Ficha Informativa - Reflexoesdopoeta

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FICHA

INFORMATIVA
N. 4
o
Ficha informativa n.o 4

Reflexões do poeta

N’Os Lusíadas, mais de uma vez [e sobretudo em final de canto] […]


esquecemos os heróis e é no poeta que atentamos, [aconselhando-se] a si
próprio, lamentando-se, ou com desassombro fustigando os epígones 1 dos
heróis. […] Tudo isto nos permite, no poema, conviver, a espaços, não apenas
com o espírito altíssimo do poeta, senão também com a concreta realidade do
homem, do cristão e do português, nos seus momentos de confiança exaltante e
de profunda depressão melancólica, no orgulho do passado, na evocação de
cujas glórias encontrava o estímulo, não tanto para a evasão da austera, apagada
e vil tristeza do presente, como para a forte, oportuna, desassombrada lição com
que escarmenta2 os descendentes dos heróis.
 
Hernâni Cidade, Luís de Camões – O épico, 2.ª edição, Lisboa,
Editorial Presença, 1995, pp. 170 e 172 (texto adaptado)

1
Epígones: geração anterior.
2
Escarmenta: repreende, critica.
Ficha informativa n.o 4
Canto I – A fragilidade humana e outros temas intemporais
 
Os valores do Humanismo, a fé afirmada no homem e nas suas
extraordinárias capacidades, fazem desta epopeia, sem dúvida, um poema
renascentista. Porém, simultaneamente, manifesta-se um outro espírito –
duvidoso, inseguro, consciente da fragilidade humana: o espírito antiépico.
[…]
[De facto, Camões] vivia já numa outra época, em que os problemas da
extensão demasiada do Império se tornam irresolúveis e avultam os vícios e a
decadência. […]
A vida no Oriente «é um quadro de decadência deplorável, de
indisciplina e de corrupção: abusos de toda a ordem dos governadores, dos
capitães, dos vedores da fazenda; as armadas são preparadas com desleixo;
domina o desperdício na gestão dos dinheiros públicos; o suborno; […] os
criminosos […] ficam impunes; não se faz justiça porque os cargos são
vendidos […]. [(ver canto VIII, ests. 96 a 99.)]
 
Maria Vitalina Leal de Matos, «Os Lusíadas», in Vítor Aguiar e Silva (coord.),
op.cit., pp. 495-497 (texto adaptado)
Ficha informativa n.o 4
Canto V – As armas e as letras
 
Toda a epopeia camoniana pode ser lida como a defesa de um valor
que o poeta não se cansa de apontar: a conciliação das armas e das letras,
topos que vinha da mais recuada Antiguidade, mas que ganhava especial
atualidade, num momento em que a grande e a pequena aristocracia,
absorvida com o comércio resultante da expansão, e desejosa de
enriquecer rapidamente, manifestava desinteresse por se cultivar e por
apoiar as artes [...].
[…] Trata-se de um discurso de grande vigor oratório, que pretende
justamente envergonhar os destinatários, estabelecendo um paralelismo
antitético entre os portugueses e os outros povos, que prezam o
paradigma do herói letrado, personificado por César. […] Mas a cultura, o
amor das artes exigem tempo, comunidade e gerações.
 
Idem, ibidem, p. 494 (texto adaptado)
Ficha informativa n.o 4

Canto VII – Invocação e lamentação do poeta


 
[Além dos traços autobiográficos e do ideal de] conciliação [entre] as
armas e as letras […], «Nùa mão sempre a espada e noutra a pena» (Os
Lusíadas, VII. 79), em momentos de balanço, […] a cólera perante a
ingratidão d’«aqueles que eu cantando andava», a «pobreza avorrecida», as
«tamanhas misérias», os «trabalhos nunca usados» que lhe impuseram
enfraquecem de tal forma a inspiração que, para continuar, tem de pedir
novo favor às Musas. A paragem, e a avaliação que faz daqueles que são
objeto do canto, leva-o a estabelecer um critério de seleção dos
protagonistas: «[...] que eu tenho já jurado / Que não no empregue em
quem o não mereça» (Os Lusíadas, VII. 83). E, assim, a relação entre o canto
e a gente, que se estabelecera na primeira invocação (I. 5) inverte-se: não é
o valor da gente que determina o canto digno dele; é, pelo contrário, o
valor do canto que não deve admitir «quem o não mereça».
 
Idem, ibidem, p. 495 (texto adaptado)
Ficha informativa n.o 4

Canto VIII – O poder corruptor do dinheiro


 
Vasco da Gama fica retido, na Índia, pelo Catual e só é libertado
a troco de «fazenda» (produtos ou dinheiro). A propósito deste e
outros factos, Camões aproveita para fazer uma série de reflexões
sobre o poder do dinheiro, insistentemente animizado e criticado
através da anáfora repetitiva «este», que ocasiona mortes, adultérios,
traições, perjúrios, raptos, justiça corrupta, inimizades, tiranias, etc.
J. Oliveira Macêdo, Sob o signo do Império, Porto, Edições Asa, 2002, p. 187

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