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PGERJ-Processo-Coletivo

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PROCESSO COLETIVO

CONCEITO:

Nas palavras de Fredie Didier, “processo coletivo é aquele em que se postula um direito
coletivo lato sensu (situação jurídica coletiva ativa) ou se afirma a existência de uma
situação jurídica coletiva passiva (deveres individuais homogêneos, p. ex.)”. A partir
da definição apresentada pelo autor, é possível notar que o núcleo do conceito de
processo coletivo está em seu objeto litigioso, que pode corresponder a uma situação
jurídica coletiva ativa ou passiva.

LITISCONSÓRCIO MULTITUDINÁRIO X TUTELA COLETIVA

O doutrinador Didier ressalta que o exercício conjunto do direito de ação por um grupo de
indivíduos não caracteriza uma ação coletiva, mas pode gerar o litisconsórcio multitudinário.
Isto porque, para a definição do processo coletivo, não é relevante a estrutura subjetiva do
processo, e sim a matéria litigiosa nele discutida (objeto do processo).

De acordo com o referido doutrinador, as ações coletivas possuem dois fundamentos


que a justificam: (i) fundamento sociológico, relacionado à ampliação do acesso à
justiça, e (ii) fundamento político, materializado no princípio da economia processual.

a) Fundamento sociológico – acesso à justiça. As ações coletivas permitem a resolução


de demandas repetidas, principalmente de consumidores, relativas a bens e serviços de
massa.
b) Fundamento político – princípio da economia processual. Permitem a solução de
diversos conflitos por meio de um único processo.

COLETIVIZAÇÃO DO PROCESSO:

É apontada como uma das três ondas renovatórias do acesso à justiça, concebidas por
Mauro Cappelletti e Bryant Garth (na obra “Acesso à Justiça”, datada de 1950). Para
estes autores, para tornar o processo um instrumento de acesso à justiça, os
ordenamentos jurídicos devem observar três ondas renovatórias:

- 1ª onda renovatória: assistência jurídica gratuita aos hipossuficientes.

- 2ª onda renovatória: tutela dos direitos metaindividuais, de modo a abarcar três


situações até então não tuteladas pelo sistema, quais sejam: (i) bens ou direitos de
1
titularidade indeterminada, (ii) bens ou direitos individuais cuja tutela individual não é
economicamente aconselhável e (iii) bens ou direitos cuja tutela coletiva é
recomendável por uma questão de economia.

- 3ª onda renovatória: reforma interna do processo, que contemple a efetividade da


tutela jurisdicional, com menos ênfase à forma e mais ênfase nos resultados.

Sob essa perspectiva, é necessário que haja um tratamento coletivo para o processo,
pois somente dessa forma haverá verdadeiramente acesso à justiça. Mauro Cappelletti
e Bryant Garth perceberam a necessidade de serem tuteladas pelo processo três
situações até então sem proteção pelo sistema:

1ª) Bens ou direitos de titularidade indeterminada: como não havia uma titularidade
específica para bens como o meio ambiente e o patrimônio público, por exemplo, tais
bens frequentemente ficavam sem tutela. Assim, os autores propuseram a coletivização
do processo neste ponto. Criaram-se os legitimados coletivos (Ex: Defensoria Pública).

2ª) Bens ou direitos individuais cuja tutela individual não fosse economicamente
aconselhável: neste ponto, encontram-se os casos em que o direito veiculado é o
tradicional direito individual, mas cuja tutela individual não é exercida, por diversos
motivos, tais como: falta de consciência da população sobre a existência e do direito e
seu mecanismo de tutela (hipossuficiência cultural); falta de recursos para custear a
assistência jurídica (hipossuficiência econômica).

3ª) Bens ou direitos cuja tutela coletiva seja recomendável por uma questão de
economia: em tais casos, a tutela do direito não é economicamente viável, mas a tutela
coletiva se revela recomendável, em razão da molecularização dos conflitos.

Portanto, é neste contexto de instrumentalização do processo e ampliação do acesso


à justiça que a tutela coletiva assumiu uma posição de relevo no sistema processual.

EVOLUÇÃO DO PROCESSO COLETIVO NO BRASIL:

No Brasil, a Lei de Ação Popular já existe desde 1965 (Lei 4.717/65), mas a efetiva
consolidação do processo coletivo só ocorreu em 1985, com a Lei de Ação Civil Pública
(Lei 7.347/85), que resolveu o problema dos bens ou direitos de titularidade
indeterminada. A potencialização do processo coletivo ocorreu em 1990, com o
surgimento do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), que passou a tutelar os
bens e direitos cuja tutela individual é inviável, bem como os bens e direitos cuja tutela
coletiva é recomendável.

CLASSIFICAÇÕES:
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QUANTO AO SUJEITO:

O processo coletivo é dividido em ativo e passivo:

a) Processo coletivo ativo: é o processo coletivo por excelência, no qual a coletividade


é autora, por meio de um legitimado coletivo. Essas são as mais comuns.

b) Processo coletivo passivo: é aquele em que a coletividade é ré no processo.

OBSERVAÇÃO: no âmbito doutrinário, há duas posições divergentes sobre a existência


da ação coletiva passiva:

• Para uma primeira corrente, capitaneada por Candido Dinamarco, não existe
ação coletiva passiva, em virtude da ausencia de previsão legal. Essa corrente
defende que a legitimidade seria ativa apenas, ou seja, os legitimados atuariam
apenas no polo ativo na defesa de direitos coletivos e não no polo passivo
representando a coletividade numa ação coletiva, por força da dicção do art. 81,
caput e § único, do CDC. Como o dispositivo menciona “exercer defesa coletiva”,
isto seria atuar apenas no polo ativo da demanda, e não no polo passivo.

• Já para uma segunda corrente, adotada pela Ada Pellegrini Grinover e Fredie
Didier, existe ação coletiva passiva, a partir de uma interpretaçao sistemática, o
que dispensa a previsão legal expressa. Para essa corrente, os legitimados
coletivos podem figurar no polo passivo atuando na defesa do direito coletivo,
por conta do art. 5º, §2º, da Lei da ACP, o qual prevê que fica facultado ao Poder
Público e a outras associações legitimadas, nos termos do artigo, habilitar-se
como litisconsortes de qualquer das partes. Isto é: a lei prevê que o poder
público pode optar por ser litisconsorte de qualquer das partes. Qualquer das
partes inclui polo ativo e polo passivo. Sendo assim, a legitimidade é tanto para
o polo ativo como para o passivo.

Além disso, a segunda corrente traz ainda outro argumento, que está calcado no
art. 83 do CDC, o qual dispõe que para a defesa dos direitos e interesses
protegidos por este código são admissíveis todas as espécies de ações capazes
de propiciar sua adequada e efetiva tutela. Desse modo, se todas as espécies de
ação podem ser utilizadas, podem ser utilizadas tanto as ações em que os
legitimados estejam no polo ativo quanto as ações em que estejam no polo
passivo.

Exemplo de ação coletiva passiva: caso do dissídio coletivo de greve. Imaginem


que determinada categoria de servidores – da saúde por exemplo – resolvem
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parar tudo em uma greve. Esses servidores estatutários têm direito de greve,
aplicando-se por analogia as regras da lei de greve dos trabalhadores celetistas.
Contudo, no exemplo, esses servidores não estão cumprindo os deveres
previstos na lei e não estão oferecendo os serviços essenciais. Por isso, o Poder
Público propõe uma ação em face do sindicato, um dissídio coletivo de greve em
face do legitimado coletivo dessa categoria. Aqui, o sindicato atua na defesa do
interesse da categoria, como substituto processual, de modo que temos um
exemplo de ação coletiva passiva.

QUANTO AO OBJETO:

O processo coletivo é dividido em especial ou comum:

a) Processo coletivo especial: é o processo das ações de controle abstrato de


constitucionalidade. Exemplos: ADI, ADC, ADPF.

b) Processo coletivo comum: é composto por todas as ações para a tutela dos interesses
e direitos metaindividuais não relacionados ao controle abstrato de constitucionalidade.
Exemplos: Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Segurança Coletivo.

CLASSIFICAÇÃO DOS DIREITOS COLETIVOS LATO SENSU: (CAI MUITO EM PROVAS!)

O processo coletivo tem por objeto a tutela dos chamados direitos coletivos lato sensu,
gênero que comporta três espécies, indicadas no art. 81, parágrafo único, do CDC: (1)
direitos difusos; (2) direitos coletivos stricto sensu e (3) direitos individuais
homogêneos.

Art. 81 [...] Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os
transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código,
os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou
classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação
jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os
decorrentes de origem comum.

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Em conhecida sistematização doutrinária, fala-se em direitos/interesses
ESSENCIALMENTE ou NATURALMENTE coletivos e direitos/interesses
ACIDENTALMENTE coletivos.

A primeira categoria (direitos essencialmente ou naturalmente coletivos) abarca os


direitos difusos e coletivos em sentido estrito, caracterizados pela indivisibilidade do
objeto. Em outras palavras, tais interesses só podem ser considerados como um todo,
não sendo possível sua partilha entre os titulares.

O segundo grupo (direitos acidentalmente coletivos) é representado pelos direitos


individuais homogêneos, caracterizados pela divisibilidade do objeto. Nesses casos, a
lei confere um tratamento coletivo para a defesa de interesses que são individuais (uma
vez que cada um de seus titulares possui direito próprio a uma tutela jurídica una e
individual). É possível apontar quatro razões que justificam a tutela coletiva de
pretensões que são individuais: (i) molecularização dos conflitos; (ii) economia
processual; (iii) evitar decisões contraditórias; e (iv) aumento do acesso à justiça.

- DIREITOS DIFUSOS:

• Os seus titulares são INDETERMINADOS e INDETERMINÁVEIS (não há como


individualizar os titulares), e entre eles não há relação jurídica. O que liga os seus
titulares entre si são circunstâncias de fato extremamente mutáveis, que podem
surgir junto com a lesão ou após a lesão. Por essa razão, diz-se que sua duração
é efêmera. Ex.: Morar em uma mesma cidade, ter acesso à água de um mesmo
rio.
• São caracterizados por uma alta conflituosidade interna, na medida em que
entre os titulares deste direito existem as mais diversas opiniões e
posicionamentos, o que dificulta a mediação. Além disso, possuem elevado grau
de abstração.

- DIREITOS COLETIVOS STRICTO SENSU:

• Os seus titulares são INDETERMINADOS (tanto quanto os difusos), mas são


DETERMINÁVEIS por grupo/categoria. Há uma relação jurídica base que liga
os titulares entre si ou com a parte contrária.
• *Atenção: Essa relação jurídica é estabelecida em momento anterior à lesão.
• Há uma baixa conflituosidade interna, sendo eficiente a mediação dos
conflitos. Além disso, apresentam baixo grau de abstração.

- DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS:

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• Os titulares são INDETERMINADOS, mas DETERMINÁVEIS. Enquanto os titulares
dos direitos coletivos em sentido estrito são determináveis por grupo desde o
início da ação, os titulares de direitos individuais homogêneos são determináveis
na fase de liquidação/execução.

1ª fase: conhecimento 2ª fase: liquidação e 3ª fase: liquidação e


do ilícito individual execução individual execução coletiva
homogêneo

Não há necessidade de Os titulares dos direitos Passado o prazo de 1 ano,


identificar os titulares individuais são identificados não ocorrendo a
nem a extensão de seu no momento da liquidação e identificação ou
dano, sendo a sentença execução, recebendo suas habilitação de titulares em
genérica e a coisa julgada respectivas indenizações, de número compatível com a
erga omnes (em caso de acordo com os danos gravidade da lesão, poderá
procedência do pedido). suportados individualmente. o MP ou qualquer
colegitimados promover a
liquidação e execução da
indenização, cujo valor
reverterá ao Fundo de
Direitos Difusos (Fluid
recovery).

Sintetizando:

Atenção: É errado supor que uma ação coletiva só pode versar sobre uma espécie de
direito coletivo. O mesmo fato pode dar ensejo a pretensões que constituam direitos

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difusos, coletivos em sentido estrito e individuais homogêneos, as quais podem ser
tuteladas em uma mesma ação coletiva. A jurisprudência do STJ se posiciona nesse
sentido:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. TUTELA DE INTERESSES
INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS, COLETIVOS E DIFUSOS POR UMA MESMA AÇÃO
COLETIVA. Em uma mesma ação coletiva, podem ser discutidos os interesses dos
consumidores que possam ter tido tratamento de saúde embaraçado com base em
determinada cláusula de contrato de plano de saúde, a ilegalidade em abstrato
dessa cláusula e a necessidade de sua alteração em consideração a futuros
consumidores do plano de saúde. O CDC expõe as diversas categorias de direitos
tuteláveis pela via coletiva. Com efeito, as tutelas pleiteadas em ações civis
públicas não são necessariamente puras e estanques – ou seja, não é preciso que
se peça, de cada vez, uma tutela referente a direito individual homogêneo, em
outra ação, uma tutela de direitos coletivos em sentido estrito e, em outra, uma
tutela de direitos difusos, notadamente em ação manejada pelo Ministério
Público, que detém legitimidade ampla no processo coletivo. REsp 1.293.606-MG,
Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 2/9/2014 (Informativo nº 547).

PRINCÍPIOS DA TUTELA COLETIVA:

1) Princípio da integratividade do microssistema coletivo:

Antes de tudo, é importante destacar a existência, em nosso ordenamento jurídico, de


um MICROSSISTEMA PROCESSUAL para a tutela coletiva (expressão largamente
utilizada pela doutrina e pelo STJ), formado pelas diversas leis que versam sobre tutela
coletiva, entre elas: Lei de Ação Popular (Lei 4.717/65), Lei da Política Nacional do Meio
Ambiente (Lei 6.938/81), Lei de Ação Civil Pública Lei (7.347/85), Lei das pessoas
portadoras de deficiência (Lei 7.853/89), ECA (Lei 8.069/90), Código de Defesa do
Consumidor (Lei 8.078/90), Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.492/92), Estatuto
do Idoso (Lei 10.741/03) e Lei do Mandado de Segurança (Lei 12.016/09).

O microssistema coletivo possui um núcleo duro, formado pela Lei de Ação Civil Pública
e pelo CDC, que trazem as principais normas de processo coletivo. O CDC e a LACP são
normas de reenvio, pois o CDC, em seu art. 90, manda aplicar, para tudo que ele trata,
a LACP; e a LACP, em seu art. 21, manda aplicar o CDC em tudo que ela trata.

Art. 90 do CDC. Aplicam-se às ações previstas neste título as normas do Código de


Processo Civil e da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, inclusive no que respeita ao
inquérito civil, naquilo que não contrariar suas disposições.
Art. 21 da LACP. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e
individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da lei que instituiu o
Código de Defesa do Consumidor.
7
Sobre este núcleo (CDC + LACP), há a comunicação de todas as normas paralelas (LIA,
LAP, ECA, MSC, Estatuto da Cidade, Estatuto do Idoso, Estatuto do Deficiente etc.) que
formam o microssistema processual coletivo.

O princípio da integratividade indica que o sistema processual coletivo adota a teoria do


DIÁLOGO DAS FONTES NORMATIVAS (ou “diálogo sistemático de coerência”), segundo
a qual, visando à harmonia e integração, na aplicação simultânea de duas leis, uma pode
servir de base conceitual para outra. A integratividade do microssistema processual
coletivo é obtida a partir da interpenetração recíproca de todas as leis que tratam de
processo coletivo.

OBSERVAÇÃO: A integratividade se distingue da subsidiariedade, pois permite a


aplicação das normas independentemente de existir a norma ou não na lei específica.
Deve-se analisar o sistema como um todo.

- EXEMPLOS DE INTEGRATIVIDADE:

• Segundo o STJ, é possível aplicar a inversão do ônus da prova em qualquer ação


coletiva (seja ação civil pública ambiental, de idoso, deficiente, patrimônio
público), mesmo não havendo essa previsão na LACP, pois o CDC prevê essa
possibilidade em seu art. 6º, VIII.

• Aplicação, em todas as ações coletivas, da possibilidade de execução por


desconto em folha de pagamento (art. 14, §3º da Lei de Ação Popular).

• Aplicação, em todas as ações coletivas, da possibilidade de “intervenção móvel”


da pessoa jurídica (de direito público ou de direito privado), cujo ato seja objeto
de impugnação, que, a juízo de seu representante legal e com a finalidade de
atender ao interesse público, poderá optar por atuar ao lado do autor, contestar
a ação como réu ou não contestar (arts. 6º, §3º da LAP e 17, §3º da LIA).

• A jurisprudência do STJ reconhece a aplicação analógica do prazo prescricional


de 5 (cinco) anos previsto no art. 21 da LAP às ações civis públicas, cuja lei não
prevê um prazo próprio. É também de 5 anos o prazo prescricional para
ajuizamento da execução individual em pedido de cumprimento de sentença
proferida em ACP, conforme decidido pelo STJ em sede de recurso repetitivo
(STJ, 2ª Seção, REsp 1.273.643-PR, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em
27/2/2013, divulgado no informativo nº 515).

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ATENÇÃO: No âmbito da lei de improbidade administrativa há previsão de prazo
prescricional próprio (art. 23), de modo que não se aplica o art. 21 da LAP de forma
analógica.

Reexame necessário:
Tradicionalmente, a jurisprudência do STJ costuma indicar o reexame necessário
previsto no art. 19 da Lei de Ação Popular como regra geral do processo coletivo. Esse
reexame necessário, ao contrário daquele previsto no art. 496 do CPC, não é voltado
à proteção da Fazenda Pública, mas à proteção do interesse discutido no processo
(direito tutelado).

Após decisão noticiada no Informativo nº 546 do STJ, no bojo do Resp 1.220.667-MG,


passou-se a entender que a sentença que concluir pela carência ou improcedência da
ação de improbidade administrativa não está sujeita ao reexame necessário previsto no
art. 19 da Lei de Ação Popular (Lei 4.717/1965). Entretanto, a 1ª Seção do STJ, no
julgamento do EREsp 1.220.667-MG, noticiado no Informativo nº 607, modificou o
entendimento do julgamento anterior e decidiu que “A sentença que concluir pela
carência ou pela improcedência de ação de improbidade administrativa está sujeita
ao reexame necessário, com base na aplicação subsidiária do CPC e por aplicação
analógica da primeira parte do art. 19 da Lei 4.717/1965.

Sobre o tema, importante mencionar que o STJ, em julgado de 2017, entendeu que não
cabe reexame necessário nas ações coletivas tutelando direito individual homogêneo,
haja vista que estes, conforme vimos, são direitos acidentalmente coletivos, ou seja, sua
coletivização tem um sentido meramente instrumental, com a finalidade de permitir
uma tutela mais efetiva em juízo:

3. O fundamento da remessa ou reexame necessário consiste em uma precaução


com litígios que envolvam bens jurídicos relevantes, de forma a impor o duplo
grau de jurisdição independentemente da vontade das partes.
4. Ações coletivas que versam direitos individuais homogêneos integram
subsistema processual com um conjunto de regras, modos e instrumento
próprios, por tutelarem situação jurídica heterogênea em relação aos direitos
transindividuais.
5. Limites à aplicação analógica do instituto da remessa necessária, pois a
coletivização dos direitos individuais homogêneos tem um sentido meramente
instrumental, com a finalidade de permitir uma tutela mais efetiva em juízo, não
se deve admitir, portanto, o cabimento da remessa necessária, tal como prevista
no art. 19 da Lei 4.717/65.
6. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 1374232/ES, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado
em 26/09/2017, DJe 02/10/2017)

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Vale ainda mencionar que, em dezembro de 2019, a 1ª Seção do STJ afetou 4 processos
para o julgamento como recurso repetitivo (Tema 1042).1 A questão submetida a
julgamento é a seguinte:

• Definir se há - ou não - aplicação da figura do reexame necessário nas ações


típicas de improbidade administrativa, ajuizadas com esteio na alegada prática
de condutas previstas na Lei 8.429/1992, cuja pretensão é julgada
improcedente em primeiro grau;

• Discutir se há remessa de ofício nas referidas ações típicas, ou se deve ser


reservado ao autor da ação, na postura de órgão acusador - frequentemente o
Ministério Público - exercer a prerrogativa de recorrer ou não do desfecho de
improcedência da pretensão sancionadora.

Na proposta de afetação, acatada por unanimidade, o relator dos casos, ministro


Napoleão Nunes Maia Filho, destacou que o tribunal, desde o precedente firmado em
2017 nos Embargos de Divergência em Recurso Especial 1.220.667, entende que é
possível realizar o reexame necessário na ação de improbidade administrativa.

Entretanto, o ministro destacou que não concorda com esse posicionamento, "uma vez
que a ação de improbidade não prevê a figura do reexame necessário, sendo certo que
a aplicação desse procedimento tem sede para as ações populares, ajuizadas com lastro
na Lei 4.717/1965, em seu artigo 19, mas não nas ações típicas de improbidade".

Desta forma, a questão será novamente revisitada pelo Tribunal, agora em sede de
repetitivo. Portanto, é importante que o aluno acompanhe o tema.

2) Princípio da indisponibilidade mitigada da ação coletiva (art. 5º. §3º, LACP e art. 9º
da LAP):

O princípio em análise estabelece que o objeto do processo coletivo é irrenunciável pelo


autor coletivo. A ratio desse princípio reside no fato de que o bem objeto do processo
coletivo não pertence ao autor, mas sim à coletividade. A consequência prática é que
não poderá haver desistência imotivada da ação coletiva e, se houver, não implicará
extinção do processo, mas sim sucessão processual.

Vale notar que se a desistência é motivada e razoável, o magistrado poderá homologá-


la. Por isso se diz que o princípio da indisponibilidade da ação coletiva é mitigado.

1
http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Repetitivo-definira-tese-sobre-
reexame-de-oficio-em-acoes-de-improbidade-administrativa-julgadas-improcedentes.aspx
10
LACP. Art. 5º, §3°. Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por
associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a
titularidade ativa.

LAP. Art. 9º. Se o autor desistir da ação ou der motivo à absolvição da instância,
serão publicados editais nos prazos e condições previstos no art. 7º, inciso II, ficando
assegurado a qualquer cidadão, bem como ao representante do Ministério
Público, dentro do prazo de 90 (noventa) dias da última publicação feita, promover
o prosseguimento da ação.

3) Princípio da indisponibilidade da execução coletiva (art. 16, LAP e art. 15 da LACP):

Este princípio objetiva evitar a corrupção entre o condenado e o representante coletivo.


Para evitar a falta de execução, o legislador deixa claro que a execução é obrigatória
para o MP. Assim, se o autor da ação coletiva não executar a sentença condenatória no
prazo de 60 dias do trânsito em julgado, e se nenhum outro legitimado a executar, o
Ministério Público é obrigado a executá-la no prazo de 30 dias.

A regra é que o autor execute a sentença coletiva, mas, passados 60 dias, qualquer
legitimado continuará podendo e o MP deverá promover a execução. Diferentemente
do princípio anterior, que é mitigado, a indisponibilidade da execução é absoluta, não
admitindo exceção.

LAP. Art. 16. Caso decorridos 60 (sessenta) dias da publicação da sentença


condenatória de segunda instância, sem que o autor ou terceiro promova a
respectiva execução, o representante do Ministério Público a PROMOVERÁ nos 30
(trinta) dias seguintes, sob pena de falta grave.

LACP. Art. 15. Decorridos sessenta dias do trânsito em julgado da sentença


condenatória, sem que a associação autora lhe promova a execução, deverá fazê-
lo o Ministério Público, facultada igual iniciativa aos demais legitimados. (Redação
dada pela Lei nº 8.078, de 1990)

4) Princípio da primazia do conhecimento do mérito:

O princípio em comento possui íntima relação com as premissas do formalismo-


valorativo, que considera o processo como instrumento voltado à obtenção da justiça
material e à pacificação social. Nessa perspectiva, admite-se uma maior flexibilização
das regras sobre a admissibilidade da ação, de modo que seja priorizado o julgamento
do mérito.

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Este princípio possui uma aplicação destacada no âmbito do processo coletivo, tendo
em vista o interesse do Estado em resolver conflitos que envolvem um número elevado
de interessados. Por conta disso, o magistrado deve evitar, ao máximo possível, a
extinção do processo sem apreciação do mérito. Ex.: Art. 9º da LAP, que, visando evitar
a extinção do processo sem conhecimento do mérito, assegura, em caso de desistência
do autor da ação popular, o prosseguimento da ação por outro cidadão ou pelo
Ministério Público.

ATENÇÃO: Com o novo CPC, tal princípio passou a ser previsto expressamente,
sendo aplicável também ao processo individual, nos termos do art. 4º do NCPC,
que dispõe: “Art. 4o As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução
integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.

Cuidado! Tradicionalmente, o STJ entendia que, caso ocorresse a dissolução da


associação que ajuizou ACP, não seria possível a sua substituição no polo ativo
por outra associação, ainda que os interesses discutidos na ação coletiva fossem
comuns a ambas. Segundo a jurisprudência tradicional do STJ, o art. 5º, § 3º, da
Lei nº 7.347/85 não se aplicaria para o caso das associações. Isso porque a
quando a associação ajuíza uma ação coletiva, ela o faz na qualidade de
representante de seus associados (ou seja, atua em nome alheio, na defesa de
direito alheio), e não na qualidade de substituto processual (defesa de direito
alheio em nome próprio). Este foi o entendimento consagrado pelo STJ em
julgado divulgado no informativo nº 570 do STJ (3ª Turma. REsp 1.405.697-MG,
Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 17/9/2015). O MP, no entanto,
poderia assumir o polo ativo da ação, na medida em que atua na condição de
substituto processual.

Contudo, em março de 2020, a 3º turma do STJ proferiu julgado em sentido


contrário, entendendo que “Associação pode assumir ação coletiva iniciada
por outra mesmo sem autorização expressa dos associados”

Para o ministro relator, no caso concreto, a substituição "é plenamente


possível, haja vista que o microssistema de defesa dos interesses coletivos
privilegia o aproveitamento do processo coletivo, possibilitando a sucessão da
parte autora pelo Ministério Público ou por algum outro colegitimado,
mormente em decorrência da importância dos interesses envolvidos em
demandas coletivas" (Informativo 665).2 Neste precedente, diferentemente
do que ficou consignado no Informativo 570, o STJ entendeu que a atuação da
associação se tratava não de representação, mas sim de SUBSTITUIÇÃO
PROCESSUAL.

2
http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Associacao-pode-assumir-acao-
coletiva-iniciada-por-outra-mesmo-sem-autorizacao-expressa-dos-associados.aspx
12
“Em ação civil pública, é possível a substituição da associação autora por outra
associação caso a primeira venha a ser dissolvida.

(...) Na hipótese dos autos, Associação Nacional dos Consumidores de Crédito - ANDEC,
entidade originariamente autora da presente ação coletiva, foi dissolvida, razão pela
qual Polisdec — Instituto Mineiro de Políticas Sociais e de Defesa do Consumidor —,
constituído há mais de um 1 (ano) e com a mesma finalidade temática, requereu sua
integração no feito na qualidade de demandante, em substituição à Andec.

Tal pretensão, de fato, é plenamente possível, haja vista que o microssistema de defesa
dos interesses coletivos privilegia o aproveitamento do processo coletivo, possibilitando
a sucessão da parte autora pelo Ministério Público ou por algum outro colegitimado,
mormente em decorrência da importância dos interesses envolvidos em demandas
coletivas. (REsp 1.781.959-SC)

5) Princípio do máximo benefício da tutela jurisdicional coletiva (arts. 103, §§ 1º, 2º e


3º e 104 do CDC):

Segundo tal princípio, a coisa julgada coletiva só beneficia os indivíduos, nunca os


prejudica. Assim, a decisão coletiva contrária não vincula o indivíduo lesado, que poderá
ajuizar sua própria ação individual posteriormente. Isso ocorre porque o legitimado
extraordinário coletivo não pede autorização dos titulares dos direitos metaindividuais
antes de propor a ação coletiva. Logo, em virtude da impossibilidade de influírem na
decisão, não poderá a sentença prejudicá-los.

OBSERVAÇÃO: Quando o indivíduo se habilita como litisconsorte na ação coletiva


proposta para defesa de direito individual homogêneo (na forma do art. 94 do CDC), fica
vinculado à sentença de improcedência proferida na ação coletiva, tendo em vista sua
possibilidade de influir no processo, o que se depreende do art. 103, §2º do CDC (a
contrario senso).

De outro lado, fica garantido ao titular do direito individual, em caso de procedência da


demanda coletiva, utilizar a sentença coletiva no seu processo individual, desde que
comprove a identidade fática de situações. A isso se denomina transporte in utilibus da
coisa julgada coletiva para o plano individual.

Nesse sentido, Didier destaca que “a coisa julgada coletiva estende os seus efeitos ao
plano individual in utilibus: o indivíduo poderá valer-se da coisa julgada para proceder à
liquidação de seus prejuízos e promover a execução da sentença (art. 103, §3º). Trata-
se do denominado transporte in utilibus da coisa julgada coletiva para o plano
individual”.
Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:
13
I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de
provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com
idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo
único do art. 81;
II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo
improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se
tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;
III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as
vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.
§ 1° Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão
interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo,
categoria ou classe.
§ 2° Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do pedido, os
interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes poderão
propor ação de indenização a título individual.
§ 3° Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13
da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as ações de indenização
por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma
prevista neste código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus
sucessores, que poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts.
96 a 99.
§ 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal condenatória.
Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art.
81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa
julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior
não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua
suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da
ação coletiva.

6) Princípio do ativismo judicial ou da máxima efetividade do processo coletivo:

O princípio do ativismo judicial é uma faceta do princípio inquisitivo (ou impulso oficial),
e, no âmbito do processo coletivo, representa a possibilidade de uma participação mais
incisiva do juiz nessas causas, tendo em vista o alto grau de interesse público primário
que elas envolvem.

Com efeito, o juiz, no processo coletivo, tem poderes mais acentuados do que o juiz de
um processo individual. Uma das expressões desse princípio é a presença da “defining
function” do juiz (denominação advinda das “class actions” do direito norte-americano),
que representa a “função de definidor” exercida pelo magistrado nos processos
coletivos. São manifestações do princípio do ativismo judicial no processo coletivo:

a) Relativização do princípio da demanda. O art. 7º da LACP dispõe que “se, no


exercício de suas funções, os juízes e tribunais tiverem conhecimento de fatos que
possam ensejar a propositura da ação civil, remeterão peças ao Ministério
14
Público para as providências cabíveis”, o que, em certa medida, representa uma
mitigação ao princípio da demanda.
b) Poderes instrutórios mais acentuados. O juiz, no processo coletivo, deve
suprir lacunas probatórias, através da determinação da produção de provas de
ofício.
c) Flexibilização procedimental. Em virtude da “defining function”, o magistrado
pode, no processo coletivo, flexibilizar as regras procedimentais, através da
alteração da ordem dos atos processuais e/ou ampliação de prazos.

d) Possibilidade de alteração dos elementos da demanda após o saneamento


do processo. No processo coletivo, o magistrado pode permitir a alteração dos
elementos da demanda mesmo fora dos prazos do art. 329 do CPC/15. Sobre o
tema, confira-se importante julgado do STJ, permitindo a emenda da inicial da
ACP mesmo após ter sido apresentada contestação:
RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC/1973. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
PETIÇÃO INICIAL INEPTA. PEDIDO GENÉRICO. EMENDA APÓS A CONSTATAÇÃO. AÇÕES
INDIVIDUAIS. JURISPRUDÊNCIA VACILANTE. AÇÕES COLETIVAS. POSSIBILIDADE.
PRINCÍPIO DA EFETIVIDADE. INSTRUMENTO DE ELIMINAÇÃO DA LITIGIOSIDADE DE
MASSA.

(...)

3. A ação civil pública é instrumento processual de ordem constitucional, destinado à


defesa de interesses transindividuais, difusos, coletivos ou individuais homogêneos e a
relevância dos interesses tutelados, de natureza social, imprime ao direito processual
civil, na tutela destes bens, a adoção de princípios distintos dos adotados pelo Código de
Processo Civil, tais como o da efetividade.

4. O princípio da efetividade está intimamente ligado ao valor social e deve ser utilizado
pelo juiz da causa para abrandar os rigores da intelecção vinculada exclusivamente ao
Código de Processo Civil - desconsiderando as especificidades do microssistema regente
das ações civis -, dado seu escopo de servir à solução de litígios de caráter individual.

5. Deveras, a ação civil constitui instrumento de eliminação da litigiosidade de massa,


capaz de dissipar infindos processos individuais, evitando, ademais, a existência de
diversidade de entendimentos sobre o mesmo caso, possuindo, ademais, expressivo
papel no aperfeiçoamento da prestação jurisdicional, diante de sua vocação inata de
proteger um número elevado de pessoas mediante um único processo.

6. A orientação que recomenda o suprimento de eventual irregularidade na instrução da


exordial por meio de diligência consistente em sua emenda, prestigia a função
instrumental do processo, segundo a qual a forma deve servir ao processo e a
consecução de seu fim. A técnica processual deve ser observada não como um fim em si
mesmo, mas para possibilitar que os objetivos, em função dos quais ela se justifica,
sejam alcançados.

7. Recurso especial a que se nega provimento.

15
(REsp 1279586/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
03/10/2017, DJe 17/11/2017)

e) Fluid Recovery (art. 100, CDC). No caso de sentença coletiva genérica


proferida em ação coletiva ajuizada para tutela de direitos individuais
homogêneos, decorrido o prazo de um ano sem habilitação de interessados em
número compatível com a gravidade do dano, os legitimados previstos no art. 82
do CDC poderão promover a execução e liquidação da indenização devida. Nesta
hipótese, deverá o juiz definir o valor da indenização residual, a ser revertido ao
Fundo de Direitos Difusos (FDD).

f) Possibilidade de controle das políticas públicas pelo Judiciário. A


jurisprudência dos Tribunais Superiores vem admitindo, em situações de
extrema necessidade, a implementação de políticas públicas definidas pela
Constituição mediante intervenção do Poder Judiciário, sempre que os órgãos
estatais competentes descumprirem seus encargos político-jurídicos, de modo a
comprometer, com sua omissão, a eficácia e integridade de direitos sociais e
culturais impregnados de estatura constitucional.

ATENÇÃO: Vale frisar que as decisões têm salientado não ser permitido ao
Judiciário a criação ou a sindicabilidade de meras diretrizes em políticas públicas,
deixadas à conveniência e oportunidade do Poder Executivo e do legislador. Isso
significa que a intervenção do Judiciário só se justifica para conferir efetividade a
direitos fundamentais previstos na Constituição, em casos de flagrante omissão
do Poder Público.

7) Princípio da não taxatividade do processo coletivo/atipicidade/máxima amplitude


(art. 83 do CDC):

Segundo este princípio, quaisquer formas de tutela serão admitidas para conferir
efetividade aos direitos coletivos em sentido amplo. Assim, o rol das ações coletivas não
é taxativo, já que a prioridade é ampliar o acesso à tutela coletiva.

Com efeito, dispõe o art. 83 do CDC: “Para a defesa dos direitos e interesses protegidos
por este código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua
adequada e efetiva tutela”.

Este dispositivo consagra o direito à adequada tutela jurisdicional, o que compreende,


no entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a possibilidade de cumulação (e
acolhimento) de pedidos relativos à obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa e
condenação em dinheiro, desde que se revelem necessários para a adequada tutela
16
dos direitos coletivos discutidos no processo. Nesse sentido: REsp 1.181.820-MG, Rel.
Min. Nancy Andrighi, julgado em 7/10/2010.

Ademais, segundo o princípio da atipicidade, o “nome” dado à ação coletiva é


indiferente para fins de sua admissibilidade em juízo, o que importa é a “substância” da
ação, inclusive para fins de aferição de litispendência.

8) Princípio da ampla divulgação da demanda coletiva (art. 94 do CDC):

Segundo Didier, esse princípio pode ser dividido em dois subprincípios:

a) Princípio da adequada notificação dos membros do grupo:


Esse princípio tem origem na “fair notice”, do direito norte-americano. Com efeito,
quando se ajuíza uma ação coletiva, ela interessa a uma gama determinada ou
indeterminada de pessoas. No intuito de levar ao conhecimento destas pessoas que há
uma ação ajuizada em favor delas, o art. 94 do CDC dispõe que a demanda coletiva deve
ter ampla divulgação, o que ocorrerá através de divulgação pelos meios de comunicação
social, por parte dos órgãos de defesa do consumidor, além da publicação de edital no
órgão oficial.

Essa ampla divulgação serve para permitir a fiscalização da condução do processo, pelo
legitimado extraordinário, bem como para permitir o exercício do direito de “sair” da
incidência da ação coletiva (“right to opt out”).

Art. 94. Proposta a ação, será publicado edital no órgão oficial, a fim de que
os interessados possam intervir no processo como litisconsortes, sem
prejuízo de ampla divulgação pelos meios de comunicação social por parte
dos órgãos de defesa do consumidor.

b) Princípio da informação aos órgãos competentes:


Está previsto nos arts. 6º e 7º da LACP, que traduzem um dever cívico, no sentido de
informar ao órgão curador da sociedade, o Ministério Público, sobre fatos que
constituam objeto da ação civil pública.

Art. 6º da lei 7.347/85. Qualquer pessoa poderá e o servidor público deverá


provocar a iniciativa do Ministério Público, ministrando-lhe informações sobre fatos
que constituam objeto da ação civil e indicando-lhe os elementos de convicção.

Art. 7º da lei 7.347/85. Se, no exercício de suas funções, os juízes e tribunais tiverem
conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura da ação civil, remeterão
peças ao Ministério Público para as providências cabíveis.

17
9) Princípio da adequada representação ou do controle judicial da legitimação
coletiva:

Diferentemente do sistema norte-americano, em que qualquer pessoa pode propor


ação coletiva, desde que prove a adequada representação do grupo, no Brasil, apenas
os legitimados autorizados por lei podem demandar coletivamente.

Dito isto, o primeiro passo para a análise da legitimação coletiva consiste na verificação
da existência de autorização legal para que determinado ente possa substituir os
titulares coletivos do direito afirmado e conduzir o processo coletivo.

De acordo com o princípio da adequada representação, além do prévio controle


legislativo da representação coletiva (materializado na definição, em abstrato, dos
legitimados), cabe ao juiz, diante do caso concreto, realizar um controle judicial da
adequada representação da legitimidade, para aferir se o legitimado coletivo reúne os
atributos que o tornem representante adequado para a melhor condução de
determinado processo coletivo, à luz dos interesses discutidos na hipótese.

O principal critério adotado pela jurisprudência para o controle judicial da


representação adequada diz respeito à pertinência temática do autor coletivo para a
defesa do direito objeto da demanda, o que é avaliado a partir de suas finalidades
institucionais.

OBSERVAÇÃO: A doutrina amplamente majoritária e a jurisprudência dos Tribunais


Superiores consagram a possibilidade deste controle judicial (ope iudicis) de adequada
representação do legitimado coletivo. Minoritariamente, Nelson Nery Jr., defende que,
para a averiguação da legitimação coletiva, é suficiente o exame do texto da lei.

Didier destaca que “a necessidade de controle judicial da adequação do legitimado


coletivo decorre da aplicação da cláusula do devido processo legal à tutela jurisdicional
coletiva. Nem mesmo o Ministério Público poderia ser considerado um legitimado
coletivo universal, pois também em relação à sua atuação se imporia o controle
jurisdicional da sua legitimidade”.

LEGITIMAÇÃO COLETIVA:

1) NATUREZA JURÍDICA DA LEGITIMAÇÃO PARA A TUTELA COLETIVA:

No estudo da legitimação para a tutela coletiva, um dos aspectos mais estudados pela
doutrina brasileira foi a sua natureza jurídica. Três foram as correntes que se fixaram: a)
legitimação ordinária; b) legitimação extraordinária; c) legitimação autônoma para a
condução do processo.
18
a) legitimação ordinária: o legitimado age em nome próprio na defesa dos próprios
interesses. Como a legitimação extraordinária pressupõe a autorização do ordenamento
jurídico, conforme previsto no artigo 18 do CPC, houve defensores da legitimação
ordinária para o processo coletivo. Era defendida como uma estratégia de ampliação do
acesso à tutela jurisdicional coletiva.

b) legitimação extraordinária: o legitimado age em nome próprio na defesa de interesse


alheio. É a corrente que tem sido considerada majoritária na jurisprudência brasileira,
mas não é pacífica no âmbito doutrinário.

c) legitimação autônoma para a condução do processo: fundamenta-se da seguinte


forma: o legitimado não vai a juízo na defesa do próprio interesse, portanto não é
legitimado ordinário, nem vai a juízo na defesa de interesse alheio, pois não é possível
identificar o titular do direito discutido.

2) CARACTERÍSTICAS:

A legitimação coletiva possui as seguintes características:

a) Tem regulamentação, inicialmente, pela via legislativa, podendo ser aferida em


concreto a presença da adequada representação;

b) É conferida a entes públicos, privados e despersonalizados e, até, ao cidadão, na ação


popular;

c) o legitimado coletivo atua em nome próprio na defesa de direitos que pertencem a


um agrupamento de pessoas, na forma do artigo 81 do CDC e seus incisos;

d) o agrupamento de pessoas é defendido pelos legitimados coletivos, que possuem


legitimação autônoma, exclusiva e concorrente e disjuntiva ou simples.

- Legitimação autônoma: ocorre quando o legitimado extraordinário está autorizado a


conduzir o processo independentemente da participação do titular do direito litigioso.

- Legitimação exclusiva: ocorre na hipótese em que apenas o legitimado extraordinário


pode figurar como parte principal do processo, e o protagonista da situação do litígio,
se já não integrar a demanda, poderá intervir no processo na condição de assistente
litisconsorcial. Nas ações coletivas, essa intervenção só é possível quando estiverem
sendo discutidos direitos individuais homogêneos (art. 94 do CDC).

- Legitimação concorrente: ocorre quando mais de um sujeito de direito detém


autorização para discutir em juízo determinada situação jurídica.

- Legitimação disjuntiva ou simples: significa que apesar de concorrente, cada


legitimado poderá exercer independentemente da vontade dos demais colegitimados.
19
JULGADOS IMPORTANTES (LEGITIMIDADE):

A jurisprudência dos Tribunais Superiores acerca da legitimidade de sindicatos e


associações de classe em ações coletivas pode ser sistematizada a partir da identificação
de três situações distintas:

(1) A legitimidade de sindicato em ação coletiva;


(2) A legitimidade de associação de classe em ação coletiva;
(3) A legitimidade de sindicato e de associação de classe em mandado de segurança
coletivo.

No que toca à legitimidade de SINDICATO em ação coletiva, o Supremo Tribunal Federal,


no bojo do RE n° 193.503 (2007), definiu que o sindicato atua como substituto
processual tanto na fase de conhecimento como na fase de execução coletiva. Assim, a
legitimidade extraordinária do sindicato é ampla, em decorrência do disposto no art. 8°,
III, da CRFB/88, que permite a defesa dos direitos e interesses de toda a categoria, sendo
desnecessária qualquer autorização dos substituídos.

Em julgado mais recente, o STJ reafirma o entendimento exarado pelo STF, destacando
a ampla legitimidade do sindicato para defender em juízo os interesses da categoria,
conforme ementa do julgado publicado no informativo nº 512:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE DO SINDICATO. PROTESTO INTERRUPTIVO
DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTIVA. O sindicato tem legitimidade para ajuizar
protesto interruptivo do prazo prescricional da ação executiva de sentença proferida
em ação coletiva na qual foram reconhecidos direitos da respectiva categoria. Os
sindicatos, de acordo com o art. 8º, III, da CF, possuem ampla legitimidade para
defender em juízo os direitos da categoria tanto nas ações ordinárias quanto nas
coletivas, pois agem na qualidade de substitutos processuais, sendo dispensável, para
tanto, a autorização expressa dos substituídos. Essa legitimidade abrange, também, as
fases de liquidação e execução de título judicial, portanto não há falar em ilegitimidade
do sindicato para interpor protesto interruptivo do prazo prescricional da ação
executiva. Precedente citado do STF: RE 214.668-ES, DJ 23/8/2007, e do STJ: AgRg no
AREsp 33.861-RS, DJe 23/5/2012. STJ, 1ª Turma, AgRg no Ag 1.399.632-PR, Rel. Min.
Arnaldo Esteves Lima, julgado em 4/12/2012, divulgado no informativo nº 512.

No que toca à legitimidade de ASSOCIAÇÃO DE CLASSE, a jurisprudência atual dos


Tribunais Superiores é polêmica. O STF, no julgamento do RE n° 573.232/SC, julgado sob
a sistemática da repercussão geral, fixou entendimento no sentido de que as
associações de classe, ao contrário dos sindicatos, atuam como representantes
processuais, sendo pressuposto da representação a autorização expressa dos
associados e a lista destes juntada à inicial. Desta forma, quando a ação coletiva é

20
proposta por associação de classe, apenas os filiados da entidade estarão abrangidos
pela coisa julgada.

REPRESENTAÇÃO – ASSOCIADOS – ARTIGO 5º, INCISO XXI, DA CONSTITUIÇÃO


FEDERAL. ALCANCE. O disposto no artigo 5º, inciso XXI, da Carta da República
encerra representação específica, não alcançando previsão genérica do estatuto
da associação a revelar a defesa dos interesses dos associados. TÍTULO
EXECUTIVO JUDICIAL – ASSOCIAÇÃO – BENEFICIÁRIOS. As balizas subjetivas do
título judicial, formalizado em ação proposta por associação, é definida pela
representação no processo de conhecimento, presente a autorização expressa
dos associados e a lista destes juntada à inicial. (RE 573232, Relator: Min.
RICARDO LEWANDOWSKI, Relator p/ Acórdão: Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal
Pleno, julgado em 14/05/2014, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO, publicado em
19.09.2014).

Na mesma linha, o STJ fixou o entendimento pela impossibilidade de execução


individual de sentença coletiva por pessoa não filiada à associação autora da ação
coletiva. É oportuna a leitura da esclarecedora ementa deste julgado:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO INDIVIDUAL DE SENTENÇA


COLETIVA POR PESSOA NÃO FILIADA À ASSOCIAÇÃO AUTORA DA AÇÃO COLETIVA. O
servidor não filiado não detém legitimidade para executar individualmente a sentença
de procedência oriunda de ação coletiva - diversa de mandado de segurança coletivo -
proposta por associação de servidores. (...) À luz da interpretação do art. 5º, XXI, da CF,
conferida por seu intérprete maior, não caracterizando a atuação de associação como
substituição processual - à exceção do mandado de segurança coletivo -, mas como
representação, em que é defendido o direito de outrem (dos associados), não em nome
próprio da entidade, não há como reconhecer a possibilidade de execução da sentença
coletiva por membro da coletividade que nem sequer foi filiado à associação autora da
ação coletiva. Assim, na linha do decidido pelo STF, à exceção do mandado de segurança
coletivo, em se tratando de sentença de ação coletiva ajuizada por associação em defesa
de direitos individuais homogêneos, para se beneficiar do título, ou o interessado integra
essa coletividade de filiados (e nesse caso, na condição de juridicamente interessado, é-
lhe facultado tanto dar curso à eventual demanda individual, para ao final ganhá-la ou
perdê-la, ou então sobrestá-la, e, depois, beneficiar-se da eventual coisa julgada
coletiva); ou, não sendo associado, pode, oportunamente, litisconsorciar-se ao pleito
coletivo, caso em que será recepcionado como parte superveniente (arts. 103 e 104 do
CDC). É oportuno frisar que, embora o mencionado leading case do STF não tenha
deixado claro se a sentença coletiva pode vir a beneficiar aqueles que se filiam à
associação posteriormente - tema de repercussão geral número 499, que será dirimido
por ocasião do julgamento do RE 612.043-PR -, não há dúvidas de que a sentença
coletiva, prolatada em ação de rito ordinário, só pode beneficiar os associados. Por
último, a título de oportuno registro, cabe ressaltar que a legitimação concorrente,
prevista no art. 82, IV, do CDC para defesa coletiva de interesses difusos, coletivos e
individuais homogêneos de consumidores e das vítimas, é manifestamente impertinente
ao caso em exame, pois o dispositivo restringe essa hipótese de atuação às associações
legalmente constituídas há pelo menos um ano e "que incluam entre seus fins
institucionais a defesa dos direitos protegidos pelo Código consumerista". STJ, 4ª Turma,

21
REsp 1.374.678-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 23/6/2015, DJe 4/8/2015,
divulgado no informativo nº 565.

ATENÇÃO: O STF, no RE 612.043 (Tema 499) entendeu que: "A eficácia subjetiva da coisa
julgada formada a partir de ação coletiva, de rito ordinário, ajuizada por associação civil
na defesa de interesses dos associados, somente alcança os filiados, residentes no
âmbito da jurisdição do órgão julgador, que o fossem em momento anterior ou até a
data da propositura da demanda, constantes da relação jurídica juntada à inicial do
processo de conhecimento". Nesta ação, o STF declarou a constitucionalidade do art.
2º-A da Lei nº 9.494/1997, que limita a eficácia subjetiva da decisão à competência
territorial do órgão prolator.

EXECUÇÃO – AÇÃO COLETIVA – RITO ORDINÁRIO – ASSOCIAÇÃO –


BENEFICIÁRIOS. Beneficiários do título executivo, no caso de ação proposta por
associação, são aqueles que, residentes na área compreendida na jurisdição do
órgão julgador, detinham, antes do ajuizamento, a condição de filiados e
constaram da lista apresentada com a peça inicial.

O STJ, contudo, tem entendido em precedentes mais recentes que esse entendimento
restritivo do STF só se aplica às ações de rito ordinário, ou seja, aquelas que envolvem
apenas direitos individuais. No que tange a direitos COLETIVOS, o STJ tem entendido
que o regime de atuação das associações encerra SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL, de
modo que não haveria a necessidade de autorização por parte dos associados.
“Por se tratar do regime de substituição processual, a autorização para a defesa
do interesse coletivo em sentido amplo é estabelecida na definição dos objetivos
institucionais, no próprio ato de criação da associação, sendo desnecessária
nova autorização ou deliberação assemblear.

As teses de repercussão geral resultadas do julgamento do RE 612.043/PR e do


RE 573.232/SC tem seu alcance expressamente restringido às ações coletivas
de rito ordinário, as quais tratam de interesses meramente individuais, sem
índole coletiva, pois, nessas situações, o autor se limita a representar os
titulares do direito controvertido, atuando na defesa de interesses alheios e
em nome alheio.

STJ. 3ª Turma. REsp 1649087/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em


02/10/2018.

STJ. 3ª Turma. AgInt no REsp 1719820/MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze,
julgado em 15/04/2019.

22
Vale destacar que o tratamento é diverso quando se trata de MANDADO DE
SEGURANÇA COLETIVO, conforme entendimento sumulado pelo Supremo Tribunal
Federal no verbete 629, que consubstancia a possibilidade de impetração de mandado
de segurança coletivo por entidade de classe independentemente de autorização
específica dos associados.
Súmula 629 do STF “A impetração de mandado de segurança coletivo por
entidade de classe em favor dos associados independe da autorização destes”.

Apesar de a súmula tratar apenas de entidade de classe, a jurisprudência estende esse


entendimento igualmente aos sindicatos (RE 348973 AgR, Relator: Min. CEZAR PELUSO,
Primeira Turma, julgado em 23/03/2004). Dito isto, conclui-se que no mandado de
segurança coletivo, tanto os sindicatos como as associações de classe atuam
independentemente de autorização específica de seus filiados, encerrando
substituição processual.

COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS:

O regime jurídico da coisa julgada coletiva é bastante diferenciado em relação ao


processo individual.

Segundo Didier, o regime jurídico da coisa julgada é visualizado a partir da análise de


três dados: (a) os limites OBJETIVOS – o que se submete aos seus efeitos; (b) os limites
SUBJETIVOS – quem se submete à coisa julgada; (c) o MODO de produção – como ela se
forma.

No que toca aos limites objetivos, não há nenhuma peculiaridade no regime jurídico da
coisa julgada coletiva. Assim, tanto no âmbito do processo individual quanto no âmbito
do processo coletivo, a coisa julgada limita-se à parte dispositiva da sentença, não
alcançando os motivos da decisão, tampouco a verdade dos fatos (arts. 503 e 504,
NCPC).

Quanto aos limites subjetivos, a coisa julgada pode ser inter partes (vincula apenas as
partes entre as quais é dada), ultra partes (atinge não só as partes do processo, mas
também determinados terceiros) ou erga omnes (atinge a todos, tenham ou não
participado do processo).

No âmbito do processo individual, a coisa julgada produz efeitos apenas perante as


partes entre as quais é dada (eficácia inter partes), não prejudicando terceiros (art. 506,
NCPC). Já no processo coletivo, a coisa julgada será erga omnes ou ultra partes (a
depender da espécie de direito tutelado), mas jamais intra partes.

23
Quanto ao modo de produção, há três diferentes tipos de coisa julgada: (i) PRO ET
CONTRA (aquela que se forma independentemente do resultado do processo); (ii)
SECUNDUM EVENTUM LITIS (aquela que somente é produzida quando a demanda é
julgada procedente); (iii) SECUNDUM EVENTUM PROBATIONIS (aquela que se forma
apenas em caso de esgotamento de provas).

No âmbito do processo individual, a coisa julgada se opera PRO ET CONTRA, o que


significa que sua produção independe do resultado do processo (se procedente ou
improcedente). No que se refere ao processo coletivo, o modo de produção da coisa
julgada será, em regra, SECUNDUM EVENTUM PROBATIONIS, salvo quando se tratar de
direito individual homogêneo, o que será explicado mais a frente.

O regime jurídico da coisa julgada no plano coletivo, portanto, depende da espécie de


direito envolvido, e pode ser esquematizado da seguinte forma:

DIREITOS DIFUSOS:
(a) Sentença PROCEDENTE -> Eficácia erga omnes (abrange toda a sociedade);
(b) Sentença IMPROCEDENTE COM ESGOTAMENTO DE PROVAS -> Eficácia erga omnes,
impedida a propositura de nova ação coletiva.
(c) Sentença IMPROCEDENTE POR FALTA DE PROVAS: Não haverá formação da coisa julgada
(coisa julgada secundum eventum probationis), sendo possível a propositura de nova ação
coletiva, por qualquer legitimado, desde que haja nova prova.

Atenção: Seja qual for a hipótese de improcedência (com provas ou sem provas), o lesado
pode propor ação individual, pois o indivíduo não pode ser prejudicado pela ação coletiva.

DIREITOS COLETIVOS EM SENTIDO ESTRITO:


(a) Sentença PROCEDENTE -> Eficácia ultra partes (abrange todo o grupo/classe);
(b) Sentença IMPROCEDENTE COM ESGOTAMENTO DE PROVAS -> Eficácia ultra partes,
impedida a propositura de nova ação coletiva.
(c) Sentença IMPROCEDENTE POR FALTA DE PROVAS: Não haverá formação da coisa julgada
(coisa julgada secundum eventum probationis), sendo possível a propositura de nova ação
coletiva, por qualquer legitimado, desde que haja nova prova.

Atenção: Seja qual for a hipótese de improcedência (com provas ou sem provas), o lesado
pode propor ação individual, pois o indivíduo não pode ser prejudicado pela ação coletiva.

DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS:


(a) Sentença PROCEDENTE -> Eficácia erga omnes (abrange toda a sociedade);
(b) Sentença IMPROCEDENTE COM ESGOTAMENTO DE PROVAS ou POR FALTA DE PROVAS ->
Eficácia erga omnes, impedida a propositura de nova ação coletiva.

24
Atenção: Se o lesado não participou da ação coletiva na condição de litisconsorte (art. 94,
CDC), poderá propor ação individual, na forma do art. 103, §2º, do CDC.

Note que, ao contrário do regime adotado no âmbito dos direitos difusos e coletivos
stricto sensu, quando se estiver diante de direitos individuais homogêneos a sentença
de improcedência impedirá a propositura de nova demanda mesmo no caso de falta de
provas, conforme entendimento consagrado pelo STJ, e reafirmado no Inf. 575. Em vista
desse entendimento, é correto afirmar que o modo de produção da coisa julgada no
âmbito dos direitos individuais homogêneos não é secundum eventum probationes.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMPROCEDÊNCIA DE DEMANDA COLETIVA PROPOSTA EM DEFESA DE


DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS E IMPOSSIBILIDADE DE NOVO AJUIZAMENTO DE AÇÃO
COLETIVA POR OUTRO LEGITIMADO. Após o trânsito em julgado de decisão que julga
improcedente ação coletiva proposta em defesa de direitos individuais homogêneos,
independentemente do motivo que tenha fundamentado a rejeição do pedido, não é possível a
propositura de nova demanda com o mesmo objeto por outro legitimado coletivo, ainda que
em outro Estado da federação. REsp 1.302.596-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para
acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 9/12/2015, DJe 1°/2/2016 (Informativo n.
575).

OBS: Devido à possibilidade do indivíduo lesado propor ação individual em caso de


improcedência da ação coletiva, diz-se que a coisa julgada do âmbito coletivo para o
âmbito individual é SECUNDUM EVENTUM LITIS (isto é: depende do resultado da
demanda).

ATENÇÃO: A coisa julgada aqui estudada não se aplica ao mandado de segurança


coletivo e à ação de improbidade administrativa, que possuem tutela específica de coisa
julgada.

Aspectos relevantes da coisa julgada coletiva.

(a) Incidência da coisa julgada coletiva sobre quem já tem ação individual em curso.
De acordo com o art. 104 do CDC, para o autor da ação individual já proposta e em curso
aproveitar o transporte in utilibus da coisa julgada coletiva, deverá requerer a suspensão
da sua ação individual em 30 dias, a contar da data em que é avisado, nos autos da ação
individual, de que a ação coletiva foi ajuizada. Trata-se do exercício da opção de ser
excluído da abrangência da decisão coletiva, chamado no sistema norte-americano de
“right to opt out”.

Art. 104 do CDC. As ações coletivas, previstas nos incisos I [difusos] e II [coletivos]
e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações
individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que
aludem os incisos II [coletivos] e III [individuais homogêneos] do artigo anterior
25
não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua
suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento
da ação coletiva.

Se eventualmente o autor pedir a suspensão da sua ação individual, e a ação coletiva for
julgada procedente, ele será beneficiado pela decisão proferida na ação coletiva. Caso
não peça a suspensão de sua ação individual, o autor não será beneficiado pela coisa
julgada coletiva, na medida em que optou por não se submeter aos efeitos da decisão
coletiva.

Essa suspensão da ação individual é faculdade da parte ou o juiz pode determinar de


ofício?
A literalidade do art. 104 do CDC indica que a suspensão do processo é uma faculdade
da parte. No entanto, em outubro de 2009, o STJ, rompendo com a ideia da
facultatividade da suspensão da ação individual, firmou, em sede de recurso repetitivo,
a seguinte tese: “Ajuizada ação coletiva atinente à macrolide geradora de processos
multitudinários, suspendem-se OBRIGATORIAMENTE as ações individuais, no aguardo
do julgamento da ação coletiva, o que não impede, entretanto, o ajuizamento da ação
individual” (Resp 1.110.549/RS).

(b) Restrição territorial da coisa julgada:


Tem-se aqui um dos pontos mais polêmicos sobre o tema. O art. 16 da LACP e o art. 2º-
A da Lei n. 9.494/97 consagram uma restrição territorial da eficácia das decisões
proferidas em ação coletiva, ao dispor que a sentença proferida em ação coletiva
produzirá efeitos nos limites da competência territorial do órgão prolator.

Art. 16 da lei 7.347/85. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos
limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for
julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer
legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de
nova prova.

Art. 2º-A da lei 9.494/97. A sentença civil prolatada em ação de caráter coletivo
proposta por entidade associativa, na defesa dos interesses e direitos dos seus
associados, abrangerá apenas os substituídos que tenham, na data da
propositura da ação, domicílio no âmbito da competência territorial do órgão
prolator. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)

A doutrina, de um modo geral, faz duras críticas a estes dispositivos, considerando-os


inconstitucionais e ineficazes. CASSIO SCARPINELA entende que esses dispositivos são
formalmente inconstitucionais, pois derivam de medidas provisórias (posteriormente
convertidas em lei) que não atendiam aos requisitos constitucionais da urgência e

26
relevância. Por sua vez, NELSON NERY JR., MAZZILLI E DIDIER sustentam que esses
dispositivos são materialmente inconstitucionais pela falta de razoabilidade, sendo
certo que o legislador confundiu dois institutos de processo que não se confundem:
coisa julgada e competência. Ademais, referida limitação representaria ofensa aos
princípios da economia processual, da igualdade e do acesso à justiça.

Neste sentido, o STJ, conferido interpretação consentânea com as críticas doutrinárias,


passou a entender que “os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a
lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido”. Confira-
se:

“DIREITO PROCESSUAL. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (ART.


543-C, CPC). DIREITOS METAINDIVIDUAIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APADECO X
BANESTADO. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. EXECUÇÃO/LIQUIDAÇÃO
INDIVIDUAL. FORO COMPETENTE. ALCANCE OBJETIVO E SUBJETIVO DOS
EFEITOS DA SENTENÇA COLETIVA. LIMITAÇÃO TERRITORIAL. IMPROPRIEDADE.
REVISÃO JURISPRUDENCIAL. LIMITAÇÃO AOS ASSOCIADOS. INVIABILIDADE.
OFENSA À COISA JULGADA. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: 1.1. A liquidação
e a execução individual de sentença genérica proferida em ação civil coletiva
pode ser ajuizada no foro do domicílio do beneficiário, porquanto os efeitos e a
eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos
limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para
tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais
postos em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC) (REsp 1243887, Min.
Rel. Luís Felipe Salomão, Corte Especial, Dje:12/12/2011).”

(...) 1. No julgamento do recurso especial repetitivo (representativo de


controvérsia) n.º 1.243.887/PR, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, a Corte Especial
do Superior Tribunal de Justiça, ao analisar a regra prevista no art. 16 da Lei n.º
7.347/85, primeira parte, consignou ser indevido limitar, aprioristicamente, a
eficácia de decisões proferidas em ações civis públicas coletivas ao território da
competência do órgão judicante. 2. Embargos de divergência acolhidos para
restabelecer o acórdão de fls. 2.418-2.425 (volume 11), no ponto em que afastou
a limitação territorial prevista no art. 16 da Lei n.º 7.347/85 (EREsp 1134957/SP,
Min. Laurita Vaz, Corte Especial, Dje: 30/11/2016).”

Contudo, no julgamento do Tema 499, o STF declarou a constitucionalidade do art.


2º-A da Lei nº 9.494/1997, que limita a eficácia subjetiva da decisão à competência
territorial do órgão prolator.

EXECUÇÃO – AÇÃO COLETIVA – RITO ORDINÁRIO – ASSOCIAÇÃO –


BENEFICIÁRIOS. Beneficiários do título executivo, no caso de ação proposta por
associação, são aqueles que, residentes na área compreendida na jurisdição do
27
órgão julgador, detinham, antes do ajuizamento, a condição de filiados e
constaram da lista apresentada com a peça inicial.

A celeuma que pareceria ter chegado ao fim, continuou. Isto porque o STJ, em
precedentes mais recentes, manteve o seu entendimento, afastando a limitação
territorial constante do artigo 16 da Lei n.º 7.347/85. Em um dos casos, o STJ chegou a
fazer um distinguishing com o que foi decidido pelo STF no Tema 499, entendendo que,
naquele caso, o STF assentou a condição de mero representante das associações para
atuar em nome dos interesses de seus associados em ações coletivas que sigam o rito
ordinário. Nessa situação, seria razoável a restrição imposta pelo art.2º-A da Lei nº
9494/97 e do art.16 da LACP, tendo em vista a limitação do próprio interesse jurídico
discutido na ação (restrito aos interesses exclusivos dos associados). Porém, em se
tratando de situação jurídica na qual as associações representam não só o interesse
de seus associados, mas interesses individuais homogêneos, coletivos ou difusos que
transcendam a esfera dos interesses de seus associados, valendo-se do rito especial
da ação civil pública, deve prevalecer as disposições constantes nos arts. 93 e 103 do
Código de Defesa do Consumidor.

“As teses de repercussão geral resultadas do julgamento do RE 612.043/PR e do


RE 573.232/SC tem seu alcance expressamente restringido às ações coletivas
de rito ordinário, as quais tratam de interesses meramente individuais, sem
índole coletiva, pois, nessas situações, o autor se limita a representar os titulares
do direito controvertido, atuando na defesa de interesses alheios e em nome
alheio.” (REsp 1649087/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 02/10/2018, DJe 04/10/2018)

“1. Não se aplica ao caso vertente o entendimento sedimentado pelo STF no RE


n. 573.232/SC e no RE n. 612.043/PR, pois a tese firmada nos referidos
precedentes vinculantes não se aplicam às ações coletivas de consumo ou
quaisquer outras demandas que versem sobre direitos individuais
homogêneos. Ademais, a Suprema Corte acolheu os embargos de declaração no
RE n. 612.043/PR para esclarecer que o entendimento nele firmado alcança tão
somente as ações coletivas submetidas ao rito ordinário.
2. O microssistema de defesa dos interesses coletivos privilegia o
aproveitamento do processo coletivo, possibilitando a sucessão da parte
ilegítima pelo Ministério Público ou por algum outro colegitimado, mormente
em decorrência da importância dos interesses envolvidos em demandas
coletivas.
3. Agravo interno desprovido.
(AgInt no REsp 1719820/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA
TURMA, julgado em 15/04/2019, DJe 23/04/2019)”

Uma dessas decisões foi questionada no RE 1.101.937 e o tema teve repercussão geral
reconhecida recentemente pelo STF, em fevereiro de 2020 (Tema 1075). Confira-se:
28
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ART. 16 DA LEI 7.347/1985, COM A REDAÇÃO
DADA PELA LEI 9.494/1997 . CONSTITUCIONALIDADE. REPERCUSSÃO GERAL
RECONHECIDA. 1. Revela especial relevância, na forma do art. 102, § 3º, da Constituição,
a questão acerca da constitucionalidade do art. 16 da Lei 7.347/1985, com a redação
dada pela Lei 9.494/1997, segundo o qual a sentença na ação civil pública fará coisa
julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator. 2.
Repercussão geral da matéria reconhecida, nos termos do art. 1.035 do CPC.

Em abril de 2020, o Min. Relator Alexandre de Moraes decretou, com base no art. 1.035,
§ 5º, do Código de Processo Civil, a SUSPENSÃO do processamento de todas as
demandas pendentes que tratem da questão em tramitação no território nacional.
Assim, o tema ainda está pendente de uma solução definitiva.

A circunstância da decisão final ter sido proferida pelo STJ, que possui jurisdição sobre
todo o território nacional, é suficiente para conferir alcance nacional à decisão?
Para o STJ, o simples fato de a causa ter sido submetida à apreciação do STJ, por meio
de recurso especial, não tem a aptidão para conferir alcance nacional à sentença
proferida em ação coletiva. Assim, é necessário levar em conta o órgão jurisdicional
competente na origem. Nesse sentido:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXAME MERITÓRIO PELO STJ EM SEDE RECURSAL E


LIMITES SUBJETIVOS DA CAUSA. O simples fato de a causa ter sido submetida à
apreciação do STJ, por meio de recurso especial, não tem a aptidão para
conferir alcance nacional à sentença proferida em ação civil pública. Isso
porque o efeito substitutivo do art. 512 do CPC, decorrente do exame meritório
do recurso especial, não tem o condão de modificar os limites subjetivos da
causa. Caso se entendesse de modo contrário, estar-se-ia criando um novo
interesse recursal, o que levaria a parte vencedora na sentença civil a recorrer
até o STJ apenas para alcançar abrangência nacional. STJ, 3ª Turma, REsp
1.114.035-PR, Rel. originário Min. Sidnei Beneti, Rel. para acórdão Min. João
Otávio de Noronha, julgado em 7/10/2014, divulgado no Informativo nº 552.

No mesmo informativo, o STJ reconheceu a abrangência nacional da decisão proferida


em ação civil pública ajuizada pelo MP, com assistência de entidades de classe de âmbito
nacional, perante a Seção Judiciária do Distrito Federal. Veja-se:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EFEITO ERGA OMNES DA SENTENÇA CIVIL


PROFERIDA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Tem abrangência nacional a eficácia da
coisa julgada decorrente de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público,
com assistência de entidades de classe de âmbito nacional, perante a Seção
Judiciária do Distrito Federal, e sendo o órgão prolator da decisão final de
procedência o STJ. É o que se extrai da inteligência dos arts. 16 da LACP, 93, II, e
103, III, do CDC. STJ, 3ª Turma, REsp 1.319.232-DF, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, julgado em 4/12/2014, divulgado no Informativo nº 552.

29
Em síntese: não basta que a decisão final tenha sido proferida pelo STJ para a decisão
possua abrangência nacional, é necessário que o órgão jurisdicional competente na
origem possua jurisdição sobre todo o território nacional.

LITISPENDÊNCIA NO ÂMBITO DO PROCESSO COLETIVO.

No processo individual, a litispendência é verificada a partir da teoria da TRÍPLICE


IDENTIDADE dos elementos da ação (partes, pedido e causa de pedir). Verificada a
litispendência, que ocorre quando, no momento da propositura da ação, há demanda
idêntica em curso, o magistrado determina a extinção da segunda ação sem julgamento
do mérito (art. 485, V, NCPC).

A peculiaridade no âmbito do processo coletivo refere-se à possibilidade de verificação


de litispendência em demanda que não há identidade entre as partes autoras. Isso
decorre das peculiares características da legitimidade ad causam das ações coletivas,
que é extraordinária (o legitimado age em nome próprio defendendo interesse da
coletividade), concorrente (há vários legitimados) e disjuntiva (qualquer dos
legitimados pode propor sozinho a ação coletiva). Como o legitimado não age em nome
próprio, é possível que uma mesma ação coletiva seja proposta por diferentes
legitimados. O que se deve avaliar, portanto, é a IDENTIDADE DA RELAÇÃO JURÍDICA
MATERIAL deduzida em juízo.

No processo coletivo, se houver litispendência com partes iguais (ações propostas pelo
mesmo legitimado ativo), a solução costuma ser a mesma atribuída ao processo
individual (extinção do segundo processo sem exame do mérito). No entanto, quando
ocorre litispendência com partes diversas, a doutrina majoritária sustenta que a solução
não será a extinção de um dos processos, mas sim a REUNIÃO deles para processamento
simultâneo. Se o estágio em que as demandas se encontrarem impossibilitar a reunião
das demandas (ex: processos em grau diferente de jurisdição), a solução deverá ser, de
lege ferenda, a SUSPENSÃO do processo.

ATENÇÃO: A ação coletiva não induz litispendência para a ação individual, conforme
dispõe o art. 104 do CDC. Isto ocorre porque as demandas nunca serão idênticas, já que
o objeto é distinto, bem como a legitimidade ativa. Apesar de o artigo mencionar apenas
as ações coletivas previstas nos incisos I e II do parágrafo único do art. 81 (direitos
difusos e coletivos em sentido estrito), é pacífica na doutrina a sua aplicação também
para os direitos individuais homogêneos.

OBSERVAÇÕES:

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• É possível que haja litispendência entre duas demandas coletivas que tramitem
por ritos diversos (ação civil pública e ação popular), já que a similitude do
procedimento é irrelevante diante da atipicidade da tutela jurisdicional coletiva
(que define que qualquer procedimento pode servir à tutela de um direito
coletivo). Quando uma ação civil pública versa sobre o mesmo tema de uma ação
popular, a jurisprudência do STJ tem identificado o que denomina ação popular
MULTILEGITIMÁRIA (STJ, Resp 401.964/RO Dj 11/11/2002).

• A doutrina sustenta que não há litispendência entre ação coletiva que discuta
direito difuso e outra que discuta direito individual homogêneo, ainda que
ambas estejam fundamentadas nos mesmos fatos (causa de pedir remota), mas
sim CONEXÃO, em razão da RELAÇÃO DE PRELIMINARIDADE existente entre
ambas.

• No âmbito do processo coletivo, também podem ser verificados os fenômenos


da conexão e da continência, que ocorrem quando há um vínculo de semelhança
entre causas, verificada a partir de uma identidade parcial entre os fatos e
fundamentos jurídicos. A consequência da conexão/continência no âmbito do
processo coletivo não difere daquela verificada nos processos individuais, isto é:
gera, como regra, a reunião das causas para julgamento simultâneo perante um
mesmo juízo. Sobre o assunto, é importante conhecer o teor da súmula 489 do
STJ: “Reconhecida a continência, devem ser reunidas na Justiça FEDERAL as
ações civis públicas propostas nesta e na Justiça estadual.”

ASPECTOS RELEVANTES SOBRE COMPETÊNCIA NAS AÇÕES COLETIVAS

a) Critério funcional:

A regra geral é que a ação coletiva se inicia em primeira instância, conforme a origem
do ato imputado, independentemente de quem seja a autoridade impugnada. Isso se
aplica, inclusive, às ações de improbidade administrativa.

Exceções:
- Quando a ação interessar à totalidade dos juízes estaduais e/ou ficar configurado, após
o julgamento na primeira instância, o impedimento de mais da metade dos
desembargadores para apreciar o recurso voluntário ou a remessa obrigatória, a
competência será do STF, na forma do art. 102, I, “n”, CF/88;
- Quando a causa substantivar conflito federativo a competência será do STF, na forma
do art. 102, I, “f”, CF/88. De acordo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF),
o conflito federativo de que trata o artigo 102, inciso I, alínea “f”, da Constituição
Federal, acerca da competência originária da Corte, engloba os casos em que litigam

31
entre si a União, os estados-membros, o Distrito Federal, ou as respectivas entidades da
administração indireta, desde que a controvérsia tenha potencial de afetar a harmonia
e o equilíbrio da federação brasileira.

b) Critério material:

• JUSTIÇA ELEITORAL (art. 121, CF). Em princípio, caberá ação coletiva na Justiça
Eleitoral, desde que a causa de pedir diga respeito a assuntos relacionados no
art. 121 da CF.
• JUSTIÇA DO TRABALHO (art. 114, CF). É perfeitamente cabível ação coletiva na
Justiça do Trabalho. Nesse sentido, a Súmula 736 do STF estabelece: “Compete
à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o
descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde
dos trabalhadores”. Exemplo: ACP proposta pelo MPT, para a defesa de
interesses coletivos, quando desrespeitados direitos sociais.
• JUSTIÇA FEDERAL (art. 109, CF). No processo coletivo, a competência da Justiça
Federal é estabelecida a partir do critério do interesse direto e imediato das
entidades mencionadas no art. 109 da CRFB/88, e não pelo critério da natureza
do bem disputado.

A simples presença do MPF na lide faz com que a causa seja da competência da Justiça
Federal?
SIM. No julgamento do RE 840.002 e do RE 822.816, o STF assentou entendimento no
sentido de que a simples presença do MPF na lide é suficiente para atrair a competência
da Justiça Federal, por ser o MPF um órgão da União, que, embora sem personalidade
jurídica própria, é investido de personalidade processual, cuja natureza é federal. Com
isto, o STF passou a adotar o mesmo entendimento do STJ, superando a antiga
divergência sobre o tema.

OBS: A competência cível da Justiça Federal é ratione personae. Assim, a JF só


será competente para as causas em que a União, entidade autárquica ou
empresa pública federal forem interessadas, na condição de autoras, rés,
assistentes ou oponentes, exceto as de falência, de acidente do trabalho e as
sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho (art. 109, I, CF).

• JUSTIÇA ESTADUAL. A competência da Justiça Estadual é residual. Assim, se não


for o caso de competência de uma das Justiças Especializadas ou da Justiça
Federal, a competência será da Justiça Estadual.

Neste ponto, merece atenção a redação da Súmula 150 do STJ: “Compete à Justiça
Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no

32
processo, da União, suas autarquias ou empresas públicas”. De acordo com este
enunciado, não é atribuição do juiz estadual julgar se entidade federal tem ou não
interesse na causa.

c) Critério valorativo.

No âmbito nacional, o critério valor da causa só serve hoje para fixar a competência dos
Juizados Especiais. Com efeito, de acordo com o art. 3º, I da Lei 10.259/01, não cabe
ação coletiva nos Juizados Especiais (cíveis ou federais).

d) Critério territorial.

A competência de foro no âmbito do núcleo duro do microssistema coletivo é regulada


pelos arts. 93 do CDC e 2º da LACP, que utilizam como critério principal o local do dano.
Não há dúvida na doutrina e na jurisprudência acerca da natureza absoluta da
competência de foro no âmbito do processo coletivo, o que representa um traço
distintivo em relação ao processo individual, no bojo do qual a competência de foro,
como regra, é relativa.

Art. 93. Ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente para a causa a


justiça local:
I - no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito local;
II - no foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos de âmbito
nacional ou regional, aplicando-se as regras do Código de Processo Civil aos casos de
competência concorrente.

Art. 2º As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano,
cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa.

Pela leitura do art. 93 do CDC, é possível esquematizar a competência de foro no


processo coletivo nos seguintes termos:

i. Se o dano for local -> A competência é do juízo do local do dano.


ii. Se o dano for regional -> O foro é o da capital do Estado. Para MAZZILLI
e ADA PELLEGRINI GRINOVER, a ação também poderia ser proposta no
Distrito Federal, alternativamente.
iii. Se o dano for nacional -> Possuem competência concorrente e
alternativa os foros do Distrito Federal e da capital de quaisquer dos
Estados envolvidos (STJ).

DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA. ACP.


LOCAL DO DANO. A competência para processar e julgar ação civil

33
pública é absoluta e se dá em função do local onde ocorreu o dano. O
art. 2º da Lei n. 7.347/1985, que disciplina a Ação Civil Pública (ACP),
estabelece que as ações da referida norma serão propostas no foro do
local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para
processar e julgar a causa. A ratio legis da utilização do local do dano
como critério definidor da competência nas ações coletivas é
proporcionar maior celeridade no processamento, na instrução e, por
conseguinte, no julgamento do feito, dado que é muito mais fácil
apurar o dano e suas provas no juízo em que os fatos ocorreram.
Precedentes citado: CC 97.351-SP, DJe 10/6/2009. STJ, 1ª Seção, AgRg
nos EDcl no CC 113.788-DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em
14/11/2012, divulgado no informativo nº 510.

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