Ciência

Por Tainá Rodrigues, com edição de Luiza Monteiro

Os plásticos estão completamente inseridos na vida humana. Embora ajudem em diversos aspectos, o descarte incorreto, sem reciclagem, faz esses resíduos sofrerem com a ação do sol, da chuva e do vento. Como resultado, eles são degradados e se infiltram no meio ambiente na forma de microplásticos — aqueles com menos de 5 milímetros de comprimento.

A pesquisadora brasileira Amanda Gouveia estuda maneiras de fazer essas partículas minúsculas de polímeros se degradarem mais rapidamente. Em fevereiro, sua pesquisa ganhou apoio do renomado programa Marie Skłodowska-Curie Actions (MSCA), a principal iniciativa de financiamento de pesquisa na União Europeia. De acordo com o Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais (CDMF), as bolsas são altamente competitivas e menos de 15% dos solicitantes conseguem obtê-las.

Durante 24 meses, Gouveia trabalhará na Universidade Sorbonne, na França — onde também estudou a cientista polonesa Marie Curie (1867-1934), vencedora de dois prêmios Nobel e que dá nome ao programa de financiamento conquistado pela brasileira.

Com uma verba de 211 mil euros, a pesquisa intitulada “Engenharia Teórica de Fotocatalisadores para Degradação de Microplásticos” acontecerá no Laboratório Teórico de Química (LCT), liderado pela professora Monica Calatayud.

“A problemática atual são os microplásticos e nanoplásticos, encontrados em águas residuais na terra, em placenta, em fezes humanas. Existe um descarte aleatório [dos plásticos] e infelizmente não temos ainda uma lei que rege muito bem essa questão da reciclagem”, analisa Gouveia, em entrevista a GALILEU.

A busca por semicondutores

A pesquisa também envolve a ação de semicondutores, que são materiais capazes de degradar elementos como vírus, fungos e poluentes, incluindo microplásticos. “O intuito é encontrar materiais que sejam capazes de fazer essa degradação, podendo até gerar produtos com valor agregado”, relata a cientista.

Com a possibilidade de eliminar a presença desses resíduos, a qualidade da água e do solo melhoraria, por exemplo. Para ser aplicado na natureza, porém, é preciso simular um tipo de microplástico e analisar se o material semicondutor de degradação funciona nos ensaios experimentais.

Tudo é feito em etapas, até chegar à degradação sustentável e eficiente de uma amostra real na natureza. “Se a gente conseguir um semicondutor que realmente seja capaz, de maneira sustentável, de degradar microplásticos para aplicar no solo ou na água, traremos muitos benefícios para a sociedade e o meio ambiente”, afirma Gouveia.

Das aulas de química aos laboratórios

Nascida em Marília (SP), Gouveia se formou em Química pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) e cursou mestrado e doutorado na Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), ambas no interior paulista. A cientista também tem no currículo um pós-doutorado em Química Teórica e Computacional (QTC) pela Universidade Jaume I, na Espanha.

Amanda no laboratório da Universidade espanhola Jaume I, na Espanha — Foto: Divulgação
Amanda no laboratório da Universidade espanhola Jaume I, na Espanha — Foto: Divulgação

O interesse por química surgiu durante o terceiro ano do ensino médio. “Eu tinha uma professora que era muito gente boa, ela explicava a química com muita paixão”, lembra Amanda. “Então, foi quando decidi ingressar nessa área, porque quando a gente para, pensa e observa as coisas, vemos que realmente tem química em tudo.”

Já a vontade de trabalhar com pesquisa veio na graduação. Em seu primeiro ano na universidade, Amanda começou a fazer iniciação científica, após entrar em contato com um professor que trabalhava com simulação computacional envolvendo conceitos de matemática e química. Mesmo tendo sido aprovada para trabalhar como policial militar temporária — oportunidade atrativa financeiramente —, ela seguiu em sua meta de ser cientista.

“Quando o sentimento de investigação brota, queremos ir descobrindo tudo. No meu segundo ou terceiro ano, deixei a pesquisa só teórica e fui para o laboratório. Então juntei a teoria e o experimento”, recorda. “Vi uma vertente da química de ir para bancada sintetizar um material e, por outro lado, já tinha conhecimento de ver estruturas moleculares, a nível atômico, no computador.”

É do Brasil!

Durante a graduação, Gouveia conseguiu duas bolsas de iniciação científica: uma do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); e outra da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Amanda Gouveia segurando amostras — Foto: Divulgação
Amanda Gouveia segurando amostras — Foto: Divulgação

Em 2014, já no doutorado, ela obteve bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), pelo Programa de Doutorado-sanduíche no Exterior. Com isso, foi para a Espanha. Quatro anos depois, já de volta ao Brasil, conquistou o título de doutora, mas seguiu conduzindo pesquisas pelo país.

Com uma bolsa de pós-doutorado júnior do CNPq, Amanda atuou na Universidade Estadual do Piauí durante um ano. Depois, passou dez meses na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no interior paulista, com outra bolsa de pós-doutorado, essa pela Fapesp. “As agências de fomento do Brasil e as universidades, bem como os professores, me ajudaram na minha formação e na minha trajetória até onde estou no momento. Foram cinco anos de graduação, mais dois de mestrado e mais cinco de doutorado”, pontua Gouveia.

Em 2020, Gouveia conseguiu um contrato de trabalho como pesquisadora de pós-doutorado, com duração de dois anos, na universidade espanhola Jaume I. Neste ano, até setembro, ela segue na Espanha. Mas, em breve, partirá rumo a terras francesas. “Esse projeto [com a bolsa MSCA] tem impacto econômico, social e científico. Além de grande potencial para trazer benefícios à universidade e à comunidade”, afirma.

Mais recente Próxima Cientistas criam camundongos com cérebros híbridos de rato; entenda
Mais de Galileu

Obra de argila representa a silhueta feminina; acredita-se que tenha sido usada como oferenda em rituais religiosos do início da Idade do Ferro

Estátua de 3.000 anos com digitais de artista é descoberta em lago vulcânico

Nascido em dezembro de 1930, Senor Abravanel, que usava o pseudônimo Silvio Santos, criou o SBT e vários momentos históricos da TV brasileira. Obras trazem trajetória dele, bem como as empreitadas nos negócios e na política

Silvio Santos: 5 livros para conhecer a trajetória do empresário e apresentador

O registro das fêmeas da espécie tubarão-de-port-jackson surpreendeu os pesquisadores, já que esses animais possuem hábitos mais individualistas

Robô flagra "festa do pijama" de tubarões-fêmea na Austrália; assista

Escavação próxima a uma piscina revelou uma das maiores relíquias de moedas medievais das últimas décadas

Homem encontra 1.500 moedas de prata medievais durante obra na Alemanha

Integrantes anônimos, que se apresentam em mantos de sacerdotes, e letras escritas em eslavo eclesiástico. Veja a experiência de um concerto de metal extremo polonês na coluna de Oscar Nestarez

A atmosfera do horror em um show de metal extremo

Novo estudo conduziu experimentos comportamentais e de imagem com 353 pacientes, em diferentes centros de saúde intensiva do mundo, durante oito anos

1 em cada 5 pacientes em coma pode ter noção sobre o que acontece ao seu redor

Objeto espacial, que desafia a gravidade da Via Láctea, foi o mais veloz já observado com sua massa. Pesquisadores agora buscam entender como ele foi formado

1,6 milhão de km/h: amadores flagram objeto mais rápido da Via Láctea

Prêmio Fotógrafo Oceanográfico do Ano 2024 selecionou como finalistas registros devastadores da poluição plástica em espécies marinhas. Veja mais sobre as fotos

Foto de urso-polar brincando com plástico na boca é finalista de prêmio

Estudo sugere que fazer pausas forçadas durante conflitos cotidianos com o parceiro pode evitar que um desentendimento "escale", se tornando algo maior ou perdurando por mais tempo

Está brigando com seu parceiro? Fazer pausa de 5 segundos pode esfriar os ânimos

Uma nova tradução do histórico Anel Forsa, um dos mais antigos documentos vikings, sugere que o sistema de pagamento de multas era mais flexível do que se pensava

Como os vikings calculavam suas multas? Estas runas antigas dão novas pistas