Futuro
O transplante, amanhã

Médicos apostam em transplante com corações de porcos no futuro

Órgãos de animais ou criados em laboratório são (e sempre foram) tendência

Recipiente térmico para transportar coração doado em sala cirúrgica do Instituto do Coração, em São Paulo - Lalo de Almeida/Folhapress

Recipiente térmico para transportar coração doado em sala cirúrgica do Instituto do Coração, em São Paulo - Lalo de Almeida/Folhapress

Gabriel Alves
São Paulo

Pelas estimativas da ABTO, seriam necessários 1.600 transplantes por ano para atender a população do país, dado o seu tamanho, mas só cerca de 400 são feitos. Resultado: três quartos dessas pessoas morrem ou na fila de espera ou sem um diagnóstico adequado.

No Brasil, 302 pessoas esperam na fila oficial por um novo coração. Pelas estatísticas, uma a cada três morrerá antes que chegue sua vez.

Enquanto o coração novo não vem, a saída pode ser usar um dispositivo que auxilie o órgão convalescente. Além do balão intra-aórtico –uma sonda que ajuda a bombear o sangue para a aorta–, há equipamentos de assistência ventricular que são acoplados ao coração e bombeiam sangue a partir dele. Nesses casos, só parte do órgão recebe auxílio.
Outra possibilidade é substituir o coração quase que totalmente por uma versão artificial do órgão, que pode custar mais de R$ 500 mil.

Mas, por mais modernos e funcionais que sejam, esses dispositivos não são as apostas dos médicos para o futuro. Xenotransplantes, ou seja, órgãos vindo de animais, e órgãos totalmente criados em laboratório são os favoritos.

Em porcos, animais de estrutura similar à humana, experimentos buscam um jeito de tornar os órgãos compatíveis. Na teoria é fácil: basta substituir as proteínas responsáveis pela rejeição por outras inertes e neutralizar ameaças, como vírus nas células suínas.

Coração doado antes de ser transplantado em paciente no centro cirúrgico do Incor, em São Paulo

Coração doado antes de ser transplantado em paciente no centro cirúrgico do Incor, em São Paulo Lalo de Almeida/Folhapress

Na prática, porém, é difícil garantir que essa limpeza genética seja bem feita.

Em 1964, o cirurgião americano James Hardy fez uma tentativa: transplantou um coração de chimpanzé em um homem, que viveu poucas horas. O coração era pequeno demais para o corpo do paciente, que, segundo padrões atuais, nem seria elegível para o transplante. Ele tinha feridas com placas de gordura em todo o organismo e havia tido as duas pernas amputadas.

Outros testes de transplantes de corações de porcos para primatas não humanos tiveram relativo sucesso, com sobrevivência de alguns meses.

Como certa vez disse o pioneiro Norman Shumway: "Xenotransplantes são o futuro dos transplantes de órgãos. E sempre serão." Quem sabe demore menos de meio século.

CRÉDITOS

Reportagem Gabriel Alves Edição de texto Mariana Versolato Infografia Luciano Veronezi e Angelo Dias Fotos Lalo de Almeida, Reinaldo Canato e Acervo Folha Edição de foto Daigo Oliva Pesquisa Edgar Lopes da Silva Coordenação e edição Mariana Versolato (concepção), Adriana Mattos, Thea Severino e Kleber Bonjoan

Vídeo

Fotografia Victor Parolin, Marina Garcia, Isabella Faria Produção Melina Cardoso Edição Marina Garcia