bilhões) tenha crescido 76% no período. No ano seguinte esses resultados caíram 7,5% e 68,7%, respectivamente, mas em 2023 as vendas cresceram 9%, segundo projeta a Huawei (os números finais ainda não estão fechados). O embargo afetou, sobretudo, a divisão de celulares e tablets, que não pôde mais contar com chipsets da Qualcomm e da Intel, nem com o sistema operacional Android e seus aplicativos.
“Quando veio o embargo, havíamos passado a Apple e, um semestre depois, passaríamos a Samsung, assumindo a liderança no mercado de celulares. Mas temos de fazer os problemas transformarem-se em soluções: criamos a divisão Shanghai Silicon, que montou uma fábrica de chipsets [conjunto de chips] e desenvolvemos o sistema operacional HarmonyOS”, afirma Atilio Rulli, vice-presidente de relações públicas da Huawei América Latina e Caribe.
A empresa já lançou celular com chipset e sistema operacional próprios na Ásia e vem reconquistando mercado, resultado atribuído ao aumento dos investimentos em P&D - setor no qual estão metade dos 207 mil funcionários da empresa no mundo. “O embargo está nos fortalecendo. A maior barreira continua sendo o acesso aos aplicativos”, diz o executivo.
A fabricante chinesa investe, em média, 15% do faturamento em P&D, mas em 2022, devido ao embargo, o patamar foi a 25%, uma das taxas mais altas da indústria global de tecnologia, somando US$ 22,3 bilhões. A companhia mantém 120 mil patentes ativas, que renderam, em 2022, US$ 560 milhões em receitas de licenciamento.
No setor de equipamentos de telecom, a companhia se prepara para oferecer soluções 5G Advanced (o 5,5G) e trabalha nas especificações para o 6G. “Num período de dois a três anos, já teremos produtos 5,5G operando em países de maior conexão, como China, Japão e Coreia do Sul. O 6G segue a linha de mais uma geração que, em seis anos, estará pronta”, sinaliza Rulli. A empresa também tem uma estratégia para o mercado de inteligência artificial (IA) e deve trazer, neste trimestre, sua ferramenta PanGu, com foco no mercado B2B.
No Brasil, onde está presente há 25 anos, a Huawei é a maior fornecedora de equipamentos de telecomunicações. “Somos líderes no setor de telecomunicações com market share superior a 50% no mundo e no Brasil, onde atendemos as três grandes operadoras e a maioria dos ISPs [provedores de internet, na sigla em inglês]”, afirma o executivo.
A companhia divide o mercado local de operadoras com a Ericsson e o de fibra óptica com a Nokia, com o maior market share, aponta Eduardo Tude, presidente da consultoria Teleco. “Com o embargo, a empresa vem diversificando para outras áreas, como TI e cloud para o mercado corporativo, além de voltar a crescer a divisão de celulares no mercado da China”, afirma.
De acordo com José Felipe Ruppenthal, consultor da Telco Advisor, a Huawei chegou ao Brasil com preços muito baixos. Ao longo dos anos, foi investindo em P&D e conquistando mercado também por qualidade. “Em 25 anos, a Huawei se transformou, investiu em inovação, treinamento e especialização e hoje está presente em 70% da infraestrutura de redes móveis do Brasil. Cerca de 60% de suas receitas vêm de operadoras”, diz.
A empresa tem mais de 3.000 produtos no portfólio e um percentual entre 40% e 45% do que é vendido no Brasil é produzido no país. São duas unidades fabris: uma em Jundiaí (SP) - planta inteligente automatizada com cloud, 5G, IA e internet das coisas, - que produz equipamentos de redes móveis e para o mercado corporativo, e outra em Manaus (AM), onde fabrica equipamentos de banda larga fixa e de fibra óptica.
Para a distribuição, a companhia mantém um grande centro logístico de 23 mil m² em Sorocaba (SP), o primeiro da América Latina automatizado com 5G, além de oito centros regionais no país. Em termos de operações, são quatro unidades de negócios no Brasil: operadoras; tecnologias de informação e comunicação (TIC) para o mercado corporativo; digital power, a que mais cresce com a oferta de equipamentos para energia solar e eólica; e por fim, a Huawei Cloud, que oferece serviços de nuvens pública e híbrida.
A empresa também investe em projetos institucionais como o conduzido pela Veloso Net na construção de redes em 90 cidades do Amazonas. “Já são 35 cidades cobertas por um projeto de inclusão digital e social que tem transformado a economia e a vida dessas comunidades. O programa de responsabilidade social Tech for All está presente em 170 países, para as áreas de educação, economia, meio ambiente e saúde”, diz Rulli.