Zoés
Zo'é | |||
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Membros da etnia Zo'é | |||
População total | |||
315 (2019)[1] | |||
Regiões com população significativa | |||
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Línguas | |||
Língua zoé | |||
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Xamanismo |
Os zo'é (zoés),[3] ou poturu,[1][4] são um grupo indígena que habita a Terra Indígena Zoé[1][5][6] (ou Área Indígena Cuminapanema/Urukuriana[7][8]), na bacia do Cuminapanema[8] (entre os rios Erepecuru, Cuminapanema e, Curuá[1]), nos municípios brasileiros de Óbidos[5][9] e Oriximiná,[1] no noroeste do estado brasileiro do Pará (Brasil). A sua população em 2010 era de 256 indivíduos,[10] tendo crescido para aproximada 330 pessoas (IEPE 2022).[11]
O seu povo é do tipo tupi–guarani[1][8][12][13] e fala a língua zo'é.[14] Com exceção de alguns jovens que aprenderam palavras em português ouvindo funcionários da Fundação Nacional do Índio falar no rádio, sua população é essencialmente monolíngue.[10] São conhecidos pelo uso do poturu (também chamado eberpot[3] ou 'mber'pót),[15] um cilindro que é enfiado numa perfuração do lábio inferior.
Esta etnia foi considerada um dos últimos povos "intactos" na Amazônia.[8] E é um dos grandes desafios da política indigenista da Fundação Nacional do Índio, pois tiveram recente-contato com a sociedade da redondeza na década de 1980, e foi preciso este órgão governamental intervir devido uma epidemia de gripe levada por missionários que matou um quarto dos indígenas.[16] Assim a Frente de Proteção Etnoambiental do Cuminapanema da Funai realiza a mediação com os zo’é através de reuniões regulares e intercâmbios com os vizinhos, para esclarecer os problemas da gestão territorial e invasão de extrativistas e missionários.[16]
Modo de vida
[editar | editar código-fonte]Os Zo'és são nômades caçadores-coletores que, durante certos períodos do ano, param para cultivar mandioca, banana, pimentão e, algodão.[15] Nesses períodos, habitam uma ou duas cabanas ao redor da plantação. Quando a colheita acaba, se mudam para outra localidade para iniciar novamente o plantio. Os Zo'és são especialistas em caça. Possuem um tipo de flecha para cada animal, que inclui anta, macaco, urubu-rei, até pequenos peixes que eles pescam com pequenas flechas e veneno (timbó[17]).[15] Os Zo'és possuem animais de estimação, que inclui espécies da qual eles alimentam-se (como a "queixada"): porém não alimentam-se dos domesticados.[15] Os zoés levam os animais de estimação para onde forem. A castanha-do-pará também tem uma grande importância na alimentação dos zoés.[15]
Os Zo'és possuem, como principal tradição, o poturu: um botoque feito com o osso da perna de macaco que tanto homens como mulheres usam no lábio inferior. O uso do poturu inicia-se com um palito quando crianças e vai aumentando conforme a idade. A perfuração do lábio inferior das crianças é um importante rito zoé. Outros ritos zoés são celebrados no nascimento, na morte, na primeira menstruação das meninas e na primeira anta caçada pelos meninos. Nesses ritos ingere-se o "seh'py'", uma bebida fermentada de tubérculos.[15] As mulheres Zo'és usam um chapéu feito de plumas brancas de aves na parte frontal da cabeça, e o cabelo amarrado atrás. Já os homens ocasionalmente usam um cocar de palha. Os homens usam um corte de cabelo que arrendonda completamente a testa independente de o cabelo ser longo ou comprido. Os Zo'és se pintam de completamente de vermelho com alguns desenhos pretos, exceto o rosto, em ocasiões especiais.
Habitação
[editar | editar código-fonte]As habitações Zo'és variam de tamanho e construção conforme o local. Normalmente, em volta das plantações, eles habitam construções de madeira apenas com um teto de palha e algumas redes. Porém, na floresta, constroem construções arrendondadas de folhas de palmeira, sempre com fogueiras no meio.
Casamento e família
[editar | editar código-fonte]Os rituais de casamento dos Zo'és nunca foram completamente compreendidos. Os Zo'és praticam, ao mesmo tempo, as duas formas de poligamia: poliandria e poliginia. Isto é, uma mulher pode ter vários maridos e um homem várias esposas. Os jovens normalmente se tornam esposos ou esposas de membros mais velhos para aprenderem como cuidar de uma família. Os Zo'és, quando são jovens, aprendem o necessário para cuidar de uma família. Quando ficam velhos, estes são cuidados com muita atenção pelas próprias famílias. Os Zo'és normalmente vivem em famílias pequenas e muito próximas e cuidam com atenção de cada membro.
Tradições e mitologia
[editar | editar código-fonte]Os Zo'és realizam uma espécie de festival todo ano, onde os membros da etnia se encontram, dançam e cantam. Na principal dança, os homens cantam batendo um taco de madeira no chão. Os Zo'és normalmente cantam e conversam em volta de fogueiras. As mulheres normalmente cozinham e ajudam os homens a prepararem as flechas. Puas e esmaga crânios com sua grande garra. Segundo a mitologia zoé, um antepassado chamado Sihié'abyr mostrou-lhes como usar o ornamento labial característico da etnia.[15]
História
[editar | editar código-fonte]A Fundação Nacional do Índio tomou conhecimento da existência dos zoés no início da década de 1970, durante as obras de construção da rodovia BR-210 (Perimetral Norte). Em 1982, missionários norte-americanos, da Missão Novas Tribos do Brasil,[8][15] efetuaram um breve e tenso contato com o até então o povo isolado zoés na bacia do Cuminapanema no estado do Pará,[8] que se limitou à entrega de alguns presentes. Os missionários tentaram novos contatos ao longo dos anos seguintes, mas encontros tensos entre zoés e missionários motivaram a Fundação Nacional do Índio (que fizeram contato com os zo'e em 1989[8]) a pedir em outubro de 1991 a saída dos missionários da região, passando a fundação a exercer um trabalho assistencial junto aos zoés. Durante o período de contato com os missionários, os zoés sofreram grandes epidemias de doenças contra as quais tinham pouca imunidade, o que reduziu drasticamente o tamanho da população zoé.[15][16] Atualmente, existe a preocupação das autoridades governamentais em proteger os zoés do contato com os não zoés, de modo a protegê-los de novas epidemias.[18]
Atualmente estão protegidos por Frente de proteção etnoambiental e estão mantendo a cultura e as tradições. A dificuldade agora é, como preparar estes indígenas para o próximo contato inevitável com a realidade fora das aldeias.[16] A Funai tenta proteger ao máximo a etnia zo'é, mas os próprios indígenas são ansiosos pelo contato com a sociedade fora da TI, além da pressão de missionários querendo evangeliza-los.[16] Mas a Funai analisa que a mediação deste contato deve levar uns dez anos, buscando fortalecer a cultura dos zo'é e mostrando a realidade de outras etnias após fazerem contato; muitas foram dizimadas ou abandonaram suas tradições.[16]
A Funai descobriu que a etnia wai-wai moradores próximos dos zo'é, que já tiveram contato com estes missionários, estão tentando a aproximação com os vizinhos e, o órgão não pode proibir o contato entre indígenas, mesmo que ocorra a interferência cultural.[19]
As Terras Indígenas dessas etnias na Amazônia Legal são constantemente invadidas ilegalmente por missionários e[20] pela ação de madeireiros.[21][20] Devido isto, em 2014 a Funai criou o Sistema de Proteção e Promoção de Direitos com doze Frentes de Proteção Etnoambiental,[21][22] para fazer a vigilância ostensiva e em tempo integral das áreas.[23][22] São sete as etnias indígenas recém-contactados no Brasil pela Funai, que estão sobre proteção deste sistema: korubo, zo'é, kunt'su, tupi-kawahiv, kanoe, uruwahá e, awa-guajá.[21]
A Funai através da Coordenação Geral de Índios Isolados e Recém Contatados (CGIIRC) verificou que alguns grupos indígenas recém-contactados estavam em situação de fragilidade, assim ofereceu assistência diferenciada a estes: zo’é no Pará; aos kanoê e aos akuntsu em Rondônia, e; aos korubo do Javari no Amazonas.[8]
Referências
- ↑ a b c d e f «Zo'é - Povos Indígenas no Brasil». pib.socioambiental.org. Consultado em 21 de junho de 2022
- ↑ Povos Indígenas no Brasil: 2006-2010 2011, p. 9-16.
- ↑ a b «O jardim das zoés». revistaplaneta.com.br. 22 de abril de 2014. Consultado em 19 de novembro de 2024
- ↑ Coletânea de Documentos da Terra Índigena Zo’é, Processo FUNAI/BSB/0217/99 (PDF). [S.l.]: Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal (PPTAL/FUNAI), Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI). 29 de novembro de 1999
- ↑ a b «Terra Indígena Zo´é». terrasindigenas.org.br. Consultado em 19 de novembro de 2024
- ↑ Vaz, Antenor (2011). Isolados no Brasil: política de estado: da tutela para a política de direitos - uma questão resolvida? (PDF). Col: Informe IWGIA 10. Copenhagen: Instituto de Promoção Estudos Sociais, Editora (International Work Group for Indigenous Affairs, IWGIA). ISBN 978-87-91563-94-2. OCLC 1090089165. Resumo divulgativo
- ↑ Paulo, Comissão Pró-Índio de São. «Zo'é». Comissão Pró-Índio de São Paulo. Consultado em 21 de novembro de 2024
- ↑ a b c d e f g h «Quem são? - Povos Indígenas no Brasil». socioambiental.org. Consultado em 19 de novembro de 2024
- ↑ Cadastro Único para Programas Sociais: Qual é a realidade dos povos indígenas no Brasil? (PDF). [S.l.]: Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome do Brasil
- ↑ a b Instituto Socioambiental. «Zo'é». Povos Indígenas do Brasil. Consultado em 31 de março de 2014
- ↑ «Terra Indígena Zo´é». terrasindigenas.org.br. Consultado em 19 de novembro de 2024
- ↑ «Isolated Indians: the case of the Zo'é». Indigenous Peoples in Brazil (em inglês). Instituto Socioambiental. Consultado em 18 de outubro de 2007. Arquivado do original em 15 de outubro de 2007
- ↑ «Jipohan is someone like yourself». socioambiental.org (em inglês). Consultado em 18 de outubro de 2007. Cópia arquivada em 5 de julho de 2007
- ↑ «Zo'é». Ethnologue. Consultado em 4 de abril de 2012
- ↑ a b c d e f g h i «Zo'é, emergindo lentamente do isolamento». Organização Survival International. Consultado em 21 de novembro de 2024
- ↑ a b c d e f «Isolados, índios da etnia zoé são desafio para a Funai». terrasindigenas.org.br. Consultado em 21 de novembro de 2024
- ↑ FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário da língua portuguesa. 2ª edição. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. 1986. p. 1 676.
- ↑ «Zo'é - Povos Indígenas no Brasil». pib.socioambiental.org. Consultado em 21 de novembro de 2024
- ↑ «Isolados, índios da etnia zoé são desafio para a Funai». terrasindigenas.org.br. Consultado em 21 de novembro de 2024
- ↑ a b Ricardo, Fany; Fávero Gongora, Majoí, eds. (2019). Cercos e resistências: povos indígenas isolados na Amazônia brasileira (PDF). C3L00002 1a edição ed. São Paulo: Instituto Socioambiental. ISBN 978-85-8226-073-9. OCLC 1124955605. Resumo divulgativo
- ↑ a b c «Terra Indígena Hi-Merimã». Instituto Terras Indigenas do Brasil. Consultado em 14 de novembro de 2024
- ↑ a b «MPF investiga entrada ilegal de missionários em terras indígenas do Amazonas | Terras Indígenas no Brasil». terrasindigenas.org.br. Consultado em 30 de outubro de 2024
- ↑ «Missionário dos EUA é interrogado pela Funai após entrar ilegalmente em terra de índios isolados | Terras Indígenas no Brasil». terrasindigenas.org.br. Consultado em 30 de outubro de 2024
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- Beto Ricardo; Fany Ricardo, ed. (2011). Povos Indígenas no Brasil: 2006-2010. São Paulo: Instituto Socioambiental. 763 páginas. ISBN 9788585994853. Consultado em 31 de março de 2014
Ligações externas
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