A Queda Do Ceu

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Palavras de um xamã yanomami

DAVI KOPENAWA E BRUCE ALBERT

Gleice Matos Bueno

FCSH | UNL
MESTRADO EM ANTROPOLOGIA:
CULTURAS VISUAIS | TEMAS CONTEMPORÂNEOS

➔ Teorias Antropológicas (2022/23)


Os Yanomami tem um vasto
conjunto linguístico e cultural
composto de, pelo menos, quatro
subgrupos adjacentes que falam
línguas da mesma família (Yanomae,
Yanõmami, Sanima e Ninam)

Os Yanomami são uma sociedade de caçadores-


coletores e agricultores.
Sua população é estimada em 33 mil pessoas, dividida
em 640 comunidades, em um território de 192.000
km², situados em ambos os lados da fronteira Brasil-
Venezuela.
No Brasil, o povo Yanomami é formado por cerca de 15
mil indivíduos, distribuídos em 245 aldeias.
"São um dos maiores grupos ameríndios da Amazônia que conservam em larga medida
seu modo de vida tradicional". O contato com a sociedade nacional é, na maior parte do
território Yanomami, relativamente recente.
"Primeiro foi Davi, o nome que os brancos me atribuíram na infância, depois
Kopenawa, o que me deram mais tarde os espíritos vespa. E, por fim,
acrescentei Yanomami, que é palavra sólida que não pode desaparecer, pois é
o nome do meu povo".

● Nasceu por volta de 1956, em Marakana, grande casa comunal de 200


pessoas, na floresta tropical de piemonte do alto rio Toototobi.
● Quando criança, Davi Kopenawa viu seu grupo de origem ser dizimado
por duas epidemias sucessivas de doenças infecciosas propagadas
por agentes do governo brasileiro e membros da organização norte-
americana New Tribes Mission.
● Adolescente e orfão, revoltado pelos sucessivos lutos, devido às doenças
dos brancos, mas intrigado com o poder material desses, Davi deixou sua
região para trabalhar na Funai, na abertura da Perimentral Norte.
● Ao trabalhar como intérprete da Funai, durante a abertura da Perimetral
Norte, percorreu quase toda a terra yanomami tomando consciência de
sua extensão e de sua unidade cultural, para além das diferenças locais.
● Na convivência com os brancos, ganhou conhecimento sobre a obsessão
predatória dos que ele chama "povo da mercadoria" e da ameaça que
ela representa para a permanência da floresta e a sobrevivência de
seu povo.
● É hoje uma liderança yanomami muito influente e um xamã respeitado.
"Na melhor das hipóteses, o etnógrafo que acredita estar 'colhendo dados' está
sendo reeducado por aqueles que aceitaram sua presença, para servir de
intérprete a serviço de sua causa".

● Bruce Albert, nasceu no Marrocos, em 1952.


● Formou-se em sociologia e tornou-se
doutor em antropologia pela Université
de Paris x-Nanterre.
● Iniciou os trabalhos com os Yanomami
do Brasil em 1975, recém-formado, aos
23 anos.
● Participou, em 1978, da fundação da
ONG Comissão Pró-Yanomami, que
tornou possível a homologação da Terra
Indígena Yanomami, em 1992
● Aprendeu uma das línguas Yanomami
(a falada na região onde nasceu Davi
Kopenawa) e participou ativamente de
programas de saúde, educação e
proteção ambiental da Terra Indígena
Yanomami, para onde viaja, anualmente,
há 40 anos.
Do (des)encontro à co.labor.ação
● Bruce Albert e Davi Kopenawa encontram-se, pela primeira
vez em 1978.
● Em 1981, encontraram-se novamente, quando Bruce Albert
passava um tempo na região natal de Kopenawa
(proximidades do rio Toototobi)
● Em 1985, a relação de amizade entre os dois se dá como
resultado do engajamento compartilhado contra a corrida do
ouro, que devastava as terras yanomami.
● O projeto nasce, a pedido do yanomami, para que o
antropólogo divulgasse as suas palavras para além da floresta.
● As gravações que serviram de base para o manuscrito
começaram em 1989 e prosseguiram até o início da década
dos 2000.
● As narrativas e conversas gravadas foram, posteriormente,
transcritas e traduzidas do Yanomami para o Francês.
● Em 2010 o livro, com mais de 700 páginas, é publicado em "Os brancos não sabem sonhar,
francês pela Editora Terre Humanie é por isso que destroem
A edição brasileira data de 2015. a floresta desse jeito"
"Devir Outro"

"A meu ver, só poderemos nos tornar brancos


no dia em que eles mesmos se transformarem em Yanomami”
Yanomami - Cláudia Andujar

palavras dadas | 1
"Por isso quero mandar minha palavras para longe. Elas vem dos espíritos que me acompanham, não são imitações de peles de
imagem que olhei. Estão bem no fundo de mim. Faz muito tempo que Omama e nossos ancestrais as depositaram em nosso
pensamento e desde então nós as temos guardado. Elas não podem acabar. Se as escutarem com atenção, talvez os brancos parem de
achar que somos estúpidos. Talvez compreendam que é seu próprio pensamento que é confuso e obscuro, pois na cidade onde vivem
ouvem apenas o ruído de seus aviões, carros, rádios, televisores e máquinas. Por isso suas ideias costumam ser obstruídas e enfumaçadas. Eles
domem sem sonhos, como machados largados nos chão de uma casa. Enquanto isso, no silêncio da floresta, nós xamãs, bebemos o pó
das árvores yãkoana hi, que é o alimento dos Xapiri. Estes então levam nossa imagem para o tempo do sonho. Por isso somos capazes de
ouvir seus cantos e contemplar suas danças enquanto dormimos. Essa é a nossa escola, onde aprendemos as coisas de verdade”. p. 77
Criança yanomami - Cláudia Andujar Jovem yanomami sob efeito da yãkoana - Cláudia Andujar

Cure d´un nouveau né - C. René-Bazin, 2002

palavras dadas | 2
"Quando seus olhares acompanharem o traçado das minhas palavras saberão que ainda estamos vivos, pois a imagem de Omama nos
protege. Então poderão pensar: “Eis aí belas palavras! Os Yanomami continuam vivendo na floresta como seu antepassados. Residem
em grandes malocas, onde dormem em suas redes, perto de suas fogueiras. Comem banana e mandioca de suas roças. Flecham os
animais da floresta e pescam peixes em seus rios. Preferem sua comida aos alimentos mofados dos brancos, fechados em caixas de ferro
ou estojos de plástico. Convidam uns aos outros, de casas diferentes, para dançar durante suas grandes festas reahu. Fazem descer seus
espíritos Xapuri. Falam sua própria língua. Seus cabelos e olhos continuam semelhantes aos de Omama. Não viraram brancos.
Continuam vivendo nas mesmas terras que, do alto de nossos aviões, parecem vazias e silenciosas. Nossos pais já causaram a morte de
muitos de seus maiores. Não devemos continuar no mal caminho". P. 78
"Quando eu é um outro (e vice-versa)"

"Toda carreira etnográfica principia em


'confissões' expressas ou caladas”
C. Lévi-Strauss in p. 512

● Ego-história (origem da vocação e


os primeiros passos de seu percurso
como etnógrafo para destacar o
contexto em que foi registrado o
depoimento de Davi Kopenawa)
● Batismo de campo (primeira
experiência junto aos povos
indígenas da Amazônia)
● Pacto etnográfico (pacto tácito
entre pesquisador e seus
interlocutores)
● Aventuras de manuscrito
(bastidores e fabricação do texto)
Yanomami - Cláudia Andujar
palavras dadas 3 | O pacto etnográfico
"O pacto tácito (...) assume uma forma complexa, de ambos os lados da relação etnográfica (...) Para seus interlocutores, trata-se
de engajar-se num processo de auto-objetificação pelo prisma da observação etnográfica, mas de um modo que lhes permita adquirir
ao mesmo tempo reconhecimento e cidadania no mundo opaco e virulento que se esforça por sujeitá-los.
Para o etnógrafo, em compensação, trata-se de assumir com lealdade um papel político e simbólico (...) à altura da dívida de
conhecimento que contraiu, mas sem por isso abrir mão da singularidade de sua própria curiosidade intelectual".
p. 522
Questões para discussão

➔ Será que a vastidão do conhecimento produzido pelas sociedades ocidentais capitalistas, desenhada e
fixada em nossas "peles de papel", terá nos tornado humanos melhores do que aquela pré-humanidade,
incapaz de controlar seus instintos e desejos, do mito narrado por Davi Kopenawa? Ou seja, seremos
capazes de mudar nosso devir para evitar que o nosso modo de vida e a sua imposição global - que arruina
outras humanidades que se colocam no caminho do progresso civilizatório - faça "o céu cair" sobre todos?
Ou serão sempre belas e vãs palavras empenhadas em nos convencer de nossa humanidade em oposição
ao "outro''? Quais humanidades cabem no conceito unificador iluminista de humanidade?

➔ O que torna uma etnografia mais fiel ao seu objetivo enquanto método antropológico: o distanciamento
científico positivista entre o pesquisador e os sujeitos objetificados de estudo ou o completo envolvimento
entre esses atores, até o ponto em que o próprio antropólogo possa tornar-se (o) outro, a fim de
compreendê-lo em sua alteridade, e verdadeiramente restituir-lhe o ponto de vista para, enfim, dar a
conhecer seu universo? Existe mesmo uma antropologia que não seja engajada? A que(m) ela serve?
https://youtu.be/PQ9x7T7CCn8

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