Sylvester Stallone era o maior astro do cinema em meados dos anos 1980. É seguro dizer que Hollywood gravitava naqueles dias em torno do responsável pelos sucessos das franquias 'Rocky' e 'Rambo'. Por isso, roteiros de filmes de ação quase sempre passavam por ele primeiro, já que ter o seu nome no topo do cartaz era visto como garantia de sucesso de bilheteria.
Um desses scripts foi o do filme que fez a grande virada no gênero nesta mesma época: 'Duro de Matar' (1988). Ao contrário de um herói invencível e infalível, trazia John McLane, um tira de Nova York que, por acaso, precisa encarar um grupo de perigosos terroristas no Nakatomi Plaza, em Los Angeles, na noite de Natal.
O que ele estava fazendo lá? Tentando reatar o seu casamento e a esposa trabalha no lugar. Mais humano que isso, senhoras e senhores, impossível.
Sly, como chamam os amigos mais próximos e familiares, no entanto, via um problema por conta de um dos seus maiores "assets". Ele achava o próprio McLane e a sua jornada muito parecidos com Rambo e sua proposta, cujo segundo capítulo, 'A Missão', arrebentou nos cinemas com enorme sucesso três anos antes - fez inacreditáveis 300 milhões de dólares. E também andava incomodado com os detratores dizendo que ele fazia sempre os mesmos personagens.
Preferiu apostar numa propriedade sua e jogar todas as fichas naquele momento em 'Rambo 3', que seria lançado no mesmo ano de 'Duro de Matar'. Sylvester Stallone, conforme o tempo tratou de provar, perdeu esse braço de ferro, e feio.
Nem tanto por faturamento, já que o longa-metragem ficou longe de dar prejuízo, apesar de faturar "apenas" 2/3 do antecessor, mas recebeu muitas críticas por conta da história mesmo, que trazia o ex-combatente do Vietnã ajudando a resistência islâmica no Afeganistão contra os invasores soviéticos. Em clima de fim de guerra fria, com a aproximação de Gorbachev com o Ocidente, pegou mal. Há relatos até de vaias em alguns cinemas nos EUA.
Isso sem falar da ironia histórica que marcaria o filme décadas depois, com o 11 de Setembro, já que os mujahideen que lutam ao lado de John Rambo são o embrião do que viria a ser o Taleban e a organização terrorista Al-Qaeda, de Osama Bin Laden.
Já com 'Duro de Matar' foi completamente diferente. E olha que fez menos dinheiro do que o terceiro 'Rambo' - cerca de US$ 143 milhões. Só que custou bem mais barato, até pelo cachê pago para o protagonista encontrado no sufoco, Bruce Willis, mais baixo do que seria o de Stallone, mas ainda assim bem respeitável. O artista recebeu algo em torno de US$ 5 milhões, o que gerou certa controvérsia á época; houve quem considerasse dinheiro demais para um nome que não era de primeira linha em Hollywood.
Willis não era um desconhecido. Fazia sucesso na televisão norte-americana com a série 'A Gata e o Rato', popular também no Brasil, mas não tinha emplacado nenhum grande sucesso nos cinemas - e o curículo até então era marcado por comédias, como 'Encontro às Escuras' (1985) e 'Assassinato em Hollywood' (1988), ambas dirigidas por Blake Edwards, o veterano da franquia 'A Pantera Cor-de-Rosa', que mostrava ter visão além do alcance ao pinçar aquele sujeito que daria as cartas na indústria cinematográfica na década de 1990.
Parece inacreditável hoje, mas Bruce Willis foi a oitava opção dos produtores para estrelar 'Duro de Matar', que ficaram vagando por Hollywood atrás de alguém que materializasse John McLane, principalmente depois da negativa de Stallone.
O papel, nem precisa dizer, caiu como uma luva no ator, até porque carecia de uma combinação de energia frenética com uma pitada ácida de comédia - não dá para pensar em outra pessoa tirando sarro dos terroristas e fazendo piadinhas autodepreciativas enquanto escapa de rajadas de metralhadora ou retalha os pés com cacos de vidro.
"'Duro de Matar' é provavelmente o mais próximo que cheguei de mostrar o que existe no meu coração em um filme. Eu não conheço nenhum super-herói. Conheço caras que têm medo e ansiedade, e acho que você também conhece pessoas assim. Isso é o que eu queria mostrar. Eu realmente queria ser honesto sobre como você age quando pensa que sua vida está prestes a acabar. Eu queria interpretar alguém que tinha sim medo de morrer", resumiu o próprio ator, em uma entrevista de alguns anos atrás.
A simbiose entre Bruce Willis e John McLane é uma das melhores da história do cinema de ação. O primeiro 'Duro de Matar' virou um clássico, com quatro indicações ao Oscar, todas técnicas, como era de praxe para os filmes do gênero naquela época (era o máximo que eles conseguiam tirar da Academia), e tanto o personagem quanto o roteiro passaram a ser imitados à exaustão.
Até se aposentar da carreira de ator, no ano passado, após diagnósticos sucessivos de afasia e demência, Bruce Willis fez outros quatro filmes da franquia, o último 'Duro de Matar: Um Bom Dia Para Morrer' (2013). Isso sem falar das variações diversas que interpretou de McLane em outras fitas policiais e de ação nas décadas de 1990, 2000 e 2010. Foi toda uma carreira em cima desse grande sucesso.
Confira a seguir o trailer do clássico 'Duro de Matar' (1988).