Os chefes de Estado de países amazônicos que se reúnem em Belém a partir de terça-feira (8) devem assinar longa declaração política com mais de 130 parágrafos e temas que vão do combate ao desmatamento e ao crime organizado a projetos de infraestrutura, mineração e modelos de desenvolvimento. O Brasil quer que a Carta de Belém tenha meta de desmatamento zero comum aos países, mas não há consenso. Nem todos concordam com a proposta colombiana de não se abrir novas frentes de exploração de petróleo na região - o Brasil se opõe.
Deve ser criada uma espécie de Interpol amazônica - um centro de cooperação policial internacional, em Manaus, para integrar as polícias dos países da região. O objetivo é combater crimes ambientais, como a derrubada da floresta e garimpos em terras indígenas, além do narcotráfico. A proposta faz parte do Plano Amas (Amazônia: Segurança e Soberania) anunciado em julho pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e elaborado na pasta da Justiça e Segurança Pública, do ministro Flávio Dino.
Outra decisão deve ser a criação de um sistema integrado de tráfego aéreo entre os países, fundamental no combate do crime organizado e às ilegalidades.
Segundo disse o diretor-executivo da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) Carlos Alfredo Lazary Teixeira, à GloboNews, a declaração de Belém criará um grupo de trabalho para estudar a formalização de um Parlamento amazônico, que pode ter caráter deliberativo. O organismo supranacional teria ser aprovado pelos congressos dos oito países signatários do Tratado de Cooperação Amazônica.
Para o governo brasileiro, a Cúpula da Amazônia inicia uma série estratégica de eventos ambientais e de desenvolvimento. Segue-se à Cúpula a presidência do G20 e a COP30, a conferência climática da ONU que deve acontecer em Belém, em 2025. O Brasil busca também a liderança regional nos assuntos amazônicos e coordenar posições comuns entre países florestais em fóruns multilaterais.
“É um momento importante em que se espera que o governo brasileiro apresente suas credenciais como liderança, mostre uma agenda concreta em relação à priorizacão da agenda climática e uma chance única de demonstrar que a outra agenda prioritária, de integração regional, dialoga com a emergência climática”, diz Cíntya Feitosa, assessora de relações internacionais do Instituto Clima e Sociedade. “A cúpula é o abre-alas de outros grandes momentos que serão liderados pelo Brasil, como G20 e a COP30. É importante lembrar que são momentos de coordenação entre países e de busca de soluções conjuntas.”
Os chefes de Estado e de governo dos oito países da OCTA se reúnem nos dias 8 e 9. Nem todos virão - não devem comparecer os de Equador e Suriname. O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, não cancelou a agenda embora esteja no epicentro de uma crise política. Seu filho Nicolás Petro admitiu ter recebido dinheiro de um narcotraficante e tê-lo usado na campanha do pai à Presidência. A Colômbia é o segundo maior país amazônico, depois do Brasil.
Devem vir presidentes de países com florestas tropicais como Congo-Brazzaville e da República Democrática do Congo. A intenção do Brasil é aproveitar a cúpula para se ter uma posição comum entre países florestais e levá-la à COP28, em Dubai, em novembro.
O evento começou na sexta-feira com os Diálogos Amazônicos, série de encontros para debater o desenvolvimento sustentável da região. Estima-se que vão acontecer mais de 400 eventos de organizações e movimentos sociais, governos estaduais e municipais, cientistas, povos indígenas, ribeirinhos e comunidades quilombolas.
Os Diálogos Amazônicos foram estruturados em oito plenárias que acontecem até domingo. A primeira, por exemplo, terá participação do ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, e vai debater a participação e a proteção dos territórios e dos defensores da floresta, além da erradicação do trabalho escravo na Amazônia.
Outras quatro plenárias discutirão projetos inclusivos para a região, saúde, soberania e segurança alimentar, o futuro da Amazônia a partir da ciência e tecnologia, mudança do clima, novos modelos de produção para o desenvolvimento regional e povos indígenas.
Haverá plenárias dedicadas a temas relacionados às mulheres, juventude e racismo ambiental, povos e comunidades tradicionais. Cinco documentos finais serão entregues aos presidentes dos países amazônicos para serem considerados na Carta de Belém.
“Queremos sair da cúpula na fase da implementação das decisões”, disse a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente. “A OCTA tem que ser fortalecida como órgão implementador das decisões.”
Os princípios fundamentais da declaração de Belém são respeito a direitos humanos, abordagem intercultural e intrageracional, e soberania, disse a embaixadora Gisela Padovan, secretária de América Latina e Caribe. “A intenção da Cúpula é fortalecer a articulação regional e mostrar que estamos abertos à cooperação, mas a gestão é dos países amazônicos”, disse ela.