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Por Sergio Adeodato — Para o Valor, de São Paulo


Uma estrutura de contêineres coloridos se destaca em meio às árvores do Parque da Cidade, em Salvador (BA), com captação de água da chuva, tratamento biológico de esgoto, painel de energia solar, ventilação cruzada e cobertura vegetal, entre outros diferenciais como espaço de coworking e negócios sociais. Na fachada, quadrinhos com símbolos e números apontam a fórmula das inovações lá nascentes, baseadas nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), instituídos pela ONU com metas para 2030. Diante da urgência de avanços mais rápidos, esse berçário de boas ideias reúne pequenos empreendedores no propósito de unir lucro e impacto positivo à sociedade, trazendo a estratégia de soluções locais para uma agenda global.

Em quatro anos, o Colabore - primeira incubadora de negócios criada por um governo municipal no país - apoiou 150 negócios com mentoria para acessar investimentos e emplacar no mercado. “A segurança alimentar, agora em risco, é base para a busca de qualificação profissional e emprego”, afirma Roseane Moreira, à frente da startup Minha Cesta, voltada à gestão de doações de alimentos.

“Queremos aumentar a renda de cooperativas da agricultura familiar associadas a produtos de identidade cultural, reduzindo atravessadores”, ressalta Suzana Calmon, empreendedora da Escoaf, negócio que também despontou na incubadora baiana, idealizada pelo ex-secretário municipal de sustentabilidade e resiliência, André Fraga. Ele adverte: “Trazer ações para o dia a dia é chave, porque o desafio de maior velocidade das mudanças não depende apenas de corporações ou governos, mas dos indivíduos”. Hoje vereador (PV-BA), o engenheiro ambiental lidera o projeto “ODS nas Ruas”, por meio de uma kombi que mobiliza bairros da capital com batalha de rap e outras ações para a difusão da Agenda 2030.

Após os Objetivos do Milênio, lançados na virada do ano 2000 para a estratégia até 2015, os ODS foram estabelecidos com uma ambição ampliada: 17 eixos principais, incluindo 169 metas sociais, econômicas e ambientais, de forma a orientar políticas, planos e investimentos como arquitetura de um grande pacto planetário para mais 15 anos. “Já vencemos o desafio do entendimento, tecnologia e métricas, e agora falta mobilização coletiva e individual por meio das escolhas”, diz Denise Hills, diretora de sustentabilidade da Natura.

A executiva destaca a importância atual dos dois últimos objetivos da lista - ODS 16, que reforça a necessidade da paz, e o 17, sobre parcerias para implementação da agenda. “Vivemos hoje uma corrida, porque restam sete anos e meio para o prazo dos compromissos, e não estaremos seguros individualmente sem que todos também estejam”, diz.

Mudança climática e desigualdade social exigem maior velocidade de ação. “Faltam lideranças capazes de mobilizar o planeta na mesma direção de forma coordenada, o que é fundamental diante do tamanho dos riscos”, analisa Mario Monzoni, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV). Ele completa: “As ações de hoje representam uma gota no oceano e a reação virá pela dor”.

Há um descompasso entre o ritmo das práticas e a alta demanda do meio empresarial por parcerias com a academia no campo da sustentabilidade. “Após acordar para o problema e se capacitar para resolvê-lo, é necessário agir”, observa Monzoni, para quem “há muitos querendo entender, mas ainda poucos marchando na implementação”.

A agenda global tem sido gradativamente incorporada nas bolsas de valores, setor financeiro e métricas de performance das empresas. No entanto, dizem analistas, é baixo o envolvimento do poder público, principalmente nas esferas locais. No Brasil, em nível federal, a Comissão Nacional dos ODS encontra-se inativa. “Há um enorme desconhecimento dos gestores municipais sobre a Agenda 2030”, avalia Rodrigo Perpétuo, diretor executivo do Iclei para a América do Sul. Exceções estão em Belo Horizonte, com política pública para mapear a evolução dos objetivos e metas; e no Rio de Janeiro, que possui plano integrando ODS e clima. Em São Paulo, foi lançada a Virada dos ODS, aberta à população no âmbito da “Década de Ação”, assinada junto à ONU.

“Não adianta somente colar quadradinhos dizendo que segue os objetivos da agenda, mas direcionar investimentos públicos e privados e adotar mensuração comparável com outras partes do mundo”, observa Perpétuo. Fora das grandes capitais, o déficit é expressivo, conforme resultados do Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades, criado pelo Instituto Cidades Sustentáveis para monitorar o nível de engajamento municipal nos ODS.

“É essencial democratizar a linguagem, conectando às periferias e comunidades que já adotam iniciativas contra a crise climática e ambiental e precisam ser multiplicadas”, afirma Raull Santiago, à frente da plataforma PerifaConnection. Segundo ele, “as favelas precisam ser vistas como solução”.

Carlo Pereira, diretor executivo da Rede Brasil do Pacto Global, com 1,6 mil integrantes no mundo, alerta: “Apesar da complexidade, não temos mais espaço, nem tempo, para adiar”. Para ele, quem não fizer as mudanças ficará para trás, porque “a pressão vem de vários lados - sociedade civil, consumidores e investidores - e a conta será paga por todos nós”. Em cenário de cobranças, diz Pereira, o espaço para greenwashing fica cada vez mais reduzido, com novos mecanismos de controle, como o Observatório 2030, que monitora o cumprimento das metas dos ODS pelas empresas.

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