A Economia de Moçambique Colonial I

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A Economia de Moçambique

Colonial:
Elementos principais da estrutura económica formada
pelo capitalismo Colonial em Moçambique
Resumo
O modelo de desenvolvimento adoptado pelo colono português era basicamente
capitalista e portanto, caracterizado por todos aspectos inerentes a este sistema,
incluindo: controlo e exploração da classe trabalhadora, maximização do lucro,
acumulação de capital e um estado que servia os interesses da classe capitalista.
A estrutura da economia assentava sobre uma sociedade com uma forte
estratificação social e racial, onde os negros ocupavam as camadas mais baixas,
com direitos reduzidos ao mínimos necessário para sustentar o sistema (Mondlane,
1995 apud José, 2005), através de, por exemplo, controlo, exploração e
diferenciação do campesinato.
Segundo Saad Filho (1998) os modos de exploração do campesinato no período
pré-independência em Moçambique, incluiam:
• O pagamento de impostos, por exemplo, o imposto de cabana ou impostos sobre
os rendimentos obtidos de trabalhadores migrantes no exterior;
• Imposição de preços baixo dos produtos nacionais (ex. algodão, o que de certo
modo impulsionou o crescimento da indústria moçambicana e a rentabilidade da
indústria têxtil portuguesa);
• A produção de alimentos baratos (o que ajudava a manter baixos salários);
• Uso de tecnologias ultrapassadas na maior parte das empresas;
• Fornecimento de mão-de-obra barata para empresas capitalistas, ou seja, os
principais sectores do sistema colonial de produção baseavam-se na
disponibilidade de mão-de-obra barata através da aplicação generalizada do
trabalho e cultivo forçado (Wuyts, 1980)
Apesar de as políticas repressivas do Estado colonial terem impedido, em grande
parte, a formação de um campesinato africano rico no país, alguns camponeses
conseguiram melhorar suas condições de vida, investir na terra e melhorar seu
status, passando a pertencer a classe média e rica do país (Saad Filho, 1998). São
eles:
• As autoridades tradicionais; os trabalhadores emigrantes; e os prisioneiros.
Entretanto, esta situação foi a excepção e não a regra. Nos meados da década de 1970, a
maioria dos camponeses eram incapazes de reproduzir-se através do trabalho em sua
própria terra.
A tendência foi a proletarização gradual dos camponeses. A maioria dos trabalhadores
assalariados em Moçambique regularmente recorreram a trabalhos como migrantes nas
minas de África do Sul ou da Rodésia.
Outros aspectos característicos da economia colonial incluem:
• Uma economia incipiente e essencialmente virada para o sector primário;

• A dependência externa e o subdesenvolvimento do sector industrial. Moçambique era


dependente tanto em importações e exportações e no fornecimento da mão-de-obra;
• Por exemplo, em 1969, do total volume das exportações e importações
moçambicanas, cerca de 41% e 31%, respectivamente resultava das relações
comerciais com Portugal e Africa do Sul (Mosca, 1999:40 apud José, 2005).
• O desenvolvimento industrial era incipiente, descapitalizado, com maquinaria
obsoleta, no geral importada em segunda mão da Europa (Castel-Branco, 1994);
• A Indústria concentrava-se na transformação primária de produtos para a exportação
(por ex. descaroçamento do algodão) (Hanlon, 1984:74 apud José, 2005) e para o
consumo interno maioritariamente pela comunidade colona portuguesa;
• A indústria era débil e por isso tinha pouco impacto para a economia. Em 1973
contribuía contribuía em 17% para formação do PIB (Castel-Branco, 1994)
Wuyts (1980) faz a periodização das principais fases de acumulação de capital no
Moçambique colonial e explica detalhadamente.
• Primeira fase – 1890-1926: A Dominação de Capital Estrangeiro Não-Português
• Segunda fase – 1926-1960: Fase do Nacionalismo Português
• Terceira fase – 1960-1973: Crise e Reestruturação do Capital
1890-1926: A Dominação de Capital Estrangeiro Não-Português
• A incapacidade financeira do estado português fez com que este assumisse uma
posição que se assemelha a de um “arrendatário” do que à de um “empresário
capitalista”.
As características dominantes deste período foram: a drenagem para o exterior de mão-
de-obra moçambicana e a dominação do capital estrangeiro não-português. O que
levou a:
• Transformação da Região Sul de Moçambique numa reserva de mão-de-obra. O capital
mineiro sul-africano conseguiu, através de acordos inter-estatais, o monopólio do
recrutamento directo do trabalho migratório;
• Formação de uma economia de plantações nas Regiões Centro e Norte com capital
estrangeiro não-português, concretamente no vale do Zambeze, que incluía actividades
agro-industriais de monocultura viradas para a produção de culturas de exportação
como o açúcar, o sisal e a copra.
• Nestas regiões foi o capital estrangeiro não-português, como as companhias
majestáticas, que organizava a venda de trabalho forçado para diversas colónias tais
como Rodésia, Malawi (então, Niassalândia), Tanganhica, Congo Belga e também a
África do Sul.
• O sector de plantações conseguiu o monopólio no acesso às reservas de mão-de-
obra através de meios políticos;

• Em 1901, por exemplo, o recrutamento de mão-de-obra para as minas sul-


africanas foi restringido ao sul do paralelo 22, cláusula que foi confirmada no
acordo de 1914;

Em suma, a fonte importante dos rendimentos de governo colonial, neste fase,


provinha de impostos sobre a migração e das concessão de terras a outros capitais
estrangeiros.
1926-1960: Fase do Nacionalismo Português
Com o governo fascista de Salazar a burguesia portuguesa consolidou as suas posições e
tentou colocar as colónias ao serviço das suas próprias necessidades de acumulação.
• Esta fase consistiu no desenvolvimento de um processo de acumulação de capital
através da racionalização e institucionalização do sistema de trabalho forçado quer
através da venda forçada de força de trabalho, quer através do cultivo forçado de
culturas de rendimento;
• O princípio do trabalho forçado estava já implícito no Acto Colonial de 1930. A sua
concretização iniciou-se no mesmo ano com a imposição do cultivo forçado do
algodão
• Portugal prosseguiu a prática do trabalho forçado através de formas abertas ou
camufladas até virtualmente ao fim da sua dominação colonial.
• Com o desenvolvimento dos aparelhos repressivos e administrativos do Estado, a
prática do trabalho forçado tornou-se cada vez mais rigorosamente imposta, como por
exemplo através da circular governamental de 5 de Maio de 1947, que obrigava os
indígenas a trabalhar seis meses por ano para o Governo, para uma companhia ou para
um particular.
Para Salazar, os territórios ultramarinos também representavam:
• Uma solução lógica para os problemas de sobrepopulação de Portugal através da
instalação dos cidadãos portugueses nas colónias; e
• Um meio para que as colónias produzissem matérias-primas (a preços baixos)
para vender à Portugal em troca de produtos manufacturados para o
desenvolvimento da indústria têxtil em Portugal que necessitava de um crescente
fornecimento de algodão barato a fim de se poder situar em posição competitiva a
nível mundial.
Entretanto, de acordo com Wuyts (1998) a canalização do fluxo da emigração para
as colónias especialmente a partir dos fins dos anos 1940 e princípios de 1950
tinha, dentre outros, como propósito:
• Camuflar o colonialismo através de uma política de incorporação das colónias
como províncias ultramarinas de Portugal (como resultado das crescentes pressões
internacionais a favor da descolonização, após a II GM).
A emigração era promovida através de subsídio de passagem e esquemas de
colonatos que deram origem a uma pequena burguesia (ex. o colonato do Limpopo)
graças a enormes financiamento de investimentos em infra-estruturas na irrigação,
Portanto a partir e 1950 registou-se uma entrada massiva de cidadãos portugueses
em Moçambique. Isso teve como implicações:
• Expansão rápida da produção agrícola dos colonos (principalmente na região Sul
– vales do Limpopo e Incomáti) orientada em especial para a produção de
produtos alimentícios para as cidades em crescimento;
• Expansão relativamente rápida de determinadas indústrias (alimentar e de
bebidas) viradas para o mercado local e que baseavam-se principalmente em
matérias-primas locais.
Até 1975, 67% da produção da indústria transformadora provinha de três ramos da
indústria ligeira: alimentos, bebidas e tabacos (54%), texteis, vestuário e couro
(7%); madeira e mobiliário (6%) (UNIDO, 1993 apud Castel-Branco, 1994).
Entretanto:
• Portugal continuou a ser a principal fonte de importações de Moçambique até
princípios dos anos 1960;
• A colónia constituía um mercado para as indústrias transformadoras de Portugal;
• O desenvolvimento industrial na colónia manteve-se principalmente orientado
para a exportação, isto é, o processamento de matérias-primas para exportação.
Assim, o descaroçamento do algodão tornou-se o principal ramo industrial nos
anos 1950;
• As indústrias viradas para o mercado interno que surgiram nunca foram
directamente competitivas com os principais ramos de exportação de Portugal
(têxteis de algodão, sardinhas, vinhos, etc.).
No âmbito político, o governo de Salazar tomou as seguintes medidas:
• Centralizou todo o poder sobre as colónias nas mãos do Estado português e não
permitiu qualquer forma de governo autónomo por parte das classes dos colono;
• Aboliu os poderes político-administrativos que as companhias que operavam no
Norte e Centro possuíam nos respectivos territórios;
• A actividade do capital estrangeiro ficou restringida à economia de plantações que
continuou a ser o aspecto dominante da região central.
• Companhias como a do Niassa, cuja única actividade consistia na venda de mão-
de-obra contratada graças ao seu controlo político-administrativo da área
respectiva, desapareceram no decurso deste processo de reestruturação;

• No sul, o governo de Salazar fortificou a cooperação com capital mineiro sul-


africano, o que culminou com a assinatura, em 1928, de uma nova convenção que
prolongava a integração já estabelecida de Moçambique no subsistema da África
Austral através do elo trabalho migratório-serviços de transporte;

• A convenção de 1928 estabeleceu que o sistema de pagamento diferido se tornasse


obrigatório, assegurando assim a entrada em Moçambique, sob a forma de divisas
estrangeiras, de parte significativa da conta salarial dos mineiros.
1960-1973: Crise e Reestruturação do Capital
No período 1960-64, assistiu-se à crise da base económica do Salazarismo devido a:
• Pressão interna e externa (movimentos nacionalistas de libertação colonial);
• A vontade de Portugal ser membro da OIT que obrigou-o a comprometer-se
formalmente a abolir o trabalho forçado (a principal base do sistema de exploração
colonial)
A crise obrigou o capital colonial português a modernizar-se. A resposta do regime
foi de:
• Transformar o “indígena” em “cidadão”;
• Abolir legalmente o trabalho forçado e o cultivo forçado de culturas (ambas em
1961);
• A adopção da política de “portas abertas”, pois a reestruturação carecia de apoio
em capital estrangeiro não-português para o fornecimento da necessária tecnologia
e know-how para realizar os necessários investimentos;
• A adopção de tecnologias mais mecanizadas que permitissem uma maior produtividade
do trabalhador;

• Este processo desenrolou-se no interior dos antigos sectores de exportação através, por
exemplo, da mecanização da produção de açúcar nos anos 1960 e da viragem da
produção nos anos 1960 da viragem da produção camponesa de algodão para a produção
de algodão pelos colonos;

• O aparecimento de novos sectores na indústria através do rápido desenvolvimento de


indústrias de substituição de importações (que gozavam de proteção em termos de tarifas
e restrição de importações);

• Empreendimentos de prestígio, como o de Barragem de Cahora-Bassa, são outra


manifestação desta nova tendência.
Referências
Castel-Branco, C. N. (1994). “Problemas Estruturais do Desenvolvimento Agrário”. In:
Moçambique: Perspectivas Económicas. Maputo, Universidade Eduardo Mondlane.
________________________. “Problemas de Industrialização: A Indústria
Transformadora” In: Moçambique: Perspectivas Económicas. Maputo, Universidade
Eduardo Mondlane.

José, A. C. (2005). “O Neoliberalismo e a Crise de Trabalho em Moçambique: O Caso


da Indústria de Cajú”. Revista O Cabo dos Trabalhos, No 1, 2006.

Saad Filho, A. (1998). “Land of Lost Opportunities: Transition and Crisis in


Mozambican Agriculture”. África: Revista do Centro de Estudos Africanos. USP, S.
Paulo, 20-21: 43-69, 1997/1998.

Wuyts, M. (1980). “Economia Política do Colonialismo Português em Moçambique”.


Estudos Moçambicanos (1). pp 9-22

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