Entrevista do Mês

Por Jaquelini Cornachioni, redação Marie Claire — São Paulo

Todos os dias Tania Cosentino acorda, dá bom dia para sua pitangueira e vai revolucionar a tecnologia no país e no mundo. Uma das líderes mais respeitadas do cenário empresarial global, a presidente da Microsoft Brasil recebeu a Marie Claire em seu escritório no Corporate Towers, o arranha-céu mais moderno de São Paulo, para contar sobre sua trajetória e revelar novidades que prometem transformar o setor. Entre as mais aguardadas está o lançamento, ainda neste semestre, do serviço OpenAI integrado a ferramentas como Teams, Outlook e Excel, já tão conhecidas no nosso cotidiano. Aliados a essa tecnologia, que conta com IA generativa – capaz de gerar novos textos, imagens e outras mídias em resposta a solicitações dos usuários (caso do famoso ChatGPT) –, os aplicativos ganham novas e incontáveis dimensões de produtividade e criatividade. “A IA é como um superpoder”, diz Tania.

Antes de comandar uma das maiores big techs do planeta, avaliada em US$ 500 bilhões, ela cresceu em Santana, na zona Norte da capital paulista, filha de um comerciante e uma secretária. “Meu pai, Mario, falava que os filhos eram os mais bonitos e inteligentes, e nos fez acreditar nisso. Eu me formei em engenharia e tenho uma carreira bem-sucedida, minha irmã é doutora em física e meu irmão é músico.” Já a mãe, Nair, parou de trabalhar quando se casou e, 25 anos depois, voltou a ser funcionária da mesma empresa. Para Tania, ela era sinônimo de determinação. “Uma nota inferior a 9 gerava um drama em casa. Isso me trouxe o hábito de estudar e performar no meu máximo. Minha mãe sempre valorizou trabalho, disciplina, execução e resultado”, diz – estas quatro palavras, aliás, são quase um mantra para Tania, que as repete sempre que questionada sobre suas conquistas.

Uma das primeiras aconteceu quando ainda cursava o ensino técnico e conseguiu um emprego na Siemens SA, onde passou oito anos. Mas foi na multinacional francesa Schneider Electric, especializada em gestão de energia e automação, que fez carreira: em dezoito anos, foi de gerente de vendas a primeira mulher a liderar a empresa no Brasil e, em seguida, na América do Sul. Em 2019, recebeu pelo LinkedIn o convite para assumir a chefia nacional da Microsoft. “Aceitar essa vaga foi um processo longo: quase um ano até a decisão. Algo que me motivou foi a quantidade de mulheres como líderes. Foi incrível ver, quando cheguei na organização, mulheres como presidentes de operações comerciais. Fiquei orgulhosa”, diz – globalmente, as mulheres representam mais de 30% da força de trabalho na empresa.

Tania conta ainda que o marido, Carlos, que conheceu na escola e reencontrou na faculdade, sempre apoiou sua carreira. Casados há 28 anos, nunca quiseram filhos. A decisão, no entanto, já foi diversas vezes julgada. “As pessoas sempre perguntam e, mais do que isso, julgam. Dizem: ‘Por que você não teve filhos?’ E é simples: não quis. Ouço que só cheguei até aqui porque não tive filhos. Esse comentário é injusto. Talvez tenha sido mais fácil? Não sei. Conheço mulheres que chegaram lá tendo filhos. Costumo dizer que filho não atrapalha carreira, o que atrapalha é o parceiro errado.”

Pressões sociais datadas à parte, Tania é hoje uma das vozes mais influentes do mercado tecnológico e uma das pessoas mais bem preparadas para falar sobre o início da revolução da inteligência artificial – que, segundo ela: “Não será, já é”. É como escreve a IA generativa quando perguntada sobre Tania Cosentino: “Adentrar seu mundo é como mergulhar em um oceano de inovação e liderança inspiradora. Seus passos não deixam apenas pegadas no mundo dos negócios, mas também marcam uma trilha luminosa para aqueles que aspiram a grandes feitos”.

MARIE CLAIRE: O assunto do momento é inteligência artificial e o receio é de que os avanços nessa área causem um terremoto no mercado de trabalho. Como enxerga as mudanças que virão?

TANIA COSENTINO: Quando alguém não conhece algo, é normal que se crie mitos em volta do assunto. A inteligência artificial não é uma tecnologia nova, falamos sobre isso desde os anos 1950, quando começamos, através de programação de computadores, a tentar imitar o comportamento e a forma de pensar do humano. Isso resume o que é IA. Ela não supera o humano, mas busca paridade. Foi feita para ajudar, é como um “superpoder”. A Microsoft vem investindo há anos nesse sentido, temos várias tecnologias assistivas. A diferença é que a elaboração dessa inteligência era restrita ao mundo da TI. Agora, temos a IA generativa e percebemos esse movimento já em 2019 com a OpenAI, criadora do ChatGPT. Fizemos uma parceria nesse mesmo ano, mas, antes disso, tínhamos desenvolvido bots [robôs] que respondiam de forma parecida com o humano. A IA generativa usa uma inteligência artificial poderosíssima, e a nuvem habilita isso. Assim, surgiu o Serviço OpenAI do Azure, que é a nuvem da Microsoft. Essa IA gera respostas, como você vê no ChatGPT, tudo isso através de linguagem natural.

Tania Cosentino conversa com Marie Claire sobre o futuro da IA no Brasil — Foto: Carine Wallauer
Tania Cosentino conversa com Marie Claire sobre o futuro da IA no Brasil — Foto: Carine Wallauer

MC: Com o avanço rápido da IA, o mercado se preocupa com a onda de possíveis demissões. A IA pode mesmo substituir os humanos e mudar o mundo do trabalho?

TC: O robô não tirou o homem da indústria, mas das operações de risco no chão de fábrica. Vi chão de fábrica de indústrias automotivas nos anos 1980, o operador entrava dentro da prensa, correndo alto risco de acidente. Hoje, estamos substituindo o homem pelo robô em aplicações de baixo uso cognitivo. A verdade é que a massa que vai perder seus empregos não está preparada para assumir os novos cargos que serão gerados. Para isso, temos programas de capacitação gratuitos de letramento digital e outros treinamentos, que vão do básico ao avançado. A oportunidade traz responsabilidade, e sabemos disso. O Programa Conecta+ é o nosso grande exemplo. Nós, no Brasil, temos um problema brutal de baixa produtividade. Poder usar a tecnologia para trazer ganhos, gerar desenvolvimento e crescimento econômico, é incrível. A IA tem o potencial de aumentar o bolo da economia mundial. E o que devemos fazer? Regulamentar a IA.

MC: Em entrevista a Marie Claire, Cármen Lúcia refletiu sobre a regulamentação da IA. Como a Microsoft se posiciona sobre isso?

TC: A Microsoft tem uma preocupação com o uso responsável da tecnologia. Na medida em que se democratiza a tecnologia, e isso sai do mundo dos técnicos e engenheiros, é possível que se perca o controle. Por isso, nós nos preocupamos e somos a favor da regulamentação. Tivemos uma atuação forte na construção do General Data Protection Regulation (GDPR), na Europa, e na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais no Brasil. Precisamos antecipar os movimentos e trazer conhecimento. O grande problema é tentar legislar sobre algo que você não conhece.

MC: De qual forma a IA entra nos produtos populares da Microsoft, como PowerPoint e Teams?

TC: A IA generativa nos dá respostas, o que torna a nossa vida mais fácil. Em 2022, quando a OpenAI lançou o ChatGPT, colocamos essa tecnologia dentro do Bing [buscador Microsoft] e começamos a discutir a revolução no mercado de busca. No PowerPoint, por exemplo, você pode usar o Copilot – um recurso de inteligência artificial integrado aos principais aplicativos de produtividade do Microsoft 365 – para colocar informações, referências, arquivos em PDF e pedir, por exemplo: “Construa para mim uma apresentação sobre sustentabilidade baseada nesse documento”.

MC: A proteção de dados com o uso da IA também é um debate frequente. De que forma é possível garantir segurança dentro dessa tecnologia?

TC: Os dados são da pessoa que está usando a ferramenta, e não dos donos da tecnologia. A Microsoft não treina algoritmos com dados dos clientes. O cliente vai usufruir dos dados públicos e da sua organização com proteção e cibersegurança.

MC: Uma pesquisa da Universidade Stanford mostrou que 75% das empresas pretendem incorporar a IA nos próximos anos. Como isso impacta minorias como pessoas com deficiência e de diferentes classes sociais?

TC: Um dos nossos princípios é a inclusão. Quando pensamos em deficiência física ou cognitiva, as nossas ferramentas possuem capacidades assistivas e incluem pessoas até com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). Para pessoas com déficit de atenção, temos coach de leitura. Temos ferramentas para pessoas com deficiência visual e auditiva. Além disso, temos programas de treinamento focados no público feminino. Sabemos como é difícil ter mulheres, cis e trans, na área técnica. Também temos o programa Black Women in Tech. A mulher não se enxerga em tecnologia. A mulher trans definitivamente não se enxerga na tecnologia. A mulher negra, também não. Por esse motivo, precisamos de recortes dentro do treinamento. O programa se chama Conecta+ porque conectamos quem recebe o certificado com o emprego. Essa é uma questão importante, mas a Microsoft sozinha não vai resolver a equação. Acredito em uma união do poder público, privado, ONGs: todas as cabeças precisam colaborar.

MC: Numa sociedade patriarcal, é importante que uma mulher esteja à frente de mudanças tidas como inevitáveis e rápidas. Você se sente sozinha, nesse universo de liderança em que mais de 90% dos CEOs de companhias brasileiras são homens e brancos?

TC: Percebi essa solidão, de fato, quando assumi a presidência. Passei por três multinacionais antes de chegar à Microsoft. Foi na Schneider Electric que entendi que poderia crescer. Assumi a diretoria comercial depois de três anos na empresa. Em 2009, me tornei CEO, e me foquei bastante no aprendizado. Nessa época, quando comecei a participar de fóruns de CEOs, percebi a discrepância. As mulheres eram 4% ali dentro. E foi assim que entendi que precisava desempenhar um papel ainda mais forte. Queria mostrar para outras mulheres que é possível. Mais do que isso, tinha que abrir portas, pegar pela mão. Era um dever. Se olharmos para 2010 e 2023, tivemos progresso. Hoje se fala em diversidade, inclusão, ações afirmativas. As empresas têm programas nesse sentido, vemos um número maior de mulheres na liderança, porém, ainda somos 20%. Estamos longe.

MC: No começo da carreira, você ouviu que mulher ou era bonita ou engenheira. Como foi seu caminho na profissão?

TC: Estudei em escola pública e, quando estava quase chegando o momento do segundo grau, me incentivaram a fazer escola técnica. Não sabia nada sobre esse mundo, mas fui. As matérias eram: engenharia civil, eletrotécnica, eletrônica, mecânica, processamento de dados e telecomunicações. De início, achei que processamento de dados era algo mais “feminino”, então me preparei para esse curso. Tudo mudou assim que me encantei pela eletrotécnica, um curso bastante pesado e com poucas mulheres. Foi um desafio me encontrar em uma área predominantemente masculina. Como defesa, levei comentários machistas como “piadas”. Acho que isso tem relação com a minha mãe, que sempre pedia que apagasse o que não me agrega valor. E isso foi o que não me paralisou.

MC: Você é a única mulher latino-americana reconhecida por seu trabalho a favor da sustentabilidade pela Organização das Nações Unidas (ONU).

TC: O tema sustentabilidade faz parte da minha agenda há anos. Não é um tema que sou especialista, mas conecto com o mundo dos negócios e tento fazer com que entreguemos uma resposta positiva ao planeta e à sociedade. É uma jornada em que você olha para outras empresas, seus pares no mercado e incorpora ações que estão dando certo. Temos o compromisso de ser carbono zero até 2030, e compensar as emissões desde a fundação até 2050.

Tania Cosentino, fotografada no escritório da Microsoft, em São Paulo — Foto: Carine Wallauer
Tania Cosentino, fotografada no escritório da Microsoft, em São Paulo — Foto: Carine Wallauer

MC: Depois de 30 anos de carreira, o que o amadurecimento trouxe a você?

TC: Quando assumimos uma primeira liderança, aparece a síndrome de impostora, com a qual só aprendemos a lidar com o tempo. Já o amadurecimento traz tranquilidade, em especial durante situações adversas.

MC: Quando se permite ser vulnerável?

TC: Quem diz que não é vulnerável, não é humano. Só robô pode ser assim [risos]. Tenho meu momento de vulnerabilidade, e esse sentimento veio de maneira forte na pandemia. E me permiti ser vulnerável com meus colaboradores, dizendo: “Sou humana”.

MC: Em um trabalho acelerado, repleto de novidades e agenda de lançamentos, como fica a cabeça?

TC: É um privilégio ser uma das pessoas à frente desse movimento de inteligência artificial, mas confesso: a cabeça não para. Por onde ando, vejo possíveis aplicações para a IA, não há limites.

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