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Tese Sabadin 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS E LINGUÍSTICA
LINHA: DIVERSIDADE LINGUÍSTICA NO BRASIL
TEMA: CRENÇAS E ATITUDES LINGUÍSTICAS EM COMUNIDADES DE
FRONTEIRA

MARLENE NERI SABADIN

CRENÇAS E ATITUDES LINGUÍSTICAS: ASPECTOS DA


REALIDADE NA TRÍPLICE FRONTEIRA

Salvador
2013
MARLENE NERI SABADIN

CRENÇAS E ATITUDES LINGUÍSTICAS: ASPECTOS DA


REALIDADE NA TRÍPLICE FRONTEIRA

Tese apresentada ao Curso de Doutorado em Letras, do


Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística da
Universidade Federal da Bahia – UFBA como requisito
para obtenção do grau de Doutora em Letras.

Orientadora: Profª. Drª. Suzana Alice Marcelino da Silva


Cardoso
Co-orientadora: Profª. Drª. Vanderci de Andrade Aguilera

Salvador
2013
Sistema de Bibliotecas da UFBA

Sabadin, Marlene Neri.


Crenças e altitudes linguísticas : aspectos da realidade na tríplice fronteira / Marlene Neri
Sabadin. - 2013.
220 f.: il.

Inclui anexos.
Orientadora: Profª. Drª. Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso.
Co-orientadora: Profª. Drª. Vanderci de Andrade Aguilera.
Tese (doutorado) - Universidade Federal da Bahia, Instituto de Letras, Salvador, 2013.

1. Sociolinguística. 2. Dialetologia. 3. Geografia linguística. 4. Plurilinguismo. 5. Linguagem


e línguas. I. Cardoso, Suzana Alice Marcelino da Silva. II. Aguilera, Vanderci de Andrade. III.
Universidade Federal da Bahia. Instituto de Letras. IV. Título.

CDD - 418
CDU - 81’27
MARLENE NERI SABADIN

CRENÇAS E ATITUDES LINGUÍSTICAS: ASPECTOS DA


REALIDADE NA TRÍPLICE FRONTEIRA

Esta tese foi julgada adequada para obtenção do grau de Doutora em Letras e aprovada em
sua forma final pelo Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística da Universidade
Federal da Bahia – UFBA.

Salvador, 17 de dezembro de 2013.

__________________________________________
Prof. Dr. Domingos Sávio Pimentel Siqueira
Coordenador do Curso

Banca Examinadora:

Profª. Drª. Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso


Orientadora
Universidade Federal da Bahia

Profª. Drª. Vanderci de Andrade Aguilera


Co-orientadora
Universidade Estadual de Londrina

Prof.ª Dr.ª Jacyra Andrade Mota


Universidade Federal da Bahia

Prof.ª Dr.ª Marcela Moura Torres Paim


Universidade Federal da Bahia

Prof.ª Dr.ª Aparecida Feola Sella


Universidade Estadual do Oeste do Paraná
Dedico à minha família, que soube
compreender os meus momentos de ausência,
pelo carinho e apoio, fundamentais nesta
caminhada.
AGRADECIMENTOS

A Deus por mais essa inspiração, que guiou meus passos, me deu proteção, sabedoria, força e
coragem durante todo o processo de execução deste estudo;
À Prof.ª Dr.ª Suzana Alice Marcelino Cardoso pela valiosa orientação, dedicação manifestada,
olhar cuidadoso nas leituras e em seus apontamentos, pelo apoio e compreensão nos
momentos difíceis e pela confiança depositada em mim ao longo desse processo;
Aos informantes de Foz do Iguaçu, Ciudad del Este e Puerto Iguazú, participantes desta
pesquisa, pela disponibilidade e atenção com que me receberam em suas casas e locais de
trabalho, pela acolhida carinhosa, sem os quais este trabalho não existiria;
Às instituições que tornaram esta tese possível. Ao Programa de Pós-Graduação em Letras
Dinter – Universidade Estadual do Oeste do Paraná e à Universidade Federal da Bahia;
À Universidade Estadual do Oeste do Paraná e à Secretaria Estadual de Educação do Paraná
pelo afastamento integral da docência para realizar meus estudos;
À Prof.ª Dr.ª Célia Marques Telles, pela acolhida em sua residência, durante a primeira
semana em Salvador para a realização do estágio de pesquisa e Tirocínio Docente na UFBA, e
também, pela receptividade e organização no encaminhamento das atividades de docência
durante o Estágio de Doutoramento realizado na Universidade Federal da Bahia;
Ao Prof. Dr. Américo Venâncio Lopes Machado Filho, que viabilizou o acompanhamento à
disciplina sob sua regência, LET A13 – Introdução ao Estudo de Língua Portuguesa e a
docência, nessa disciplina, realizada por mim na UFBA;
À Prof.ª Dr.ª Jacyra Andrade Mota e a Prof.ª Dr.ª Vanderci de Andrade Aguilera, pelas
valiosas contribuições no exame de qualificação;
Na certeza de que um trabalho como este não se faz sem o apoio e a contribuição efetiva de
professores, colegas de trabalho, amigos e familiares, e por temer o risco da injustiça por
omissão, estendo a todos meu mais sincero reconhecimento.
[...] como os cavaleiros que têm huns
vocabolos e os lavradores outros, e os
cortesãos outros, e os religiosos outros, e os
mecanicos outros, e os mercadores outros; ou
também se faz em terras esta particularidade,
porque os da Beira têm hũas falas e os
d’Alentejo outras. E os homens da
Estremadura são diferentes dos d’Antre Douro
e Minho, porque assi como os tempos, assi
também as terras criam diversas condições e
conceitos. E o velho, como tem o entender
mais firme com o que mais sabe, também suas
falas são de peso e as do mancebo mais leves.

(FERNÃO DE OLIVEIRA, [1536] 1975, p.


52)
RESUMO

A tese “Crenças e atitudes linguísticas: aspectos da realidade na Tríplice Fronteira” insere-se


no conjunto de pesquisas de cunho sociolinguístico e dialetológico sobre crenças e atitudes
linguísticas nos três municípios fronteiriços: Foz do Iguaçu, no Paraná (Brasil), Puerto Iguazú
(Argentina) e Ciudad del Este (Paraguai). A escolha da região se dá pela complexidade
sociolinguística marcada pelo espaço multiétnico da Tríplice Fronteira, onde se fazem
presentes núcleos de imigração de alemães, poloneses, italianos, ucranianos, libaneses, árabes,
argentinos, paraguaios, chineses e coreanos, entre outros. Para a composição do corpus foram
entrevistados vinte e quatro informantes radicados há mais de vinte anos em cada uma das
comunidades investigadas, distribuídos quanto ao grau de escolaridade, em dois grupos:
universitários e não universitários. Conforme pesquisas da área da Sociolinguística e da
Dialetologia, a língua falada em contexto de fronteira reflete as particularidades sociais,
regionais, culturais e históricas de cada localidade. Sendo assim, a Tríplice Fronteira, por ser
local de encontro de muitas culturas, despertou o interesse em verificar os fatores de variação
linguística decorrentes da crença e das atitudes linguísticas nas línguas em contato nessa área
de fronteira. Como espaço de contato de línguas, analisam-se, nesta tese, as crenças e atitudes
linguísticas dos falantes e os usos linguísticos na fronteira, espaço plurilíngue, compartilhado
por práticas resultantes de seu cruzamento.

PALAVRAS-CHAVE: Atitudes. Contato linguístico. Crenças. Variação.


ABSTRACT

The thesis “Beliefs and Attitudes language: aspects of reality in the triple border” is part of the
set-based studies on sociolinguistic and dialectological beliefs and attitudes about language in
the three border municipalities: Foz do Iguaçu, Paraná (Brazil), Puerto Iguazú (Argentina) and
Ciudad del Este (Paraguay). The choice of the region is given by the complex sociolinguistic
multiethnic space marked by the triple border where nuclei are present immigration of
Germans, Poles, Italians, Ukrainians, Lebanese, Arabs, Argentines, Paraguayans, Chinese and
Korean, among others. For the composition of the corpus were interviewed twenty-four
informants settled for more than twenty years in each of the communities investigated,
distributed as to schooling in two groups: university and non-university. As research in the
area of Sociolinguistics and Dialectology, the language spoken in the context of border
reflects the specific social, regional and cultural history of each location. Thus, the triple
border, being a meeting place for many cultures, has sparked interest in verifying the factors
of linguistic variation resulting from belief and language attitudes in the languages in contact
in this border area. As space language contact, are analyzed, in this thesis, the beliefs and
attitudes of language speakers and linguistic uses in border space linguistic environment,
shared by practices resulting from their intersection.

KEYWORDS: Attitudes. Language contact. Beliefs. Variation.


LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Línguas que os informantes dizem falar em Foz do Iguaçu................................108


Gráfico 2 – Línguas que os informantes dizem que falam, leem e escrevem em Foz do Iguaçu
.................................................................................................................................................109
Gráfico 3 – Línguas que os informantes dizem falar em Ciudad del Este..............................110
Gáfico 4 – Línguas que os informantes dizem que falam, leem e escrevem em Ciudad del
Este..........................................................................................................................................111
Gráfico 5 – Línguas que os informantes dizem falar em Puerto Iguazú.................................113
Gráfico 6 – Línguas que os informantes dizem que falam, leem e escrevem em Puerto Iguazú
.................................................................................................................................................115
Gráfico 7 – É possível ser julgado melhor pelas línguas que fala do que pela inteligência?
.................................................................................................................................................174
Gráfico 8 – As mulheres falam melhor o idioma na Tríplice Fronteira.................................177
Gráfico 9 – Escolha linguística e jeito diferenciado para lidar com as pessoas no trabalho
.................................................................................................................................................183
Gráfico 10 – Uma pessoa bastante instruída fala melhor na Tríplice Fronteira......................190
Gráfico 11 – Quem fala melhor na Tríplice Fronteira?...........................................................193
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Mapa com a localização da Tríplice Fronteira........................................................18


Figura 2 – Marco das Três Fronteiras.......................................................................................21
Figura 3 – Foz do Iguaçu..........................................................................................................25
Figura 4 – Santos Dumont........................................................................................................26
Figura 5 – Ponte Internacional da Amizade..............................................................................27
Figura 6 – Hidrelétrica de Itaipu...............................................................................................28
Figura 7 – Cataratas do Iguaçu.................................................................................................30
Figura 8 – Naipi........................................................................................................................30
Figura 9 – Ciudad del Este.......................................................................................................31
Figura 10 – Chipa paraguaia....................................................................................................35
Figura 11 – O artesanato...........................................................................................................35
Figura 12 – Puerto Iguazú.........................................................................................................35
Figura 13 – Fotomontagem do Passeio da Identidade..............................................................36
Figura 14 – Ponte Tancredo Neves...........................................................................................38
LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Perfil dos habitantes de Foz do Iguaçu..................................................................28


Quadro 2 – Nível de instrução dos habitantes de Foz do Iguaçu..............................................28
Quadro 3 – Perfil dos habitantes de Ciudad del Este……..…………………………………..33
Quadro 4 – Nível de instrução dos habitantes de Ciudad del Este...........................................33
Quadro 5 – Perfil dos habitantes de Puerto Iguazú...................................................................38
Quadro 6 – Nível de instrução dos habitantes de Puerto Iguazú..............................................38
Quadro 7 – Composição dos informantes.................................................................................96
Quadro 8 – Perfil dos informantes de Foz do Iguaçu (BR)......................................................98
Quadro 9 – Perfil dos informantes de Cidade del Este (PY) ...................................................99
Quadro 10 – Perfil dos informantes de Puerto Iguazú (AR)...................................................99
Quadro 11 – Língua aprendida na família...............................................................................107
Quadro 12 – Pode-se reconhecer a origem de uma pessoa pelo seu jeito de falar..................122
Quadro 13 – Línguas mais faladas na Tríplice Fronteira........................................................126
Quadro 14 – Ocasiões em que o bi/multilinguísmo se manifesta...........................................131
Quadro 15 – Dificuldades linguísticas na Tríplice Fronteira.................................................137
Quadro 16 – Mistura linguística na Tríplice Fronteira............................................................149
Quadro 17 – A importância da pluralidade linguística na Tríplice Fronteira.........................152
Quadro 18 – Lugares em que a pluralidade linguística se manifesta.....................................157
Quadro 19 – As línguas usadas para se ter sucesso na Tríplice Fronteira...............................165
Quadro 20 – A língua utilizada na contratação de empregados..............................................168
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................13
1.1 AS RAZÕES QUE DESENCADEARAM ESTA PESQUISA...........................................13
1.2 DELIMITAÇÃO DO OBJETO E OS OBJETIVOS DESTE ESTUDO...........................14
2 O PARANÁ E A TRÍPLICE FRONTEIRA: DADOS HISTÓRICOS............................18
2.1 A HISTÓRIA DO PARANÁ...............................................................................................18
2.2 A HISTÓRIA DA TRÍPLICE FRONTEIRA......................................................................20
2.2.1 Foz do Iguaçu/Brasil......................................................................................................24
2.2.2 Ciudad del Este/Paraguai..............................................................................................30
2.2.3 Puerto Iguazú/Argentina...............................................................................................35
3 LÍNGUA: CONCEITOS.....................................................................................................40
3.1 Línguas em Contato..........................................................................................................42
3.1.1 A Variação Linguística...................................................................................................51
4 CRENÇAS E ATITUDES LINGUÍSTICAS NA REGIÃO DE FRONTEIRA
BRASIL/PARAGUAI/ARGENTINA....................................................................................56
4.1 AS CRENÇAS E ATITUDES LINGUÍSTICAS: CONCEITOS E DEFINIÇÕES............56
4.1.1 Inter-relação entre Crenças e Atitudes.........................................................................62
4.1.2 Atitudes Linguísticas e Comunidades de Fala.............................................................65
4.2 CRENÇAS E ATITUDES: ESTUDOS REPRESENTATIVOS ........................................68
4.2.1 Estudos representativos na esfera internacional.........................................................74
4.2.2 Estudos representativos no Brasil.................................................................................79
4.3 CONCEITO DE PESQUISA SOCIOLINGUÍSTICA E DIALETOLÓGICA
DIRECIONADA ÀS CRENÇAS E ATITUDES LINGUÍSTICAS .........................................91
5 METODOLOGIA................................................................................................................95
5.1 CONSTITUIÇÃO DO CORPUS........................................................................................95
5.2 PERFIL SOCIOLINGUÍSTICO DOS INFORMANTES...................................................96
5.3 ESCOLHA DAS LOCALIDADES..................................................................................100
5.4 QUESTIONÁRIOS...........................................................................................................101
5.5 EXECUÇÃO DOS INQUÉRITOS...................................................................................102
6 ANÁLISE DOS DADOS....................................................................................................104
6.1 ANÁLISE DOS AGRUPAMENTOS DE PERGUNTAS.................................................105
6.1.1 Grupo 1 – Identificação da língua materna, da(s) língua(s) que mais fala e
daquela(s) em que escreve....................................................................................................105
6.1.2 Grupo 2 – Crenças e atitudes relativas à identificação de uma pessoa pelo seu jeito
de falar....................................................................................................................................117
6.1.3 Grupo 3 – Interferência linguística guarani x espanhol x português......................139
6.1.4 Grupo 4 – As escolhas linguísticas..............................................................................158
7 ANÁLISE DOS RESULTADOS.......................................................................................199
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................202
REFERÊNCIAS....................................................................................................................204
ANEXO A – Ficha do Informante...........................................................................................214
ANEXO B – Questionário das Atitudes Linguísticas do Brasil com o Paraguai e com a
Argentina.................................................................................................................................217
ANEXO C – Temas para discursos semi-dirigidos.................................................................219
ANEXO D – Texto para Leitura.............................................................................................220
1 INTRODUÇÃO

Nesta seção apresentam-se as razões que desencadearam a pesquisa, a delimitação do


objeto de estudo juntamente com os objetivos, as hipóteses e cada uma das seções que
constituem a tese.

1.1 AS RAZÕES QUE DESENCADEARAM ESTA PESQUISA

A proposta intitulada “Crenças e atitudes linguísticas: aspectos da realidade na Tríplice


Fronteira” insere-se no conjunto de pesquisas de cunho sociolinguístico e dialetológico sobre
crenças e atitudes linguísticas.
Um estudo de tal natureza pode contribuir para a compreensão da história destes
diferentes grupos, estabelecidos em cada uma das localidades. Pode, por outro lado, estender-
se ao campo da educação, fornecendo elementos para a reflexão sobre a relação das crenças e
atitudes linguísticas com o ensino-aprendizagem da língua portuguesa em contexto de
fronteira.
A escolha da região se deu pela complexidade sociolinguística marcada pelo espaço
multiétnico da Tríplice Fronteira Argentina, Brasil e Paraguai. Esse cenário torna-se cada vez
mais complexo com a presença de núcleos de imigração de alemães, poloneses, italianos,
ucranianos, libaneses, árabes, argentinos, paraguaios, chineses e coreanos, entre outros. Não
há como deixar de pesquisar a região quando se vive a aproximadamente 150 km da área de
intersecção de duas pontes, dois rios, três cidades, três países, três fronteiras.
O município de Foz do Iguaçu, devido à sua localização na fronteira com a cidade de
Puerto Iguazú, situada na Argentina, em que os habitantes falam espanhol e português, e em
Ciudad del Este, situada no Paraguai, cujos habitantes falam espanhol, guarani, yopará1 e
português, apresenta, na fala e nas demais manifestações do convívio social, trocas
linguísticas e culturais. Embora o multilinguismo seja uma constante neste cenário, observa-se
uma carência de pesquisas que abordem as crenças e atitudes linguísticas na Tríplice
Fronteira.

1
Yopará, em espanhol, ou jopará, em guarani, é uma variedade linguística, surgida com base no espanhol e
no guarani, falada no Paraguai e Norte da Argentina.

13
1.2 DELIMITAÇÃO DO OBJETO E OS OBJETIVOS DESTE ESTUDO

As características geográficas e históricas da região Oeste do Paraná favorecem a um


estudo pautado na interface etnográfica. Os movimentos de colonização podem ser apontados
como responsáveis pelo polimorfismo na fala paranaense, com destaque para áreas de maior
conservação e formação de ilhas linguísticas, conforme estudos de Aguilera (1990), Mercer
(1992), Rodrigues (2007), Altino (2007) e Busse (2010).
A compreensão dos mecanismos que regem o uso da língua na interação social e a
etnicidade dos envolvidos nos mais diversos contextos sociais pode, por exemplo, apontar
estratégias que auxiliam na melhoria das relações de convívio em comunidades plurilíngues,
muitas vezes propensas a tensões e a dificuldades na comunicação.
A partir dessas considerações, a presente pesquisa pretende responder às seguintes
questões: As três comunidades estudadas mantêm um intercâmbio linguístico, isto é, são
plurilíngues no sentido de conhecerem a língua falada pelo seu vizinho e de se
expressarem por meio dela? Quais são as interinfluências das línguas em contato?
Observa-se que a língua portuguesa falada na fronteira é diferente da língua falada em
outras regiões do Brasil. Segundo Sturza (2005, p. 48), “o português é ‘brasileiro’ e o
espanhol é ‘castelhano’”, e a diferença reside também no fato ligado à “hereditariedade
linguística – língua portuguesa de Portugal e língua espanhola da Espanha e aos seus
domínios políticos na América hispânica.”(STURZA, 2005, p. 48). Pode-se acrescentar a esse
fato, que há três dialetos falados na fronteira, conhecidos por yopará e guaraportunhol2
falados mais especificamente por algumas comunidades do Paraguai e da Argentina e o
portunhol que é falado pelos habitantes das três comunidades pesquisadas.
Na fronteira do Brasil com Argentina e Paraguai, o fluxo migratório trouxe um
contingente significativo de brasileiros que trabalham nos países vizinhos e vice-versa, que
contribuíram para estabelecer um comportamento linguístico diferenciado ao se tratar da
língua portuguesa nas comunidades de fronteira. Camblong (2002, p. 12) define fronteira
como

[…] um território de passagem, de tráfico perpétuo e de agitações simbólicas


obscuras, complexas e misturadas. Um mundo dinâmico no qual se usam várias
moedas, distintas línguas, mais de um documento pessoal, compra-se e se vende,
chora-se e se ri, ama-se e se odeia em movimentos contínuos de um lado para o
outro. No habitat fronteiriço as diferenças, a diversidade e as misturas são o pão

2
Mistura linguística do guarani com português e espanhol.
14
nosso de cada dia: tensões ideológicas, preconceitos e estigmas se entrelaçam com
simpatias ancestrais, afeto comunitário e idiossincrasia local reconhecida na língua
dos habitantes daqui e de nenhum outro lugar. Estamos, pois esboçando “outro
mapa” no qual faz ninho e se agita irônica sensação paradoxal: o que é exótico para
o centro, para nós é familiar; o que para o Estado-Nação é estrangeiro, para nós é
vizinho; o que as gramáticas distinguem, nós o usamos mesclado, pois também na
fala atravessamos fronteiras, e por sua vez, as fronteiras nos atravessam
continuamente3.

A fronteira aqui referida se caracteriza por uma mobilidade social paradoxal, por vezes
de conflito, por vezes de integração, pois apresenta uma série de traços socioculturais e
costumes comuns. Nesse espaço, as pessoas circulam, conversam e a prática linguística
apresenta outra dinâmica. É comum falar um ou outro idioma, mesclando os idiomas (fato
mais frequente entre o português e o espanhol), mantendo um nível de compreensão. Os
falantes são capazes de se fazer entender e a comunicação flui normalmente,
independentemente do nível de domínio linguístico que cada falante tenha do idioma do
outro.
A partir dessas considerações, levantam-se as seguintes hipóteses:
A primeira hipótese consiste em reconhecer que a maneira dos falantes se expressarem
não se configura como una e imutável. Pelo contrário, varia conforme o contexto, pois o
mesmo falante pode identificar-se com o espanhol argentino ou espanhol paraguaio, ou,
contrariamente, com o português brasileiro e como membro de uma classe social específica,
mais ou menos escolarizada.
A segunda hipótese está relacionada à diglossia, isto é, à natureza da aquisição da
língua portuguesa nas respectivas comunidades, vinculada ao seu uso nas relações comerciais
e turísticas.
A terceira hipótese admite que, por se tratar de um contexto plurilíngue com a
presença de falantes de várias regiões do Brasil, os falantes de português de Puerto Iguazú e
Ciudad del Este poderiam aproximar sua fala à do carioca, à do gaúcho, à do mineiro, à do

3
“[…] un territorio de pasajes, de tráfico perpetuo y de ajetreos simbólicos enrevesados, complejos y
mixturados. Un mundo dinámico en el que se manejan varias monedas, distintas lenguas, más de una
documentación personal, se compra y se vende, se llora y se ríe, se ama y se odia en movimientos
continuos de un lado al otro. En el habitat fronterizo las diferencias, la diversidad y los mestizajes son el
pan nuestro de cada día: tensiones ideológicas, prejuicios y estigmas se entrelazan con simpatías
ancestrales, afecto comunitario e idiosincrasia local reconocible a la legua por los de aquí nomás. Estamos
pues bosquejando “otro mapa” en el que anida y se agita el irónico tufillo paradojal: lo que para el centro
es exótico, para nosotros familiar; lo que para el Estado-Nación es extranjero, para nosotros, vecino; lo
que las gramáticas distinguen, nosotros lo usamos mezclado, pues también en el habla atravesamos
fronteras, y a la vez, las fronteras nos atraviesan en continuidad.” (CAMBLONG, 2002, p. 12). (Tradução
nossa).

15
paulista ou à de qualquer falante de outra região que lá se tenha feito presente.
Enfim, a comprovação dessas hipóteses que orientam a pesquisa pode documentar as
crenças e atitudes de falantes de uma língua em relação à língua ou à variante utilizada pelo
outro, como também, fatores de variação linguística decorrentes da crença e das atitudes
linguísticas nas línguas em contato nessa área de fronteira.
A proposta tem como objetivo geral analisar as crenças linguísticas representativas
dos diferentes grupos estabelecidos nos três municípios fronteiriços: Foz do Iguaçu, no estado
do Paraná (Brasil), Puerto Iguazú, na província de Misiones (Argentina) e Ciudad del Este, no
Departamento de Alto Paraná (Paraguai).
Como objetivos específicos propõem-se: (I) Identificar as crenças do falante da
fronteira relacionadas à língua de interação utilizada neste contexto; (II) Investigar se nas
comunidades de fronteira ocorre ou não a diglossia; (III) Identificar fatores de variação
linguística decorrentes das crenças e das atitudes linguísticas.
Neste estudo, analisam-se as crenças e atitudes linguísticas, a partir de dados
constantes de inquéritos aplicados a falantes do português, estabelecidos há mais de 20 anos,
em distintas comunidades da fronteira, que mantêm contato linguístico direto e contínuo entre
grupos de indivíduos representantes de culturas diversas e com as continuadas mudanças da
Língua Portuguesa e da Língua Espanhola observadas nas três cidades pesquisadas.
Para dar cumprimento ao proposto nos objetivos, esta tese está estruturada em sete
seções, a saber:
A primeira seção se constitui da parte introdutória, em que se apresentam a
justificativa, os objetivos e as hipóteses, enfim, os elementos que desencadearam a pesquisa.
A segunda seção traz alguns dados do Paraná, da Tríplice Fronteira e da origem de
cada uma das comunidades pesquisadas.
A terceira seção discute conceitos e definições de língua; de línguas em contato e
variação linguística.
A quarta seção trata da fundamentação teórica, do estudo das crenças e atitudes
linguísticas na região de fronteira Brasil/Paraguai/Argentina. As subseções tratam das crenças
e atitudes linguísticas: conceitos e definições; das crenças e atitudes: estudos representativos;
da inter-relação entre crenças e atitudes; das atitudes linguísticas e comunidades de fala; e do
conceito de pesquisa Sociolinguística e Dialetológica direcionada às crenças e atitudes
linguísticas.
A quinta seção trata dos procedimentos metodológicos para a preparação da pesquisa,

16
constituição do corpus, o perfil sociolinguístico dos informantes, escolha das localidades,
questionários e execução dos inquéritos.
A sexta seção traz a análise dos dados extraídos do corpus constituído das respostas
obtidas com os inquéritos aplicados em Foz do Iguaçu, Ciudad del Este e Puerto Iguazú, para
visualizar a realidade linguística de cada cidade e entender melhor o processo de variação da
língua em comunidades de fronteira.
A sétima seção expõe dos resultados obtidos por meio da análise dos dados para
verificar se as hipóteses e os objetivos traçados no princípio deste estudo se confirmam.
E a oitava seção apresenta as considerações finais a respeito do trabalho realizado.

17
2 O PARANÁ E A TRÍPLICE FRONTEIRA: DADOS HISTÓRICOS

Figura 1 – Mapa com a localização da Tríplice Fronteira

Fonte: Disponível em: <http://www.pmfi.pr.gov.br /portal2 /home_turismo/>. Acesso em: 02 de maio de 2011.

2.1 HISTÓRIA DO PARANÁ

A história do Estado do Paraná4 (WACHOWICZ, 2002, p. 160-163) remonta há


milhares de anos. As provas materiais dessa história estão presentes em todo o território
paranaense nos vários sítios arqueológicos pesquisados como as pinturas rupestres nos
Campos Gerais e os sambaquis5 no litoral. Nesses locais foram encontrados vestígios
materiais importantes que revelam como viviam os habitantes desta terra antes da vinda dos
primeiros europeus para a América. A ocupação européia no Brasil, em especial no Paraná,
aconteceu por duas vias: uma espanhola e a outra portuguesa.
O Estado do Paraná é caracterizado, historicamente, por um povoamento que teve

4
A palavra Paraná é de origem Tupi e significa: “Paraná. S.m. (PR) [Do G. para: mar + anã: semelhante,
parecido] Paraná: semelhante ao mar, grande como o mar.” (FILIPAK, 2002, p. 108 e 110).
5
Designação dada a antiquíssimos depósitos, situados ora na costa, ora em lagoas ou rios do litoral, e
formados de montões de conchas, restos de cozinha e de esqueletos amontoados por tribos selvagens que
habitaram o litoral americano em época pré-histórica.

18
orientação nas diversas fases econômicas pelas quais percorreu: tropeirismo6, madeira, mate, café
e soja. Essas fases resultaram num processo de povoamento irregular, no qual parcelas do território
foram ocupadas segundo as motivações de exploração econômica do momento. O início do
povoamento, ainda no período colonial, envolve as disputas territoriais entre Portugal e Espanha.
Em 1541, Dom Alvarez Nuñes Cabeza de Vaca, partindo da Ilha de Santa Catarina
seguiu por terra em direção a oeste tomando posse simbólica deste território em nome da
Espanha. Nesta fase a Coroa Espanhola cria cidades e algumas reduções para assegurar o seu
território determinado pelo Tratado de Tordesilhas – acordo bilateral entre os reinos ibéricos
de Portugal e Espanha.
No ano de 1554, é criada a primeira povoação européia em território paranaense, a vila
de Ontiveros, às margens do Rio Paraná, perto da foz do Rio Ivaí. Dois anos depois, o
povoamento se transfere para perto da foz do Rio Piquiri, recebendo o nome de Cuidad Real
del Guairá – hoje município de Terra Roxa – que juntamente com Vila Rica do Espírito Santo
– nas margens do Rio Ivaí – formou a província de Vera ou do Guairá, a qual pertencia boa parte
do atual território paranaense, “tinha a população indígena, de milhares de pessoas, desenvolvendo
atividades como o plantio de milho, mandioca, criação de gado e extração de erva mate, além de
outras ocupações.” (SANTOS, 2001, p. 19-20).
No início do século XVI, os portugueses criaram duas capitanias sobre o nosso litoral.
A primeira, a Capitania de São Vicente, na região compreendida entre a Barra de Paranaguá e
a de Bertioga. A segunda, a Capitania de Sant’Ana, desde a Barra de Paranaguá até onde fosse
legítima pelo Tratado de Tordesilhas; mas, referências históricas, datadas de 1540, dão conta
da existência de moradores na baía de Paranaguá vindos de Cananéia e São Vicente.
Em meados de 1600, intensifica-se a presença dos vicentinos (moradores da capitânia
de São Vicente) em todo o litoral e nos Campos de Curitiba. Em 1648, o povoado de
Paranaguá é elevado a categoria de Vila com a denominação de Nossa Senhora do Rosário de
Paranaguá.
O primeiro português a requerer terras em solo paranaense foi Diogo de Unhate, em
1614, que obteve uma Sesmaria na região de Paranaguá, localizada entre os rios Ararapira e
Superagüi. Em 1617, Gabriel de Lara funda uma povoação na Ilha da Cotinga, transferiu-a,
depois, para a margem esquerda do Rio Taquaré.
Mesmo após os tratados (como de Santo Ildefonso em 1777), no período imperial,

6
Atividade econômica ligada ao comércio de tropas de gado.
19
conflitos, como a Guerra do Paraguai7, as dificuldades de fixação persistiram no território
desmembrado da Província de São Paulo em 1853. As disputas com Paraguai e Argentina e,
posteriormente, com Santa Catarina (na questão do Contestado) avançaram até o início do século XX.
“Com isso, o Paraná viveu quase quatro séculos de estagnação econômica.” (NICHOLLS,
1971, p. 28).
O Paraná esta localizado na Região Sul do Brasil. Com 399 municípios, tem área de
199.316.694 Km². De acordo com o Censo realizado no ano de 2010 pelo IBGE a população
era de 10.444.526 habitantes.
Três tipos de clima são identificados no Paraná, definidos principalmente pela
localização do Estado, pelas temperaturas e pelos ciclos de chuva. No litoral, predomina o
clima tropical super-úmido, sem estação seca. Nas regiões norte, oeste e sudoeste predomina
o clima subtropical úmido mesotérmico, com verões quentes, sem estação seca, com poucas
geadas. Na região de Curitiba, nos campos gerais e sul, o verão é brando, sem estações secas e
ocorrem geadas severas. A temperatura média do Estado é de 18,5ºC.
O Paraná é subdividido em duas bacias de desaguamento: os rios que pertencem ao
grande sistema de captação do Rio Paraná e o complexo de rios que pertencem à bacia de
drenagem do Oceano Atlântico.
Os principais rios da bacia hidrográfica do Paraná são o Paranapanema, o Tibagi, o
Piquiri e o Iguaçu, que formam um complexo hidrográfico com enorme potencial energético.
Somente a bacia do Rio Iguaçu, que nasce ao lado de Curitiba e deságua no extremo oeste do
estado, no Rio Paraná, na fronteira com o Paraguai, tem potencial hidroelétrico para 11,3
megawatts.
A bacia hidrográfica do Atlântico abrange os sistemas hidrográficos do Rio Ribeira, da
baía das Laranjeiras, da baía de Antonina, do Rio Nhundiaquara, da baía de Paranaguá e da
baía de Guaratuba.

2.2 A HISTÓRIA DA TRÍPLICE FRONTEIRA

O Oeste paranaense destaca-se dentre as regiões do Paraná por estar na fronteira com
outros países. A sua formação histórica remete à história do próprio Brasil: a colonização
portuguesa e espanhola, os tratados entre Portugal e Espanha, a presença da companhia

7
As informações sobre a Guerra do Paraguai serão tratadas na seção 2.2, que discorre sobre a história da
Tríplice Fronteira.
20
jesuítica, a demarcação das fronteiras, os conflitos com o Paraguai, conforme vistos nas
seções anteriores.

Figura 2 – Marco das Três Fronteiras8

PARAGUAI

BRASIL ARGENTINA

Fonte: acervo pessoal

De acordo com pesquisas realizadas, Borstel (1992), Damke (1988), Pereira (1999),
Sabadin (2006), entre outros pesquisadores, apontam que os 19 municípios da região oeste do
Paraná, que fazem fronteira com o Paraguai e a Argentina, têm a sua história marcada pelos
imigrantes paraguaios, argentinos, indígenas, e descendentes de alemães, poloneses, italianos,
ucranianos, libaneses, chineses, coreanos, africanos, árabes e demais etnias. Conforme visto
na introdução, a Tríplice Fronteira une três países da América do Sul, com suas respectivas
cidades e no município de Foz do Iguaçu. Além da presença de imigrantes de todos os países,
é grande também o número de migrantes de todas as regiões brasileiras.
A delimitação dos domínios do Brasil e Paraguai, colônias de Portugal e da Espanha,
aconteceu pela primeira vez pela Bula de Alexandre VI, em 1493, logo alterada pelo Tratado
de Tordesilhas. Com a unificação das coroas de Portugal e Espanha de 1580 a 1640, ocorreu o
avanço das fronteiras portuguesas para o Ocidente. Em 1750, estes dois países assinaram o
Tratado de Madri e, em 1777, o de Santo Idelfonso. Em 1844, foi firmado entre Paraguai e
Brasil o Tratado de Limites, Aliança e Comércio, não ratificado pelo Brasil.
Apesar da região ter sido pouco ocupada durante os séculos XVI e XVIII por missões
jesuíticas, a demografia da região passou a ser alterada especialmente quando esta se tornou
um ponto de imigração após a Guerra do Paraguai, ocorrida entre 1864 e 1870, e que colocou
em combate o Paraguai contra o Brasil, Uruguai e Argentina. A guerra do Paraguai foi o maior

8
Fotomontagem do Marco das Três Fronteiras.
21
conflito armado internacional ocorrido no continente americano. A consolidação da República
do Paraguai e a ocorrência de duas guerras internacionais: Tríplice Aliança (1864-1870) e a
Guerra do Chaco9 (década de 1930) foram decisivas no processo de elaboração da identidade
paraguaia calcada na língua guarani. A Guerra do Chaco foi significativa para os militares da
época, porque, mais precisamente, em maio de 1933, o Comandante e Coronel Estigarribia,
ordena que o diálogo entre as tropas, as conversas telefônicas entre os Chefes e Oficiais com
seus subordinados sejam feitas em guarani. O fato de determinar a comunicação em guarani
estabelece um relacionamento de confiança entre eles que foi uma forma estratégica a favor
do país. A língua guarani se fortalece no decorrer de ambos os conflitos. Pela vantagem de ser
quase totalmente desconhecida pelos exércitos inimigos.
De fato, esta guerra dizimou boa parte da população paraguaia e exigiu do governo
daquele país incentivo para que imigrantes povoassem algumas regiões do país, em especial
as fronteiriças.
Do lado brasileiro, o povoamento iniciou em 1888 por meio da criação da colônia
militar do Iguaçu. Tanto Brasil como Argentina iniciam a ocupação da área por volta do
mesmo período.
Os fluxos migratórios de alemães e holandeses vieram engrossar o caldo humano e
oficial de populações brasileiras, argentinas e paraguaias em Iguaçu.
Wachowicz (2002, p. 242) relata que “um viajante perguntou a uma cabocla brasileira
sua nacionalidade, obteve como resposta: ‘Soy brasileña, señor, gracias a Dios’. Em Foz do
Iguaçu, o português era falado apenas pelos funcionários públicos”. Na sequência chegaram
imigrantes via Guarapuava e sulistas de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Em 1930, as
populações das obrages ultrapassavam 10.000 habitantes, quase todos estrangeiros
(WACHOWICZ, 2002, p. 243). Em 1931, a mão de obra das obrages foi nacionalizada por
Decreto-Lei. Nessa época, Foz do Iguaçu estava interligada e dependia da Argentina; o
dinheiro circulante era o peso argentino.
Nos anos sessenta, surge uma nova onda de imigração devido ao aumento de
investimento em infra-estrutura, especialmente por parte do Brasil, que teve como
consequência a ampliação da movimentação de bens e mão-de-obra na região.

9
“Guerra do Chaco foi um conflito armado entre a Bolívia e o Paraguai que se estendeu de 1932 a 1935.
Originou-se pela disputa territorial da região do Chaco Boreal, tendo como uma das causas a descoberta de
petróleo no sopé dos Andes”. Disponível em: <http://www.portalbrasil.net/brasil.htm>. Acesso em: 31 de
julho de 2012.

22
Essa imigração em massa gerou vários conflitos no país, entre brasileiros e indígenas e
camponeses paraguaios, conflitos esses em torno das questões sobre posse de terra e que são
visíveis até os dias de hoje. Os paraguaios sentem que foram invadidos e desapropriados pelos
brasileiros, que contaram com a ajuda e apoio do seu próprio governo, que possibilitou toda a
transferência e garantiu a legalidade da compra de propriedades por estrangeiros.
Assim, muitos indígenas e camponeses, por não conseguirem manter suas terras,
venderam-nas a um baixo custo aos brasileiros e com isso, até hoje, sofrem as consequências
da presença massiva desses estrangeiros no local.
Os conflitos envolvendo brasileiros, camponeses e indígenas paraguaios não se
resumem apenas à disputa pela terra; estão relacionados também à destruição florestal, uma
vez que a área fronteiriça destinada aos brasileiros era ocupada por uma reserva, e o uso de
agrotóxicos nas lavouras de soja tem provocado vários casos de intoxicação de camponeses na
região.
Apesar de Soares (2004) refutar qualquer singularização relacionada ao preconceito,
percebemos que alguns vocábulos são (re) criados e assumem novos significados e muitas
vezes essa atitude linguística é carregada de significado, como a depreciação do outro,
segundo Albuquerque (2009, p. 5):

[...] Assim, “che iru”, que em guarani significa “meu amigo”, “meu companheiro” os
brasileiros mudam para “chiru” ou “chiru mandioqueiro”, e passa a ser um termo
pejorativo (“bugre”, “índio”, “não civilizado”, etc.). De mesma forma, a palavra
portuguesa “rapaz” (“jovem”, “moço”) (...) se transforma em “rapai” na linguagem
paraguaia e também adquire um sentido depreciativo (“ignorante”, “inculto”, etc.).

Embora Albuquerque (2009) trace um dos ângulos das relações entre as comunidades,
isto é, a ressignificação dos vocábulos. O sentimento de pertença a uma comunidade com
diferentes costumes e outros aspectos extremos de diferenciação; muito embora, não seja isso
que ocorre em alguns casos, como se comprova com a utilização do termo “brasiguaio” que
adquiriu sentidos variados ao longo das duas últimas décadas, conforme constata Albuquerque
(2009, p. 8) que cita os diferentes empregos do termo:

[...] 1) ao imigrante pobre que foi para o Paraguai, não conseguiu ascender
socialmente e que, muitas vezes, regressou ao Brasil; 2) aos grandes fazendeiros
brasileiros no Paraguai; 3) aos filhos dos imigrantes que já nasceram naquele país e
têm a nacionalidade paraguaia; 4) aos imigrantes e seus descendentes que falam um
“idioma fronteiriço” e mesclam outros elementos culturais dos dois países; 5) a
todos os imigrantes brasileiros na nação vizinha.

23
Pode-se considerar também significativa a influência cultural brasileira via meios de
comunicação, músicas, danças, tradições e culinária nessa ampla zona de fronteira. Percebe-
se, que é muito comum assistir aos programas de televisão brasileiros em Puerto Iguazú e em
Ciudad del Este. Nos restaurantes, bares e casas noturnas é frequente o gosto pela música
brasileira. Assim como, em alguns ambientes de Foz do Iguaçu, com uma frequência menor,
isto é, esporadicamente, são ouvidas músicas dos países vizinhos, que têm se mostrado
sempre muito agradáveis aos brasileiros.
Destaca-se também que a integração internacional proposta para o bloco do Mercado
Comum do Sul (MERCOSUL), assinada em 26 de março de 1991, além de outras questões,
tem as questões linguística e cultural como elementos fundamentais para o seu sucesso. Desde
1991, os países membros do MERCOSUL se comprometeram a ensinar e aprender as línguas
comuns, português e espanhol, oferta obrigatória de espanhol no ensino médio brasileiro (Lei
11.161, 5/8/2005) e português no ensino médio argentino (Lei 26.468, 16/1/2009). Essas leis
obrigam as escolas a ensinar a língua àqueles estudantes que quiserem aprendê-las. A lei
argentina inclui o ensino primário na fronteira com o Brasil (províncias de Corrientes e
Misiones, e no nordeste da Argentina). Já a aprovação do acordo sobre ensino de português e
espanhol no MERCOSUL (PDC-2072/2009) (BRASIL, 2010), foi estabelecido pela
Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), em março de 2010. Trata-se de um
acordo que normatiza o ensino de português e espanhol como línguas estrangeiras nos países
do MERCOSUL (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai), porém não se sabe se esse acordo é
cumprido pelas escolas dos países que integram o MERCOSUL.

2.2.1 Foz do Iguaçu/ Brasil

De acordo com os Dados Socioeconômicos de Foz do Iguaçu (2011, online)10


descobertas arqueológicas feitas pela Universidade Federal do Paraná, mais especificamente
no reservatório de Itaipu, relatam que foram encontrados vestígios da existência de humanos
na região há mais seis mil anos antes de Cristo. Os últimos vestígios originam-se de indígenas
e de europeus (espanhóis e portugueses).

10
Dados Socioeconômicos de Foz do Iguaçu. Disponível em: <http://www.pmfi.pr.gov.br/Portal/Visualiza
Obj. aspx?IDObj=12845>. Acesso em: 31 de julho de 2011.
24
Figura 3 – Foz do Iguaçu

Hidrelétrica de Itaipu Hidrelétrica de Itaipu Templo Budista

Centro de Foz do Iguaçu Mesquita Cataratas do Iguaçu

Fonte: acervo pessoal

No ano de 1542, o espanhol Álvar Nuñes Cabeza de Vaca, chegou ao Rio Iguaçu e por
ele seguiu guiado por índios Caingangues. Ao chegar às Cataratas, batiza-as de “Salto Santa
Maria” nome que, com o tempo, foi substituído por sua primitiva denominação guarani:
Iguaçu, I – “água” e guaçu – “grande”. Segundo registros, Álvar Nuñes Cabeza de Vaca é
considerado o descobridor das Cataratas.
Foz do Iguaçu recebeu os primeiros habitantes em 1881, Pedro Martins da Silva
(brasileiro) e Manuel Gonzáles (espanhol). Tempos mais tarde chegaram os irmãos
Goycochéa, que dão início à exploração da erva-mate.
Ainda com registros obtidos na Prefeitura do Município, em julho de 1889, chegou ao
local a expedição do Engenheiro e Tenente José Joaquim Firmino. Em 22 de novembro do
mesmo ano, o Tenente Antonio Batista da Costa Júnior e o Sargento José Maria de Brito
fundaram a Colônia Militar na fronteira, que tinha competência para distribuir terrenos a
colonos interessados. O período marca também o início da ocupação do lugar por brasileiros,
paraguaios, argentinos, espanhóis e ingleses, já presentes na região e dedicados à extração da
erva-mate e da madeira, exportadas via Rio Paraná.
No ano de 1897, com a criação da Agência Fiscal, que tinha como chefe Capitão
Lindolfo Siqueira Bastos, 13 casas foram registradas e alguns ranchos de palha. Nos
primeiros anos do século XX, a população de Foz do Iguaçu chegou a aproximadamente
2.000 pessoas e a vila dispunha de uma hospedaria, quatro mercearias, um quartel militar
rústico, estação telegráfica, engenhos de açúcar e cachaça e uma agricultura de subsistência.
25
A Colônia Militar passou à condição de “Vila Iguassu” em 1910, distrito do Município
de Guarapuava. Na sequência, o Ministro da Guerra emancipou a Colônia, o povoamento civil
estava, então, aos cuidados do governo do Paraná, que, em 1912, criou a Coletoria Estadual
da Vila. Em 14 de março de 1914, pela Lei 1383, foi criado o Município de Vila Iguaçu,
instalado efetivamente no dia 10 de junho do mesmo ano, com a posse do primeiro prefeito,
Jorge Schimmelpfeng, e da primeira Câmara de Vereadores. Seus habitantes são designados
usualmente pelo gentílico iguaçuenses.

Figura 4 – Santos Dumont11

Fonte: acervo pessoal

A história do Parque Nacional do Iguaçu remonta ao ano de 1916, com a passagem de


Alberto Santos Dumont por Foz do Iguaçu. Conhecido como o Pai da Aviação, é considerado
o fundador do Parque Nacional do Iguaçu, conforme ilustração em destaque. Naquela época, a
área pertencia ao uruguaio Jesus Val. Santos Dumont foi quem intercedeu junto ao Presidente
do Estado do Paraná, Sr. Affonso Alves de Camargo, para que a área fosse desapropriada e
tornada patrimônio público.
Segundo dados da Prefeitura de Foz do Iguaçu, a estrada que liga Foz do Iguaçu a
Curitiba surge em 1920; era uma estrada precária, cheia de obstáculos. Em 1969, foi
inaugurado o asfaltamento da estrada que corta o Paraná de leste a oeste e possibilita o trajeto
de Foz do Iguaçu a Paranaguá.
Os Decretos nº 6506, de 17 de maio de 1994 e de nº 6587 de 14 de junho do mesmo
ano, consolidam e ampliam a área do Parque Nacional do Iguaçu dando-lhes os limites

11
Fotomontagem de Santos Dumont, registrada no Parque Nacional do Iguaçu, as placas ao lado, são as
que se encontram aos pés da estátua e foram ampliadas para melhor visualização.
26
propostos pelo chefe da seção de Parques Nacionais; os limites atuais são 185.000 hectares.
Os Dados Socioeconômicos (2011, online)12 registram que, com a inauguração da
ponte internacional da amizade (Brasil-Paraguai), em 1965, e inauguração da BR-277, ligando
Foz do Iguaçu a Curitiba e ao litoral, em 1969, o município teve seu desenvolvimento
acelerado pela intensificação do seu comércio, principalmente com a cidade paraguaia de
Ciudad del Este.

Figura 5 – Ponte Internacional da Amizade

Ponte vista da margem do rio Parte superior da Ponte

Fonte: acervo pessoal

Outro fator que contribuiu para o aumento da população e o índice de empregos em


Foz do Iguaçu foi a construção da Hidroelétrica de Itaipu (Brasil-Paraguai), denominação de
origem tupi-guarani que significa “A Pedra que Canta”. A usina foi iniciada na década de 70 e
causou fortes impactos em toda a região. Em 1960, o município contava com 28.080
habitantes; em 1970 com 33.970 e havia, em 1980, 136.320 habitantes, registrando um
crescimento de 385%. Para 2010, estimava-se uma população de 325.137 habitantes, segundo
dados da Prefeitura Municipal, número esse que o Censo 2010 não confirmou, indicando uma
população de 256.088 habitantes.
O clima de Foz de Iguaçu é subtropical úmido mesotérmico, classificado por Köppen,
um clima temperado e úmido com verão quente. A cidade tem uma das maiores amplitudes
térmicas anuais do estado, valor aproximado de 11°C de diferença média entre o inverno e o
verão. Isto se deve à menor influência das correntes marítimas do que a que ocorre em outros
municípios.

12
Dados Socioeconômicos de Foz do Iguaçu. Disponível em: <http://www.pmfi.pr.gov.br/Portal/Visualiza
Obj. aspx?IDObj=12845>. Acesso em: 31 de julho de 2011.
27
Figura 6 – Hidrelétrica de Itaipu

Fonte: acervo pessoal

Foz do Iguaçu se localiza no extremo-oeste do Paraná. O acesso ao município pode


ser: a) terrestre pela Rodovia Federal BR-277 (Brasil), Ponte Internacional da Amizade
(Paraguai) e Ponte Internacional Tancredo Neves (Argentina): b) fluvial pelos rios Paraná,
Iguaçu e pelo Lago de Itaipu; c) aéreo pelo Aeroporto Internacional de Foz do Iguaçu.
O Quadro 1 mostra o perfil geral dos habitantes do município de Foz do Iguaçu, de
acordo com sexo (homem/mulher) e o Quadro 2 apresenta o nível de instrução escolar dos
habitantes.

Quadro 1 – Perfil dos habitantes de Foz do Iguaçu


SEXO HABITANTES PERCENTUAL
Homens 124.218 48,50%
Mulheres 131.870 51,50%
Total 256.088 100%

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística –IBGE (2010)

Quadro 2 – Nível de instrução dos habitantes de Foz do Iguaçu

Nível de Instrução dos Habitantes acima de 15 HABITANTES HOMENS MULHERES


Anos
256.088 124.218 131.870
Sem instrução 30,6% 17,9% 12,7%
Ensino Fundamental Completo 30,3% 12,4% 17,9%
Ensino Médio Completo 36% 15,6% 20,4%
Ensino Universitário Completo 3,71% 1,26% 2,45%

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2010)

De acordo com os dados registrados do município de Foz do Iguaçu pelo Ministério da


Educação e Cultura (MEC, 2010) e Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

28
Anísio Teixeira (INEP, 2010, online)13 foram matriculados 1.770 alunos na Creche; 3.299
alunos no Ensino Pré-escolar; 19.690 alunos nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental;
18.811 alunos no Anos Finais do Ensino fundamental; 10.699 alunos no Ensino Médio e
foram registrados 11.948 alunos no Ensino Superior. Percebe-se que a maioria dos
iguaçuenses vai para o mercado de trabalho com baixa escolaridade, pouca qualificação
profissional, e que a outra parcela de escolarizados e com qualificação profissional é menor,
comparando com o índice de alunos que entram no Ensino Fundamental.
Segundo dados do IBGE (2010, online)14, o índice de natalidade de homens é maior do
que o de mulheres. Essa prevalência do sexo masculino se mantém até os 14 anos,
verificando-se que a partir dos 15 anos há uma redução significativa de homens, no
município, com o aumento do número de mulheres. As estatísticas apontam, também, que as
pessoas estão vivendo mais, como indicam dados de censos anteriores, cuja estimativa de vida
era em torno dos 68 anos, em confronto com os dados de 2010 que mostram a existência de
16 moradores, dos quais 10 são mulheres, com mais de 100.
A origem das Cataratas do Iguaçu data de 120 milhões de anos, resultado de uma
sequência de erupções vulcânicas. Sua formação habita o imaginário da população local com
lendas indígenas que narram a respeito do maior conjunto de quedas d’água do planeta. Uma
delas diz que índios caingangues, que habitavam as margens do Rio Iguaçu, acreditavam que
o mundo era governado por M'BOY, o deus serpente, filho de Tupã.
A partir desse fato, surgiu a Lenda das Cataratas do Iguaçu e suas várias formas de
contar e encantar a população em geral, uma das quais, registrada no site (2011) do Parque
Nacional do Iguaçu, aqui se reproduz.

Lenda das Cataratas15

Conta-se que os índios Caigangues, habitantes das margens do Rio Iguaçu, acreditavam que o
mundo era governado por M'Boy, um deus que tinha a forma de serpente e era filho de Tupã. Igobi, o
cacique dessa tribo, tinha uma filha chamada Naipi, tão bonita que as águas do rio paravam quando

13
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Disponível em: <http://
portal.mec.gov.br/index.php?option=comcontent&view=article&id=206:inep&catid=122:inep-estudos-e-
pesquisas&Itemid=229>. Acesso em: 05 de novembro de 2012.
14
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/
topwindow.htm?1>. Acesso em: 05 de maio de 2011.
15
Figura de Naipi e Lenda das Cataratas. Disponível em: <http://www.cataratasdoiguacu.com.br/portal/
paginas/226-lenda-das-cataratas.aspx >. Acesso em: 30 de abril de 2011.
29
a jovem nelas se mirava. Devido à sua beleza, Naipi era consagrada ao deus M'Boy, passando a viver
somente para o seu culto. Havia, porém, entre os Caingangues, um jovem guerreiro chamado Tarobá
que, ao ver Naipi, por ela se apaixonou.

Figura 7 – Cataratas do Iguaçu

Fonte: acervo pessoal

No dia da festa de consagração da bela índia, enquanto o cacique e o pajé bebiam cauim
(bebida feita de milho fermentado) e os guerreiros dançavam, Tarobá aproveitou e fugiu com a linda
Naipi numa canoa rio abaixo, arrastada pela correnteza. Quando M'Boy percebeu a fuga de Naipi e
Tarobá, ficou furioso. Penetrou então as entranhas da terra e, retorcendo o seu corpo, produziu uma
enorme fenda, onde se formou a gigantesca catarata.
Envolvidos pelas águas, a canoa e os fugitivos caíram de grande altura,
desaparecendo para sempre. Diz a lenda que Naipi foi transformada em uma
das rochas centrais das cataratas, perpetuamente fustigada pelas águas
revoltas.Tarobá foi convertido em uma palmeira situada à beira de um
abismo, inclinada sobre a garganta do rio. Debaixo dessa palmeira acha-se a
Figura 8 – Naipi entrada de uma gruta sob a Garganta do Diabo onde o monstro vingativo
vigia eternamente as duas vítimas.

2.2.2 Ciudad del Este/Paraguai

Ciudad del Este, que faz divisa com Foz do Iguaçu, é conhecida por seu vasto
comércio de produtos importados, mas pouco conhecida pelas atrações turísticas, tradições,
cultura, praças, lagos e jardins presentes neste cenário, que na maioria das vezes é destacado
pela violência, pelo crime e pelas atitudes ilegais, tal como: contrabando de produtos eletro-
eletrônicos, armas e drogas.

30
Figura 9 – Ciudad del Este

Aduana Entrada de Ciudad del Este Praça

Centro da cidade Camelôs Catedral Saída da cidade

Fonte: acervo pessoal

Segundo o Atlas Censal del Paraguay (2004, p. 143), foi no início do século XX que
Don Carlos Antônio Lopez fez uma tentativa frustrada de colonizar a região, pois a mata era
fechada e habitada pelos índios guaranis que estavam espalhados pela selva. Após a Guerra da
Tríplice Aliança, esse território passou à especulação privada que começou a comercializar a
madeira local, sem fundar povoados, e sim pequenas madeireiras e pequenos portos para
despachar a madeira pelo rio, conhecidos por Puerto Adela, Puerto Irala, Puerto Ñacunday,
entre outros. E ainda de acordo com o referido Atlas, até metade do século XX eram as
empresas privadas que se beneficiavam da madeira extraída na região.
Em julho de 1945, os territórios de San Pedro e Itapuá foram divididos, e por meio do
Decreto Divisão Política do Território da República foi criado o Departamento de Alto Paraná.
A partir de então, com a construção da rodovia pavimentada, começa a surgir o pequeno
povoado que se transforma no que se conhece hoje por Ciudad del Este, considerada a
segunda cidade mais importante no Paraguai, fundada em 3 de fevereiro 1957, isto é,
quatrocentos e vinte anos depois de Assunção (1537), primeira cidade colonial e atual capital
do país.
De acordo com o Atlas (2004, p. 143), Ciudad del Este já teve dois outros nomes: o
primeiro, Puerto Flor de Lis e depois Puerto Presidente Stroessner em homenagem ao

31
presidente Alfredo Stroessner. Após a sua deposição, em 1989, a cidade passou a ser
denominada Ciudad del Este. A cidade também é conhecida pela alcunha de “cidade Jardim”,
por ser bastante arborizada e apresentar belos lagos e jardins em seu interior.
Observa-se também que há desigualdades nas condições de vida rural, e esse fato é
fonte de conflitos. Tal situação resulta da opressão política de que muitos camponeses e
indígenas paraguaios são vítimas, e de questões vinculadas às terras compradas por
brasileiros.
Ao enfrentar esse tipo de realidade complexa e perversa, as terras passam a ter um
valor comercial elevado, os camponeses e indígenas são expulsos desses locais, e, sem
trabalho, eles partem para a criminalidade. Esse fato gera insegurança nas zonas aduaneiras,
enfim, constrangimentos que dificultam o bem-estar social.
Dessa forma, os pequenos produtores e os sem-terras (campesinos) lutam
principalmente com os grandes proprietários brasileiros. Os brasiguaios que conseguiram
ascender socialmente controlam importantes setores da economia, da política e da cultura
local nas principais cidades do Paraguai.
De acordo com a BBC Brasil (2012, online)16 mais de “350 mil brasileiros vivem em
terras brasiguaias”.
Os primeiros brasileiros a migrarem para o Paraguai, principalmente no Departamento
de Alto Paraná – distante cerca de 50 quilômetros da fronteira – começou na década de 60 a
pedido do próprio ditador do Paraguai Alfredo Stroessner (1954-1989), impressionado com a
força de trabalho desses sulistas.
No acordo, o militar prometeu proteger os imigrantes, concedendo-lhes os direitos
pátrios. Desde então, a tecnologia aliada ao trabalho dos imigrantes colocou o país vizinho no
Mapa da produção de grãos, tornando-o o segundo maior exportador de soja da América
Latina.
Segundo dados da Dirección General de Estadística, Encuestas y Censos – DGEEC, a
cidade está situada no extremo leste do país, às margens do Rio Paraná, é conhecida como a
capital do Departamento de Alto Paraná, está localizada a 327 km de Assunção e com uma
população de 367.310 habitantes (DGEEC, 2011, p. 75).
O Quadro 3 mostra o perfil geral dos habitantes do município de Ciudad del Este de
acordo com o sexo (homem/mulher) e o Quadro 4 traz dados referentes à instrução escolar

16
JORNAL, BBC Brasil. Disponível em:<http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2012/06/120626
_paraguai_semterras_jf.shtml>. Acesso em: 02 de agosto de 2012.
32
(DGEEC, 2011, p. 95-103). Registra-se que os alunos alfabetizados superam os não
alfabetizados da faixa etária de 15 anos a mais.

Quadro 3 – Perfil dos habitantes de Ciudad del Este


SEXO HABITANTES PERCENTUAL
Homens 224.348 61,08%
Mulheres 142.962 38,92%
Total 367.310 100%

Fonte: Dirección General de Estadística, Encuestas y Censos – DGEEC (2011)

Quadro 4 – Nível de instrução dos habitantes de Ciudad del Este

Nível de Instrução dos habitantes acima de 15 Anos HABITANTES HOMENS MULHERES

367.310 224.348 142.962


Sem instrução 5,3% 4,7% 6%
Ensino Fundamental Completo 44,6% 46,1% 42,4%
Ensino Médio Completo 37,2% 38,2% 35,7%
Ensino Universitário Completo 12,9% 11% 15,9%

Fonte: Dirección General de Estadística, Encuestas y Censos – DGEEC (2011)

Segundo dados do DGEEC (2011, p. 107), Ciudad del Este revela grande crescimento
populacional nos últimos anos, observa-se que o número de estudantes matriculados no
ensino fundamental aumentou muito nas últimas décadas, e os estudantes matriculados no
ensino médio apresentaram crescimento ainda maior do que os dados registrados em Censos
anteriores.
O acesso a Ciudad del Este pode ser feito pela Ponte Internacional da Amizade que a
une a Foz do Iguaçu, Brasil. Há dois portos fluviais de embarque utilizados para a produção
de soja e outros itens agrícolas na região — La Paz, em Hernandarias, e das Três Fronteiras,
em Presidente Franco — e o Aeroporto Internacional “Guarani”, localizado na Rota 7 (a 320
km de Assunção), um terminal aéreo que possibilita o pouso de aeronaves de pequeno, médio
e grande porte.
A cidade é responsável por metade do Produto Interno Bruto (PIB) paraguaio, é a
segunda cidade depois de Assunção com maior índice populacional e a terceira maior zona
franca de comércio do mundo, perdendo apenas para Miami e Hong Kong (DGEEC, 2009, p.
60). Pode-se acrescentar a esses dados que a venda de eletricidade da usina Hidrelétrica de
Itaipu para o Brasil gera mais de trezentos milhões de dólares de renda anual para o país.
As línguas de comunicação são o guarani, o espanhol e o português, não só por estar
localizada na fronteira com o Brasil, mas também pelo grande contato com os brasileiros que

33
são os grandes consumidores do comércio local. Além dessas línguas, outras vozes ecoam
neste contexto plurilíngue, segundo Rabossi (2004, p. 2):

[...] vozes nas conversas e nas promoções dos vendedores que ofereciam seus
produtos, nas negociações de preços, nas consultas ou nas discussões. E aí, as
línguas e os switches entre elas, os entendimentos e os mal-entendidos. O guarani e
o espanhol. O português, o árabe e o chinês – mandarim, cantonês ou taiwanês. O
inglês, o hindu e o coreano. As notícias em árabe na rede Al-jaze era – antes que
ficasse famosa com a guerra do Iraque - em algum canto das casas de eletrônicos ou
dos estandes de programas de jogos de computador. As transmissões em português
da Rede Globo, na tela gigante da praça de alimentação do Shopping Vendôme, onde
se misturavam os cheiros de feijão e churrasco dos restaurantes brasileiros, com o
cheiro de massa de esfiha e quibe do restaurante Líbano.

A região também se destaca pelos doces caseiros feitos de leite e frutas de Caacupé,
feitos em indústrias caseiras: a tradicional Chipa paraguaia. Da integração entre Brasil e
Paraguai surge o dialeto conhecido por “portunhol”, uma mistura de português com espanhol.
Não é só a com a língua que isso ocorre, pois os costumes e tradições se mesclam: brasileiros
tomam tererê17 e comem chipa, paraguaios ouvem a música brasileira.
A cidade também apresenta um tipo de artesanato tradicional, trabalhos feitos com
madeira nobre, com plumas, com penas, com fibras naturais, com barro, com sementes, entre
outros. Ciudad del Este se caracteriza por uma diversidade cultural visível, que se manifesta
no artesanato local, tapeçarias, colares, canastras, artigos domésticos e outros produtos de fino
acabamento. O artesanato indígena oferece delicados bordados têxteis conhecidos como aho
poí18, arte pré-colombiana que consiste em cerâmicas decoradas e ornamentos pessoais do
período colonial conhecida como jesuítica – guarani, inspirados no renascimento barroco. O
encaixe ñandutí19 é um tecido fino utilizado nas roupas brancas pelas paraguaias; outros
artesanatos como copos de chifre, redes, cobertores e muitos outros produtos que se destacam

17
1. Refresco de mate ou erva-mate (Ilex paraguariensis), servido em cuia ou guampa, sorvido com
bombinha, e que se distingue do chimarrão por ter água fria em vez de água quente. É bebida característica
dos Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e do Paraguai. De maneira geral, o tererê é degustado
puro ou com suco de limão, no período da tarde, em reuniões nas calçadas das ruas mais tranquilas das
cidades – nessas reuniões há apenas uma cuia, que gira de mão em mão. 2 Conversa, bate-papo, que se
tem durante a merenda, entre os dois turnos de trabalho. Disponível em: <http://www.aureliopositivo.
com.br/>. Acesso em: 02 de maio de 2011.
18
Bordado em estilo rococó. Disponível em: <http://ciudaddeleste.galeon.com/aficiones250736.html>.
Acesso em: 02 de maio de 2011.
19
Encaixe muito fino que fazem as paraguaias; do guarani, tecido muito fino utilizado na América do Sul
para toda roupa branca. Disponível em: <http://www.aureliopositivo.com.br/>. Acesso em: 02 de maio de
2011.

34
pela criatividade e destreza do artesão.

Figura 10 – Chipa paraguaia Figura 11 – O artesanato20

Fonte: acervo pessoal

Fonte: acervo pessoal Fonte: http://3.bp.blogspot.com

2.2.3 Puerto Iguazú / Argentina

As imagens, da Figura 12, representam um pouco do que é a cidade de Puerto Iguazú,


a fotomontagem da feira-livre. Nesse espaço as pessoas se reúnem para saborear e comprar
produtos como: queijo, salame, azeitonas, doce de leite, alho, entre outros produtos. Observa-
se também que o nome de um dos estabelecimentos está em português “Barraca do Papagaio”.
A feira ou feirinha, como é conhecida, é bastante frequentada por brasileiros, logo, alguns
estabelecimentos têm seus nomes em português como uma loja de azeitonas e vinhos entre
outras mercadorias, chamada “Salame Maluco”.

Figura 12 – Puerto Iguazú

Trevo de Puerto Iguazú Avenida central Praça San Martin

20
Artesanato. Disponível em: <http://3.bp.blogspot.com/_kX_ykC5Luyc/SAVSh3aA7artesanato.jpg>.
Acesso em: 02 de maio de 2011.

35
Catedral Feira – livre

Fonte: acervo pessoal

Conforme visto anteriormente, o explorador espanhol Álvar Núñez Cabeza de Vaca


descobriu as Cataratas do Iguaçu em 1541. Nesse mesmo período chegam os espanhóis, que
não interferem na população local, que permaneceu povoada por indígenas até o século XIX.

Figura13 – Fotomontagem do Passeio da Identidade

Fonte: acervo pessoal

As imagens, do Paseo del la indentidad, retratam, por meio dos desenhos, um pouco
da história da origem do povo de Puerto Iguazú, as raízes indígenas, os rituais, as disputas
pela terra e seu cultivo, à religião, a família, assim como também a evolução histórica deste
território. A história é contada por meio dos seis murais expostos que transmitem a mensagem
do respeito as diferentes identidades. A praça está localizada na área central da cidade. Ponto
de encontro dos moradores da cidade, que se reúnem para conversar, a praça também é

36
frequentada por turistas que querem saber um pouco mais a respeito das origens do local.
De acordo com Instituto Nacional de Estadística y Censos (INDEC, 2010, online)21,
em 1902, o governo argentino destina uma área das terras para o que, futuramente, formaria o
Parque Nacional argentino e o Parque Nacional do Iguaçu. Em 1907, Gibaja e Nuñez
retornam à cidade e instalam o primeiro hotel, pouco antes de surgir a primeira escola. Em
1916 aparece o primeiro registro civil, em 1928 surge o primeiro posto dos correios e outros
acontecimentos fundamentais para que fosse oficializado o futuro município.
Em 1943, surge o Parque Nacional do Iguaçu, a área urbana de Puerto Aguirre é
delimitada, mas só em 1948 são vendidos os primeiros terrenos urbanos.
Puerto Iguazú está localizada na Argentina, é província de Misiones e foi fundada em
12 de agosto de 1901. Seus habitantes são chamados de Iguazuenses. É a quarta cidade mais
importante da província e fica a 23 km das Cataratas do Iguaçu, principal pólo turístico da
região. A cidade conta também com o comércio internacional devido a sua proximidade com o
município de Foz do Iguaçu através da ponte Internacional Tancredo Neves que une os dois
países.
A cidade de Puerto Iguazú apresenta uma população de 81.215 habitantes (INDEC,
2010, online). Com o aumento da população, nos últimos anos, a cidade passa a ocupar o
terceiro lugar na província. Grande parte da população é mestiça devido à mistura de
indígenas, europeus (portugueses, italianos, ucranianos, espanhóis, alemães entre outros) e,
em menor quantidade, africanos. Sua população é marcada também pela presença de
brasileiros e paraguaios que não aparecem no Censo, porém trabalham na comunidade e
vivem em seus respectivos países. Foram registrados também, aproximadamente 600
habitantes indígenas da reserva Mbya Guarani: Fortín Mbororé e Yriapú (INDEC, 2010,
online).
No final de 1982, os presidentes João Batista Figueiredo e Roberto Bignone
acordaram a construção da Ponte Brasil/Argentina, que atravessa o Rio Iguaçu, inaugurada
em 1985, com o nome de Ponte Tancredo Neves pelos presidentes José Sarney e Raúl
Alfonsín.
O Quadro 5 mostra o perfil geral dos habitantes do município de Puerto Iguazu de
acordo com o sexo (homem/mulher) e o Quadro 6 apresenta o nível de instrução escolar dos

21
Instituto Nacional de Estadística y Censos (INDEC). Disponível em: http://www.indec.gov.ar/cgibin/Rp
WebEngine.exe/PortalAction?&MODE=MAIN&BASE=CPV2001ARG&MAIN=WebServerMain.inl>.
Acesso em: 06 de maio de 2011.

37
habitantes.

Quadro 5 – Perfil dos habitantes de Puerto Iguazú

SEXO HABITANTES PERCENTUAL


Homens 41.031 50,52%
Mulheres 40.184 49,48%
Total 81.215 100%

Fonte: Instituto Nacional de Estadística y Censos – INDEC (2010)

Quadro 6 – Nível de instrução dos habitantes de Puerto Iguazú

Nível de Instrução dos Habitantes acima de 15 Anos HABITANTES HOMENS MULHERES


81.215 41.031 40.184
Sem Instrução 12,9% 7,7% 5,2%
Ensino Fundamental Completo 51% 45,8% 47,3%
Ensino Médio Completo 29,7% 42,29% 42,32%
Ensino Universitário Completo 6,39% 4,21% 5,18%

Fonte: Instituto Nacional de Estadística y Censos – INDEC (2010)

Conforme se pode constatar, observando os dados do Quadro 6, o nível de instrução


das mulheres supera os índices de instrução dos homens. O índice de pessoas sem instrução
de acordo com os últimos censos tem diminuído, e o acesso a universidade ainda é privilégio
de poucos. Tudo isso reflete a situação socioeconômica do município, cuja renda tem se
mantido no setor gastronômico e turístico.
O acesso terrestre à cidade de Puerto Iguazú é feito por meio da Ponte Tancredo Neves
que une as rodovias Nacional 12 AR e BR 469. O acesso fluvial pode ser feito pelo Rio
Iguaçu e o acesso aéreo é feito pelo aeroporto Internacional de Puerto Iguazú. O Aeroporto é
um dos meios de acesso mais utilizados para chegar ao Norte da Argentina porque, por meio
fluvial, não é mais uma prática comum neste município.

Figura 14 – Ponte Tancredo Neves

Fonte: acervo pessoal

38
A cidade possui um centro comercial próximo da Ponte Internacional Tancredo Neves.
No centro da cidade há bancos, casas de câmbio, bares, cassinos, restaurantes, lojas de roupas,
lojas de equipamentos esportivos, discotecas, pubs, delicatessen, panificadoras entre outras.
Puerto Iguazú apresenta atrações turísticas, tais como as Cataratas do Iguaçu, o Marco das três
Fronteiras, a feira artesanal, o Museu de Imagens da floresta, o Museu Mbororé, o Parque
Natural Municipal Luis Honório Rolón e o centro de reabilitação para aves Güira Oga.

39
3 LÍNGUA: CONCEITOS

“Os homens fazem a língua, e não a língua os homens” (FERNÃO DE OLIVEIRA,


([1536] 1975, p. 43)

Fernão de Oliveira ([1536] 1975) enfoca a oralidade demonstrando a identidade e as


particularidades do povo pela estrutura do falar. A partir dessa epígrafe sobre a língua, outras
reflexões e outros escritos serão abordados neste capítulo com o objetivo de entender, refletir
e conceituar língua, já entendida como elemento de variação e mudança, porque a língua é
feita pelos homens.
A diacronia de uma língua é feita pelo povo que usa essa língua. Pelo viés das teorias
sobre a natureza das línguas e das representações sobre a mudança linguística e às variações
da língua histórica, Fernão de Oliveira ([1536] 1975, p. 45) trata a língua associada ao
desenvolvimento cultural. Segundo o autor, a língua é constituída historicamente e sua
articulação diz respeito aos costumes e às normas sociais. A função elementar da língua é ser
expressão do pensamento e meio de comunicação. Por meio da língua, constroem-se
identidades e consciências e maneiras de ver e ser no mundo. A obra gramatical de Fernão de
Oliveira ([1536] 1975, p. 52) não somente registra formas e conteúdos da língua e dos falares
portugueses como deixou marcas documentais para a análise da sociedade portuguesa de
quinhentos.
Através do uso da língua materna, os homens se comunicam, se constituem, por meio
da reflexão sobre a língua e autores elaboram teorias. Ao tratar da linguagem, crenças, ideais e
valores despontam na educação como elemento constitutivo da cultura e da língua, uma vez
que semelhanças e diferenças se consolidam na cultura da analogia, refletindo assim a
maneira de conhecer e ser de seu tempo.
Na visão de Saussure ([1916] 1996, p. 22), a linguagem é composta de duas partes: a
língua, essencialmente social porque é convencionada por determinada comunidade
linguística; e a fala, que é secundária e individual, ou seja, é veículo de transmissão da língua,
que se concretiza pelos falantes através da fonação e da articulação vocal.
Alvar (1970, p. 147) define língua como, “um sistema linguístico caracterizado por ser
diferenciado, por ter um alto grau de nivelação, sendo um importante veículo de tradição

40
literária, e às vezes, por impor-se a sistemas linguísticos próprios”22.
Para Coseriu (1979, p.19), “a língua não pode ser isolada dos fatores externos – isto é,
de tudo aquilo que constitui a fisicidade, a historicidade e a liberdade expressiva dos
falantes”. A língua deve ser entendida, primeiramente, como “função”, depois como
“sistema”, um “sistema de oposições funcionais e realizações normais”. Coseriu (1979, p.
183) informa que a língua é primeiro sistema e depois tradição, ou vice-versa, mas é, ao
mesmo tempo, e a todo instante, “tradição sistemática” ou “sistema tradicional”.
Quanto à dicotomia língua e fala, Coseriu (1979) propõe a tríade sistema, norma e
fala, considerando importante diferenciar nas estruturas que constituem a língua: o que é
simplesmente normal ou comum (norma) abrange tudo que é estabelecido e comum nas
realizações linguísticas tradicionais (seja fossilizado ou não), e o que é oposicional ou
funcional (sistema), pois, de acordo com Coseriu (1979, p. 50):

O sistema é sistema de possibilidades, de coordenadas que indicam os caminhos


abertos e os caminhos fechados de um falar compreensível numa comunidade; a
norma, em troca, é um sistema de realizações obrigatórias, consagradas social e
culturalmente: não corresponde ao que se pode dizer, mas ao que já se disse e
tradicionalmente se diz na comunidade considerada”. O sistema abrange as formas
ideais de realização duma língua (...) a norma, em troca, corresponde à fixação da
língua em moldes tradicionais; e neste sentido, precisamente, a norma representa a
todo momento o equilíbrio sincrônico (externo e interno) do sistema.

Coseriu (1979, p. 16) comprova que não há nenhuma contradição entre “sistema e
historicidade”, ao contrário: “a historicidade da língua implica a sua sistematicidade”, porque,
sendo a língua um saber, ela é aprendida daqueles que “falam melhor”, dos que sabem. E a
esse respeito, informa que “o ouvinte adota o que não sabe, o que o satisfaz esteticamente, o
que lhe convém socialmente ou o que lhe serve funcionalmente. A adoção é, por isso, um ato
de cultura, de gosto e de inteligência prática.” (COSERIU,1979, p. 78). A partir dessa citação,
infere-se que, por meio das escolhas linguísticas do ouvinte, considerando a estética, a
conveniência social e o que lhe serve funcionalmente, estão ligadas as crenças que o ouvinte
tem sobre a língua e a sua sistematização, isto é, mediante a atitude linguística do falante
emerge a variação linguística.
Como afirma Câmara Junior (1981, p. 269), “a língua é uma parte da cultura, mas uma
parte que se destaca do todo e com ele se conjuga dicotomicamente [...]”. Nesse sentido, a

22
“un sistema lingüístico caracterizado por su fuerte diferenciación, por poseer un alto grado de nivelación,
por ser vehículo de una importante tradición literaria y, en ocasiones, por haberse impuesto a sistemas
lingüísticos del mismo origen.” (ALVAR, 1970, p. 147).
41
língua como instrumento de simbolização do homem no mundo, abarca diferenças e seus
conflitos, desdobramentos e deslumbramentos se dão pelos elos que as diversas formas de
expressão e comunicação mantêm entre si.
Em outras palavras, é necessário para o homem, ser de contato, aliar seus costumes,
suas tradições, seus falares, suas formas e modelos, as origens linguísticas. As línguas faladas,
seus sons e usos assim como suas semelhanças e diferenças são como marcas no mundo. Na
estruturação da língua, o contato é fator essencial na medida em que nele estão presentes as
interações, variações e mudanças linguísticas.

3.1 Línguas em Contato

Ao falar sobre o contato linguístico, se faz necessário considerar os conceitos de


pidgin, diglossia e bilinguismo, entendido como o domínio da oralidade de duas línguas
distintas (português e espanhol), entre outros temas decorrentes do contato. O resultado
linguístico é, por sua vez, dependente da forma pela qual as línguas entraram ou
permaneceram em contato.
Longe de conceber as línguas em contato como processo individual, reconhecem os
autores consultados que o contato linguístico é produto histórico de pressões sociais, pois
essas pressões sociais operam nos resultados dos contatos linguísticos (BLOOMFIELD, 1933;
SILVA NETO, 1952; NASCENTES, 1953; WEINREICH, 1953; FERGUSON, 1959;
FERGUSON e GUMPERZ, 1960; GUMPERZ, 1971; SAPIR 1980; APPEL e MUYSKEN,
1996; MORENO FERNÁNDEZ, 1998).
De acordo com Bloomfield (1933, p. 472), o contato linguístico surge quando povos
falantes de línguas mutuamente ininteligíveis estabelecem estreitas relações, ou seja, quando
têm necessidade de se comunicar uns com os outros, como ocorreu durante a exploração de
outros países pelos europeus, surge a partir daí uma língua de contato conhecida por pidgin.
Para Silva Neto (1952, p. 67), “A vitória do português não se deveu a imposição
violenta da classe dominante. Ela explica-se por seu prestígio superior, que forçava os
indivíduos ao uso da língua que exprimia a melhor forma de civilização”. Pode-se inferir
dessa citação que o contato entre línguas provocou mudanças linguísticas no Brasil.
No que concerne ao português do Brasil, desde meados do século XVI, como afirma
Nascentes (1953, p. 8), colonos portugueses, índios, africanos, e seus descendentes
começaram cada qual a seu jeito, a modificar a língua portuguesa do Brasil e, moldando,

42
assim, o que viria a se constituir no falar brasileiro. Para Nascentes (1953, p. 10), “[...] as
pressões sociais continuamente operam sobre a língua, não devendo esta ser estudada fora do
contexto social [...]”. Essas pressões ocorrem interna e externamente, uma vez que há
contextos favoráveis para a implementação ou manutenção de certos traços linguísticos,
cabendo, assim, ao linguísta descrever os fenômenos e identificar os ambientes em que
ocorrem.
Weinreich (1953, p. 47) discorre sobre os seguintes tipos de contato entre línguas:
contato direto ou indireto; casual ou temporário; permanente ou instável; externo ou interno.
Os contatos internos podem incluir a relação entre uma língua dominante, isto é, majoritária,
ou línguas dominantes e uma língua minoritária, ou línguas minoritárias. Essas situações
podem ser encontradas nas fronteiras de países ou dentro de um país; em regiões próximas a
países fronteiriços ou em comunidades bilíngues.
Existem, principalmente, duas motivações sociais que levam uma língua a adquirir
vocábulos de outra língua. Segundo Weinreich (1953, p. 56), a primeira razão surge da
necessidade prática que a língua apresenta de nomear algo novo que está entrando em sua
cultura e que já existe em outra. Já a segunda razão surge da influência cultural sobre outra
comunidade e os membros dessa comunidade usam vocábulos estrangeiros como forma de
demonstração de sua familiaridade com a língua.
Há ainda outros tipos de contatos interlinguísticos como o espontâneo e o consciente.
Segundo Weinreich (1953, p. 74), o contato consciente sucede nos casos de traduções de uma
língua para outra. O contato espontâneo é típico das ocorrências de code-switching, quando o
falante bilíngue passa de um código linguístico a outro ou inclui lexemas de ambas as línguas
em suas falas.
As línguas em contato estudadas por Weinreich (1951), Ferguson e Gumperz, (1960),
Gumperz (1971) são vistas como um produto histórico de forças sociais, porque ocorrem na
maioria das vezes em condição de desigualdade social, surgem da colonização, migração,
urbanização entre outras. A consequência do contato linguístico vai depender do grau de
intensidade presente na interação das distintas comunidades linguísticas, que vai desde a
extinção das línguas minoritárias até mudanças linguísticas significativas como é o caso dos
empréstimos linguísticos, mudanças morfossintáticas, semântico-lexicais, fonético-
fonológicas e culturais. De acordo com Gumperz (1971, p. 119):

A influência transcultural pode também dar origem a mudança lingüística, o


abandono de uma língua nativa em favor de outra. Este fenômeno ocorre mais
43
frequentemente quando dois grupos se fundem, como na absorção tribal, ou quando
os grupos minoritários assumem a cultura do grupo majoritário 23.

A influência transcultural é percebida nas comunidades de fala pesquisadas, pois os


informantes e os moradores locais deixavam transparecer na forma de se comunicar e nas
atitudes linguísticas, vocábulos do português e/ou do espanhol no uso da língua materna
revelando um processo de aculturação. A mistura linguística percebida na região da Tríplice
Fronteira dá indícios da existência de uma situação linguística diglóssica.
Fishman (1967), retomando o conceito de diglossia e ampliando-o, inclui outros casos
de dualidades funcionais estáveis, socialmente determinadas, que podem existir em
determinada comunidade de fala. Ao estabelecer esse tipo de dualidade funcional, Fishman
(1967, p. 36) observa que:

O bilinguismo sem a diglossia tende a ser transicional, tanto em termos de


repertórios linguísticos de comunidades de fala como em termos das variedades de
fala envolvidas per si. Sem separar, no entanto, as normas complementares e valores
para estabelecer e manter a separação funcional das variedades de fala, aquela língua
ou variedade que seja o bastante favorável para ser associada com o movimento
predominante das forças sociais tende a substituir a(s) outra(s). 24

Segundo Fishman (1967, p. 31-33), o Paraguai é o país que mais se aproxima de uma
situação de bilinguismo com diglossia, devido à diferença funcional das duas línguas na
sociedade em que o guarani é utilizado em situações informais, íntimas, associado à família e
o espanhol utilizado em situações mais formais, associado a situações de prestigio. E agora,
quase 50 anos depois dessa afirmação feita por Fishman, 22 anos de MERCOSUL e há quatro
anos da aprovação (PDC-2072/2009) da lei que obriga o ensino do português nos países do
MERCOSUL, observa-se que, apesar do tempo e das mudanças provocadas por Decretos e
Leis, as comunidades estudadas não têm apresentado grandes mudanças. Cardoso (2010, p.
187) afirma que, “não se pode desconhecer a nova fisionomia que se delineou com o
MERCOSUL pelo menos no tocante, especificamente, às relações português-espanhol e ao

23
“Cross-cultural influence may also give rise to language shift, the abandonment of one native tongue in
favor of another. This phenomenon most frequently occurs when two groups merge, as in tribal absorption,
or when minority groups take on the culture of the surrounding majority.” (GUMPERZ, 1971, p. 119).
24
“Bilingualism without diglossia tends to be transitional both in terms of the linguistic repertoires of speech
communities as well as in terms of the speech varieties involved per se. Without separate though
complementary norms and values to establish and maintain functional separatism of the speech varieties,
that language or variety which is fortunate enough to be associated with the predominant drift of social
forces tends to displace the other(s).” (FISHMAN, 1967, p. 36).

44
papel de cada uma dessas línguas, individualmente, na América Latina”. Logo, com a
influência do português não só informalmente, mas também por meio da escola, na região de
fronteira com o Brasil, alguns moradores de Ciudad del Este já podem ser considerados
trilíngues, apesar do portunhol ser muito forte nas três cidades estudadas, fato observado pela
pesquisadora, durante a aplicação dos inquéritos, mas ignorado pela maioria dos informantes,
que o veem como um dialeto desprestigiado, se autodenominam falantes do português e não
do portunhol, de acordo com a análise das entrevistas adiante.
Retomando a questão da diglossia, de acordo com Ferguson ([1959] 1974, p.112), a
diglossia se opõe ao bilinguismo na medida em que a primeira situação reúne duas variedades
de uma única e mesma língua. Estas se opõem por terem estatutos sociais diferentes e por
terem uma função complementar, enquanto a segunda refere-se à presença de diferentes
línguas.
No caso de uma variedade padrão associada ao uso, todos os membros da comunidade
linguística têm acesso a ambos os códigos. O que vale ressaltar é que todos os falantes da
fronteira têm acesso à variedade padrão do espanhol e do português nas escolas, jornais,
televisão, rádio, revistas, internet, entre outros meios. Já que a variedade padrão está
associada a um contexto formal, seu uso na fronteira, nas relações comerciais, turísticas,
familiares e rotineiras, não se fez presente em nenhuma das línguas, pelo menos nos
depoimentos da maioria dos informantes, portanto não foi destacada.
De acordo com Sapir (1980, p. 122), “é excessivamente duvidoso que uma língua
possa ser falada numa vasta área sem multiplicar-se dialetalmente”. A mudança é inevitável,
não apenas pelo histórico de uma estrutura em constante transformação através do tempo, mas
também pela influência mútua das línguas diferentes em contato.
Contato linguístico, multilingualismo e misturas linguísticas, sua definição merece
cuidados, tendo em vista a definição de língua como algo abstrato. Para tal definição, Appel e
Muysken (1996, p. 12) entendem que seria necessário definir a natureza, a escala e o grau
desse contato e determinar a forma, o lugar em que ocorrem essas interações e quem são os
interlocutores. Segundo Appel e Muysken (1996, p. 60), a situação de contato gera mudanças
no modo de falar dos indivíduos, e gera mudanças nas estruturas das línguas envolvidas.
Para Moreno Fernández (1998, p. 258), o contato linguístico de duas ou mais línguas
quaisquer em uma situação qualquer leva inevitavelmente ao bi(multilinguismo), que pode ser
individual ou social.
Conforme visto, para que se estabeleça o contato linguístico, são necessárias pelo

45
menos duas línguas, uma língua e um dialeto ou dois dialetos na mesma comunidade de fala.
Consequências poderão advir desse contato visto que, entre elas, se estabelecem relações de
força. O percurso e o resultado do contato linguístico depende fundamentalmente do tipo de
relação que as respectivas comunidades estabelecem e do tempo de duração através do qual o
contato é mantido.
De maneira geral, dois processos sociais geraram o interesse dos sociolinguistas no
âmbito do contato linguístico: conquista e imigração. Nessas situações, geralmente, a
comunidade linguística minoritária sofre a imposição da língua do grupo político dominante.
Se a comunidade linguística conquistada é local, essa influência se dá de forma mais lenta,
podendo haver gerações bilíngues nessa comunidade. Devido ao contato nesse ambiente
bilíngue haverá, por exemplo, influências entre as línguas.
O estudo das línguas em contato em região de fronteira, mais especificamente
português e espanhol, tem em Rona (1959) um precursor dos estudos fronteiriços, seguido por
Hensey (1972), Elizaincín, Behares e Barrios (1987), Elizaincín (1992), Meliá (1992), Sturza
(2005), Calvet (2002), Aguilera e Busse (2008), Dietrich (2010), Faria Cardoso (2010), que
em seus estudos, abordam as línguas faladas na fronteira.
Rona (1959, p. 5) observa que o contato linguístico no Norte do Uruguai deu origem a
um dialeto que ele chamou de fronteiriço, isto é, “uma mescla de português e espanhol, mas
que não é nem português, nem espanhol e resulta inteligível tanto para os brasileiros quanto
para os uruguaios.” (RONA, 1959, p. 7)25. Fronteiriço ainda é usado atualmente como um
termo de referência ao dialeto falado na fronteira conforme se apresenta na análise dos
inquéritos.
A denominação fronteiriço também é utilizada por Hensey (1972, p. 14), que o
classifica como um grupo de dialetos do português falados principalmente em zonas rurais do
Norte do Uruguai.
Em vários estudos de Elizaincín, Behares e Barrios (1987, p. 12), as designações mais
comuns desta fala na fronteira reconhecida pelos próprios falantes são carimbão, basano,
brasilero y portuñol. De acordo com Elizaincín, Behares e Barrios (1987, p. 14), as
variedades do fronteiriço designadas de Dialectos Portugueses del Uruguai (DPU) são
definidos como formas mistas, de base portuguesa e que apresentam forte influência do
espanhol.
25
“una mezcla de portugués y español, pero que no es ni portugués, ni español y resulta con frecuencia
ininteligible tanto para los brasileños como para los uruguayos.” (RONA, 1959, p. 7).

46
Elizaincín (1992) afirma que o contato espanhol/ português faz parte de um tipo muito
especial: as duas línguas têm a mesma origem, são tipologicamente muito próximas e têm
forte relação areal. Segundo Elizaincín (1992, p. 18)26, “gênese, tipologia e realidade há
séculos compartilhados provocam convergências significativas em diferentes setores
gramaticais das línguas envolvidas”. Um exemplo, citado pelo autor, é o do verbo gustar. Em
português, esse tipo de verbo se constrói com o experimentador no nominativo (eu gosto de);
em espanhol com dativo (me gusta). Mas o contato das duas línguas gera enunciados como Yo
gosto de volver temprano/ Juan gusta de María. O que seria um desvio de padrão normativo,
na zona de fronteira (onde as duas línguas se encontram), esse tipo de construção não é só
aceito, mas também é o que caracteriza linguisticamente a região. Verifica-se que o que
diverge nos contatos linguísticos são os contextos sociais em que estão inseridos os falantes e
o resultado dessas interações.
Devido à longa história de bilinguismo no Paraguai, a influência mútua dos sistemas
linguísticos parece inevitável. De acordo com estudos feitos por Meliá (1992, p. 184), o
guarani sofreu um processo de hispanización que constitui uma terceira língua chamada de
guaranhol ou yopará. Por ser um dialeto misto e diferente do guarani paraguaio ensinado nas
escolas, o yopará é visto com desprestigio por seus próprios falantes.
Sturza (2005, p. 47) afirma que foi a partir do trabalho de Rona (1959) que “os estudos
sobre a presença da língua portuguesa na zona fronteiriça foram tendo regularidade e
continuaram a focalizar este ‘Dialecto Fronterizo’ como questão fundamental”. Ao tratar das
línguas em contato no Paraguai, Sturza (2005, p. 48) aponta para a importância da população
na configuração das línguas da fronteira, “sobretudo a importância étnica e identitária que o
guarani ocupa frente a outras línguas, as dos imigrantes e a do Estado”. E Sturza lembra
também dos brasiguaios e todo o fluxo migratório na região do Brasil, Argentina e Paraguai:

[...] os brasileiros no Paraguai, chamados brasiguaios, que levam para o interior das
terras paraguaias a sua língua portuguesa (a de gaúchos, paulistas, paranaenses,
mato-grossenses...).
Na fronteira do Brasil com Argentina e Paraguai, mais ao sul, é esclarecedora a
situação de província fronteiriça de Misiones. Nesta região, o fluxo migratório
trouxe, especialmente, para dentro do território argentino, alemães, italianos e
polacos, além de um contingente significativo de brasileiros, que contribuíam para
fortalecer a presença da língua portuguesa nas comunidades da zona fronteiriça.
(STURZA, 2005, p. 48).

26
“génesis, tipología y a realidad compartidas durante siglos provocan convergencias importantes en
diferentes sectores de la gramática de las lenguas involucradas.” (ELIZAINCÍN, 1992, p. 18).

47
Assim como há paraguaios e argentinos falantes de português, o que comprovaria uma
situação de bilinguismo, também há falantes do portunhol variante dialetal que circula na
Tríplice Fronteira, conforme já referido, caracterizado por um panorama linguístico
heterogêneo. Essa variante dialetal pode ser considerada diglóssica para as respectivas
comunidades de fala estudadas por ser bastante usada nas relações comerciais e turísticas
entre os três países, esse fato confirma uma das hipóteses, conforme se apresenta no capítulo
destinado às análises.
Calvet (2002, p. 51) destaca que, “[...] em todos os casos, o contato das línguas produz
situações sociais nas quais a passagem de uma língua para outra reveste uma significação
social”. A escolha linguística pode identificar o falante como, também, situá-lo
economicamente, salientar sua posição política e socioeconômica. De acordo com Aguilera e
Busse (2008, p. 23):

O uso da língua está relacionado, portanto, à formação de uma identidade étnica e


linguística, e seu caráter dinâmico representa-se num contexto complexo quanto à
delimitação de cada uma nos processos de interação e de organização dos grupos
sociais.

Ao refletir sobre o uso das diversas línguas e, ao falar sobre elas, é possível observar o
que envolve a escolha linguística, suas motivações, os preconceitos em torno do uso da língua
minoritária. Enfim, com tal prática é possível compreender que fatores motivam os falantes da
fronteira a usar o portunhol ou, ainda, por que priorizam tal escolha nas interações sociais.
O panorama linguístico dos falantes do guarani no Paraguai e na Argentina é traçado
por Dietrich (2010, p. 168) que, assim, se manifesta: “o guarani é a língua materna de mais de
90% dos paraguaios e, desde 1992, é a segunda língua oficial do país, ensinada nas escolas
primárias e, em parte, nas secundárias, ao lado do castelhano”. Dietrich (2010, p.168) informa
que a língua guarani na Argentina, na província de Corrientes, apresenta um caráter e uma
evolução independentes do Paraguai por ser a língua co-oficial daquela província desde 2004.
Já na província de Misiones, os poucos falantes do guarani originam-se da imigração de
correntinos e de paraguaios.
Uma nova variante dialetal está imbricada num processo sócio-histórico de contato de
diferentes povos e suas línguas específicas. Logo, o processo sócio-histórico é pré-requisito
para a compreensão do resultado da mistura entre as línguas. No caso brasileiro, mesmo antes
da independência, a política portuguesa de Marquês de Pombal tinha fortalecido a supremacia
da língua portuguesa na colônia, após a expulsão dos padres jesuítas em 1759 e da eliminação
48
da língua geral ou tupi-guarani de todos os currículos escolares. Apesar desse forte processo
de homogeneização linguística, as línguas indígenas, os idiomas e dialetos dos imigrantes que
estavam estabelecidos no Brasil não desapareceram. Dietrich (2010, p. 168) informa que até
1998, no Brasil, não havia conhecimento sobre a extensão, nem sobre a natureza da língua
guarani e as suas interferências sobre o português regional.
Conforme Dietrich (2010, p. 169):

Em cada um dos lugares explorados, porém, os falantes bilíngues também não


abundam. Muitos sabem um pouco de guarani, mas não têm conhecimentos
suficientes para o interrogatório completo. Outros falam bem, mas não têm com
quem conversar em guarani, faltando-lhes a comunidade linguística da sua terra.

Isso acontece porque os falantes de guarani, na verdade, falam uma variante do


guarani, conhecida como yopará, que seria uma característica própria do processo de
crioulização, falado por pessoas com pouca ou nenhuma escolaridade. Nas conversas com os
informantes, eles afirmam que o guarani escolarizado é difícil de ser falado e compreendido,
logo entre eles o uso do yopará é muito frequente.
Ao tratar das ocasiões em que a língua é utilizada, Dietrich (2010, p. 169) afirma que:

A língua da família é o português, ao passo que o guarani se fala só em ocasiões


raras, no encontro com um irmão, uma irmã, a mãe ou com amigos na Associação
Paraguaia da Terra, no melhor dos casos duas ou três vezes por mês. O guarani,
neste caso, fica reduzido à memória do falante e, muitas vezes, palavras e expressões
vão-se perdendo, faltando a introdução de outras, novas, no uso do falante. É um
guarani que contém muitos arcaísmos (lembranças da língua da mãe, de expressões
usadas antes pelos tios, aprendida na escola etc.), mas a língua está morrendo, já que
o falante vai se esquecendo das riquezas expressivas da sua língua. O segundo tipo,
mais raro, é o guarani vivo da gente que está em contato permanente com paraguaios
e que viaja constantemente ao Paraguai.

Nessa citação, percebe-se que a ausência do contato linguístico faz com que a língua
desapareça aos poucos. A língua é viva quando ocorre a interação, o contato linguístico, caso
contrário, ela está fadada ao esquecimento, à estagnação, excetuando a literatura que nos
possibilita o contato com as mais diversas realidades linguísticas.
Ao se referir ao guarani e tupi, Dietrich (2010, p. 170) aponta que “embora os
brasiguaios não sejam representantes da tradição tupi da costa atlântica do Brasil, a língua
deles não é muito diferente do tupinambá do século XVI e da língua brasílica dos séculos
XVII e XVIII. [...]”.
Ao se referir às possíveis influências linguísticas advindas do contato entre as línguas

49
indígenas e africanas sobre o português brasileiro, Faria Cardoso (2010, p. 158) afirma,
também, que “[...] no português não há, positivamente, influência de línguas indígenas (nem
de línguas africanas), além daquelas relacionadas ao léxico e às expressões idiomáticas”,
tendo em vista que “nenhum desenvolvimento do português” pode ser “classificado como
sendo de origem indígena (ou africana)”.
Em suas conclusões, Faria Cardoso (2010, p. 165) afirma que a situação de contato
depende “[...] do tipo de situação de contato de línguas, da intensidade deste contato, do tipo
de interação e do grau de bilinguismo existente na sociedade, modificar-se-á a forma de
adoção e adaptação de empréstimo linguísticos em uma e em outra língua”.
Quanto à influência do português no guarani, Faria Cardoso (2010, p.165) informa
que:

[...] pudemos verificar uma ampla adoção de empréstimos linguísticos lexicais e não
lexicais que ocasionaram inovações e mudanças linguísticas no guarani. A partir
disso, sugerimos que as mudanças linguísticas ocorridas no guarani (principalmente
a sintática), por implicar mudança em sua tipologia, sirvam de contra-exemplo à
ideia de que o contato entre línguas tipologicamente distintas não produz mudanças
gramaticais.

Esta é uma abordagem do contato enquanto constitutivo de um espaço de crenças e


atitudes diferenciadas, em que as línguas significam as condições sócio históricas das
comunidades de falantes, os quais se encontram expostos cotidianamente nas interações
sociais permeadas tanto pela presença do espanhol/guarani como a do português. Nessa
situação de contato se inter-relacionam e por vezes, se misturam.
Na fronteira, os sentidos das línguas não são necessariamente os sentidos da língua
nacional. As línguas, então, estão constituídas de sentidos que significam ainda mais quando
proferidas pelo homem da fronteira, local de transgressão e integração. Embora a fronteira se
reporte a uma divisão política, ao se referir às línguas faladas na fronteira, o falante se integra
a esse universo linguístico dando um tom todo peculiar, só percebido nesse contexto.
O contato frequente de uma língua em um estado nacional distinto provoca alguns
impactos. Esses impactos registram as diferenças, como é o caso das comunidades de fala
pesquisadas, falantes do yopará ou do guaraportunhol. Essas duas variantes dialetais são
consideradas a língua das classes menos escolarizadas e menos favorecidas socialmente. A
língua aprendida na escola, em Ciudad del Este, é o guarani, mas não é falada pelos
moradores do local que consideram o guarani uma língua difícil de ser falada. É perceptível o
inter-relacionamento das variantes dialetais, cujos traços linguísticos nesta situação diglóssica
50
definem, interferem nas relações sociais. De um lado, brasileiros não se esforçam em aprender
guarani por ser considerada uma língua de índio, demonstrando que existe preconceito
linguístico e, por outro lado, paraguaios, mesmo correndo o risco de serem ridicularizados
pelo sotaque, esforçam-se por falar a língua portuguesa. Observa-se também, que a maioria
dos habitantes da Tríplice Fronteira fala portunhol.
No contato linguístico, toda e qualquer língua sofre mudança e variação à medida que
não é rígida ou intacta. Nesse sentido, a presença de uma língua influencia outras línguas que
estejam em contato com ela. Quando há essa interação entre diferentes línguas, uma ou ambas
as línguas sofrerão mudanças. Em outros casos, quando há várias línguas em contato, é
possível o surgimento de uma língua completamente nova que será usada como forma de
comunicação entre falantes que não dividem uma língua em comum.

3.1.1 A Variação Linguística

A Sociolinguística nos mostra que um falante, mesmo quando se acredita monolíngue,


é, de alguma forma, plurilíngue: ele possui uma série de competências que transitam entre
formas vernaculares e veiculares, e cada uma delas responde a uma função social
determinada. As variações encontradas, nesse caso, derivam simultaneamente de aspectos
relacionados ao grupo social, à religião, à faixa etária, à escolaridade, profissão, entre outros
aspectos.
Saussure ([1916] 1996, p. 221) concebe a variação como sendo “o fenômeno de uma
língua que sofre variações ao longo do tempo, do espaço geográfico, do espaço ou estrutura
social, da situação ou contexto de uso”. Isso significa dizer que uma língua está sujeita a
reajustar-se no tempo e no espaço para satisfazer às necessidades de expressão e de
comunicação, individual ou coletiva, de seus usuários e ocorre em todos os níveis da língua
(fonético-fonológico, morfológico, sintático-semântico e lexical).
Para Weinreich, Labov e Herzog (1968, p. 97), toda língua varia, a variação é inerente
à língua e se a mudança implica necessariamente variação, a variação não implica
necessariamente mudança em curso.
Dessa forma, para os sociolinguistas, nas comunidades de fala, frequentemente,
existirão formas linguísticas em variação, isto é, que estão em co-ocorrência (quando duas
formas são usadas ao mesmo tempo) e em concorrência (quando duas formas concorrem).
Toda a análise sociolinguística passa então a ser orientada para as variações

51
sistemáticas, considerando-se que há uma organização implícita por trás da heterogeneidade
linguística. A língua não é usada de modo homogêneo por todos os seus usuários.
Dependendo da situação, a mesma pessoa pode usar diferentes variedades de uma só forma da
língua.
Logo, todas as línguas apresentam variação, e, ainda, variam simultaneamente numa
dupla perspectiva, isto é, geografica e socialmente, podendo-se identificar variação diatópica
e diafásica.
No que concerne à faixa etária, segundo Chambers e Trudgil (1980, p. 92-93), a
variação estável se caracterizaria por um padrão curvilinear, no qual as faixas intermediárias
apresentariam a maior frequência de uso das formas de prestígio, porém a tendência aferida
pelos resultados da faixa etária deve ser confirmada pelos resultados das outras variáveis
sociais.
Ao tratar da variável sexo nas situações de variação estável, segundo Chambers e
Trudgil (1980, p. 98), as mulheres tendem a ser mais sensíveis ao uso das formas de prestígio,
o que pode ser aferido numa escala de níveis de formalidade da fala. Por outro lado, nas
mudanças em que se abandona o uso de uma forma padrão, o processo tende a ser liderado
pelos homens, enquanto as mulheres lideram as mudanças em direção às formas de prestígio.
Para Labov ([1972] 2008), as mulheres estão bem a frente dos homens, “na maioria das
mudanças linguísticas, as mulheres estão à frente dos homens na proporção de uma geração.”
(LABOV, [1972] 2008, p. 78). Porém, como bem nota Scherre (1988, p. 429), “a respeito da
variável sexo, pode-se ver na literatura linguística que o seu papel, especialmente do sexo
feminino, na questão da mudança não é muito claro”. E, como reconhece o próprio Labov
([1972] 2008, p. 347):

[...] é importante ter em mente que essa propensão das mulheres para as formas de
maior prestígio (no sentido do padrão normativo) é limitada àquelas sociedades em
que as mulheres desempenham um papel na vida pública.

Ao refletir sobre a citação de Labov ([1972] 2008), observa-se que a mulher que
participa da vida pública tem mais chances de interação, ao passo que a mulher cuja vida é
mais limitada, isto é, restringe-se ao lar e suas adjacências, as interações acontecem sempre
com as mesmas pessoas e a possibilidade de mudança é remota, neste cenário não ocorre a
mudança.
A língua portuguesa, assim como todos os idiomas do planeta, não se mostra uniforme.

52
O uso de uma língua varia de época para época, de região para região, de classe social para
classe social, e assim por diante. Nem individualmente seu uso é uniforme.
Segundo Labov ([1972] 2008, p. 21), a variação revela “um aspecto essencial das
relações entre a vida social e cultural do homem e o seu ambiente natural”, uma vez que há
contextos favoráveis para a implementação ou manutenção de certos traços linguísticos.
Dubois (1978, p. 448), ao tratar da forma padrão, aponta para ao fato de que:

[...] além das variações locais ou sociais, ela se impõe a ponto de ser empregada
correntemente, como o melhor meio de comunicação, por pessoas susceptíveis a
utilizar outras formas ou dialetos [...]. É difundida pela escola, pelos meios de
comunicação em massa e utilizada nas relações oficiais.

Dubois (1978, p. 448) discorre sobre as variedades de uma língua que são
consideradas variedade padrão, por serem faladas por grupos dominantes, elitizados do ponto
de vista econômico, político ou cultural. A variedade padrão corresponde ao ideal de falar
bem. Sendo assim, quando se fala de padronização se pensa em aspectos puramente sociais
que se referem à maneira como dentro de uma sociedade é feita a escolha de uma variedade
que servirá como base para a variedade padrão, de que maneira ela é codificada (elaboração
de dicionários, gramáticas, normas ortográficas), é promovida e tem sua aceitação viabilizada.
Esse processo se chama normalização e reflete os diferentes graus de poder exercidos
pelos diferentes grupos sociais. Como afirma Dubois (1978, p. 448), a variedade padrão
sempre está diretamente relacionada a atividades e instituições de prestígio, como mídia,
escola e instituições públicas.
Labov ([1972] 2008, p. 188) afirma que, “variantes linguísticas são diversas maneiras
de se dizer a mesma coisa em um mesmo contexto e com o mesmo valor de verdade”. Nesse
sentido, a teoria da variação considera a língua em seu contexto sócio-cultural, uma vez que
parte da explicação para a heterogeneidade que emerge nos usos linguísticos concretos, pode
ser encontrada em fatores externos ao sistema linguístico e não só nos fatores internos à
língua.
Para Gnerre (1998, p. 6-7), “uma variedade linguística ‘vale’ o que ‘valem’ na
sociedade os seus falantes, isto é, vale como reflexo do poder e da autoridade que eles têm nas
relações econômicas e sociais”. Ou seja, está associado ao prestígio, pois a variedade de maior
prestígio dentro de uma sociedade se impõe como variedade padrão, também chamada norma
culta e, com tal, passa a ser utilizada nas relações econômicas e sociais como única
possibilidade linguística.
53
Alkmin (2001, p. 39) considera “[...] uma ordenação valorativa das variedades
lingüísticas em uso, que refletem a hierarquia dos grupos sociais”. Desse modo, fica evidente
a existência de uma variedade de prestígio e de variedades não prestigiadas nas sociedades.
Ainda de acordo com Alkmin (2001, p. 40), “a variedade alçada à condição de padrão não
detém propriedades intrínsecas que garantem uma qualidade ‘naturalmente’ superior às
demais variedades”. Isso se deve ao fato de que, o que vai determinar a qualidade de superior
ou inferior está mais ligado à comunidade de fala e aos seus falantes. Alkmin (2001) destaca
que o prestígio “[...] coincide com a variedade lingüística falada pela nobreza, pela burguesia,
pelo habitante de núcleos urbanos, que são centros de poder econômico e do sistema cultural
predominante.” (ALKMIN, 2001, p. 40).
Portanto, isso significa que um conjunto de variedades determina os traços que as
particularizam, isto é, as normas que as caracterizam.
Na sociolinguística, a língua deve ser entendida como um elemento social que reflete,
condiciona e configura as diferenças representadas pelos grupos sociais. Quanto a isso, as
variáveis linguísticas atuam como indicadores dos diferentes tipos de comportamentos
sociais. Labov ([1972] 2008) aponta que as variações sociais e estilísticas desempenham um
papel importante na mudança linguística. Apresenta como definição de ‘social’ “os traços
linguísticos que caracterizam os distintos subgrupos de uma sociedade heterogênea” e como
‘estilística’ “as modificações mediante as quais um falante adapta sua linguagem ao contexto
imediato do seu ato de fala”. (LABOV [1972] 2008, p. 271)
Além do mais, conforme Naro (2003, p. 16-17), “[...] a operação de uma regra variável
é sempre o efeito da atuação simultânea de vários fatores”. Afirmação importante porque é, de
fato, impossível acontecer uma variação que não sofra interferência de mais de um fator
interno e/ou externo.
Pode-se dizer que, um indivíduo ou grupos de indivíduos adotam certas variedades
linguísticas como forma de diferenciação, de isolamento, por meio de uma linguagem
especial, principalmente no campo lexical. É claro que, a variedade linguística eleita, é
decorrente do próprio comportamento social e a criação dessa linguagem específica serve a
diversos objetivos como: o desejo de privacidade, respeito, aceitação, de auto-afirmação, de
ser entendido apenas por indivíduos do grupo a que pertence e também como forma de querer
fazer parte de um determinado grupo.
Seguindo o mesmo entendimento, Scherre (2005, p. 43) afirma que:

54
Em nome da boa língua pratica-se a injustiça social, muitas vezes humilhando o ser
humano por meio da não-aceitação de um de seus bens culturais mais divinos: o
domínio inconsciente e pleno de um sistema de comunicação próprio da comunidade
em seu redor. E mais do que isto: a escola e a sociedade – da qual a escola é reflexo
ativo – fazem associações perversas, sem respaldo lingüístico estrutural, entre
domínio de determinadas formas lingüísticas e beleza e feiúra; entre domínio de
determinadas formas lingüísticas e elegância e deselegância; entre domínio de
determinadas formas lingüísticas e competência ou incompetência; entre domínio de
determinadas formas lingüísticas e inteligência e burrice [...].

Para que não se repitam, ou se cometam essas atrocidades referidas por Scherre
(2005), buscam-se, dessa maneira, algumas sugestões importantes direcionadas aos
responsáveis pelo ensino, nas palavras de Cardoso (2010, p. 183-184):

[...] os que planejam e os que executam, os programadores e os professores – à


reflexão sobre as peculiaridades sociais e geográficas da língua; sobre a finalidade
de sua utilização; sobre a pluralidade de usos que se constata no falante; sobre a
situação de contraste que muitas vezes, vive o professor, falante de um dialeto,
professor de alunos dialetalmente diferenciados e mestre da norma que pode não ser
a do seu próprio uso cotidiano. Levar o professor a se estabilizar nesse tripé –
situação muito geral hoje em dia, com exemplos até mesmo na área universitária – é
o que se deve constituir em prioridade para as políticas linguísticas no ensino do
vernáculo. Particularizar o ensino da língua afigura-se precipitado porque ainda não
se dispõe do embasamento necessário – qualificação e quantificação de dados de
cunho nacional – para justificar proposições. De outro modo, impor, sem ajustes, o
uso de um registro se figura como declaração do desconhecimento da multifacetada
realidade linguística, tão evidente, do país.

Precisa-se reconhecer mais do que nunca a variação linguística, não como forma de
exclusão, preconceito, ou para apenas tomar ciência de que ela existe como é feito há anos nas
escolas, mas acima de tudo, conhecê-la para respeitá-la, aceitar as diferenças. Compreender a
variedade linguística que o aluno leva para a escola e apresentar a ele um registro formal,
comum e geral a todos, que permite o seu avanço social, profissional e tecnológico, mas que
suas origens devem ser respeitadas, mantidas e nunca discriminadas. Assim, ciente da
diversidade linguística, o indivíduo pode transitar em todas esferas socias sem ser
preconceituoso e sem sofrer o preconceito.

55
4 CRENÇAS E ATITUDES LINGUÍSTICAS NA REGIÃO DE FRONTEIRA
BRASIL/PARAGUAI/ARGENTINA

Esta tese fundamenta-se nos princípios da Sociolinguística e, para tanto, baseia-se em


estudos representativos de diversos teóricos nacionais e internacionais, pois tratar do contato
linguístico na fronteira é também tratar dos aspectos sociais, ideológicos e culturais da
linguagem. O estudo das crenças e atitudes tem por objetivo descrever e analisar sentimentos
e ações dos falantes frente à sua língua e em relação ao falar do outro. Nesse aspecto, as
crenças e atitudes estabelecem relação direta com a identidade linguística e social do falante.
Há uma diversidade de conceitos relacionados às crenças e atitudes, pois tais conceitos estão
interconectados aos objetivos e à perspectiva teórico-metodológica da investigação. Essa
diversidade conceitual pode ser percebida a partir da seleção do referencial teórico aqui
apresentado.

4.1 AS CRENÇAS E ATITUDES LINGUÍSTICAS: CONCEITOS E DEFINIÇÕES

O conceito de crença abrange questões sobre as quais se desconhece, porém são


aceitas como verdade relativa, uma vez que o surgimento de novas informações pode
modificar o entendimento dos fatos e alterar o que se tinha como verdade.
O termo atitude tem sido definido de diferentes maneiras. As atitudes são fontes de
grande interesse pela sua importância como influenciadoras de maneira determinante do
comportamento dos sujeitos. Atitude, enquanto conceito fundamental da Psicologia Social faz
junção entre a opinião (crença) e a conduta (atitude) e indica o que interiormente se está
disposto a fazer. Portanto as atitudes dependem das crenças que se tem da situação que se
deve enfrentar, podendo-se reagir de maneira positiva ou negativa. As atitudes constituem
uma parte importante da constituição de cada pessoa e no interior de grupos, sejam eles
familiares ou não, e da sociedade. Para esse aspecto chama a atenção Allport (1935, p. 810) ao
apresentar a seguinte definição:

atitude é um estado mental e psicológico de disposição, organizado através da


experiência, que exerce uma influência direta ou dinâmica na relação do individuo
diante de todos os objetos e todas as situações com que se encontra relacionado 27.

27
“ attitude is a mental and neural state of readiness, organized through experience, exerting a directive and
dynamic influence upon the individual’s response to all objects and situations with which it is related.”
(ALLPORT, 1953, p. 810)
56
Para Lambert e Lambert (1966, p. 77), atitude é definida como sendo uma ideia
carregada de emoções a qual influencia ações de uma classe para situações particulares,
conforme a situação social. O fato de que as atitudes podem ser estabelecidas por
condicionamento verbal (social) indica um caráter cognitivo. Isto implica que, para
compreender e modificar atitudes, é necessário conhecer os conceitos e princípios de
conhecimento que respondem pelos aspectos cognitivos. Lambert e Lambert (1966, p. 78)
afirmam que seus componentes essenciais são:

os pensamentos e as crenças, os sentimentos (ou emoções) e as tendências para


reagir. Dizemos que uma atitude está formada quando esses componentes se
encontram de tal modo inter-relacionados que os sentimentos e tendências reativas
específicas ficam coerentemente associados com uma maneira particular de pensar
em certas pessoas ou acontecimentos.

Como se depreende da definição apresentada, esses autores salientam três


componentes da atitude: pensamentos e crenças, sentimentos ou emoções, e tendências de
reação. No entanto, não há consenso quanto à estrutura que compõe a atitude.
Lambert (1967) distingue três princípios que regem as crenças e suas consequentes
atitudes sociais, são eles: (i) associação – princípio pelo qual se evita o contato com pessoas
ou coisas que nos desagradem e nos aproximamos daqueles que nos trazem coisas agradáveis;
(ii) transferência, pois transferimos nossas expectativas para determinados fins; e (iii)
satisfação de necessidade, quando procuramos nos aproximar de pessoas que associamos a
coisas agradáveis (LAMBERT, 1967, p. 93).
As crenças podem ser definidas, de acordo com Labov ([1972] 2008, p. 176), como
“um conjunto uniforme de atitudes frente à linguagem que são partilhadas por quase todos os
membros de comunidade de fala, seja no uso de uma forma estigmatizada ou prestigiada da
língua em questão”. Para Labov ([1972] 2008, p. 120), na comunidade de fala, apesar de as
pessoas compartilharem as mesmas normas relacionadas à linguagem, não falam da mesma
forma. Ao contrário, pois são encontradas com frequência formas linguísticas em variação que
concorrem umas com as outras na comunidade de fala.
Fasold ([1974] 1984, p. 158) observa, também, que as atitudes são uma valiosa
ferramenta que revelam a “importância social” da linguagem e como ela é usada tal qual “um
símbolo de pertencer ao grupo” isto é, “uma identificação”, na sociedade. Por meio de uma
série de análises de atitudes linguísticas, Fasold ([1974] 1984, p. 158) observa que:

57
Falantes que usaram a variedade alta foram classificados positivamente na escala
social dominante, bem como nas escalas de solidariedade. Geralmente, as variedades
baixas são mais apreciadas nas escalas de solidariedade que as variedades altas na
escala social dominante28.

O estudo das atitudes linguísticas constitui um dos aspectos mais interessantes das
análises da Sociolinguística moderna. Alvar (1975, p. 93)29 destaca que: “Considerar o que
possa ser Sociolinguística é, em primeiro lugar, abordar a questão do conceito de que o falante
tem sua própria ferramenta linguística.” Para Alvar (1975), as atitudes linguísticas partem do
pressuposto que o falante tem da própria língua.
Dessa forma, as atitudes linguísticas é que definem a escolha, a mudança, a variação,
os padrões linguísticos, conforme salienta Blas Arroyo (1994, p. 143):

[...] as atitudes podem contribuir poderosamente para a propagação das mudanças


linguísticas, à definição de comunidades de fala, `a consolidação dos padrões de uso
e da avaliação social e, em geral, a uma ampla gama de fenômenos estreitamente
relacionados com a variação linguística na sociedade30.

As crenças que um falante tem de sua língua, isto é, se ele a considera apropriada ou
não apropriada perante outras variedades, fará com que ele a utilize e de certa forma propague
sua maneira de falar.
A este respeito, Moreno Fernández (1998, p. 178) também se manifesta e destaca que:

[...] atitude em relação à linguagem e seu uso se torna especialmente atraente quando
vista na sua verdadeira magnitude o fato de que as línguas não são apenas portadoras
de formas e atributos linguísticos determinados, mas também são capazes de
transmitir significados ou conotações sociais, bem como valores sentimentais. As
regras e as marcas culturais de um grupo se transmitem ou se destacam por meio da
língua31.

28
“Speakers who used the high variety were rated higher in the power as well as the solidarity scales.
Generally, the low varieties are rated higher in solidarity scales whereas the high varieties dominate the
power scales.” (FASOLD [1974] 1984, p. 158).
29
“Plantearse qué pueda ser una sociolingüística es, ante todo, enfrentarse con la cuestión del concepto que
el hablante tiene de su propio instrumento lingüístico.” (ALVAR, 1975, p. 93).

30
“[…] las actitudes pueden contribuir poderosamente a la difusión de los cambios lingüísticos, a la
definición de las comunidades de habla, a la consolidación de los padrones de uso y de evaluación social
y, en general, a una serie amplia de fenómenos estrechamente relacionados con la variación lingüística en
la sociedad.” (BLAS ARROYO, 1994, p. 143).
31
“[…] la actitud ante la lengua y su uso se convierte en especialmente atractiva cuando se aprecia en su
justa magnitud el hecho de que las lenguas no son solo portadoras de unas formas y unos atributos
lingüísticos determinados, sino que también son capaces de transmitir significados o connotaciones
sociales, además de valores sentimentales. Las normas y marcas culturales de un grupo se transmiten o
enfatizan por medio de la lengua.” (MORENO FERNÁNDEZ, 1998, p. 178).
58
Todas essas reações, na realidade, consistem em atitudes que se mantêm em relação à
nossa forma de falar e à dos outros, atitudes essas que, muitas vezes, culminam em
preconceito em relação a determinadas variedades linguísticas.
A definição de preconceito encontrada no dicionário básico de filosofia de acordo com
Marcondes, Souza Filho e Japiassu (1996, p. 219) está assim formulada:

opinião ou crença admitida sem ser discutida ou examinada, internalizada pelos


indivíduos sem se darem conta disso, e influenciando seu modo de agir e de
considerar as coisas. O termo possui um sentido eminentemente pejorativo,
designando o caráter irrefletido e frequentemente dogmático dessas crenças.

E para complementar essa definição, busca-se em Bagno (1999, p. 40), a definição


para preconceito linguístico que, no seu entender:

[...] se baseia na crença de que só existe uma única língua portuguesa digna deste
nome e que seria a língua ensinada nas escolas, explicada nas gramáticas e
catalogada nos dicionários. Qualquer manifestação lingüística que escape desse
triângulo escola-gramática-dicionário é considerada, sob a ótica do preconceito
lingüístico, “errada”, feia, estropiada, rudimentar, deficiente, e não é raro a gente
ouvir que “isso não é português.

A partir dos conceitos examinados, verifica-se que as crenças, deixam transparecer nas
atitudes linguísticas a maneira de ser e de se relacionar com o outro. Sobre o assunto, Moreno
Fernandez (1998, p.179) reitera que:

[...] as atitudes influenciam decisivamente nos processos de variação e mudança


lingüística que ocorrem nas comunidades de fala. Uma atitude favorável ou positiva
pode fazer com que uma mudança lingüística ocorra mais rapidamente, e que em
certos contextos predomine o uso de uma língua em detrimento de outra. [...] Uma
atitude desfavorável ou negativa pode levar ao abandono e esquecimento de uma
língua ou impedir a propagação de uma variante ou uma mudança lingüística32.

E acrescenta que:

a atitude lingüística é a consciência sociolingüística: os indivíduos forjam atitudes,

32
“[...] las actitudes influyen decisivamente en los procesos de variación y cambio lingüístico que se
producen en las comunidades de habla. Una actitud favorable o positiva puede hacer que un cambio
lingüístico se cumpla más rápidamente, que en ciertos contextos predomine el uso de una lengua en
detrimento de otra. […] Una actitud desfavorable o negativa puede llevar al abandono y el olvido de una
lengua o impedir la difusión de una variante o un cambio lingüístico”. (MORENO FERNANDEZ, 1998,
p. 179).

59
quaisquer que sejam, porque têm consciência de uma série de fatos lingüísticos e
sociolingüísticos que se referem a eles ou lhes afetam. (MORENO FERNÁNDEZ,
1998, p. 181)33.

Já que os indivíduos podem forjar suas atitudes, porque há a consciência dos fatos
linguísticos, os estudos das crenças e atitudes desenvolveram-se em duas linhas principais de
pesquisa, a saber: a comportamentalista e a mentalista (FASOLD, [1974] 1984; LÓPEZ
MORALES, 1993; MORENO FERNÁNDEZ, 1998; BLANCO CANALES, 2004). Dentro da
perspectiva mentalista e comportamentalista, Fasold ([1974] 1984, p. 147) afirma que o
aspecto mentalista está relacionado a uma atitude, a um estímulo e uma resposta de forma
variável. Já o behaviorista ou comportamentalista, considera o fato de as atitudes estarem
associadas a determinadas reações do indivíduo a certas situações sociais, isto é, as atitudes
são percebidas nas reações dadas às respostas por meio de determinado estímulo.
Para López Morales (1993), as atitudes seriam formadas apenas pelo componente
afetivo, uma vez que podem ser medidas e observadas abertamente, como menciona López
Morales (1993, p. 231-232)34: “Um estado de disposição, uma variável que intervém entre um
estímulo que afeta a pessoa e sua reação a ele.” Ao complementar o raciocínio de López
Morales, Moreno Fernández (1998, p. 182-183) destaca a atitude:

[...] como um estado interno do indivíduo, uma disposição mental para umas
condições ou para uns fatos sociolinguísticos concretos; neste sentido, a atitude seria
uma categoria intermediária entre um estímulo e o comportamento ou a ação
individual35.

Os comportamentalistas, nas palavras de Moreno Fernández (1998, p. 182)36,


estabelecem que “a atitude é uma conduta, uma reação ou resposta a um estímulo, isto é, a
uma língua, uma situação ou características sociolinguísticas determinadas”. Ou seja, as
atitudes do falante podem ser previstas dentro das mais diversas interações sociais.
Do pensamento de López Morales (1993) e Moreno Fernández (1998) percebe-se que
33
“[…] la actitud lingüística es la conciencia sociolingüística: los individuos forjan actitudes, del tipo que
sea, porque tienen conciencia de una serie de hechos lingüísticos e sociolingüísticos que les conciernen o
les afectan.” (MORENO FERNÁNDEZ, 1998, p. 181).

34
“Un estado de disposición, una variable que interviene entre un estímulo que afecta a la persona y su
respuesta a él.” (LÓPEZ MORALES, 1993, p. 231-232).
35
“[…] como un estado interno del individuo, una disposición mental hacia unas condiciones o unos hechos
sociolinguísticos concretos; en este sentido, la actitud sería una categoría intermedia entre un estímulo y el
comportamiento o la acción individual.” (MORENO FERNÁNDEZ, 1998, p. 182-183).
36
“la actitud es una conducta, una reacción o respuesta a un estímulo, esto es, a una lengua, una situación o
unas características sociolingüísticas determinadas.” (MORENO FERNÁNDEZ, 1998, p. 182).
60
a atitude está intrinsecamente ligada às crenças, às convicções, e a ação sempre corresponde à
visão de mundo que se tem ao conhecimento e ao contexto em que se estiver inserida.
A partir disso, constata-se o quanto as crenças e atitudes influenciam diretamente na
questão da mudança e variação linguística, pois as crenças estão relacionadas à maneira de
pensar, sentir e as atitudes estão ligadas à reação em relação às pessoas, grupos, questões
sociais ou a qualquer acontecimento. Portanto, os fundamentos psicológicos das crenças e
atitudes apresentam também o componente social, pois estão fundamentadas em quatro
atividades humanas: pensar, sentir, reagir e interagir. E, segundo Lambert e Lambert (1966),
Fasold ([1974] 1984), López Morales (1993), Blas Arroyo (1994), Moreno Fernández (1998),
e Aguilera (2008b), as atitudes linguísticas são formadas por três componentes essenciais:
cognoscitivo (percepções, crenças e estereótipos); afetivo (emoções e sentimentos) e conativo
(tendência a atuar de certa maneira em relação ao objeto). Logo, as atitudes linguísticas
influenciam na interação linguística.
López Morales (1993, p. 235) classifica as atitudes linguísticas de duas maneiras: a
“mentalista e a comportamental”. Na perspectiva mentalista, a atitude por ser uma disposição
de ordem mental, não pode ser mensurada ou observada diretamente. Quanto à perspectiva
comportamental, a atitude é a resposta ou comportamento de um indivíduo em determinada
situação social, e assim, pode ser observada de forma direta.
Bisinoto (2007) corrobora com Blanco Canales (2004) ao conceituar as atitudes
linguísticas como, “postura, reação ou propósito, mas antes disso há que se considerar os
fatores psicológicos e políticos que desencadeiam as atitudes dos falantes perante sua própria
língua e a língua do outro.” (BISINOTO, 2007, p. 23).
Ainda a esse respeito, Bisinoto declara que:

a atitude lingüística e a social complementam-se, ou melhor, fundem-se nas ações e


reações dos indivíduos. As avaliações manifestas e encobertas, subjetivas e
objetivas, mais ou menos conscientes, relativas à linguagem dos homens numa
sociedade plural têm a propriedade de fundar e governar tanto as relações de poder
quanto o prestígio ou o desprestígio das formas linguísticas, estabelecendo
seletividades, evidenciando preconceitos. (BISINOTO, 2007, p. 24).

Ao lado das atitudes dos falantes das línguas desprestigiadas, devem ser situadas as
línguas dos falantes com maior prestígio social. A princípio, a atitude do falante cuja língua é
mais prestigiada, caracterizada de tranquila e superior às demais variantes, portanto em
qualquer situação comunicativa, essa língua será a preferida, logo, não há necessidade de
esforço para adquirir outra. Por conseguinte, essa atitude apresenta muitos graus, que vão
61
desde a auto confiança, segurança até a arrogância linguística consciente.
As atitudes linguísticas consistem em avaliações e julgamentos dos falantes sobre a
própria língua e a língua dos outros. Sobre as atitudes linguísticas, Bisinoto considera que
“[…] representam pistas importantes para a compreensão das mudanças lingüísticas
estruturais, mas também respondem a indagações sobre o funcionamento da própria
sociedade, afetada pela heterogeneidade lingüística.” (BISINOTO, 2007, p. 38).
Aguilera (2008a, p. 106) afirma que “a atitude linguística de um indivíduo é o
resultado da soma de suas crenças, conhecimentos, afetos e tendências a comportar-se de uma
forma determinada diante de uma língua ou de uma situação sociolingüística”. Dessa forma as
crenças e atitudes estão interligadas. Aguilera (2008b, p. 314) concorda que a compreensão
das crenças e atitudes linguísticas auxilia no entendimento das diversas ‘competições’ entre:
(i) as múltiplas variedades linguísticas regionais do português; (ii) as questões de prestígio,
rejeição e preconceito linguísticos; (iii) o problema do bilinguismo e do contato linguístico
em regiões fronteiriças e, dentro do próprio país, em regiões de alta concentração de
imigrantes.
Nesse aspecto, Aguilera (2008b, p. 319), também faz suas considerações quanto às
aferições relacionadas aos estudos das atitudes na perspectiva mentalista e afirma que elas
podem acontecer de duas maneiras: i) diretas – aferições realizadas por meio de questionários
ou entrevistas; e ii) indiretas – aferições feitas sem que o informante tenha consciência do
objeto da pesquisa, que seria a atitude. E Busse (2010, p. 84) expõe que as crenças e atitudes
são o passaporte para a mudança linguística, pois esta se dá em ambiente complexo mediante
a atuação de forças sociais, com uma tendência para a manutenção ou implementação de
formas advindas de grupos com maior prestígio.

4.1.1 Inter-relação entre Crenças e Atitudes

Ao estudar as crenças e atitudes, verifica-se que, algumas vezes, elas se coadunam


quando expressam opinião, gosto, preferência e também diante das escolhas que são feitas em
determinada situação. Porém, a interferência das crenças nas atitudes do indivíduo, nem
sempre será fator definitivo em suas atitudes, que muitas vezes podem ser superficiais. De
acordo com Trudgill (1974, p. 14):

O nosso sotaque e nosso discurso geralmente mostram de que parte do país nós
viemos, e que tipo de conhecimento nós temos. Podemos até dar alguma indicação
62
de alguma de nossas ideias e atitudes, e toda esta informação pode ser usada pelas
pessoas com quem estamos falando a ajudá-las a formular uma opinião sobre nós37.

E acrescenta-se ainda, que as atitudes linguísticas são definidas por julgamentos


favoráveis ou desfavoráveis sobre a variedade linguística utilizada por determinadas pessoas
ou certas comunidades de fala. Esses prejulgamentos podem ser considerados a base do
preconceito linguístico, que resultam de uma crença sobre as características pessoais que são
atribuídas aos indivíduos já que, em geral, aparecem concretizadas em suas escolhas
linguísticas.
Alves (1979) acrescenta que a atitude linguística pode ser vista dentro de um processo,
que apresenta certas etapas, e não vista como mero resultado:

[…] Ou seja, a percepção do objeto e a demonstração ativa de um indivíduo, a partir


dele e com relação a ele, são precedidas e reforçadas por outros procedimentos: o
enquadramento do objeto no sistema de crenças e valores do individuo e sua
eventual reação emotiva a ele. A tendência para um certo tipo de ação, torna-se
assim o produto, o resultado final desse confronto. (ALVES, 1979, p. 27).

Richardson (1996, p. 104) acredita que não só as crenças influenciam as atitudes, e


classifica em três as maneiras possíveis de compreender essa relação: I) a primeira relação é
de causa e efeito, em que as crenças exercem influência direta nas atitudes. Nesse caso, para
que as atitudes sejam mudadas seria necessário mudar as crenças ou vice-versa; II) a segunda
está relacionada à interação, ou seja, crenças influenciam atitudes e atitudes influenciam as
crenças. Assim, mudanças nas crenças acarretariam mudanças nas atitudes, bem como
mudanças nas atitudes acarretariam mudança e/ou na formação de novas crenças; III) a
terceira relação é a hermenêutica, que situa o pensamento e as atitudes do falante dentro da
complexidade dos contextos em que estiver inserido. Dessa forma, é possível dizer que as
crenças e atitudes podem ser divergentes, principalmente devido a fatores contextuais.
Nesse aspecto, se o indivíduo crê ou não em algo, pouca ou nenhuma diferença isso
trará para mostrar sua avaliação sobre um fato. A partir dessa constatação pode-se dizer que as
crenças são sociais, individuais e flexíveis. Tendo por base as crenças e atitudes linguísticas
em situação de fronteira, é possível observar, conforme será apresentado na seção das

37
“Our accent and our speech generally show what part of the country we come from, and what sort of
background we have. We may even give some indication of certain of our ideas and attitudes, and all of
this information can be used by people we are speaking with to help them formulate an opinion about us.”
(TRUDGILL, 1974, p. 14).

63
análises, a preferência dos sujeitos por determinada escolha linguística e a identificação com o
grupo que a concretiza.
Para Barcelos (2001, p. 85), “as crenças devem ser investigadas de maneira interativa,
onde crenças e ações [atitudes linguísticas] se inter-relacionem e se interconectem”. De
acordo com Barcelos (2001), ao estudar as crenças não há como dissociá-las das atitudes,
porque as ações resultam das crenças, toda ação leva a uma reação e nesse vai e vêm elas se
inter-relacionam.
Segundo Calvet (2002, p. 65), “existe todo um conjunto de atitudes, de sentimentos
dos falantes para com suas línguas e para com aqueles que as utilizam, que torna superficial a
análise da língua como simples instrumento.” Os falantes, então, têm a capacidade de emitir
valores de juízo, que podem ser positivos ou negativos, sobre a variedade da fala adotada.
Aguilera (2008b), também concorda com Calvet (2002) ao afirmar que cada pessoa
tem sempre uma atitude neutra, positiva ou negativa, referente a um objeto ou a um conceito e
varia no grau de intensidade dessa avaliação. Assim, qualquer atitude em relação aos grupos
com determinada identidade pode ser uma reação às variedades usadas por ele, ou aos
indivíduos usuários dessa variedade, já que normas, regras e características culturais de um
grupo são transmitidas ou sedimentadas pela língua, modificada, de maneira particular, na fala
de cada pessoa (AGUILERA, 2008b, p. 315).
Observa-se, porém, que nem sempre a atitude está relacionada como manifestação da
crença que o indivíduo tem sobre um conceito, porque ele pode admitir determinado conceito,
ou seja, pode não apenas achar o conceito coerente ou incoerente, mas simultaneamente
considerá-lo como verdade absoluta ou como verdade relativa.
Portanto a escolha da variedade e estrutura linguística tem um importante efeito sobre
as crenças a respeito da realidade concreta. A escolha linguística mostra as atitudes com que
se justificam as crenças. Assim, mais que um veículo para expressar ideias, pode restringir o
pensar, tendo em vista que a mídia dissemina o que é fashion, quer seja na forma de falar, de
comportamento social ou vestuário e algumas pessoas reproduzem esse comportamento sem
se quer refletir em seu uso. Ao aprender a língua materna, adquire-se também a forma com
que o grupo majoritário avalia a sua língua e as línguas dos outros, isto é, estabelece
julgamentos de valor, mais prestígio e menos prestígio, acarretando de certa forma , situações
de bullying e preconceito linguístico ao grupo minoritário, menos prestigiado socilamente.

64
4.1.2 Atitudes Linguísticas e Comunidades de Fala

Na coexistência de diferentes variedades linguísticas, a disputa entre essas variedades


é percebida por meio da fala, na maneira de pensar, de ser e agir dos falantes. Os valores que
são atribuídos a determinadas variedades, consideradas mais ou menos prestigiadas
socialmente, revelam as atitudes linguísticas dos falantes frente a tais variedades, atitudes
essas, reveladoras de suas crenças, de suas origens que estão associadas à escolaridade, à faixa
etária, à classe social, à religião, à cultura, à nacionalidade, a distintas regiões dentro de uma
nação, à região urbana e rural, a diferentes grupos sociais e esferas profissionais.
Giles, Ryan e Sebastian (1982, p. 20-25) consideram importantes os estudos das
atitudes linguísticas porque pressupõem reconhecer que, em toda sociedade há variedades
linguísticas, que são os dialetos, os sotaques e os registros38, que coexistem de forma
competitiva e contrastante, variedades essas que podem envolver diferentes línguas ou apenas
diferentes estilos de uma determinada língua.
No uso, do dia-a-dia, essas diferenças são confundidas com frequência e têm sido
marcas para discriminação em vários níveis sociais. A questão é que as diferenças são
estigmatizadas pela sociedade.
A base da descrição de comunidade de fala, pautada em Bloomfield (1933, p. 42)
afirma que, “é um grupo de pessoas que interage por meio da fala” 39. Alguns autores
estabelecem distinção entre comunidade linguística e comunidade de fala, e outros autores,
utilizam-nas indiscriminadamente, isto é, utilizam a expressão de acordo com a conveniência
de suas pesquisas. Já que alguns autores apresentam diferentes conceitos para comunidade
linguística e comunidade de fala, faz-se necessário apresentar alguns desses conceitos
estabelecidos pelos estudiosos da linguagem, em ordem cronológica, como é o caso de
Gumperz (1971, p.101), que utiliza o termo linguistic community e speech community isto é,
comunidade linguística e comunidade de fala, discriminadamente.
Para Gumperz (1971, p. 113), a língua dos integrantes da comunidade de fala não
precisa ser necessariamente a mesma, seus integrantes tanto podem ser monolíngues quanto

38
“Os registros são variedades que ocorrem em função do uso que se faz da língua [...] dependem do
recebedor, da mensagem ou da situação.” (TRAVAGLIA, 2002, p. 42). Para as variações de cunho social
também é corrente a designação "socioleto" e para a variação individual “idioleto”. A diferença entre os
termos sotaque e dialeto é que o sotaque é restrito à variedade de pronúncia, enquanto dialeto inclui
diferenças de gramática e de vocabulário.
39
“is a group of people who interact by means of speech.” (BLOOMFIELD, 1933, p. 42).

65
multilíngues e devem estar unidos pela frequência da interação social. Gumperz (1971, p.114)
conceitua também como, “um agrupamento humano caracterizado por uma interação
frequente, regular e efetivado através de um mesmo sistema de signos verbais, e separado de
agrupamentos similares por significantes diferenças no uso da língua”40. Para Gumperz (1971,
p. 116) é necessário que os membros de uma comunidade linguística estejam unidos por
normas e aspirações comuns, no entanto tais normas podem se sobrepor aos limites do
idioma, logo os falantes podem compartilhar das mesmas normas em seus atos de fala.
Contrariamente à Gumperz (1971), Labov ([1972] 2008), na pesquisa realizada na
Cidade de Nova Iorque em 1966, toma como comunidade de fala os usuários que têm o inglês
como primeira língua, isto é, os nativos, não levando em conta os imigrantes, que constituíam
cerca de um terço de Nova Iorque. De acordo com Labov ([1972] 2008, p. 120-121):

a comunidade de fala não é definida por qualquer acordo marcado no uso de


elementos da língua, nem pela participação em um jogo de normas compartilhadas.
Estas normas podem ser observadas em tipos manifestos de comportamentos
avaliativos e pela uniformidade dos padrões abstratos de variação, invariantes em
níveis particulares de uso.

Labov ([1972] 2008, p. 158) considera comunidade de fala “como um grupo que
compartilha as mesmas normas em relação a língua”. A uniformidade de padrões linguísticos,
como critério para definir comunidade de fala. Sua concepção de uniformidade diz respeito a
regras gramaticais que são compartilhadas na forma de regras variáveis. Ao definir
comunidade de fala, enfatiza o primeiro termo do sintagma, deixando em evidência o objeto
da Sociolinguística: a comunidade social em seu aspecto linguístico, ou seja, a comunidade de
fala.
Todos os falantes de uma ou mais línguas pertencem pelo menos a uma comunidade
de fala, de modo que partilham das mesmas normas e variedades linguísticas. Assim, no
âmbito da sociedade, as diferenças advindas de distintos grupos sociais encontram-se
refletidas na variação da linguagem e nas atitudes dos indivíduos diante dessas variantes. Tais
normas são apreendidas pelo pesquisador mediante o valor que os falantes de certa
comunidade de fala atribuem a elas, sendo que – normalmente – ao grupo de prestígio, cuja
fala é dominante na escola, no trabalho, na mídia, nos discursos políticos, entre outros, são
vinculados valores positivos. Segundo Labov ([1972] 2008, p. 192): “membros de uma

40
“human aggregate characterized by regular and frequent interaction by means of a shared body of verbal
signs and set off from similar aggregates by significant differences in language usage.” (GUMPERZ,
1971, p. 114).
66
comunidade de fala compartilham um conjunto comum de padrões normativos mesmo
quando encontramos variação altamente estratificada na fala real”. Vale ressaltar que a
uniformidade das normas compartilhadas pelos falantes geralmente ocorre quando a variável
linguística possui marcas sociais evidentes aos falantes. No caso de não haver tais marcas
vinculadas às variáveis, as normas compartilhadas correm o risco de não ser tão uniformes;
neste caso, a delimitação da comunidade de fala não poderia se restringir unicamente aos
valores compartilhados pelos falantes, pois há variáveis que não são, necessariamente,
conhecidas por estes falantes, embora Labov acredite que “julgamentos sociais inconscientes
sobre a língua podem ser medidos por técnicas.” (LABOV [1972] 2008, p. 248). Portanto, o
que é analisado é o grupo de indivíduos em sua comunidade de fala e não o indivíduo tomado
isoladamente, pois conforme argumenta Labov ([1972] 2008, p. 256), o vernáculo 41 é
propriedade de um grupo e não de um indivíduo.
Hymes ([1967] 1972, p. 47) não concorda com a redução de comunidade de fala à
linguagem estabelecida por Bloomfield (1933). Hymes ([1967] 1972, p. 47) acrescenta que é
impossível equalizar linguagem com comunidade de fala, quando não se tem clareza,
entendimento da natureza da linguagem, e que, “a comunidade de fala não pode ser definida
apenas por meio do critério linguístico.” (HYMES, [1967] 1972, p. 123)42.
Para Fasold ([1974] 1984, p. 42), há uma sobreposição sobre o conceito de
comunidade de fala, pois em geral as pessoas fazem parte de várias comunidades
simultaneamente. As pessoas alteram sua forma de falar para se adequar a determinada
comunidade de fala, acrescentando, subtraindo, e substituindo regras consideráveis do
comportamento comunicativo para se adaptarem à comunidade de interação.
Na definição de Wardhaugh (1986, p. 113), comunidade de fala engloba falantes de
várias línguas ou dialetos, pois as pessoas têm características linguísticas próprias para se
identificar com um grupo ou para se diferenciar dele. Logo, Wardhaugh (1986) reconhece a
impossibilidade de tomar como base apenas o uso de características linguísticas para
determinar o que é e o que não é comunidade de fala.
Romaine (1994, p. 22) também faz distinção entre comunidade linguística e
comunidade de fala:

41
Define-se vernáculo como a fala espontânea, empregada de forma natural entre falantes de um mesmo
grupo.
42
“speech communities cannot be defined solely through the use of linguistic criteria”. (HYMES, [1967]
1972, p. 123).

67
Uma comunidade de fala não é necessariamente coextensiva com uma comunidade
linguística. Um comunidade de fala é um grupo de pessoas que não compartilha
necessariamente a mesma língua, mas compartilham um conjunto e as regras para o
uso da língua43.

A partir do exposto, observam-se basicamente três tendências gerais para a definição


de comunidade de fala: (i) a primeira tendência, refere-se à comunidade de fala como
constituída por pessoas que têm a mesma primeira língua, ou seja, elas interagem por meio
das regras compartilhadas para o uso da língua materna; (ii) a segunda tendência considera o
caráter pragmático da comunicação, independentemente do número de línguas ou variedades
empregadas, nesse sentido, uma comunidade de fala pode se constituir de pessoas que se
compreendem ao fazer uso da mesma língua, mesmo não sendo esta a materna; e (iii) terceira
tendência, uma comunidade de fala pode se constituir de pessoas que julgam pertencer a uma
determinada comunidade de fala, já que se identificam socialmente com ela.
A tarefa de definir comunidade de fala não é simples. Essa dificuldade, no entanto,
precisa ser transposta, quando o desenvolvimento de um trabalho visa compreender a variação
e a mudança linguística.
A concepção aqui adotada, de comunidade de fala, é a mesma concepção, vista
anteriormente, simplificada por Bloomfield (1933, p. 42), pois os membros da comunidade de
fala investigada interagem por meio de uma mistura linguística, são nascidos ou residentes há
mais de 20 anos em cada uma das comunidades investigadas, isto é, moradores de Foz do
Iguaçu (BR), de Ciudad del Este (PY) e de Puerto Iguazú (AR), conforme se descreve na
seção 4, que trata da metodologia empregada neste estudo.

4.2 CRENÇAS E ATITUDES: ESTUDOS REPRESENTATIVOS

No que se refere à base sociolinguística, busca-se nos estudos de alguns teóricos que
tenham suas pesquisas voltadas às crenças e atitudes linguísticas o alicerce para este trabalho.
Ferguson ([1959] 1974, p. 71-94), um dos precursores dos estudos sociolinguísticos
nos anos sessenta, com o auxílio de seus alunos, da Universidade de Washington e da
Universidade de Georgetown, descreve a situação sociolinguística de diferentes países, dando

43
“A speech community is not necessarily coextensive with a language community. A speech community is a
group of people who do not necessarily share same language, but share a set and rules for the use of
language.” (ROMAINE, 1994, p. 22).
68
origem ao profile formulas, que são os critérios que situam cada língua em uma categoria.
Segundo Ferguson ([1959] 1974, p. 99) é o saber dos informantes a respeito da sua
comunidade linguística que estabelece critérios de classificação da categoria linguística. Para
isso estabelece três categorias de línguas – “línguas majoritárias, línguas minoritárias e
línguas de status especial”; estabelece também cinco tipos de línguas – “vernácula, clássica,
padrão, pidgin e crioula”; e sete funções, – “oficial, gregária, veicular, língua de ensino,
língua de religião, língua internacional e língua objeto de ensino”.
Ferguson ([1959] 1974) foi o primeiro a discorrer sobre diglossia e, em seu artigo,
exemplifica com recortes de variedade linguística o que ele entende por diglossia, como se vê
no trecho a seguir:

Diglossia é uma situação lingüística relativamente estável na qual, além dos dialetos
principais da língua (que podem incluir um padrão ou padrões regionais), há uma
variedade superposta, muito divergente, altamente codificada (na maioria das vezes
gramaticalmente mais complexa), veículo de um grande e respeitável corpo da
literatura escrita, quer de um período anterior, quer de outra comunidade lingüística,
que é aprendida principalmente através da educação formal e usada na maior parte
da escrita e fala formais, mas que não é usada por nenhum setor da comunidade na
conversação atual. (FERGUSON, [1959] 1974, p. 111).

Ferguson ([1959] 1974, p. 101-103) apresenta quatro comunidades linguísticas


distintas, nas quais coexistiam duas variedades da mesma língua convivendo em uma única
comunidade linguística: Haiti (francês e crioulo), Grécia (catarevusa e demótico), Suíça
(alemão e suíço) e países árabes (árabe clássico e coloquial). Aponta, também, outras
características da diglossia, como o prestígio social, referindo-se à variedade utilizada em
situações formais, ou seja, em palestras, sermões, discursos políticos, gramáticas, dicionários
dentre outras situações que seguem essa mesma linha do discurso. Essa variedade foi
classificada por variedade alta. A outra variedade utilizada em situações informais, como em
conversas do cotidiano familiar, com os amigos em situações em que a fala não é policiada,
isto é, não há preocupação quanto ao emprego das palavras exigido pela norma padrão, a fala
é livre, essa variedade foi classificada por variedade baixa. Ferguson ([1959] 1974, p. 107)
apresenta outra característica, que é a estabilidade da diglossia, o que faz com que essas
situações possam durar por muitos anos.
Os estudos sobre crenças e atitudes, fundamentam-se na Psicologia Social, conduzidos
à área dos estudos linguísticos por Lambert e Lambert (1966), que buscavam analisar o
indivíduo em seu contexto social e, com isso, ganham destaque dentro dos estudos

69
Sociolinguísticos de Labov (1963, 1966), Fishman (1971, 1972), Fasold ([1974] 1984) entre
outros referendados nesta tese.
Os estudos de Lambert e Lambert, nos anos sessenta, realizados em Montreal-Canadá ,
despertaram interesses relacionados à linguagem humana por outros pesquisadores no ramo
da Sociolinguística, especialmente no que diz respeito às atitudes linguísticas. Lambert e
Lambert (1966, p. 76-109) investigaram falantes bilíngues em francês e inglês, numa
modalidade de teste que tinha como propósito determinar como os falantes se viam
mutuamente. Nessa investigação, Lambert e Lambert utilizaram a linguagem falada como
forma de produzir atitudes estereotipadas, uma vez que os falantes se identificavam pelo
idioma que utilizavam.
Para tanto, na técnica de avaliação indireta, os indivíduos pesquisados não têm
consciência de que a pesquisa se baseava nas suas atitudes linguísticas, inserindo-se, neste
tipo de método a técnica do matched-guise, que, de acordo com Lambert (1967, p. 94),
consiste em ouvir vozes gravadas de declamadores ingleses e franceses lendo pequenas
estrofes do mesmo texto. As gravações eram apresentadas aos informantes para que
identificassem quais eram as características dos falantes, isto é, procedência, profissão, idade,
escolaridade entre outras. Os informantes eram instruídos a indicar o que pensavam sobre as
características da personalidade desses leitores, e informados de que ouviriam as gravações de
dez leitores, na realidade, tratava-se apenas de cinco declamadores bilíngues que liam uma
vez em inglês e uma vez em francês canadense.
Lambert e Lambert (1966, p. 79) afirmam que, “as pessoas nem sempre revelam
abertamente suas atitudes”, porque aprendem a manter certas atitudes “escondidas” em
determinadas situações sociais. Tais atitudes podem ser inferidas a partir de escalas de
medição que incluam, por exemplo, algum tipo de atitude que se pretende averiguar, como é o
caso da língua mais ou menos prestigiada.
Além disso, a pesquisa demonstrou que as atitudes de membros de um grupo
minoritário são afetadas pelos contatos com grupos que são considerados de posição mais
elevada, como ocorre com os grupos de falantes nativos de língua inglesa. O fato de o inglês
ser considerado prestigiado fez com que os estudantes pesquisados atribuíssem aos falantes da
língua inglesa características mais favoráveis que às dos falantes de língua francesa, mesmo
sendo esta a língua materna de muitos deles.
O resultado revelou que, em ambos os grupos pesquisados, os falantes ingleses foram
avaliados de maneira mais favorável, isto é, vistos como mais seguros, ambiciosos, atraentes,

70
inteligentes e de caráter mais positivo que os falantes franceses. Porém, muitos franco-
canadenses, contrariamente aos anglo-canadenses, caracterizavam seu grupo como inferior,
contudo eram recebidos em ambos os grupos, quando utilizam a língua inglesa.
Concluindo seu estudo, Lambert (1966, p. 85) afirma que “as reações dos estudantes
franco-canadenses demonstram, pois, que as atitudes dos membros de um grupo minoritário
são afetadas pelos contatos com grupos que são considerados de posição social mais elevada”.
Segundo Lambert e Lambert (1966, p. 93), o falante tende a demonstrar distintos
modos de pensar, sentir e agir em relação aos acontecimentos e às pessoas do seu convívio.
Foi a partir desse método de pesquisa que Lambert e Lambert na década de 60 abrem
as portas para outros estudos investigativos na área da Sociolinguística, como é o caso dos
testes avaliativos aplicados por Labov ([1972] 2008, p. 23-25), que em 1963 desenvolve uma
investigação, em sua dissertação de Mestrado, a respeito da mudança fonológica, a
centralização dos ditongos /ay/, como por exemplo, em ‒ white = branco e /aw/ doubt =
dúvida ‒ na fala dos nativos e no falar dos pescadores locais, cuja faixa etária era entre 30 e
60 anos, em uma pequena ilha ao Norte da costa americana, chamada Martha’s Vineyard no
estado de Massachussets. Labov ([1972] 2008, p. 201) constata “certos indicadores nas
atitudes subjetivas em relação à vida na ilha”. Atitudes relacionadas “ao turista de verão, ao
seguro-desemprego, ao trabalho no continente, a outros grupos profissionais e étnicos, foram
correlacionados com dados obtidos de líderes comunitários e registros históricos e depois com
as variáveis linguísticas.” (LABOV, [1972] 2008, p. 201).
A mudança sonora na comunidade indicava atitudes de reivindicação pelos direitos e
privilégios locais, contra a ocupação da ilha pelos turistas que estavam adquirindo suas
propriedades, ocupando toda ilha, e com isso pressionando o “vineyardense nativo” a se
retirar para o interior. Dessa forma, segundo Labov ([1972] 2008, p. 202-208), os dados
mostram que o alçamento dos ditongos estava correlacionado com atitudes de forte resistência
às incursões dos veranistas. Quando a atitude era de reivindicação, mais forte era a mudança
sonora dos ditongos.
De acordo com Labov ([1972] 2008, p. 209-211), ao tratar da faixa etária, o grupo
mais jovem de ascendência inglesa considera como referência os idosos e os moradores da
parte superior da ilha, porque esses grupos apresentam atitudes convictas de que têm
propriedade sobre a ilha. Logo, exerciam influência entre os mais jovens. Dessa forma, Labov
([1972] 2008, p. 219) argumenta que, “o significado da centralização, julgado pelo contexto
em que ela ocorre, representa uma orientação positiva em relação à ilha de Martha’s

71
Vineyard.”
Apesar de ter atribuído o significado da centralização como positivo, Labov ([1972]
2008, p. 221-223) observa que os ditongos centralizados não se manifestam na consciência
dos falantes, portanto, busca uma explicação que visa responder de que forma as pressões e as
atitudes sociais estão relacionadas com as estruturas linguísticas. Há um desejo comum aos
moradores da localidade, que é o de ser diferente dos habitantes do continente, pois possuem
uma marca que os unifica e os separa do resto do estado e do país.
Labov ([1972] 2008, p. 202 -203), ao refletir sobre os nova-iorquinos em sua tese de
Doutorado, em 1966, observa que a maioria dos informantes demonstra opiniões convictas
sobre a língua e se mostram firmes ao expressar essa convicção. A maneira como a língua é
percebida pelos informantes está relacionada à aceitação dessa língua. Assim, é recorrente
emitir julgamentos a respeito da língua utilizada por um indivíduo, grupos ou uma
comunidade em geral.
De acordo com Labov ([1972] 2008, p. 208), quando os nova-iorquinos afirmam que
as pessoas de outros estados não se mostram favoráveis ao dialeto falado em Nova Iorque,
demonstram uma atitude considerada por Labov de “auto-depreciação linguística”. E esse fato
é marcante nas mulheres, que depreciam o dialeto nova-iorquino, enquanto os homens se
mostram mais favoráveis ao dialeto utilizado em Nova Iorque. Essa atitude negativa
demonstra o pensamento de pessoas que nunca saíram da cidade. Segundo Labov ([1972]
2008, p. 209), as atitudes negativas relacionadas à fala da cidade demonstram a visão negativa
que o falante tem de sua própria fala que está relacionada às pressões sofridas pela classe
operária para que se adaptasse aos padrões de fala da classe média.
Ao analisar a fala de pais e filhos pertencentes à classe trabalhadora, Labov ([1972]
2008, p. 211-213) argumenta que os informantes mostram não respeitar a fala dos mais
velhos. Os mais velhos são confrontados com a insegurança linguística denominado por
pressure from above (as pressões que vem de cima). Esse mecanismo parte da fala utilizada
por um grupo social elevado em sentido à fala das pessoas que se encontram em um nível
social mais baixo, procurando adequá-las ao padrão linguístico superior.
Todavia, as pressões vindas de cima, não são as únicas a afetar o falante de Nova
Iorque e a provocar mudança. Sua pesquisa mostra que tais pressões podem surgir na parte
inferior da sociedade, denominado de pressures from below, já que os padrões de
estratificação linguísticos se acentuavam ao invés de desaparecer.
Logo, Labov ([1972] 2008) torna-se responsável por fazer da teoria das crenças e

72
atitudes um método de análise dentro da Sociolinguística. Tal afirmação decorre de seus
estudos significativos sobre o inglês americano, iniciado em Martha’s Wineyard (1963),
perpassando pelas lojas de departamento nova-iorquinas (1966) e recorre às crenças e atitudes
linguísticas para explicar como o contexto extralinguístico (valores, sentimentos, estereótipos,
situações) influencia nas atitudes linguísticas dos falantes.
Fishman (1971, p. 51-72) explorou as atitudes linguísticas de 450 informantes
portorriquenhos que habitavam um bairro de Nova Iorque, frente à língua espanhola e à língua
inglesa. Os resultados apontaram para a manifestação de solidariedade dos informantes
perante a língua espanhola, pois a consideram como símbolo de sua própria identidade, ainda
que os inquéritos demonstrassem a crença dos informantes de que a língua inglesa é a língua
de ascensão social e profissional.
Na obra The sociology of a language, Fishman (1972, p. 1) investiga a interação entre
dois aspectos do comportamento humano: o uso da língua e a organização do comportamento
social. Sucintamente, o estudo proposto por Fishman tem foco nos tópicos relacionados à
organização social do comportamento da língua, incluindo não só o uso da língua em si, mas
também atitudes e comportamentos abertos a respeito da língua e de seus usuários.
No mesmo estudo, Fishman (1972, p. 7) define as características: a) das variedades da
língua; b) de suas funções; e c) de seus falantes. Como ocorre a interação constante dessas três
características, isto é, as mudanças transformam um ou outro, ocorrem entre e nas
comunidades de fala.
O estudo das atitudes e crenças linguísticas, portanto, abrange não só os fenômenos
particulares específicos ao tema, como também se estendem ao plurilinguismo e, mais
especificamente, à variedade linguística. Para Fishman (1972, p. 15), a expressão variedade é
uma designação que não atribui nenhum julgamento, ao contrário do termo dialeto, que está
subordinado à língua e não indica apenas variedades linguísticas de origens geográficas
diferentes. Quer dizer, o termo variedade, contrariamente ao termo dialeto “ [...] não indica
um status lingüístico determinado (outro além da diferença) relacionado às outras
variedades.” (FISHMAN, 1972, p. 17) .44
Dessa forma, Fishman (1972, p. 110) desenvolve e dá um novo viés ao conceito de
diglossia de Ferguson ([1959] 1974) e acaba com a ideia de que, para que ocorra a diglossia,
as línguas ou variedades necessitam parentesco genético. Isso quer dizer, que Fishman

44
“[...] indicates no particular linguistic status (other than difference) vis-à-vis other varieties”. (FISHMAN,
1972, p. 17).
73
considera que há diglossia tanto entre duas línguas como o árabe clássico e o árabe dialetal
como entre uma língua européia e demais línguas indígenas.
Assim, relaciona os papéis sociais, as atitudes sobre diferentes línguas e variedades de
linguagens, que refletem o posicionamento das pessoas em diferentes níveis sociais, e como
essa postura influencia a interação no interior ou no exterior das fronteiras de uma
comunidade de fala.
Em seus estudos, Fasold ([1974] 1984, p.148-149) aponta alguns fenômenos que
podem ser influenciados pelas atitudes linguísticas como: a mudança linguística; a maneira
como professores e alunos interagem em sala de aula; o desinteresse por determinada
variedade linguística; a aprendizagem de uma língua estrangeira; a maneira com que os
falantes veem as línguas e dialetos (bonitas, feias, prestigiadas, desprestigiadas); a projeção
futura de uma língua; marca definidora de etnicidade e diglossia.
Fasold ([1974] 1984, p. 176) conclui, por meio desses itens elencados, que a forma de
perceber a atitude linguística como parte do sistema ideológico dominante serve para
organizar, relacionar valores, crenças e comportamento a um conjunto de julgamentos ético e
estético.

4.2.1 Estudos representativos na esfera internacional

Como não se pretende fazer uma apresentação exaustiva da descrição dos estudos
realizados por tais pesquisadores, destacam-se apenas alguns nomes representativos na esfera
internacional: López Morales (1979), que analisa os índices de crenças e atitudes no espanhol
de Porto Rico; Rojo (1981), que desenvolve estudos das condutas e atitudes linguísticas na
Galiza/Espanha; Alvar (1981), que pesquisa as atitudes linguísticas na Guatemala e em Porto
Rico; Blas Arroyo (1994), que estuda as atitudes linguísticas na sociedade valenciana; Gómez
Molina (1998), que investiga as crenças e atitudes linguísticas numa comunidade bilíngue e
multidialetal em Valência relacionadas ao prestígio social; Moreno Fernández (1998), que
estuda as atitudes linguísticas de um indivíduo como resultado de suas crenças, e Blanco
Canales (2006), que analisa as crenças e atitudes linguísticas em Alcalá de Henares e sua
contribuição na análise Sociolinguística dos dados, entre outros.
López Morales (1979, p. 107-130), ao analisar os índices de crenças e atitudes no
espanhol de Porto Rico e o papel relevante das atitudes linguísticas diante da mudança
linguística, reflete também sobre questões como insegurança linguística, hipercorreção e

74
mudança linguística a partir das “atitudes positivas ou negativas”, segundo o status social do
grupo que a caracteriza (LÓPEZ MORALES, 1989, p. 231). A insegurança linguística
acontece quando o próprio falante se sente pouco prestigiado em seu modo de falar,
comparando com a fala do grupo dominante, que estabelece as regras e condutas do que seria
falar de acordo com a norma padrão. A segurança linguística acontece quando o falante se
sente respeitado em sua fala, pois fala de acordo com a norma padrão. Esse fato influencia
diretamente nas crenças e atitudes que o falante tem a respeito da variedade utilizada por ele.
Para López Morales (1989, p. 232), a Sociolinguística preocupa-se fundamentalmente
em definir os contextos linguísticos e sociais que explicam a variação, e de analisar as atitudes
dos usuários frente a certas variantes linguísticas, isto é, os aspectos marginais da língua. De
acordo com López Morales (1989, p. 233), os componentes que formam a atitude perante o
objeto são: o cognitivo ou cognoscitivo, em que são incluídas as percepções, as crenças e os
estereótipos que fazem parte da pessoa; o afetivo, que se refere às emoções e aos sentimentos,
e o comportamental, que se apresenta como tendência a agir e reagir de certa maneira de
acordo com a situação.
Rojo (1981) desenvolve estudos das condutas e atitudes linguísticas na Galiza/Espanha
e chegou às seguintes conclusões sobre a situação linguística no país: a situação diglóssica –
que para Rojo (1981, p. 270) está associada a duas ou mais variantes em línguas distintas (que
é contrário ao conceito de Ferguson ([1959] 1974, p. 111) – ou de desigualdade, dominação
ou desequilíbrio entre o galego e o espanhol quanto aos seus usos sociais e quanto ao grau
diferente de prestígio social que possuem; a assimilação do espanhol tem ascendido
socialmente em relação aos falantes do galego, que tem se apresentado de forma decrescente
na região: o galego está presente nos grupos mais tradicionais, porém há outra vertente
preocupada em recuperar o galego nas comunidades da classe média urbana falantes do
espanhol. O que Rojo (1981, p. 280-301) percebe na Galiza é uma hierarquia de grupos de
diversas etnias linguísticas: a) uma minoria de falantes de espanhol, que controlam a
economia, o aparato político-administrativo da sociedade galega; b) uma minoria monolíngue
em galego, ou com pouco conhecimento do espanhol, absolutamente isolada no campo; c)
uma maioria dominante bilíngue de falantes do galego, com diversos graus de competência do
espanhol, que são imigrantes ou moradores de núcleos semiurbanos, aldeias e vilas; e d) um
sub-grupo do item anterior, uma minoria bilíngue de origem galega, mas que assimilou o
espanhol e encontra no espanhol uma ponte para avançar socialmente, e que vai constituir a
pequena burguesia.

75
A descrição do contato de línguas na Galiza estabelece correlações bilaterais entre a
língua utilizada, contexto e valores sociais. Partindo da diglossia, o galego seria a língua
coloquial, utilizada em contextos informais, enquanto o espanhol seria a língua formal,
carregada de prestígio social.
Os estudos desenvolvidos, na Guatemala, por Alvar (1981, p. 393-406) permitiram
compreender e interpretar as atitudes individuais dos falantes frente à língua nacional com
relação às línguas indígenas que afetam. Cada falante possui uma forma de se comunicar, e ao
se comunicar o falante expressa seus valores, portanto, “cada língua é o que seus falantes
querem que seja.” (ALVAR 1981, p. 394)45. De acordo com Alvar (1981, p. 394), o espanhol é
uma língua carregada de prestígio porque é a língua da escola, da igreja, da administração e
de comunicação entre todas as pessoas do país.
Quanto às línguas indígenas (ALVAR, 1981, p. 395), são estimadas com menor valor,
que desaparecem diante da pressão da escola, da igreja e dos grupos de intelectuais. Em sua
pesquisa, Alvar (1981, p. 398) referindo-se muitos lugares da América Latina, declara
deparar-se com uma realidade polêmica: a indecisão dos falantes que não emitem juízo de
valor relacionado às línguas, porém Alvar (1981) chama atenção para as situações que são
conflitivas, pois ao pensar em um problema de nomenclatura se reconstrói do mundo do
falante um fragmento de história. A história é encontrada no que os falantes de espanhol da
Guatemala pensam sobre si mesmos, quando discorrem sobre a sua língua; os obstáculos
encontrados diante da língua nacional e das línguas indígenas. A história é entendida por
Alvar (1981, p. 400), como uma necessidade que exige caminhar. Alvar (1981, p. 403) conclui
que é na língua que está o tesouro da própria história do indivíduo.
Blas Arroyo (1994, p. 143-155) pesquisa o distrito de Campanar, bairro situado ao
oeste da cidade de Valença, local que apresenta nas línguas em contato uma situação típica,
que a maioria dos estudiosos classifica como diglóssica. As línguas que coexistem na
localidade são o espanhol e o catalão que, na realidade dialetal, é conhecido como valenciano.
Blas Arroyo (1994, p. 147)46 registra, “o entusiasmo que os falantes manifestam diante
do emprego de sua língua em determinados registros oficiais relevantes”. Nessa afirmação,
perpassa um discurso envolto de pressão social, que subjaz na obrigação de usar o valenciano
nos atos públicos oficiais e nos meios de comunicação. Por outro lado, a outra parte dos
falantes, os grupos que não falam essa língua, sente-se seguros e acomodados praticando

45
“cada lengua es lo que sus hablantes quieren que sea.” (ALVAR 1981, p. 394).
46
“[…] entusiasmo que los hablantes manifiestan ante el empleo de la lengua propia en determinados
registros oficiales de especial relevancia.” (BLAS ARROYO, 1994, p. 147).
76
exclusivamente o castelhano, são os grupos de imigrantes procedentes de locais que falam
castelhano, que se opõem à normatização do ensino do valenciano nas escolas.
Ao tratar da diglossia favorável ao castelhano, Blas Arroyo (1994, p. 153) afirma que
existe parcialmente, pois se reduz a grupos ou usuários com características sociais bem
definidas, isto quer dizer que são maiores de 55 anos, com nível sociocultural baixo,
moradores da zona rural, bilíngues com predomínio do valenciano e são os que apresentam
suas crenças bem firmes com relação à língua eleita. Enquanto para os mais jovens é
heterogênea, porque expõe as diferenças de crenças e atitudes em relação às duas línguas,
certos setores manifestam a ausência da identidade linguística, e até consideram o castelhano
como símbolo valenciano, em comparação com outro setor que se orgulha de falar valenciano
e creem na sua vitalidade futura, já os falantes da cidade valorizam mais o castelhano.
Blas Arroyo (1994, p. 155) conclui que estas diferenças permitem caracterizar
relativamente bem a sociedade Campanar no que se refere às adesões linguísticas. Parece, de
fato, que ambos, tanto a filiação linguística como a origem ou status social, são índices
importantes para a estruturação de atitudes Sociolinguísticas nessa comunidade de fala.
Outro estudo desenvolvido em Valência sobre as crenças e atitudes linguísticas numa
comunidade bilíngue e multidialetal relacionadas ao prestígio social foi feito por Gómez
Molina (1998). De acordo com essa investigação, Gómez Molina (1998, p. 95-96) verifica
que não há rejeição por nenhuma das duas línguas e, em geral, não existe pressão por parte
dos falantes para que se escolha uma ou outra língua. Há uma atitude positiva diante do uso
normal do valenciano, mas o uso predominante do castelhano é um fato, uma escolha legítima
que deve ser respeitada, de igual forma o avanço positivo do emprego cada vez maior do
valenciano sem que acarrete prejuízo ao castelhano. Outro fato destacado é que a linguagem
não é para os valencianos sua única marca de identidade sociocultural. Gómez Molina (1998,
p. 96)47 exemplifica que “[...] em Valência e área metropolitana, apenas 29,1% dos
entrevistados creem que é necessário falar valenciano para se sentir valenciano, seja por
sentimento de lealdade, utilidade, orgulho, para evitar a perda, para a integração no grupo
[…]”. Gómez Molina (1998) conclui que isso tudo é sinal de identificação de grupo política e
socialmente.
Moreno Fernández (1998, p. 179-193), destaca a importância da atitude na relação
íntima estabelecida com a língua e com a etnicidade, vínculos de atitude relacionada ao

47
“[...] en Valencia y área metropolitana, solo el 29,1% de los informantes encuestados cree necesario hablar
valenciano para sentirse valenciano, sea por lealtad, por utilidad, orgulho, para evitar su pérdida, para la
integración en el grupo.” […]. (GÓMEZ MOLINA, 1998, p. 96).
77
prestigio e a influência das atitudes nas mudanças linguísticas, consciência sociolinguística e
sua relação com a segurança e insegurança linguística. Trata, também, da natureza psíquica
das atitudes e de seus componentes, tais como atitudes positivas, atitudes negativas e neutras e
sua relação com a insegurança linguística. Para Moreno Fernandez (1998, p. 190), o conceito
de prestígio está relacionado a um comportamento que se tem ou a uma atitude que se
concede a algo ou alguém, como um estudo realizado em Madrid para descobrir a modalidade
de prestígio (individual, profissional, horizontal, vertical, aberto, oculto, entre outros).
Blanco Canales (2006, p. 367) analisa as crenças e atitudes linguísticas no estudo da
linguagem em Alcalá de Henares, uma comunidade situada a 30 quilômetros de Madri, local
onde convivem pessoas de procedência geográficas diversas. O que em muitas ocasiões
propiciou o contato linguístico de diversos dialetos e, também, o desenrolar de processos de
mudanças linguísticas diferentes. Seu trabalho consiste em uma investigação de análise
sociolinguística da fala de Alcalá, uma comunidade que convive com contato dialetal há mais
de cinco décadas. Blanco Canales (2006, p. 367) busca de um lado analisar e descrever as
características fonéticas e morfossintáticas da fala de Alcalá e sua relação com diversos
fatores linguísticos e extralinguísticos, e, por outro lado, examinar a fase de evolução de
alguns processos do espanhol, no que diz respeito à simplificação fonética. Para realizar essa
investigação, Blanco Canales (2006, p. 368) conta com o estudo das crenças e atitudes
linguísticas para a interpretação dos dados.
Segundo Blanco Canales (2006, p. 369), a análise das crenças e atitudes é fundamental
na investigação sociolinguística, pois problemas como a mudança linguística, situação de
línguas ou dialetos em contato, aprendizagem de segundas línguas podem ser elucidadas por
meio do estudo das atitudes dos falantes. Blanco Canales (2006, p. 370) afirma que o estudo
das crenças e atitudes possibilita obter informações sobre o sistema de crenças dos falantes,
sobre suas próprias falas e a respeito das falas dos outros falantes. Verifica que, conforme as
atitudes dos falantes (positivas ou negativas), esses falantes demonstram as suas crenças, o
que possibilita uma investigação a respeito dos fatos linguísticos estigmatizados e os que
apresentam prestigio social (explícito ou implícito).
A partir desses dados, Blanco Canales (2006, p. 373) investiga a direção que a
mudança linguística estava tomando e também à pressão sobre a fala dos alcalaínos. Se havia
desprestígio relacionado a certas variedades linguísticas, em prol da defesa de sua norma ou à
expansão de alguns fenômenos com a evolução interna da língua. Após essa investigação,
Blanco Canales (2006, p. 374) conclui que: 1) há um caráter normativo e conservador nos

78
falantes de Alcalá, devido à grande preocupação de se adequar à norma; 2) há aceitação das
variantes inovadoras no que se refere à investigação fonética; 3) as mulheres apresentam
maior preocupação normativa e foram as responsáveis pelo aprofundamento das análises
linguísticas feitas por Blanco Canales; 4) os falantes mais velhos, da primeira geração,
apresentam uma fala mais conservadora e os falantes mais jovens, da segunda geração,
apresentam uma fala mais inovadora, isso ocorre pela presença dos imigrantes, pois
estabelecem um contato mais estreito com esses falantes que trazem um sotaque bem
carregado, e os mais jovens apresentam maior tolerância e são menos críticos (BLANCO
CANALES, 2006, p. 376); 5) o grande interesse pela língua falada pelos alcalaínos, torna-os
conscientes da mudança linguística nas últimas décadas; e, por fim, 6) uma variedade tão
conservadora e normativa como é a alcalaína apresenta tendências tão inovadoras e demonstra
uma espécie de resistência diante das variedades desprestigiadas.

4.2.2 Estudos representativos no Brasil

Quanto às pesquisas desenvolvidas, relacionadas às crenças e atitudes no Brasil,


constata-se um número bastante significativo de pesquisadores que discorrem sobre o tema,
porém neste estudo, faz-se um breve percurso do desenvolvimento dessas pesquisas, com
objetivo de mostrar como essas pesquisas podem dialogar com a presente tese trazendo à
consideração reflexões sobre a obra de: Alves (1979), que investiga as atitudes de nordestinos
em São Paulo, com relação às variedades linguísticas nativas e paulistas; Ramos (1997), que
procura saber quais as atitudes de falantes de cinco estados brasileiros, isto é, como reagem a
diferentes sotaques; Bisinoto (2000), que analisa a atitude sociolinguística na cidade de
Cáceres – Mato Grosso; Moralis (2000), que estuda os dialetos em contato e verifica as
atitudes linguísticas dos nativos e não nativos do Alto Araguaia – Mato Grosso; Barbosa
(2002), que trata da questão do não-sotaque no processo de formação da atitude linguística
dos falantes de Brasília; Aguilera (2008a; 2009), que trata das “crenças e atitudes linguísticas:
o que dizem os falantes das capitais brasileiras”; e elaborou o projeto sobre as crenças e
atitudes linguísticas, Intitulado “um estudo da relação do português com línguas de contato”;
e Busse (2010), que a partir de um recorte de sua tese de doutorado, escreve sobre as crenças
e atitudes em três localidades do oeste paranaense: Guaíra, Assis Chateaubriand e Santa
Helena.
Alves (1979) investiga as tendências nas atitudes linguísticas dos nordestinos que

79
residiam em São Paulo, em relação às variedades linguísticas nordestinas e paulistas. Quatro
hipóteses nortearam a pesquisa de Alves (1979, p. 37-40): (i) a primeira é a de que
nordestinos em São Paulo, pertencentes a um nível socioeconômico cultural baixo, chamados
de Grupo B, tendem a apresentar atitudes linguísticas mais positivas, em relação às variedades
linguísticas paulistanas; (ii) a segunda é a de que nordestinos pertencentes a um nível
socioeconômico cultural alto, chamados Grupo A, tendem a apresentar atitudes linguísticas
mais positivas em relação às variedades linguísticas nativas; (iii) a terceira é a de que o Grupo
B, busca ocultar sua origem regional, como forma de aceitação em São Paulo e, (iv) a quarta é
a de que o mesmo não se daria com o Grupo A. O resultado da pesquisa, relacionada às
hipóteses (i) e (ii) aponta que o Grupo A prestigiava as variedades linguísticas regionais
nordestinas; diferentemente do Grupo B, que estigmatizava o seu dialeto em favor do falar de
São Paulo, atitude atribuída por Alves (1979, p. 163-165) às perspectivas otimistas nas quais
os falantes enquadravam a cidade de São Paulo. Quanto às hipóteses (iii) e (iv), Alves (1979,
p. 164), não foi possível uma análise diacrônica, sugerindo assim um levantamento
fonológico e lexical para estudos posteriores. Alves (1979, p. 167) sugere “a realização de
uma pesquisa visando observar as atitudes de paulistas em face das variedades linguísticas
nordestinas [...]”.
Ramos (1997, p. 105) aplicou aos seus informantes de faixa etária de (14-15 anos) e
(25-40 anos), dois questionários a respeito das atitudes linguísticas. O primeiro questionário
foi aplicado a 60 falantes de classe média de cinco estados: Rio Grande do Sul, Santa
Catarina, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Paraíba. O objetivo estabelecido para o primeiro
questionário constituiu na avaliação da linguagem veiculada em noticiários de TV,
considerada representativa do padrão culto atual. Ramos (1997, p. 106), com o segundo
questionário, visou avaliar atitudes a partir de amostras dos diferentes dialetos. Um total de 31
informantes mineiros respondeu ao segundo questionário.
Ramos (1997, p. 108) apresenta apenas os resultados de uma etapa do trabalho sobre
atitudes linguísticas. Os resultados apontaram uma rejeição ao dialeto rural em favor dos
dialetos urbanos, o que configura atitudes negativas para o dialeto rural e, positivas, para o
dialeto urbano. Há que se considerar que apenas falantes urbanos foram testados.
Trabalhando a questão de aceitação dos cinco dialetos (RAMOS, 1997, p. 111), os
resultados apresentam: o mineiro e o paraibano como os menos aceitos, seguidos do carioca e
catarinense. O dialeto gaúcho foi contemplado como o mais aceito. O estado do Rio Grande
do Sul avalia positivamente o seu dialeto, ao passo que o estado da Paraíba é o que menos

80
aceita o próprio dialeto.
Ao tratar do dialeto utilizado em noticiários da televisão, em especial o Jornal
Nacional, Ramos (1997, p. 116) constata que os falantes do Rio de Janeiro consideram sua
fala mais próxima à fala da mídia, contudo os falantes da Paraíba são os que dela mais se
distanciam. Na escala de reconhecimento, submetidos a amostras de falas dos diferentes
dialetos, falantes de Belo Horizonte atestaram que o dialeto carioca foi o mais reconhecido. O
dialeto mineiro ficou em terceiro lugar e o dialeto catarinense obteve o menor índice de
reconhecimento.
Ramos (1997, p. 119) conclui que “apesar das limitações, os resultados acima
revelaram que o dialeto preferido pelos próprios falantes é também o que é um dos mais
aceitos pelos demais”.
Bisinoto (2000, p. 15) identifica e analisa as atitudes sociolinguísticas dos nativos da
cidade de Cáceres, MT, e dos habitantes que para a região migraram há pelo menos oito anos.
Para a realização desse estudo entrevista 24 informantes, sendo 12 nativos e 12 imigrantes,
entre profissionais da língua (professores, advogados, jornalistas e radialistas) e leigos, por
meio de entrevistas realizadas individualmente, gravadas e transcritas (BISINOTO, 2000, p.
52).
Quanto à fala dos habitantes de Cáceres, verifica que não se trata de uma variedade
homogênea, devido à presença dos falares carioca, gaúcho, mineiro ou nordestino, que
convivem harmoniosamente, sem pressão social e, “aparentemente, sem autopoliciamento.
Forma-se então um quadro de variação altamente complexo, resultando uma linguagem casual
polimorfa, dada a diversidade de origens dos imigrantes.” (BISINOTO, 2000, p. 31).
O objetivo da pesquisa de Bisinoto (2000, p. 42) “é investigar a possibilidade da
existência de uma estigmatização exacerbada acelerando o desaparecimento do falar local.”
Nesse estudo constata que a variedade linguística local é estigmatizada socialmente e
as formas linguísticas estereotipadas são evidências do enfraquecimento e podem ser um
prenúncio de um possível desaparecimento do falar nativo. Entrementes, Bisinoto (2000, p.
103) relembra que estigmatização da linguagem não se limita às atitudes preconceituosas do
imigrante, e sim, na auto-rejeição do nativo que, ao negar a sua origem, não admite as
diferenças e tem vergonha da sua maneira de falar. “O nativo internaliza ou dissimula perante
o estigma manifestado pelo imigrante, reproduzindo-o. O que difere essencialmente essas
atitudes é a sua motivação.” (BISINOTO, 2000, p. 103).
Bisinoto (2000, p. 103 -105) observa na análise dos resultados que a presença do

81
estigma evidencia estereótipos da variedade linguística local, o preconceito se manifesta no
imigrante e no nativo, pois ambos desprestigiam as formas linguísticas que constituem o falar
cacerense. A distinção reside na motivação do preconceito, tendo em vista que, para o
imigrante, representa o poder, isto é, uma forma de dominação sobre o nativo; e para o nativo,
uma ferramenta de defesa contra as pressões políticas, sociais e econômicas.
Moralis (2000, p. 9) verifica as atitudes linguísticas de goianos, gaúchos, mineiros,
baianos, paulistas, e araguaienses, sob dois prismas: o primeiro trata das “atitudes sobre a fala
de grupos lingüísticos de origens geográficas distintas, em contato dentro de uma mesma
comunidade” e o segundo verifica “as atitudes sobre o papel que a linguagem desempenha na
atividade ocupacional de indivíduos”.
O objetivo do estudo foi saber quais são “as atitudes lingüísticas manifestadas por
falantes nativos e não nativos residentes em Alto Araguaia-MT, com relação às suas falas e às
falas dos outros.” (MORALIS, 2000, p. 21). Os informantes selecionados exerciam atividade
ocupacional distinta, como: “a política, o comércio e a agropecuária”.
Os dados foram coletados por meio de entrevistas diretas, que seguiriam um
questionário previamente elaborado, ficha pessoal e a observação direta. “Foram selecionados
dezoito (18) informantes, três (3) de cada origem geográfica.” (MORALIS, 2000, p. 23).
Assim, Moralis (2000, p. 69) conclui que o falar araguaiense é resultado de muitas
influências, por isso é mesclado.
Moralis (2000, p. 80) afirma que o araguaiense avaliou positivamente os distintos
falares do Alto Araguaia, excluindo apenas o gaúcho, pois considera sua forma de falar
arrogante. Por outro lado, ao se referirem ao trabalho, foram unânimes em manifestar
positivamente a visão que eles têm do gaúcho, reconhecendo a sua contribuição regional. A
forma de falar araguaiense, que é resultado de uma mistura, não desagrada o gaúcho.
Ao tratar das atitudes linguísticas, levando em conta a atividade ocupacional, Moralis
(2000, p. 84) verifica que, “as atitudes dos comerciantes produziram sentidos, inscrevendo
‘todos os seus fregueses’ no mesmo lugar de respeito e tratamento, sem promoção de
separação ou diferença”. Quanto aos informantes políticos, buscavam sempre adequação
vocabular, para, assim, ter igualdade no tratamento com seus eleitores. Já as atitudes
demonstradas pelos informantes agropecuaristas apontam para as diferenças interpessoais, “o
que faz com que um vaqueiro não seja tratado da mesma maneira que um comerciante ou
comprador de gado.” (MORALIS, 2000, p. 85).
O estudo de Barbosa (2002, p. 9) investiga as falas dos indivíduos nascidos no Distrito

82
Federal frente à diversidade de sotaques presentes no local desde a sua constituição,
originando a formação de um falar próprio dos nativos da capital que tem se refletido
especialmente na constituição de uma pronúncia particular de uma fala neutra e sem sotaque.
Esse estudo busca entender como os brasilienses percebem seu falar e suas atitudes
perante a sua fala e a fala do outro. Para tanto, Barbosa (2002, p. 42) propõe “um estudo de
atitudes explícitas em Brasília, com informantes brasilienses, por meio de entrevistas dirigidas
sobre o tema.” As entrevistas foram feitas por meio de um questionário aplicado a doze
informantes, entre 19 e 40 anos, do ensino médio e superior, sendo dois homens e duas
mulheres moradores de três cidades satélites (Plano Piloto, Taguatinga/Ceilândia e Gama):
Plano Piloto é a parte central de Brasília que concentra uma população de classe média alta,
setores de administração pública, comércio, bancos, hospitais, escola e universidade;
Taguatinga é a cidade mais antiga do Distrito Federal e apresenta indústrias e comércio, uma
cidade de classe média e Ceilândia que surgiu como resultado de invasão, apresenta uma
população de classe média e baixa, conhecida por “cidade dormitório”, porque oferece o
básico para os seus habitantes, Gama também considerada “cidade dormitório”, com uma
população de classe média e baixa (BARBOSA, 2002, p. 45-47).
Barbosa (2002, p. 73) concluiu que os informantes entrevistados reconhecem que há
uma fala regional particular aos brasilienses, da mesma forma como os informantes definem
essa fala como um não sotaque, isto é, uma fala sem traços característicos. Isso mostra que os
brasilienses ratificam a imagem externa que existe do Distrito Federal, ou seja, a mesma ideia
de modernidade que promoveu a construção da capital do Brasil: um lugar sem fronteiras
geográficas e/ou dialetais em um só país; um espaço de todos os brasileiros.
Nesse estudo sobre as “crenças e atitudes lingüísticas: o que dizem os falantes das
capitais brasileiras”, Aguilera (2008a, p. 105) discutiu as crenças e as atitudes linguísticas
assumidas e realizadas na fala de 200 informantes urbanos de vinte e cinco capitais brasileiras
“a partir das respostas dadas às Questões Metalinguísticas, que integram os Questionários do
Projeto Atlas Linguístico do Brasil – ALiB (Comitê Nacional: 2001)” (AGUILERA, 2008a,
p. 105).
Aguilera (2008a, p. 106) selecionou os informantes por dois níveis de escolaridade: 50
informantes pertencentes ao nível fundamental, entre 18 e 30 anos; e 50 informantes na faixa
de 50 a 65 anos, sendo 25 homens e 25 mulheres de cada faixa etária (I e II). A mesma
distribuição se dá em relação aos 100 informantes de nível superior, sendo 50 homens e 50
mulheres.

83
Após análises dos depoimentos a respeito da língua que cada um fala e sobre a
existência ou não de grupos que falam diferente na localidade, Aguilera (2008a, p. 109)
verifica que a “grande maioria (92%) acredita falar o português ou língua portuguesa”. Os
demais, que se identificavam com o falar brasileiro, o cuiabano, o nativo, “eram corrigidas na
reformulação da pergunta em favor da crença majoritária”.
Ao concluir suas análises no que se refere à faixa etária, Aguilera (2008a, p. 110)
afirma que, ela, “é definidora da incerteza e da vacilação no momento de o informante expor
sua crença sobre a língua que fala”, pois os mais idosos deixam transparecer bem mais que os
mais jovens essa insegurança. Esse fato, de acordo com Aguilera (2008a, p. 110), não se
restringe apenas à faixa etária, está ligado também à escolaridade, pois os informantes menos
escolarizados se mostram mais inseguros na hora de afirmar que língua falam. Quanto aos
homens e mulheres, as mulheres, demonstraram mais segurança que os homens,
independentemente do nível de escolaridade. Ao tratar da origem do informante, os nativos
das regiões Norte e Nordeste demonstraram uma tendência maior à insegurança “sobre a
crença de falar o português. Essa tendência pode, também, estar associada à variável nível de
escolaridade”. (AGUILERA, 2008a, p. 110).
O estudo sobre “as crenças e atitudes linguísticas: um estudo da relação do português
com línguas em contato”, realizado por Aguilera (2009), no período de 2008 a 2009,
compreendeu a descrição e análise das crenças e atitudes linguísticas dos falantes do
português, em áreas de fronteira e contato linguístico no Paraná, nas localidades de Santo
Antônio do Sudoeste, Pranchita, Capanema, Foz do Iguaçu, Marechal Cândido Rondon,
Guaíra, Irati e Ponta Grossa.
Para a realização da pesquisa, foram produzidos 18 inquéritos em cada cidade, com
exceção de Foz do Iguaçu, município maior que os demais, que exigiu que fossem realizados
36 inquéritos, aplicados a informantes selecionados entre três faixas etárias, isto é, entre 18 e
30 anos, entre 31 e 45 anos e entre 46 e 65 anos, do Ensino Fundamental Incompleto, Ensino
Médio e Ensino Superior de ambos os sexos. Esses inquéritos foram realizados, transcritos e
revistos por membros da equipe do “Projeto Crenças e Atitudes Linguísticas”, disponibilizado
em forma de CD-ROM, o corpus da pesquisa sobre falantes da região do Paraná e está
disponível para os pesquisadores interessados em discorrer sobre o tema. Os 36 inquéritos
realizados na cidade de Foz do Iguaçu foram baseados em um questionário com 57 questões
que envolvem aspectos relativos à língua do informante e outras que são direcionadas à
verificação de como se constroem as crenças e atitudes linguísticas desses informantes.

84
Por meio de questionário metalinguístico, extraído da tese “estudo
geossociolinguístico da fala do Oeste do Paraná”, Busse (2010, p. 118) selecionou respostas
dos inquéritos realizados com os informantes de três municípios: Guaíra, Assis Chateaubriand
e Santa Helena. “A eleição das localidades justifica-se pelos fatores históricos e culturais em
que ocorreram os processos de colonização e povoamento dessas áreas.” (BUSSE e SELLA,
2012, p. 80).
Uma das hipóteses era de que a escolarização poderia contribuir na variável
relacionada ao conservadorismo e à inovação linguística, por isso Busse (2010, p. 113-114)
estabelece os seguintes critérios: i) Homens e mulheres de duas faixas etárias de 18 a 35 anos
e de 40 a 65 anos; ii) não escolarizados ou ensino fundamental incompleto; iii) ensino
fundamental completo e ensino médio incompleto.
Os questionários têm como objetivos, para Busse (2010, p. 116), “além de refletir
aspectos e traços linguísticos específicos da região, confirmar fenômenos observados na
região Sul e no Brasil”. Os inquéritos estruturam-se em duas partes: i) em torno da ficha do
informante e da localidade; ii) questionário fonético-fonológico com 87 questões, questionário
semântico-lexical com 163 questões, questionário morfossintático com 40 questões,
questionário metalinguístico com 8 questões e conversa livre (BUSSE, 2010, p. 118).
As questões metalinguísticas forneceram informações para que fosse realizada “uma
análise das crenças e atitudes linguísticas dos falantes do Oeste do Paraná.” (BUSSE e
SELLA, 2012, p. 77).
De acordo com Busse (2010, p. 266), quanto à fala da região, no que concerne à
dimensão diatópica e diastrática, foi constatado, por meio dos dados coletados durante a
pesquisa, o crescimento e desenvolvimento socioeconômico dos municípios e do sistema de
produção agrícola, pois os minifúndios transformaram-se em latifúndios. Onde havia grandes
plantações de grãos e criação de gado, com a construção da hidrelétrica de Itaipu e Salto
Caxias houve um alagamento das terras desse produtores, originando assim o
desenvolvimento do comércio na fronteira.
Dentre todas as conclusões referentes ao estudo geossociolinguístico da fala do Oeste
do Paraná, Busse (2010, p. 268-269) apresenta que, as formas inovadoras e de preservação de
traços da fala, no que se refere à dimensão diassexual e diageracional: as mulheres e os jovens
são os que apresentam as formas consideradas de prestígio (positivas), em que as formas
inovadoras se encontram em expansão; já os homens e os informantes mais idosos apresentam
traços de conservadorismo dialetal da fala do grupo de origem, que seria considerado pelos

85
demais como formas desprestigiadas (negativas) com a manutenção de traços da fala dos
primeiros colonizadores e de zonas mais heterogêneas.
Em torno das crenças e atitudes sobre a fala, foi apontado “que esta realidade pode ser
observada na implementação da retroflexão na região”. (BUSSE e SELLA, 2012, p. 91).
Tanto é que é possível avaliar a noção de falar correto, falar de prestígio, a partir da pressão
social sobre a fala em comunidades de contato linguístico.
Busse e Sella (2012, p. 92) concluem que:

Fica a impressão de que há um movimento de assimilação cultural, porque nas falas


apresentadas os falantes ora demonstram terem se adaptado ao falar já existente, ora
terem aceito o estigma ou ora parecem certos de que quase todos estão falando uma
espécie de português. Essa última avaliação pode ser um indício de que a
sensibilidade ao multiculturalismo rende também a aceitação da diversidade da
língua, no nível fonético-fonológico, semântico-lexical e morfossintático, e mesmo
de um português praticamente miscigenado, fruto do encontro de culturas, línguas e
falares.

O sul do Brasil, por apresentar na maioria das localidades um contexto multiétnico, em


que os contatos linguísticos são mais intensos, apresenta comunidades de alemães, poloneses,
ucranianos, italianos, espanhóis, japoneses, que são as mais representativas na região, entre
outras comunidades menores. Enquanto na região de fronteira, há um movimento étnico
imigratório e migratório muito intenso, possibilitando inter-relações sociolinguísticas e
culturais intensas, que podem resultar em atitudes de rejeição ou de aceitação, de prestígio
(aceitação linguística), de desprestígio (não-aceitação linguística), ao se depararem com a
diversidade linguística e cultural desses povos, os estudos sobre crenças e atitudes linguísticas
vêm atraindo o interesse de muitos pesquisadores nas últimas décadas. Faz-se a seguir apenas
um recorte exemplificativo de alguns estudos realizados no Sul do Brasil e nas zonas
fronteiriças, pois as investigações destes autores contribuem direta ou indiretamente nos
estudos realizados por esta pesquisadora.
Sobre a situação específica do Sul do Brasil, destacam-se os trabalhos de Frosi, Dal
Corno e Faggion (2005), que trataram da estigmatização à solidariedade nas atitudes
linguísticas, em regiões do interior gaúcho de forte influência italiana; Bergamaschi (2006),
que discorre sobre o bilinguismo de dialeto italiano-português e as atitudes linguísticas em
Caxias do Sul. No Paraná, Amâncio (2007), que trata da atitude linguística dos falantes da
Tríplice Fronteira – Barracão/ PR, Dionísio Cerqueira/SC e Bernardo de Irigoyen, cidade
argentina; Carlos (2008), que analisa as atitudes linguísticas na fronteira de Guaíra/PR;
Pastorelli (2011), que estuda as crenças e atitudes linguísticas na cidade de Capanema: um
86
estudo da relação do português com línguas em contato.
Os estudos de Frosi, Dal Corno e Faggion (2005) fazem parte do projeto de pesquisa
“Linguagem da Região de Colonização Italiana” do Nordeste do Rio Grande do Sul: prestígio
e estigmatização – estigma –, desenvolvido na Universidade de Caxias do Sul, que trata das
situações de contato linguístico, entre o português e dialeto italiano. O estudo das atitudes
linguísticas possibilitaram saber a respeito da evolução, permanência e até extinção de uma
língua ou variedade linguística.
Apresentam-se aqui apenas três objetivos, dos seis estabelecidos por Frosi, Dal Corno
e Faggion (2005, p. 2), que podem relacionar-se com o presente estudo: (a) identificar e
descrever as variáveis socioculturais que dão prestígio ou estigmatizam os sistemas de fala da
comunidade de Caxias do Sul, (b) determinar quem estigmatiza ou atribui prestígio à fala
dialetal italiana e à variedade local de língua portuguesa; (c) determinar quais são as quatro
atitudes em relação à variedade de fala do português padrão.
De acordo com Frosi, Dal Corno e Faggion (2005, p. 3), a investigação é conduzida
em quatro etapas distintas, com aplicação de instrumentos a um corpus constituído por dois
grupos. Um deles é composto por 40 sujeitos de nível de escolaridade superior, habitantes da
Região de Colonização Italiana (RCI); o segundo, por 47 sujeitos de nível de escolaridade
diversa, mas todos habitantes do mesmo bairro do município de Caxias do Sul, distribuídos
por gênero e em duas faixas etárias, entre 30 e 55 anos e entre 56 e 81 anos.
Na primeira etapa, os informantes selecionados respondem às perguntas abertas e
estruturadas, constantes em um instrumento para registro de reações subjetivas, após a
audição de três textos, um em cada uma das variedades linguísticas sob análise.
A segunda etapa, questionário qualitativo, investiga as crenças a respeito da
manutenção da fala dialetal italiana, o que revelou as atitudes dos informantes a respeito das
mesmas duas variedades linguísticas.
A terceira etapa investiga as reações valorativas com relação à fala dialetal italiana, à
fala em língua portuguesa com sotaque dialetal italiano e à fala em língua portuguesa padrão.
Para essa análise, foi considerada a origem étnica dos informantes: foram selecionados 19
descendentes de italianos e 11 não-descendentes de italianos (independentemente de gênero e
faixa etária). Foram testadas duas variáveis, em suas versões: (i) atitudes positivas e atitudes
negativas, de forma a verificar a consistência das opiniões fornecidas nas respostas em relação
à fala dialetal italiana, (ii) à fala em língua portuguesa com sotaque de dialeto italiano. Frosi,
Dal Corno e Faggion ( 2005, p. 8) apresentam 32 afirmações para cada uma das variáveis, e

87
os informantes assinalam suas respostas fazendo a seguinte escolha: concordo plenamente,
concordo parcialmente, indeciso (nem concordo, nem discordo), discordo parcialmente,
discordo plenamente.
Frosi, Dal Corno e Faggion (2005, p. 9) afirmam que “os idosos dão preferência à fala
em dialeto italiano”, (1) e “aquele que fala em português com sotaque de dialeto italiano é
instruído”, (2) isto significa que falar em português com sotaque de dialeto italiano é sinal de
progresso, porém há os que consideram que, quem fala em português com sotaque de dialeto
italiano é atrasado, não progrediu.
Frosi, Dal Corno e Faggion (2005, p. 269) verificam a questão da atitude dos ítalo-
descendentes em relação à fala da RCI. Apontam causas históricas para a sedimentação do
estigma, como a Campanha de Nacionalização do Ensino, promovida pelo governo Vargas na
década de 1930, e a proibição de falar italiano ocorrida na Segunda Guerra Mundial: “A
lembrança traumática da guerra continua sendo uma explicação básica para o fato de o
italiano ser marcado negativamente.” (FROSI, DAL CORNO E FAGGION, 2005, p. 270).
Por outro lado, o uso do dialeto italiano era uma maneira de demonstrar aproximação,
pertencimento ao grupo étnico.
Frosi, Dal Corno e Faggion (2005) concluem que existe na região o que elas podem
considerar um multiculturalismo devido à presença de outras etnias e suas “marcas são aceitas
pelos ítalo-descendentes da RCI, indicando uma superação do preconceito e o reforço a
lealdade e solidariedade do grupo anteriormente desprestigiado.” (FROSI, DAL CORNO E
FAGGION, 2005, p. 277). Isto é, o desprestígio era atribuído ao estereótipo do colono, do
trabalhador rural, tendo em vista o desenvolvimento urbano e seus reflexos sociais.
Bergamaschi (2006), na mesma linha de pesquisa de Frosi, Dal Corno e Faggion
(2005), trata das atitudes linguísticas dos falantes em relação às variedades linguísticas do
português e do dialeto italiano utilizadas nas duas comunidades, isto é, na Sede de Galópolis
(zona urbana) e na Comunidade de Santo Antão na Terceira Légua (zona rural)
(BERGAMASCHI, 2006, p. 14).
Bergamaschi verifica as atitudes linguísticas prestigiadas ou desprestigiadas, assim
como preconceito ou estigma, dos falantes nas ocorrências de português padrão, dialeto
italiano e português com interferências do dialeto italiano.
Para tal estudo, Bergamaschi (2006, p. 70) estabelece os seguintes critérios: dois
informantes do sexo masculino e dois do sexo feminino pertencentes a três faixas etárias de
15 a 25 anos, de 30 a 45 anos e acima de 50 anos, doze são moradores da zona urbana e doze

88
residem na zona rural, somando-se vinte e quatro informantes. Quanto ao nível de
escolaridade, foram distribuídos informantes do ensino fundamental incompleto e completo;
ensino médio incompleto e completo; e ensino superior incompleto.
Bergamaschi (2006, p. 77) informa que todos os informantes ouviram as três versões
de um texto e posteriormente responderam a dezenove afirmações presentes no instrumento
de pesquisa e na sequência responderam as trinta perguntas do questionário, que foi elaborado
com o objetivo de observar aspectos relativos às atitudes de preconceito e estigma presentes
nas respostas dos informantes.
Conforme Bergamaschi (2006, p. 76), nas frases positivas, encontram-se palavras que
caracterizavam os falantes como pessoas de confiança, inteligentes, trabalhadoras e estudadas,
pois atribuíam prestígio aos falantes nas gravações das três variedades linguísticas
pesquisadas. Já as frases negativas, ao contrário, desprestigiavam estes mesmos falantes,
caracterizando-os com uma visão preconceituosa e estigmatizada de pessoas que enganam os
outros, feias, rudes e atrasadas.
Ao confrontar os resultados das análises com duas das três hipóteses levantadas,
Bergamaschi (2006, p. 139) conclui que os informantes das três gerações não apresentam
atitudes negativas, de preconceito relacionadas ao uso do dialeto italiano, nem quanto ao uso
da variedade linguística de português com interferência do dialeto italiano a favor das
variedades consideradas de prestígio como o português padrão e o português utilizado nos
telejornais. Os resultados apontam para o prestígio relativamente semelhante das três
variedades linguísticas consideradas pelos informantes do gênero feminino e masculino na
zona urbana e rural.
Amâncio (2007, p. 7) apresenta e problematiza dados relacionados às atitudes
sociolinguísticas e à identidade, manifestadas por membros de três cidades, Barracão
(Paraná), Dionísio Cerqueira (Santa Catarina), e Bernardo de Irigoyen (Misiones, Argentina),
que fazem fronteira seca entre “dois países, três estados e três cidades, formando, assim, as
Cidades Trigêmeas”, separadas apenas por linhas imaginárias. Para a execução da pesquisa,
Amâncio (2007, p. 31) entrevista vinte informantes, dez homens e dez mulheres, catorze
entrevistas com informantes brasileiros, seis entrevistas com informantes argentinos, de faixa
etária entre 15 e 25 anos, cuja escolaridade era ensino médio ou superior e nascidos na região.
Segundo Amâncio (2007, p. 31), dois fatores levam a diferença de informantes brasileiros e
argentinos; o primeiro, porque são dois municípios brasileiros e uma cidade argentina; o
segundo fator foi a limitação linguística, pois a pesquisadora não fala espanhol e encontra

89
obstáculos para entrevistar argentinos não escolarizados.
É recorrente o discurso sobre a rivalidade histórica existente entre brasileiros e
argentinos. Porém, de acordo com Amâncio (2007, p. 32), “a harmonia e irmandade
anunciadas oficialmente” geram certa inquietação e desconfiança por parte da pesquisadora
que foi in loco “analisar quais as consequências que tal proximidade gera na esfera da
avaliação linguística”. A partir da análise dos dados, Amâncio constata que a situação é mais
complexa “do que o discurso oficial leva a crer”.
Amâncio (2007, p. 92) conclui que é evidente, num primeiro olhar, a avaliação
positiva e entusiasmada dos informantes relacionados à comunidade ao lado e à sua língua.
Contudo, com o decorrer das entrevistas foi percebendo a atitude desinteressada dos
brasileiros em falar o idioma dos argentinos.
As Cidades Trigêmeas, portanto, apresentam divergências, e as delimitações entre os
dois países é bem visível, isto é, há uma relação complexa e contraditória, uma tensão entre o
que chamam de “comunidade ideal”, e de “comunidade real.” (AMÂNCIO, 2007, p. 95).
Carlos (2008, p. 3399) analisa as atitudes linguísticas dos falantes residentes no
município de Guaíra no Brasil e Salto del Guairá no Paraguai, relacionadas aos dialetos do
português e a situação de bilinguismo entre as línguas portuguesa, a espanhola e a guarani,
realizadas por meio do comércio na zona de fronteira.
Conforme Carlos (2008, p. 3400), a pesquisa tem por base os critérios utilizados pelos
pesquisadores do ALiB (Atlas Linguístico do Brasil). A coleta de dados foi realizada por meio
de inquéritos aplicados a seis informantes de três faixas etárias: de 18 a 30 anos, de 31 a 50
anos e com mais de 51 anos; do sexo masculino e feminino; nascidos na localidade ou que
viveram 2/3 de suas vidas no local e que tenham estudado até o ensino médio.
Carlos (2008, p. 3406) conclui que “as atitudes dos brasileiros com relação aos
paraguaios na região de Guaíra são bastante positivas”. E no que concerne à linguagem, todos
interagem sem grandes dificuldades, seja em português, castelhano ou portunhol. O portunhol
é a língua utilizada pela maioria dos habitantes das duas cidades que trabalham no comércio e
Carlos (2008, p. 3406) afirma que, “[...] a língua espanhola deveria ser ensinada nas escolas
de Guaíra e acrescentamos que a língua portuguesa também deveria ser ensinada nas escolas
de Salto del Guairá”.
Carlos salienta a importância do estudo das atitudes linguísticas em regiões
fronteiriças, “devido à complexidade das relações que se fazem nessa fronteira, centro de
compras muitas vezes ilegais e falsificadas”. (CARLOS, 2008, p. 3406).

90
Pastorelli (2011, p. 20) investiga as crenças e atitudes linguísticas na fala dos
moradores de Capanema, que fica ao Oeste do estado do Paraná e faz divisa com a cidade de
Andresito, na Argentina, e seu objetivo foi verificar as crenças positivas e negativas desses
informantes em relação à diversidade linguística que se manifestam na interação cotidiana.
Para a seleção dos informantes, Pastorelli (2011, p. 54) estabelece os seguintes
critérios: seis informantes do sexo masculino e seis informantes do sexo feminino
pertencentes a três faixas etárias de 18 a 30 anos, de 35 a 55 anos e de 60 a 75 anos. Quanto
ao nível de escolaridade, foram distribuídos informantes do ensino fundamental; ensino
médio; e ensino superior. Para realizar os inquéritos, Pastorelli (2011, p. 55) toma por base o
questionário da Dissertação de Mestrado de Bergamaschi (2006).
Ao concluir as análises, Pastorelli (2011, p. 195-196) afirma que a maioria dos
informantes de Capanema demonstraram atitudes positivas no que concerne aos argentinos,
porém apresentam atitudes negativas ao se referirem aos paraguaios, justificando a diferença
sociocultural, que são descendentes de índios, ausência de tecnologia e escolaridade, e a
língua utilizada pela maioria é o guarani e o yopará, vista com desprestígio por parte dos
informantes. Quanto aos alemães, os informantes os consideram fechados, pois não deixam
transparecer as emoções e utilizam um idioma “difícil e esquisito”, portanto visto de maneira
negativa, mas são vistos como trabalhadores responsáveis. Ao se referirem aos italianos, os
informantes manifestaram atitudes positivas, pois disseram que são alegres e espontâneos,
creem na proximidade cultural e linguística, tendo em vista a ascendência latina.

4.3 CONCEITO DE PESQUISA SOCIOLINGUÍSTICA E DIALETOLÓGICA


DIRECIONADA ÀS CRENÇAS E ATITUDES LINGUÍSTICAS

A presente pesquisa define-se como de caráter sociolinguístico e dialetológico, uma


vez que se busca observar as crenças e atitudes linguísticas das diferentes comunidades
pesquisadas e, dessa maneira, compreender o fenômeno da variação linguística, a partir do
estudo in loco.
Assim, compreende-se que o desenvolvimento desse tipo de investigação, torna-se
importante pelo contexto de fronteira em que foi realizada a pesquisa, a riqueza sócio-cultural,
a diversidade étnica e a situação linguística que envolve os três países.
Esses fatores supracitados determinam as especificidades linguísticas das localidades,
e é justamente essa heterogeneidade verificada na língua, na modalidade oral, que nos
interessa neste trabalho: a complexidade do sistema linguístico e as variações nele contidas,
91
determinadas por diferenças espaciais (geográficas).
Dessa forma, entende-se que, de acordo com Alvar (1968, p. 30), não há um método
que seja capaz de abranger em sua completude, a variabilidade de uma língua: “Nunca
possuiremos a realidade de qualquer fala, porque a realidade é mutável em cada comunidade,
em cada indivíduo dessa coletividade e nos momentos, distintos, de cada indivíduo.”
Em consonância com a citação de Alvar (1968) e tomando por base a variação
linguística, combinadas aos princípios sociolinguísticos e dialetológicos, pode-se dessa forma
trilhar os conhecimentos dos mecanismos com que opera uma língua e dos fatores que
determinam sua evolução. Apontando para a heterogeneidade linguística e a necessidade de
confrontar as comunidades de fala. Rossi (1969, p. 87-88) vê nos estudos dialetológicos essa
ponte, que permite transitar entre diferentes pontos geográficos ao afirmar que, Dialetologia:

[...] é uma ciência eminentemente contextual, isto é, [...] o fato apurado num ponto
geográfico ou numa área geográfica só ganha luz, força e sentido documentais na
medida em que se preste ao confronto com o fato correspondente – ainda que por
ausência – em outro ponto ou em outra área [...]

Bright (1974, p. 17) afirma que a tarefa da Sociolinguística é “demonstrar a co-


variação sistemática das variações lingüística e social, e, talvez, até mesmo demonstrar uma
relação causal em uma ou outra direção”. Portanto, cabe à Sociolinguística, dentre outras
tarefas, descrever em padrões gerais o uso linguístico numa determinada comunidade de fala,
a fim de descrever as alternâncias entre a diversidade linguística e os indivíduos que
compartilham de todas essas variedades.
Em sua íntima relação com a sociedade e comunidade fala, a língua revela-se diversa.
Ou seja, há diferenças sociais, de níveis de escolaridade, econômicos, étnicos dos falantes e
há diferenças regionais. Os conjuntos destas variedades compõem um sistema relacionado
com a comunidade de fala. Portanto a Sociolinguística focaliza as diferenças de que os
falantes fazem das línguas ou as crenças desses falantes sobre seu próprio comportamento
linguístico e podem, ainda, de acordo com Bright (1974, p. 18), apreender a diversidade na
sua extensão multidialetal, plurilíngue e social. Dessa forma, os estudos sociolinguísticos são
aplicados como avaliação da estrutura social e na reflexão sobre a história das línguas.
Complementa essa visão o pensamento de Coseriu (1987, p. 3), que define a
Sociolinguística, como: “[...] o estudo da variedade e variação da linguagem em relação com a
estrutura social das comunidades falantes”, e a esse respeito Silva-Corvalán (1988, p. 8)
acrescenta que:
92
Sociolingüística e Dialetologia se tem considerado até certo ponto sinônimos uma
vez que ambas as disciplinas estudam a língua falada, o uso linguístico e
estabelecem as relações que existem entre certos traços lingüísticos e certos grupos
de indivíduos. Assim como a Sociolingüística, a Dialetologia reconheceu desde cedo
a existência da heterogeneidade lingüística48.

Silva-Corvalán (1988, p. 8-9) acrescenta que a Dialetologia especifica o contexto


linguístico no sistema do dialeto em questão e delimita a distribuição geográfica das
variantes. Por outro lado, a Sociolinguística, além de estudar os dialetos e o valor que a
comunidade lhes empresta, incorpora entre outras características, os fatores que incidem na
variação. Examina as atitudes dos falantes de acordo com as diversas realizações, analisa sua
difusão no sistema linguístico e social considerando o grau de prestígio destas formas e de
seus usuários. Pesquisa também a correlação entre as diversas formas linguísticas de uma
língua e sua apropriação de acordo com o estrato social dos falantes e o contexto em que
estiverem inseridos.
Segundo Pottier (1996, p. 41), a Dialetologia tem como objeto central o estudo dos
dialetos da língua, porém “a geografia humana, a econômica e a cultural também se refletem
nessa tela de atividades sociais de onde se projetam os padrões linguísticos dos falantes”.
Nesta perspectiva, a Dialetologia atual não se ocupa apenas de questões diatópicas,
porém acompanha a Sociolinguística, ao analisar fatores de ordem sócio-cultural que
determinam a variação e mudança linguística. Na verdade, a Dialetologia contemporânea
ultrapassa o campo geolinguístico e possibilita o alcance de informações que contemplam a
variação linguística em diferentes dimensões: diatópica, diafásica, diastrática e outros
subtipos variacionais que tem relação entre si. Para tal, Cardoso (2005) fala da importância
dos estudos dialetais para evidenciar não só o que faz referência aos estudos linguísticos:

[...] mas também no que se refere a outros campos do conhecimento com os quais
mantém profunda relação e explícita interface. [...] é reconhecida a relevância da
contribuição que esse ramo de estudos da linguagem pode trazer à reconstituição da
história, ao entendimento da organização demográfica, às questões de natureza
antropológica, em geral, e ao próprio ensino da língua materna. (CARDOSO, 2005,
p. 130-131).

48
“Sociolingüística y Dialectología se han considerado hasta cierto punto sinónimas en cuanto a que ambas
disciplinas estudian la lengua hablada, el uso lingüístico y establecen las relaciones que se dan entre
ciertos rasgos lingüísticos y ciertos grupos de individuos. Así como la sociolingüística, la dialectología ha
reconocido desde siempre la existencia de la heterogeneidad lingüística.” (SILVA-CORVALÁN, 1988, p.
8).

93
Cardoso (2010, p. 26) busca elucidar o que distingue Dialetologia de Sociolinguística,
afirmando que a distinção reside na forma de:

tratar os fenômenos e na perspectiva que imprimem à abordagem dos fatos


linguísticos. A dialetologia, nada obstante considerar fatores sociais como elementos
relevantes na coleta e tratamento dos dados, tem como base da sua descrição a
localização espacial dos fatos considerados, configurando-se, dessa forma, como
eminentemente diatópica. A sociolinguística, ainda que estabeleça a intercomparação
entre dados diferenciados do ponto de vista espacial, centra-se na correlação entre os
fatos linguísticos e os fatores sociais, priorizando, dessa forma, as relações
sociolinguísticas.

94
5 METODOLOGIA

Nesta seção, apresentam-se os procedimentos metodológicos em que se fundamenta


esta investigação, assim estruturados: 1) a constituição do corpus; 2) o perfil sociolinguístico
dos informantes; 3) escolha das localidades; 4) questionários; 5) execução dos inquéritos.
Para a realização desta tese, seguem-se procedimentos metodológicos, com vistas a
disciplinar a investigação e alcançar os objetivos traçados. Sobre os passos a serem seguidos,
Ferreira e Cardoso (1994, p. 23-36) apresentam e descrevem 4 (quatro) etapas principais que
devem ser observadas na pesquisa dialetal:
1) preparação da pesquisa;
2) execução dos inquéritos;
3) exegese e análise dos materiais recolhidos;
4) divulgação dos resultados obtidos.
As quatro etapas elencadas pelas autoras serviram de base para a realização dessa
pesquisa e são explanadas no decorrer desta seção em que são apresentadas todas as
informações de acordo com os cinco itens elencados no primeiro parágrafo desta seção

5.1 CONSTITUIÇÃO DO CORPUS

Para a constituição do corpus, foram entrevistados oito informantes nascidos na


localidade investigada, ou nela moradores há mais de 20 anos, totalizando 24 informantes.
Na seleção dos informantes, foram consideradas as orientações de dialetólogos já
consagrados, como Nascentes (1953, p. 14) e Silva Neto (1957, p. 32), aos quais se agrega o
pensamento de dialetólogos contemporâneos.
Com base no que foi proposto, como estratégia para a coleta de dados e constituição
do corpus, estabeleceram-se os seguintes critérios para a seleção de informantes:
a) Dimensão diassexual – quatro informantes do sexo feminino e quatro informantes
do sexo masculino em cada ponto.
b) Dimensão dialingual ou plurilingual – no caso, português/espanhol, português/
guarani, português/espanhol/guarani, de acordo com a realidade de cada ponto.
c) Dimensão diageracional – Faixa etária I (18 a 35 anos), Faixa etária II (50 a 65
anos). Segundo Silva-Corvalán (1988, p. 75-76), a variável faixa etária pode revelar
três atitudes com relação à língua: “1) identidade de grupo; 2) autocorreção por parte

95
dos grupos geracionais mais ativos na vida pública; 3) mudança linguística em
progresso”.
d) Dimensão diastrática – dois níveis de escolaridade: universitário e não universitário.

5.2 PERFIL SOCIOLINGUÍSTICO DOS INFORMANTES

A composição dos informantes, como se mostra no Quadro 7, contempla falantes de


dois níveis de escolaridade, de duas faixas etárias, envolvendo, de forma equitativa, homens e
mulheres.

Quadro 7 – Composição dos informantes

Escolaridade Masculino Feminino


Não universitário FI 1 (18 a 35 anos) FI 2 (18 a 35 anos)
FII 3 (50 a 65 anos) FII 4 (50 a 65 anos)
Universitário FI 5 (18 a 35 anos) FI 6 (18 a 35 anos)
FII 7 (50 a 65 anos) FII 8 (50 a 65 anos)

Para identificação e descrição dos informantes são considerados os critérios


apresentados na seguinte ordem:
a) Identificação da localidade – Precedendo o nome do informante, apresentam-se as
iniciais de cada uma das localidades, assim definidas: Foz do Iguaçu (FI), Ciudad del
Este (CL), Puerto Iguaçu (PI); seguidas pelo número do informante indicado no
Quadro 07.
b) Iniciais do nome completo.
c) Idade.
d) Estado Civil.
e) Naturalidade.
f) Tempo de domicílio na localidade.
g) Domicílios e tempo de permanência fora da localidade (caso tenha ocorrido).
h) Escolaridade.
i) Profissão.
j) Naturalidade da mãe.
k) Naturalidade do pai.
96
l) Naturalidade do cônjuge.
A ausência de qualquer um dos itens elencados é indicada com um travessão.
FI/1 – JSV. 34. Casado. Foz do Iguaçu. 34 anos. —. Não universitário (ensino
fundamental completo). Vendedor. Paulista. Mineiro. Iguaçuense.
FI/2 – GAS. 29. Casada. Foz do Iguaçu. 23 anos. Seis anos no Rio Grande do Sul.
Não universitário (ensino médio completo). Garçonete. Gaúcha. Gaúcho. Paranaense.
FI/3 – JMS. 55. Casado. Gandu/BA. 21 anos. Morou em Camaçari (BA), chegou em
Foz do Iguaçu aos 34 anos. Não universitário (ensino fundamental completo). Eletricista
predial. Baiana de Gandu. Baiano. Pernambucana de Serra Talhada.
FI/4 – VBS. 50. Divorciada. Foz do Iguaçu. 50 anos. —. Não universitário (ensino
fundamental completo). Cozinheira. Paulista. Mineiro. Alagoano.
FI/5 – AAS. 23. Solteiro. Foz do Iguaçu. 23 anos. —. Universitário. Coordenador de
esporte e lazer. Cascavel. Desconhecido. —.
FI/6 – LML. 29. Solteira. Foz do Iguaçu. 24 anos. Cinco anos em Cascavel (estudos).
Universitário. Vendedora. Mineira de São João Del Rei. Foz do Iguaçu. —.
FI/7 – MB. 51. Casado. Centenário do Sul/PR. 36 anos. Chegou em Foz do Iguaçu aos
15 anos. Universitário. Professor. Formigas em Minas Gerais. Avaré em São Paulo. Foz do
Iguaçu.
FI/8 – MDG. 50. Solteira. Capinópolis/MG, até os 4 anos. 36 anos. Morou em Goiás
até os 14 anos e chegou em Foz do Iguaçu aos 14 anos. Universitário. Professora. Rio Grande
do Norte. Rio Grande do Norte. —.
CL/1 – MFP. 33. Casado. Ciudad del Este. 33 anos. —. Não universitário (ensino
Médio). Manobrista. Vila Rica no Paraguai. Vila Rica no Paraguai. Caaguaçu no Paraguai.
CL/2 – NF. 22. Solteira. Ciudad del Este. 22 anos. — . Não Universitário (ensino
médio). Estudante. Paraguaia. Paraguaio. —.
CL/3 – CAC. 50. Casado. Ciudad del Este. 46 anos. Morou 4 anos em Assunção. Não
Universitário (ensino médio). Segurança. Coronel Olviedo. Coronel Olviedo. Ciudad del Este.
CL/4 – EV. 50. Casada. Ciudad del Este. 49 anos. Morou 1 ano na Argentina. Não
Universitário (ensino fundamental completo). Vendedora. Paraguaia. Paraguaio. Argentino.
CL/5 – AG. 25. Solteiro. Ciudad del Este. 25 anos. Morou 6 meses em Minga Guaçu
no Paraguai. Universitário. Técnico em computadores. Paraguaia. Paraguaio. —.
CL/6 – CG. 27. Solteira. Ciudad del Este. 27 anos. —. Universitário. Atendente.
Paraguaia. Paraguaio. —.

97
CL/7 – CM. 57. Casado. Assunção. 32 anos. Chegou em Ciudad del Este aos 25 anos.
Universitário. Comerciante. Paraguai. Paraguai. Paraguai.
CL/8 – ZL. 50. Casada. Ciudade del Este. 49 anos. Morou um ano em Assunção.
Universitário. Trabalha na imigração. Paraguaia. Paraguaio. Paraguaio.
PI/1 – AO. 34. Casado. Puerto Iguazú. 32 anos. Morou 2 anos em Buenos Aires. Não
universitário (ensino médio). Vendedor. Argentina. Argentino. Brasileira.
PI/2 – MF. 23. Solteira. Puerto Iguazú. 23 anos. —. Não universitário (ensino médio).
Garçonete. Argentina. Argentino. —.
PI/3 – OAO. 56. Casado. Puerto Iguazú. 55 anos. Morou 1 ano em Buenos Aires. Não
universitário (ensino fundamental completo). Aposentado. Argentina. Argentino. Paraguaia.
PI/4 – CC. 50. Viúva. Puerto Iguazú. 50 anos. —. Não universitário (ensino médio).
Inspetora de alunos. Italiana. Alemão. Argentino.
PI/5 – AR. 24. Solteiro. Puerto Iguazú. 24 anos. —. Universitário. Professor.
Paraguaia. Paraguaio. —.
PI/6 – LBA. 27. Solteira. Puerto Iguazú. 27 anos. —. Universitário. Vendedora.
Argentina. Argentino. —.
PI/7 – RAB. 63. Divorciado. Noroeste da Argentina, Catamarca. 36 anos. Morou 5
anos em Curitiba, chegou aos 27 anos em Puerto Iguazú. Universitário. Consultor
empresarial. Argentina. Argentino. Argentina.
PI/8 – NV. 62. Casada. Buenos Aires. 32 anos. Chegou a Puerto Iguazú aos 30 anos.
Universitário. Advogada. Argentina. Argentino. Argentina.
Em resumo, o universo dos informantes foi constituído por 24 falantes, assim
distribuídos: oito informantes de Foz de Iguaçu, oito informantes de Ciudad del Este e oito
informantes de Puerto Iguazú, conforme se apresenta nos Quadros 8, 9 e 10.

Quadro 8 – Perfil dos informantes de Foz do Iguaçu (BR)

LOCALIDADE INFORMANTE NÍVEL ESCOLAR IDADE LOCAL DE TEMPO DE LÍNGUA LÍNGUAS


Foz do Iguaçu NASCIMENTO RESIDÊNCIA MATERNA QUE FALA
(FI) / BR EM FI

Não Universitário
FI/1 J. V. (Ens. Fund.) 34 anos Foz do Iguaçu 34 anos Português Português

Não Universitário Polonês e


FI/2 G. S. (Ens. Fund.) 29 anos Foz do Iguaçu 29 anos brasileiro Português

FI/3 J. M. S. Não Universitário 55 anos Gandu/ BA 21 anos Português Português

Não Universitário Espanhol e Português e


FI/4 V. S. (Ens. Médio) 50 anos Foz do Iguaçu 50 anos Português Espanhol

98
LOCALIDADE INFORMANTE NÍVEL ESCOLAR IDADE LOCAL DE TEMPO DE LÍNGUA LÍNGUAS
Foz do Iguaçu NASCIMENTO RESIDÊNCIA MATERNA QUE FALA
(FI) / BR EM FI

Português,
Italiano e Espanhol e
FI/5 A. S. Universitário 23 anos Foz do Iguaçu 23 anos Português Inglês

Português e
FI/6 L. M. L. Universitário 29 anos Foz do Iguaçu 29 anos Português Inglês

Português,
Centenário do Espanhol e
FI/7 M. B. Universitário 51 anos Sul/ PR 36 anos Português Guarani

Capinópolis/
FI/8 M. G. Universitário 50 anos MG 36 anos Português Português

Quadro 9 – Perfil dos informantes de Ciudad del Este (PY)

LOCALIDADE INFORMANTE NÍVEL ESCOLAR IDADE LOCAL DE TEMPO DE LÍNGUA LÍNGUAS


Ciudad del Este NASCIMENTO RESIDÊNCIA MATERNA QUE FALA
(CL) / PY EM CL

Português,
Não Universitário Guarani e Guarani e
CL/1 M. P. (Ens. Fund.) 33 anos Cidade de Leste 33 anos Castelhano Espanhol

Não Universitário
(Universitário Português e
CL/2 N. F. incompleto) 22 anos Cidade de Leste 22 anos Espanhol Espanhol

Português,
Não Universitário Espanhol e
CL/3 C. C. (Ens. Fund.) 50 anos Cidade de Leste 50 anos Guarani Guarani

Não Universitário Português e


CL/4 E. V. (Ens. Fund.) 50 anos Cidade de Leste 50 anos Guarani Espanhol

Espanhol,
Espanhol e Guarani e
CL/5 A. G. Universitário 25 anos Cidade de Leste 25 anos Guarani Português

Português,
Espanhol e
CL/6 C. G. Universitário 27 anos Cidade de Leste 27 anos Espanhol Castelhano

Guarani e Espanhol e
CL/7 C. M. Universitário 57 anos Assunção/PY 32 anos Castelhano Português

Espanhol e Português e
CL/8 Z. Z. Universitário 50 anos Cidade de Leste 50 anos Guarani Espanhol

Quadro 10 – Perfil dos informantes de Puerto Iguazú (AR)

LOCALIDADE INFORMANTE NÍVEL ESCOLAR IDADE LOCAL DE TEMPO DE LÍNGUA LÍNGUAS


Puerto Iguazú NASCIMENTO RESIDÊNCIA MATERNA QUE FALA
(PI) / AR EM PI

Não Universitário 34 anos Português e Português e


PI/ 1 A. O. (Ens. Médio.) Puerto Iguazú 34 anos Espanhol Espanhol

Português, Espanhol,
Não Universitário Espanhol e Inglês e
PI/2 M. F. (Ens. Fund.) 23 anos Puerto Iguazú 23 anos Inglês Português

99
LOCALIDADE INFORMANTE NÍVEL ESCOLAR IDADE LOCAL DE TEMPO DE LÍNGUA LÍNGUAS
Puerto Iguazú NASCIMENTO RESIDÊNCIA MATERNA QUE FALA
(PI) / AR EM PI

Castelhano,
Não Universitário Inglês e
O. O. (Ens. Fund.) 56 anos Puerto Iguazú 56 anos Castelhano Português
PI/3

Português,
Não Universitário Português e Castelhano e
PI/4 C. C. (Ens. Fund.) 50 anos Puerto Iguazú 50 anos Castelhano Espanhol

Português,
Guarani e Castelhano e
PI/5 A. R. Universitário 23 anos Puerto Iguazú 23 anos Português Espanhol

Castelhano
Guarani e Argentino e
PI/6 L. A. Universitário 27 anos Puerto Iguazú 27 anos Português Português

Noroeste da
Argentina, Português,
Catamarca/ Espanhol e
PI/7 R. B. Universitário 63 anos Santa 36 anos Espanhol Castelhano

Buenos Aires/ Espanhol e


PI/8 N. V. Universitário 62 anos AR 32 anos Espanhol Português

5.3 ESCOLHA DAS LOCALIDADES

A escolha das localidades submetidas à investigação sociolinguística orientou-se pelos


critérios que, a seguir, se apresentam.
O primeiro critério diz respeito à distribuição geográfica das localidades e às
características do português falado na área pesquisada. Assim, foram selecionadas Foz do
Iguaçu no Brasil, Ciudad del Este no Paraguai e Puerto Iguazú na Argentina, localidades que
formam a Tríplice Fronteira.
O segundo critério está relacionado ao contexto plurilíngue e ao fato de, nessa área,
registrar-se a presença de falantes oriundos de várias regiões do Brasil, particularmente em
virtude da migração ocorrida com a construção da usina hidrelétrica de Itaipu, e, assim, esses
falantes hispânicos podem aproximar sua fala à do carioca, à do gaúcho, à do mineiro, à do
paulista ou à de qualquer falante de outra região em que residiu ou reside.
As análises feitas nesta tese tomam como referência o fato de que as crenças e as
atitudes linguísticas são as propulsoras das reações de uma sociedade. Para tal, selecionaram-
se dados que revelam o posicionamento dos falantes relacionados às crenças e atitudes
linguísticas em contexto plurilíngue e multicultural.

100
5.4 QUESTIONÁRIOS

A pesquisa de campo compreendeu várias etapas: identificação do universo da


pesquisa, seleção dos informantes, realização de inquéritos experimentais e definitivos, visitas
às comunidades da fronteira que seriam investigadas, visando ao contato com pessoas da
comunidade, para dar conhecimento aos informantes da finalidade do trabalho e da destinação
do material a ser recolhido.
Na fase da pesquisa piloto, optou-se por adotar o mesmo Questionário elaborado por
Reis49 (2006) para a sua tese “Atlas lingüístico das regiões sul-mato-grossenses na fronteira
Brasil/Paraguai: em busca das inter-influências das línguas em contato”, desenvolvida na
Universidade Estadual de Londrina, sob a orientação da Prof.ª Dr.ª Vanderci de Andrade
Aguilera. A pesquisa-piloto (entrevistas feitas em português), para esta tese, foi aplicada a
quatro informantes (dois informantes de Foz do Iguaçu, uma informante de Puerto Iguazú e
um informante de Ciudad del Este) nos meses de outubro e novembro de 2010. Após a
aplicação-piloto, foram feitas as alterações necessárias nos questionários, como acréscimos e
supressões, para contemplar os objetivos desse estudo.
O referido questionário, cujas perguntas foram feitas oralmente, compreende: (i) o
questionário das crenças e atitudes linguísticas com dezoito perguntas; (ii) temas para
discursos semi-dirigidos com quatro temas e (iii) um texto para leitura. Foi utilizada também,
a Ficha do Informante adotada pelo Comitê Nacional do Projeto Atlas Linguístico do Brasil –
Questionários 2001.
Os temas para discursos semi-dirigidos com quatro temas e com exemplos de
perguntas: 1) Relato Pessoal – Relate sobre um acontecimento marcante em sua vida
(casamento, viagem, namoro...); 2) Comentário – De que programa de televisão você/ o (a)
senhor(a) gosta mais? Por quê? 3) Descrição – Você/ o (a) senhor(a) trabalha em quê? Fale um
pouco sobre o seu trabalho; 4) Relato não pessoal – Conte um caso/ um fato de seu
conhecimento (de que tenha ouvido falar, que tenha acontecido com um amigo, parente, etc.
Com a aplicação de temas para discursos semi-dirigidos, esperava-se obter
informações complementares. Mas isso não foi alcançado, uma vez que os informantes se
limitavam a retomar questões anteriores.

49
O questionário utilizado por Reis é resultado de uma triagem dos questionários do: “Atlas Lingüístico do
Mato Grosso do Sul (ALMS)” (OLIVEIRA, 2007), e também do Extrato do questionário lingüístico
“Atitudes Lingüísticas na Fronteira do Brasil com o Paraguai.” (SANCHES 2006).

101
O texto para a leitura mostra que alguns informantes de Ciudad del Este e de Puerto
Iguazú embora dissessem falar e ler em português, muitas vezes, durante a leitura, substituíam
algumas palavras que estavam escritas em português pela sua correspondente em espanhol,
como é o caso de filho, pronunciavam “hijo”. Constata-se que, a partir do momento que o
leitor identifica o sentido do texto, é como se ele perdesse a noção do que está diante de seus
olhos, pois se deixa envolver pela compreensão da leitura. Esse fato aconteceu com diversos
informantes de ambas as cidades, porém em Foz do Iguaçu a leitura do texto não trouxe
maiores resultados.

5.5 EXECUÇÃO DOS INQUÉRITOS

As entrevistas foram realizadas em locais em que, de preferência, estivessem a sós a


inquiridora e o(a) inquirido(a), visando a atender à disponibilidade dos entrevistados. Todas as
entrevistas foram realizadas em português, os inquéritos linguísticos foram salvos em
pendrive e no arquivo do computador com os dados dos informantes (nome, idade, localidade,
assim como as fichas dos informantes). Fasold ([1974]1984, p. 152) explica que entrevistas
facilitam a obtenção de respostas e o pesquisador pode conduzir a conversa caso os indivíduos
pesquisados tendam a mudar de assunto e até mesmo aprofundar questões levantadas pelos
informantes. Embora o autor julgue como uma desvantagem o tempo consumido para
realização das entrevistas orais, considera-se este instrumento de vital importância para esta
pesquisa, uma vez que através delas obtiveram-se dados extremamente significativos sobre as
crenças e atitudes na Tríplice Fronteira.
A coleta de dados foi realizada nos meses de dezembro de 2010, janeiro e fevereiro de
2011. O tempo de aplicação dos inquéritos foi de quinze minutos a uma hora e quinze
minutos. As entrevistas realizadas em quinze minutos devem-se à objetividade dos
informantes, à sua timidez e por estar no local de trabalho, não se prolongavam nas respostas.
A maioria dos informantes respondeu as entrevistas num tempo aproximado de trinta minutos.
Para um informante registrou-se uma hora e quinze minutos de entrevista, tendo em vista que
ele sempre trazia outras informações relacionadas aos seus projetos realizados com estudantes
e fugia um pouco do assunto. Ao término das entrevistas, registraram-se 696 minutos, isto é
11h36min de inquéritos realizados. Alguns Para a aplicação dos inquéritos foi utilizado
gravador de voz, com as seguintes características: marca SONY ICD – PX820 digital, com
2GB de memória interna flash, com capacidade de armazenar 534 horas e 25 minutos (Modo

102
LP), 89 horas (Modo SP) 33 horas e 20 minutos (Modo HQ), 22 horas e 15 minutos (Modo
SHQ); função de gravação ativada por voz (VOR), microfone embutido de alta sensibilidade
(2 níveis: Low/High), relógio e alarme, com registro de data e hora da gravação, conexão USB
2.0 para conexão com o computador e transferência de arquivos de alta velocidade, indicador
de carga de bateria, visor de cristal líquido (LCD) de 2,8 cm x 2,2 cm grande para fácil
visualização; entrada para fone de ouvido e microfone externo, alto-falante incorporado com
potência de 250mw. Compatível com MP3 e WMA. Dimensões: 30mm x 103.5mm x 16mm
(L x C x A). Alimentação: 2 pilhas AAA, podendo utilizar pilhas recarregáveis. Longa
duração da Pilha: Funciona 26 horas em gravação e 30 horas em reprodução.
A transcrição grafemática dos dados foi realizada de março a dezembro de 2011,
observando-se que as transcrições mais demoradas e que ofereceram mais dificuldade foram
as referente aos informantes de Ciudad del Este e Puerto Iguazú em virtude de as entrevistas
apresentarem uma mescla de português e espanhol.

103
6 ANÁLISE DOS DADOS

As crenças e as atitudes linguísticas se manifestam na forma de se expressar de todo


falante. No que concerne ao homem da fronteira, observa-se uma linguagem carregada de
conteúdo e expressão que, além de identificar a nacionalidade (brasileiro, paraguaio ou
argentino), apresenta realidades diferentes vivenciadas por distintos grupos sociais.
Nesta seção, procede-se à análise do corpus constituído das respostas obtidas com os
inquéritos aplicados em Foz do Iguaçu, Ciudad del Este e Puerto Iguazú e espera-se, com isso,
visualizar a realidade linguística de cada cidade, bem como entender melhor o processo de
variação da língua em comunidades de fronteira.
Para a análise dos dados, optou-se por agrupar as perguntas de acordo com a temática
dominante e a afinidade existente entre elas. Dessa forma, foram constituídos quatro grupos
assim estabelecidos: Grupo 1 – Identificação da língua materna, da(s) língua(s) que mais fala
e daquela(s) em que lê e escreve. Grupo 2 – Crenças e atitudes relativas à identificação de
uma pessoa pelo seu jeito de falar, pela língua mais utilizada na fronteira e das ocasiões em
que as pessoas brasileiras, argentinas, paraguaias falam português, espanhol, guarani, yopará e
as dificuldades linguísticas no uso da língua falada na fronteira. Grupo 3 – Interferência
linguística guarani-espanhol-português, como essa inter-relação é percebida pelo informante,
a importância da pluralidade linguística na fronteira e onde é mais frequente, na família, na
escola, no trabalho, no comércio ou nas relações de amizade. Grupo 4 – Escolha linguística
para ter sucesso na fronteira, a preferência linguística ao contratar empregados — julgados
pela língua e não pela competência — definição se é o homem ou a mulher quem fala melhor
o idioma, a escolha linguística no trabalho de acordo com o grau de escolarização — uma
pessoa instruída fala melhor do que a que tem pouca ou nenhuma instrução — e a escolha
entre os diferentes falares da fronteira.
No corpo da análise, os informantes aparecem identificados pela localidade (letras
iniciais), pelo grau de escolaridade, pelo gênero e faixa etária, conforme disposto na
metodologia. A análise das respostas dadas pelos informantes permite compreender quais são
as crenças do informante da fronteira diante das diversas manifestações linguísticas.

104
6.1 ANÁLISE DOS AGRUPAMENTOS DE PERGUNTAS

Para facilitar a análise e permitir uma melhor intercomparação entre os dados das três
localidades, as respostas reunidas em grupos passam a ser analisadas.

6.1.1 Grupo 1 – Identificação da língua materna, da(s) língua(s) que mais fala e
daquela(s) em que lê e escreve.

O primeiro grupo reúne as respostas a três perguntas – 1. Que língua você o (a)
senhor (a) aprendeu na família? 2. Em que língua você o (a) senhor (a) mais fala? Por
quê? e 3. Em que língua você o (a) senhor (a) lê e escreve? – que são tratadas, inicialmente,
de forma individual e a seguir reunidas em um comentário único.

Pergunta 1. Que língua você o (a) senhor (a) aprendeu na família?


Da conversa com os oito informantes de Foz do Iguaçu, cinco deles, informantes FI/1,
FI/3, FI/6, FI/7 e FI/8 disseram ter aprendido o português com a família, e os demais
aprenderam outra língua, como é o caso da informante FI/2 que aprendeu polonês e da
informante FI/4 que aprendeu espanhol. O informante FI/7 aprendeu português e declarou ter
aprendido a “língua mineira” que é entendida como uma variedade de uso do português, no
qual destaca a pronúncia do /R/ em coda silábica realizado como retroflexo, como se
documenta na sua fala a seguir transcrita:

FI/7 – Eu aprendi língua mineira, que é brasileiro do interior de Minas, po/R/ta, etc.,
em português familiar, depois o português acadêmico. Mas é a mesma, são variantes,
aí por conseguinte...

Já o informante FI/5 menciona sua infância e recorda que ouvia os pais falar italiano e,
portanto, sabe algumas palavras soltas. O fato, porém, de falar apenas algumas palavras soltas
não indica que o informante seja bilíngue. Apesar de fazer essa referência ao italiano, ele é
um falante monolíngue que apresenta um pouco do conhecimento lexical do italiano.
Ao tratar dos informantes de Ciudad del Este, verifica-se que apenas quatro
informantes CL/3, CL/4, CL/5 e CL/8 aprenderam guarani em casa. Duas informantes CL/2 e
CL/6 aprenderam espanhol e dois informantes CL/7 e CL/1 aprenderam o guarani e o
espanhol com a família. O informante CL/1 discorre sobre a influência da televisão no seu
aprendizado do português:
105
CL/1 – [...] na família eu aprendi o guarani, espanhol e português também pelo meio
da tevê.

Nessa afirmação, é notório que a televisão, além de ser veículo formador de opinião,
de entretenimento, de difusão cultural, entre outras características, também é um instrumento
de disseminação linguística. E o fato de aprender português por meio das emissoras de
televisão do Brasil tem sido recorrente na fala dos informantes das duas cidades dos países
vizinhos, conforme os demais depoimentos.
Quanto aos informantes de Puerto Iguazú, segundo as respostas dadas, todos falam
espanhol, que é considerada a língua oficial do país, porém alguns informantes se dizem
falantes do português e do guarani. Dois informantes PI/7 e PI/8 afirmam que aprenderam
apenas espanhol. O informante PI/1 é falante de espanhol e português, e aprendeu português
com a família. O informante PI/3 aprendeu castelhano. A informante PI/4 aprendeu castelhano
e fala um pouco de português, que, de acordo com ela, foi aprendido na família. Os
informantes PI/5 e PI/6 aprenderam guarani e português e a informante PI/2 além do
espanhol, referiu-se ao português e ao inglês como as línguas aprendidas. As respostas dos
oito informantes acabam por surpreender, uma vez que, tratando-se de uma cidade situada na
Argentina cuja língua oficial é o espanhol, cinco deles afirmam falar português. Sabe-se que
há um número significativo de brasileiros que residem na comunidade e que desempenham
suas funções profissionais e comerciais na localidade. Os informantes acreditam que falam
português, porém apresentam forte influência do espanhol, mesclam muito uma língua e
outra, o que demonstra, na verdade, que o português foi aprendido informalmente, na família,
com os turistas e que, em nenhum momento, essa aprendizagem se deu de maneira formal,
passou por uma instituição escolar. Para demonstrar que não há barreiras relacionadas à
receptividade e acolhimento aos brasileiros, fazem referência, como língua do seu domínio,
primeiro ao português e depois mencionam o espanhol.
Em síntese, as línguas aprendidas na família das três comunidades de fala destacam-se
no Quadro 11.

106
Quadro 11 – Língua aprendida na família50

Cidades Total
Foz do Iguaçu Ciudad del Este Puerto Iguazú
Línguas
___ ___
Português 06 06
___
Espanhol 02 02 04
___ ___
Guarani 02 02
___ ___
Castelhano 01 01
___ ___
Polonês 01 01
___
Português e Espanhol 01 01 02
___ ___
Português e Guarani 02 02
___ ___
Português e Castelhano 01 01
___ ___
Espanhol e Guarani 02 02
___ ___
Guarani e Castelhano 02 02
___ ___
Português, Espanhol e Inglês 01 01

Total 08 08 08 24

As perguntas, 2 e 3, são analisadas conjuntamente, tendo em vista que uma


complementa a outra:

Pergunta 2. Em que língua você o (a) senhor (a) mais fala? Por quê?
Pergunta 3. Em que língua você o (a) senhor (a) lê e escreve?
As respostas a essas perguntas podem confirmar ou não o que foi dito anteriormente
pelos informantes. Dessa forma, pretende-se saber quais são as atitudes linguísticas do
informante com relação às línguas que ele domina.
Em Foz do Iguaçu, 75% dos informantes, isto é, seis informantes FI/1, FI/3, FI/4, FI/6,
FI/7 e FI/8 afirmam falar em português. A informante FI/2, que representa 12,5%, afirma falar
brasileiro, e pode-se inferir da resposta da informante que brasileiro é a língua falada por
quem mora no Brasil, da mesma forma que portugueses falam português, franceses falam
francês, italianos falam italiano, japoneses falam japonês e assim por diante. O informante
FI/5, representando 12,5%, afirma falar espanhol a maior parte do tempo.
A Informante FI/4 sabe ler também em espanhol, porém se sente constrangida em
falar, conforme se pode observar da sua afirmação:

50
Registram-se no quadro as expressões espanhol e castelhano como usadas pelos informantes durante a
entrevista.
107
FI/4 – Falar eu não consigo muito não, mas lê eu leio em espanhol, mais falar assim eu
tenho vergonha. [...] Português.

A vergonha de falar, da informante, está fundamentada em estereótipos intergrupais,


isto é, ela poderia ser vista como falante do portunhol, visto como uma língua falada pelos
moradores da fronteira, menos escolarizados e trabalhadores do comércio informal.
O Gráfico 1 demonstra, de forma sucinta, as línguas que os informantes dizem falar
em Foz do Iguaçu, e os dados revelam a resistência dos brasileiros em falar outras línguas
além de mostrar que o número de falantes de espanhol tem se apresentado bastante reduzido.

Gráfico 1 – Línguas que os informantes dizem falar em Foz do Iguaçu

12,5%

12,5% Português
Brasileiro
Espanhol
75%

No que concerne às línguas que os informantes dizem que falam, leem e escrevem,
além do português, pode-se observar, no Gráfico 2, que 62,5% dos informantes de Foz do
Iguaçu, sendo eles FI/1, FI/2, FI/3, FI/4 e FI/8 falam, leem e escrevem apenas em português.
De certa forma, esses dados mostram a resistência dos iguaçuenses em aprender outros
idiomas. O informante FI/5, que representa 12,5%, fala, lê e escreve português, inglês e
espanhol com certa dificuldade e a informante FI/6, que representa 12,5% afirma falar, ler e
escrever, além do português um pouco de inglês. O informante FI/5, apesar de estudar inglês e
espanhol, informa que escreve mal, como indicam as seguintes passagens a eles referentes:

FI/5 – Eu falo mais espanhol. [...] Porque eu trabalho aqui e por uma movimentação
muito grande de argentino. [...] apesar de eu estar estudando eu escrevo muito mal, né?
[...] Inglês, espanhol e português.

FI/6 – Português. [...] Porque eu sei, foi o que eu aprendi. [...] Português e um pouco
de inglês.

O informante FI/7, que representa 12,5%, afirma falar, ler e escrever em espanhol e
que chegou a dar aulas em Ciudad del Este, Paraguai:
108
FI/7 – Por morar na fronteira, aprendi espanhol, daí, aprendi a ler e escrever em
espanhol, depois de formado, fui dar aulas no Paraguai. Então eu falo espanhol
também.

O Gráfico 2 apresenta as línguas que os informantes dizem que falam, leem e


escrevem, além do português, pois, como se pode observar, são poucos os entrevistados que
são letrados em outras línguas.

Gráfico 2 – Línguas que os informantes dizem que falam, leem e escrevem em Foz do Iguaçu

12,5%
12,5% Português

Espanhol

Português e Inglês

Português, Inglês e Espanhol


12,5% 62,5%

Ao analisar as respostas dos informantes de Ciudad del Este, observa-se que, apesar de
mesclarem as línguas, todos os informantes falam português, afinal era um dos critérios para
ser inquirido. Assim, apresentam-se dados em que o (a) informante aponta a(s) língua(s) que
ele(a) mais fala. Dois informantes CL/1 e CL/5, indicando 25%, falam espanhol, português e
guarani; outros dois informantes CL/2 e CL/8, representando 25%, falam espanhol; o
informante CL/3, que corresponde a 12,5%, disse que fala yopará; a informante CL/4,
representando 12,5%, informou que fala português; e os informantes CL/6 e CL/7, que juntos
representam 25%, afirmam falar português e espanhol.
Constata-se que o número elevado de línguas faladas em Ciudad del Este comprova
que se trata de uma comunidade com nítidas evidências de bilinguismo e, em muitos casos,
apresentando situações em que três línguas são utilizadas nas interações sociais, conforme
visto anteriormente. As interações ocorrem normalmente entre pessoas ligadas ao comércio
formal e informal e os clientes, que na maioria das vezes são brasileiros, falam português, ou
portunhol, logo a maioria das pessoas que estão nesse meio também falam português. Para
demonstrar essa situação, destaca-se a resposta do informante CL/5, que traz algumas
considerações a respeito do contexto linguístico em que se encontra:

109
CL/5 – No meu trabalho eu ouço mais o português, porque noventa por cento dos
meus clientes ou as pessoas que frequentam o lugar onde trabalho são brasileiros [...].
Eu falo mais em português. E em minha casa, com minha mãe e meu pai assim,
misturado, eu falo guarani, espanhol, mais guarani do que espanhol, e com os amigos
mais espanhol.

O Gráfico 3 ilustra o número significativo de falantes do português em Ciudad del


Este, dados estes que apontam para uma terceira língua, o português, pois está sempre
presente, se forem somados os dados em que o português está presente com outras línguas,
isto é, 62,5% dos falantes.

Gráfico 3 – Línguas que os informantes dizem falar em Ciudad del Este

25% 25%
Espanhol
Yopará

Espanhol, português e guarani

12,5% 12,5% Português

25% Português e espanhol

No que se refere às línguas que os informantes de Ciudad del Este dizem que falam,
leem e escrevem, observa-se que 75%, isto é, seis informantes CL/1, CL/2, CL/4, CL/6, CL/7
e CL/8 falam, leem e escrevem apenas em espanhol, de acordo com o excerto das respostas
dos informantes a seguir apresentados:

CL/1 – Espanhol, porque o guarani é muito difícil pra... é como inglês também, né?
Fala de uma forma, mais iscribe de otra forma, né?

CL/7 – Espanhol para ler e escrever, português para ler tudo bem, mas para escrever é
mais difícil, eu não estudei, eu só aprendi assim.

O informante CL/3, que representa 12,5%, lê em português, espanhol e guarani, já o


informante CL/5, representando 12,5%, afirma falar, ler e escrever em espanhol, português e
guarani, conforme recorte da entrevista a seguir:

CL/5 – [...] Eu leio e escrevo em espanhol perfeitamente, e guarani eu leio


perfeitamente, escrever já é um pouco mais difícil, mas a gente escreve também. E em

110
português, de repente se for necessário eu escrevo também [...].

O Gráfico 4 apresenta o perfil linguístico dos informantes de Ciudad del Este, como se
pode observar, com dados referentes às outras línguas além do espanhol. Embora essa seja
uma informação dada por um informante, é um dado significativo, demonstra que a cidade
está despontando para a terceira língua, o português, que há pouco tempo estava presente
apenas no discurso oral informal e que começa a despontar com o ensino formal, em escolas,
nos países do MERCOSUL. Por outro lado, as cidades da Tríplice Fronteira já podem ser
consideradas bilíngues (Foz do Iguaçu e Puerto Iguazú), e Ciudad del Este que é
historicamente bilíngue por falar espanhol e guarani e depois do acordo do MERCOSUL, com
o ensino do português, passa a ser trilíngue.

Gráfico 4 – Línguas que os informantes dizem que falam, leem e escrevem em Ciudad del Este

12,5% 12,5%

Espanhol

Espanhol, português e guarani

Lê em português, espanhol e guarani


75%

Quanto aos informantes de Puerto Iguazú, constata-se que 25% afirmam falar
espanhol, como é o caso dos informantes PI/1 e PI/8, outros 25% são representados pelas
informantes PI/2 e PI/6, que se dizem falantes do português e espanhol de acordo com o
recorte da fala com a informante PI/6:

PI/6 – Português. [...] Eu acho que pela triplé frontera que a gente está, tem muitas
pessoas do Brasil, então, aí, a gente pode praticá mais o idioma.

Os informantes PI/3, PI/4 e PI/5, somando 37,5%, afirmam falar castelhano, enquanto
que 12,5%, representado pelo informante PI/7 falante de portunhol. Os informantes PI/3 e
PI/7 apresentam considerações a respeito de suas escolhas:

PI/3 – É, por la situación del trabalho e… Durante el dia uno siempre fala más
castelhano, pero también cuando tem que falar com brasilero o turista, aí falamos
português, portunhol, que és uma mescla de, de idiomas.
111
PI/7 – Aqui na região eu falo portunhol. [...] Porque eu acho que é a língua que
representa mais de trezentos milhões de habitantes.

A informante PI/8, falante de espanhol, demonstra ter consciência de falar portunhol


com os brasileiros e justifica sua dificuldade em falar português, conforme se pode observar
no excerto a seguir:

PI/8 – Porque a língua principal é o espanhol, mi trabajo, às vezes tengo que ver-me
com personas que hablan portunhol, e trato de hablar um portunhol habitual. [...] a cá
viene de noite muitos brasileiros, então eu trato de que ellos fiquem tranquilos, trato de
falar-lhes em português, para que nos entendamos mejor, ou portunhol certo [....].

Nas respostas obtidas, podemos constatar que a atitude do informante perante a língua
que ele domina é sempre positiva, porém nas interações sociais, todos procuram fazer uso da
língua do interlocutor para se fazer entender, diversificando a sua fala, isto é, usam uma
variante mais próxima do interlocutor. Percebe-se, também, que algumas línguas não
consideradas pelo informante, na pergunta anterior, são apresentadas agora, como é o caso do
português e o portunhol.
O Gráfico 5 apresenta os dados referentes aos falantes das diversas línguas em Puerto
Iguazú. Pode-se perceber que o castelhano predomina sobre o espanhol, dado revelado nas
respostas à segunda pergunta, pois na primeira pergunta era o espanhol quem se destacava.
Uma consideração, porém, se faz necessária para esclarecer o uso das duas denominações,
espanhol e castelhano. Durante os inquéritos, percebeu-se que alguns informantes não
utilizam o espanhol e o castelhano como sinônimos, de acordo com as respostas obtidas. Em
vista disso, consideram-se as duas denominações separadamente, espanhol e castelhano, tendo
em vista que alguns informantes estabelecem diferença entre as duas denominações:

PI/4 – Castelhano... Porque vibo a cá e trabajo em la província com alunos, la escuela,


entonce tem que se hablar si el espanhol.

PI/7 – Leio muito em português, escrevo em portunhol, mas leio muito mais em
espanhol, castelhano e escrevo em castelhano.

Embora alguns informantes façam distinção entre o espanhol e o castelhano, observa-


se que se trata da mesma língua, portanto, castelhano e espanhol são sinônimos. Infere-se,
assim, que essa distinção estabelecida por alguns informantes está ligada à origem do

112
espanhol, que abrange questões políticas, ideológicas e de colonização, assim a maioria dos
informantes de Puerto Iguazú afirmam falar castelhano que é uma construção popular.
Os dados comprovam que a interação entre brasileiros e argentinos é menor do que a
interação com os paraguaios, pois o comércio em Puerto Iguazú não tem a variedade de
produtos importados presentes em Ciudad del Este.

Gráfico 5 – Línguas que os informantes dizem que falam em Puerto Iguazú

12,5%
37%
Castelhano
Espanhol
Português
Portunhol
25%

25%

Considerando-se as línguas que os informantes dizem falar, ilustradas no Gráfico 5, no


que se refere ao espanhol e ao castelhano, tendo em vista que os termos são sinônimos, tem-se
na realidade que (espanhol 25% + castelhano 37,5%) 62,5% falam espanhol, 25% falam
português e apenas 12,5% são falantes do portunhol.
Quanto aos informantes de Puerto Iguazú que dizem que falam, leem e escrevem,
apenas em espanhol, representam 50%, isto é, quatro informantes, PI/1, PI/2, PI/4 e PI/8;
outros 25% correspondem aos informantes PI/3 e PI/5, que falam, leem e escrevem apenas em
castelhano. Já a informante PI/6, representando 12,5%, afirma falar, ler e escrever o
castelhano argentino. Na verdade, todos os informantes falam, leem e escrevem em espanhol,
porém eles têm a crença de que espanhol e castelhano são diferentes, fazem distinção entre as
variedades faladas e estabelecem diferentes denominações, conforme se pode constatar na
resposta do informante PI/7, que representa 12,5%, informa que fala, lê e escreve em
castelhano e espanhol:

PI/7 – [...] Leio muito em português, escrevo em portunhol, mas leio muito mais em
espanhol, castelhano e escrevo em castelhano.

Embora o informante PI/7 leia em português, ele não têm habilidade para escrever,

113
pois disse que escreve em portunhol, a variante mais utilizada na Tríplice Fronteira. O
desprestígio, porém, que circunda o portunhol, faz com que poucos informantes se apresentem
como falantes do portunhol. Por mais que os informantes de Ciudad del Este e Puerto Iguazú
se autodenominassem falantes de português, a maioria deles, na verdade, fala portunhol, e as
marcas do espanhol estavam bem presentes durante a aplicação e transcrição dos inquéritos
realizados.
A informante PI/8 faz suas considerações a respeito da língua em que fala, lê e
escreve:

PI/8 – [...] mi padres são netamente argentinos, com raízes européias, italianos,
franceses, pero já de segunda, terceira generação argentina, então totalmente um
espanhol claro, claro, sem mistura, não mesclado, que é muy distinto, desse de muitas
famílias a cá [...].

Dos dados que refletem a realidade dos falantes de Puerto Iguazú, que, embora digam
falar português, percebe-se que falam portunhol, conforme observado durante a aplicação dos
inquéritos, em que sempre se mostram bastante receptivos aos brasileiros, e a receptividade
está na aceitação do português e no esforço para poder se comunicar nessa língua. De acordo
com os informantes, não há interesse em aprender uma língua estrangeira,
O Gráfico 6 apresenta as línguas que os informantes dizem falar, observa-se que eles
se dividem em castelhano e espanhol. Alguns estabelecem distinção entre as duas formas,
porém o que se constatou, durante os inquéritos, é que eles usam os termos
indiscriminadamente. Sabe-se, porém, que a distinção entre espanhol e castelhano está
relacionada ao prestígio social. A língua que é mais prestigiada é a que tem história, pois a
língua sempre é vista como forma de manifestar poder, conhecimento e discernimento social.
A partir destes dados, apresentados no Gráfico 6, pode-se dizer que, na verdade, 100%
dos informantes falam espanhol, tendo em vista que espanhol, castelhano e castelhano
argentino são a mesma língua

114
Gráfico 6 – Línguas que os informantes dizem que falam, leem e escrevem em Puerto Iguazú

12,5%
12,5% Espanhol
Castelhano
Castelhano argentino
Castelhano e espanhol

25% 50%

Pode-se dizer, após análise desse primeiro grupo de respostas, que os brasileiros e
argentinos têm atitudes positivas em relação à sua língua nacional e os dados revelam que eles
não se mostram interessados em aprender outros idiomas. As atitudes consideradas negativas
estão relacionadas à acomodação linguística dos falantes dessas comunidades. Por que
acomodação linguística? Em nenhum momento observou-se o interesse da maioria dos
informantes em formalizar o conhecimento de pelo menos mais um idioma, e nesse caso, a
referência é quanto ao português para as comunidades de Ciudad del Este e Puerto Iguazú e
ao espanhol para a comunidade de Foz do Iguaçu, nada obstante um dos acordos do
MERCOSUL prever o ensino dessas línguas para melhorar a interação entre os países, como
se lê no acordo sobre ensino de português e espanhol no MERCOSUL (PDC-2072/2009).
Conforme o Portal do MEC (2013, online)51, trata-se de um acordo que estabelece regras para
o ensino de português e espanhol como línguas estrangeiras nos países do MERCOSUL
(Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai), aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e
de Cidadania (CCJ), em março de 2010.
Segundo o acordo, cada país deverá credenciar uma rede de instituições para a
capacitação de professores com cursos de duração mínima de 3 anos e 2.400 horas de estudo.
O reconhecimento oficial do título garante que não haverá distinção entre professores de
nacionalidades diferentes. Ou seja, não poderão ser exigidos de professores de outros países
do MERCOSUL quaisquer requisitos para o exercício da docência que não sejam aqueles já
exigidos para os seus cidadãos. O acordo também estabelece que o credenciamento para o
ensino de português e espanhol como línguas estrangeiras não permite a docência de qualquer
outra disciplina.
Essas atitudes linguísticas revelam ainda que a comunicação é estabelecida

51
Portal MEC, Brasília. Escola de Fronteira. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=
com_content&view=article&id=12586:escola-de-ronteira&catid=341:escola-de-fronteira&Itemid=835>.
Acesso em: 10 de março de 2013.

115
informalmente, no cotidiano, porque os informantes afirmam que não precisam estudar para
progredir profissionalmente, nos negócios e nas relações sociais, isto é, a interação em
portunhol é fato na Tríplice Fronteira. O portunhol proporciona o alcance de alguns objetivos
dos moradores locais, como o de comprar e vender e, quando necessário, fazem uso de um
termo ou outro em inglês e assim a vida segue na fronteira.
Por outro lado, numa situação de bilinguismo, como a analisada, as atitudes
linguísticas passam a ser entendidas como as reações do sujeito bilíngue diante da situação
das línguas que conhece. As causas que levam um bilíngue a escolher entre uma língua ou
outra para usar em determinadas situações são, por um lado, o conhecimento das duas línguas,
suas atitudes em relação a elas, seu nível de identificação e seu desejo de utilizá-las. Por
outro, os fatores sociais, as normas que regulam o uso de uma ou de outra língua em distintas
situações públicas ou privadas. Portanto, as atitudes em relação à língua estão entre os
principais fatores para esclarecer que línguas são aprendidas na família, e em que língua o
informante mais fala, lê e escreve.
A atitude de um bilíngue ou trilíngue relacionada a duas ou mais línguas faladas na
fronteira influenciará o seu comportamento nessa área de contato em que cada língua é usada,
nas mais diversas situações. O falante pode se sentir constrangido devido a sua pronúncia,
como é o caso de alguns informantes analisados que leem, compreendem, mas têm vergonha
de falar.
Uma vez que a língua identifica o grupo, funciona tanto como instrumento de
comunicação, quanto como símbolo de identidade de grupo. A língua é acompanhada de
crenças e atitudes positivas e negativas, que pertencem aos usuários que não sabem usá-la e
muitas vezes são silenciadas devido ao preconceito relacionado à sua língua materna. Isso
sucede com o yopará, sobre o qual alguns informantes disseram que é a língua falada pelas
pessoas menos escolarizadas e de pouco poder aquisitivo.
Na análise das línguas em contato, nota-se que existe preconceito linguístico e que está
relacionado ao portunhol, ao yopará e ao guaraportunhol. Conforme se depreende das
respostas de alguns informantes, que conhecem a variante dialetal, sabem do seu uso,
identificam as pessoas que utilizam essa variante, porém afirmam não utilizar tal variante,
com o intuito de se colocar num patamar superior aos demais.

116
6.1.2 Grupo 2 – Crenças e atitudes relativas à identificação de uma pessoa pelo seu jeito
de falar

Ao observar a maneira de um indivíduo falar, pode-se identificar seu país ou região de


origem. Os informantes que reconhecem a origem dos falantes pontuam alguns elementos
como forma de identificação: a maioria dos informantes sinaliza o sotaque como um ponto
marcador da origem; outros destacam o léxico; alguns acreditam que o falante pode ser
identificado pelo tom da voz, por expressões próprias utilizadas pela região de origem. Assim,
uma variante utilizada por membros da comunidade que possuem prestígio social, adquire
também esse prestígio, isto é, a valorização de uma variante por ela ser utilizada por um grupo
dominante, e passa a ser reconhecida como variante padrão ou de prestígio. Por outro lado,
uma variante falada por classes menos escolarizadas, passa a ser vista de maneira negativa e
transforma-se numa variante tida como não-padrão, na área, ou estigmatizada, pelo fato de ser
utilizada por um grupo dominado.
O conjunto que se passa a analisar constitui-se de quatro perguntas, assim distribuídas:
4. Pode-se reconhecer a origem de uma pessoa pelo seu jeito de falar? Cite
exemplos.
5. Qual a língua mais utilizada na fronteira? Por quê? Em que ocasiões essa língua
é mais utilizada?
6. Em que ocasiões as pessoas brasileiras/ argentinas/ paraguaias falam espanhol/
castelhano/ yopará/ guarani/ português/ árabe etc.? Por quê?
7. Quais as dificuldades linguísticas que você o(a) senhor (a) encontra no uso da
língua falada na fronteira? Por quê?
A análise parte da abordagem de cada uma das perguntas, em separado, e, ao final,
apresenta-se uma reflexão geral sobre as crenças e atitudes desse conjunto de respostas.

Pergunta 4. Pode-se reconhecer a origem de uma pessoa pelo seu jeito de falar?
Cite exemplos.
Com esta pergunta, busca-se identificar o grau de percepção que tem o falante da
diversidade de usos na sua própria língua e do comportamento que têm falantes de outras
línguas maternas quando utilizam a língua portuguesa.
Dos oito informantes inquiridos de cada localidade, isto é, vinte quatro informantes no
total, apenas dois deles — um de Ciudad del Este e outro de Puerto Iguazú — demonstraram
em suas respostas que não percebem a origem de uma pessoa pelo seu jeito de falar. Pode-se
117
dizer que todos os informantes de Foz do Iguaçu reconhecem a procedência da pessoa pelo
seu modo de falar, conforme documentado no corpus:

FI/1 – É... Isso aqui dentro do nosso estado, nosso país mais ou menos. Eu acho que
pode sim. Eu, eu converso com bastante carioca eles têm um jeito de falá, pessoas que
veio lá do Nordeste, tem um cearense que trabalha aí [...], já sabe da onde mais ou
menos qual é a região deles, mais ou menos assim dá pra distingui.

FI/4 – Pode. [...] O paraguaio tem uma forma de falar. O argentino tem outra, alemão,
italiano e aqui no Brasil, aqui no Brasil eu defino bem também. Quem é mineiro,
mato-grossense, carioca [...].

FI/5 – [...] Não, não acho que não tem. [...] Pois é, talvez um pouco mais arrastado do
mineiro [...]

O informante FI/7 traz alguns exemplos de variação lexical como forma de


identificação da localidade de origem, conforme o depoimento:

FI/7 – Sim, pode. [...] se você vier pra mim e falá assim, vai comer macaxera, eu já sei
que você é lá do Ceará, da Bahia, aipim, se vier falá vou comê aipim, se vier assim, ai
que saudade de uma cuca, eu sei é uma pessoa do interior do Paraná, que veio do Rio
Grande, ou é do Rio Grande, dá pra sabê tranquilamente [...].

Os informantes FI/2, FI/3, FI/6 e FI/8 referem-se ao sotaque e algumas interjeições,


como forma de identificar a origem, procedência desses falantes, de acordo com os trechos
extraídos das entrevistas:

FI/2 – Pelo sutaque, pelo jeito da pessoa se expressá.

FI/3 – Pelo sotaque sim, [...] Qualquer estrangeiro mesmo falando portugueis tem um
sotaque, né? Por exemplo, [...] um americano há vários anos no Brasil ele assim, tem
um sotaque diferente.

FI/6 – Quase sempre, tem regionalismo,[...] por exemplo, nordestino, o pessoal de São
Paulo tem o sotaque puxado.

FI/8 – É provável, geralmente as pessoas trazem o sotaque, né? A maneira, né? Que ela
fala, é as particularidades que seriam os dialetos, que elas falam, isso identifica. Uai, é
de minera, é deixa o vê, tchê, por exemplo, quando fala assim é de gaúcho [...].

No que tange à Ciudad del Este, todos os informantes identificam a origem da pessoa
pelo seu jeito de falar e também apontam o sotaque (que chamam de tom, tonada, tono) como

118
fator que identifica a procedência das pessoas, como é o caso dos informantes CL/1, CL/2,
CL/4, CL/5 e CL/7, conforme se expressaram nas entrevistas:

CL/1 – [...] Sim, né? Por exemplo, o Via Riquenho, ele tem um tono de aquele tipo
mexicano, de onde você veeiim, é aquele tono, né? Depoi tem aquele que são de
Assunção.

CL/2 ‒ Sim. É o tom quando ele é de outro país vem falá aqui em espanhol é
totalmente diferente, no és o mesmo. É a mesma coisa eu falo português mais com um
tom diferente, então posso reconhecê.

CL/4 ‒ Si, quando um argentino fala português eu percebo pelo sotaque.

CL/5 ‒ Eu acho que sim, não é? Pela cultura, pelo tono de voz, essas coisa, por
exemplo, os paulistas por exemplo que quando falam, dá pra vê de longe que são
paulista, porque eles já começam gritando, falando alto, falando rápido, eu acho isso,
por exemplo.

CL/7 – Si, todo estrangeiro em mi país fala diferente, segundo a tonada de cada um
dele a gente pode distingui de onde ele vem, e o brasileiro pra mim é coisa simples, o
carioca fala diferente o paulista, o baiano.

Verifica-se na resposta do informante CL/5, questões relacionadas à influência das


línguas em contato, neste caso o português coloquial falado pelos brasileiros.
A questão relativa à crença de que todo paulista fala gritando, alto e rápido,
julgamentos a respeito das pessoas de acordo com suas características linguísticas, é uma
forma de criar estereótipos, considerados como a base cognitiva do preconceito. O estereótipo
tem sua origem na crença sobre as características pessoais que se atribui aos indivíduos. É
possível identificar tais estereótipos através da língua, já que, em geral, aparecem
concretizados na atitude linguística dos falantes. Nota-se, na resposta do informante CL/5, que
a atitude de rejeição está vinculada à forma de falar de alguns paulistas e que é percebida pela
atitude negativa que teve, diante de tal sotaque. Essa constatação decorre do fato de o
informante conhecer uma fração dos paulistas, descendentes de italianos que, na maioria das
vezes, fala alto e, ao mesmo tempo, tal atitude linguística do italiano é para ser ouvido, e é
ouvido quem fala mais alto.
Os informantes CL/3 e CL/6 respondem que identificam a origem do falante pela
forma de se expressar:

CL/3 ‒ Mais ou menos, mais ou menos às veces vem uno é americano e é francês mais

119
ou menos sei como ele fala de donde que país é [...]

CL/6 ‒ Pode. Algumas pessoas brasileiras vêm falar castelhano e a gente sabe como é,
elas se expressam diferente, a forma de falar.

A informante CL/8 não apresenta clareza ao responder, parecendo não ter entendido a
pergunta, como se pode inferir de sua resposta:

CL/8 – Sim. É português em Brasil, inglês en lo ambiente de grupo.

Quando se observa a realidade linguístico-cultural da Tríplice Fronteira, pensa-se nas


condições geográficas e sociais de um lugar que tem a diferença como marco importante. Ali
convivem grupos de nacionalidades diversas, pessoas que possuem em seu repertório
linguístico mais de um idioma.
Ao tratar das respostas dos oito informantes de Puerto Iguazú, constata-se que os
informantes PI/2, PI/6, PI/7 e PI/8 referem-se ao sotaque como forma de identificar a origem
da pessoa, como se vê documentado nos seguintes trechos:

PI/2 – Pode. Muito, pelo tonado como um inglês que falando espanhol se dá conta,
como o português também é muita diferença.

PI/6 – Sim, não de que lugares, mas dá pra perceber quando são brasilero do corazón,
do Paraguai dá pra percebê pela forma já de entrá, de falá, né? [...] tem os sutaques
diferentes correntinos.

PI/7 – Ah sem dúvida, sem dúvida, por exemplo, se eu escuto falar dez pessoa latino-
américa, latinoamérica espanhol, castelhano, eu sei quem é argentino, quem é
boliviano, quem é peruano, quem é mexicano, porque cada um é, embora tenha um
sotaque diferente [...].

PI/8 – Si, mas, o sea, el europeu quizá se puede mesclar entre un alemán e um
holandês por exemplo, italiano se da cuenta, um francês también, por la entonación,
espanhol indubitavelmente también, despos los demais países já nó, porque son mui
cerrados, un viejo, un croata, un belga, un austríaco, aí já não, ma digo los europeus, lo
digo certo, pero já lo no puedo identificar bien[...]

Conforme indicado nos próximos excertos, os informantes PI/1, PI/3 e PI/4 afirmam
que podem identificar a procedência do indivíduo pelo jeito de falar:

PI/1 ‒ Sim, pelo idioma, pelo idioma, porque se você está me falando português eu sei

120
que é brasileira, ou é de Portugal, não tem muitos países que falam portugueis [...].

PI/3 ‒ É, estando aqui na frontera e como nós conocemo a todos los turista é ma fácil
reconocer a los extranjeros e saber língua elos están praticando.

PI/4 ‒ Pode. Muitas veces me perguntaban cê é brasileira? (Risos) Meus pais são
brasilero.

O informante PI/5, apesar de não afirmar que reconhece a origem da pessoa pelo seu
jeito de falar, usa o gentílico informando a procedência da mãe

PI/5 – [...] minha mãe. Ela é paraguaia.

De certa forma fica implícito que ele reconhece a origem de uma pessoa pelo seu jeito
de falar. Percebe-se, também, que os indivíduos que pertencem a um grupo social com menos
poder aquisitivo parecem aceitar o estereótipo como são avaliados pelos grupos dominantes, e
esse tipo de preconceito linguístico/estilístico acaba por refletir na educação, nas relações
sociais e nos projetos de carreira profissional.
A diversidade linguística, presente neste cenário, mostra que a fronteira linguística é
estabelecida a partir do momento em que o falante de determinado idioma o utiliza para que
seu interlocutor não o compreenda, fato esse, muito comum na fronteira, principalmente no
comércio de Ciudad del Este, na interação entre chefes e seus subordinados coreanos, árabes,
falantes do guarani e de outras línguas com exceção do espanhol. Nesse caso, constata-se
claramente a fronteira linguística estabelecida por esses falantes.
A origem da pessoa é reconhecida pelo seu jeito de falar nas três cidades e revela que a
forma com que o idioma é utilizado pelos falantes das diversas línguas inclui ou exclui o
receptor. A partir do momento, que o emissor altera o código linguístico numa interação com
mais de três interlocutores e um deles deixa de entender a mensagem, a exclusão é
estabelecida. As diferenças entre os três países afloram nos sentimentos e valores que os
informantes deixam transparecer sobre o português e o espanhol.
Confirma-se a ideia de que os informantes reconhecem a origem de uma pessoa pelo
seu jeito de falar, e que, possuem consciência de que há três nacionalidades distintas na
região: brasileiros, paraguaios e argentinos. São bilíngues em algum nível, demonstram essa
noção e reconhecem que cada idioma é um símbolo, respectivamente, do Brasil, do Paraguai e
da Argentina.

121
O Quadro 12 traz um resumo das respostas dos vinte e quatro informantes das três
comunidades e mostra que todos afirmam reconhecer a origem de uma pessoa pelo seu jeito
de falar ou pelo sotaque.

Quadro 12 – Pode-se reconhecer a origem de uma pessoa pelo seu jeito de falar.

Cidades Foz do Iguaçu Ciudad del Este Puerto Iguazú Total

Formas de Identificação
Sotaque 04 05 04 13
Maneira de Falar 04 03 04 11
Total 08 08 08 24

Pergunta 5. Qual a língua mais utilizada na fronteira? Por quê? Em que ocasiões
essa língua é mais utilizada?
O objetivo é saber, entre os diferentes idiomas utilizados na fronteira, pelas diversas
etnias ali presentes, que língua é mais utilizada, tanto por brasileiros, quanto por argentinos e
paraguaios. Apesar da convivência entre essas etnias, pode-se verificar, nas respostas dos
informantes de Foz do Iguaçu, a referência feita ao idioma falado em cada uma das três
localidades, ou seja, português e espanhol, ou portunhol. Os informantes FI/1, FI/4, FI/5 e
FI/8 acreditam que a língua mais utilizada na fronteira seja o espanhol, seguida pelo portunhol
e o português. Conforme excertos destacados:

FI/1 – Eu acredito que o espanhol. [...] Porque a gente já faz frontera aqui com dois
países [...].

FI/4 – Ah! O espanhol [...] por causa dos dois países.

FI/5 – Eu acho que é o espanhol [...].

FI/8 – [...] Eu acho que é o castelhano, espanhol, porque o brasileiro fala... porque
trabalha no Paraguai, o argentino também utiliza, é mais próximo esse do que o
português, né?[...].

Os informantes FI/3 e FI/6 citam o portunhol como a língua mais utilizada na


fronteira, e a forma de eles se referirem ao portunhol demonstra o jeito descontraído do
brasileiro, pois o brasileiro é conhecido por sempre encontrar uma saída para enfrentar as
dificuldades. Ao se deparar com obstáculos para falar espanhol, surge essa mescla linguística,

122
conhecida por portunhol, para auxiliar na comunicação entre os habitantes da fronteira. Esse
fato ocorre também com os falantes de Puerto Iguazú e de Ciudad del Este:

FI/3 – Acho que mais... portunhol, né? (risos) mistura de portuguêis com espanhol, a
pessoa se vira bem com o portunhol, [...] qualquer lugar que você vai aqui, tanto no
trabalho como na fronteira aqui, portunhol é bem falado.

FI/6 – Portunhol (risos) [...] é uma forma das pessoas interagirem, né? Misturam o
espanhol lá do Paraguai com o nosso português, e uns se sentem à vontade de tentá
falá um pouco o que o outro fala.

A informante FI/2 não faz referência nem ao português nem ao espanhol, mas sim à
brasileira, como a língua falada na fronteira, devido ao número expressivo de brasileiros que
moram na fronteira:

FI/2 – Eu acho que é a brasilera, [...] Porque tem bastante brasileiro, mais convivência.

O informante FI/7 parece não ter muita certeza quanto à língua mais falada na
fronteira e faz referência ao portunhol de uma forma pejorativa, mas finda por optar pela
indicação do português:

FI/7 – Bom, é o português porque a maioria das pessoas que estão ali são brasileiros,
no entanto, tem muito de portunhol. [...] No comércio, na região da fronteira muito
próxima ao Paraguai e Argentina, portunhol, que é um português mal falado pelos
argentinos e paraguaios, e que é um espanhol muito mal falado pelo brasileiro
aqui na fronteira. Mas eu penso que ainda é a língua portuguesa mesmo, Foz do
Iguaçu é ainda maior concentração de gente ali na fronteira.

A crença que o informante FI/7 tem a respeito do portunhol, de acordo com sua
definição, em destaque no trecho transcrito, demonstra uma atitude carregada de preconceito,
de certo modo já cristalizado. Essa mentalidade acaba por fazer parte do modo de ser, de estar
e pensar do informante e se manifesta por meio de sua linguagem e de suas atitudes.
Os informantes de Ciudad del Este, CL/1, CL/3, CL/4 e CL/6, referem-se ao português
como a língua mais falada na fronteira e os demais informantes afirmam ser o espanhol ou
portunhol a língua mais utilizada na região:

CL/1 – Aqui na verdade é o português mesmo, [...] porque tem mais freguês brasilero
que, que do argentino, né?

123
CL/3 – É o português. [...] E a cá a frontera, maioria, são tão brasilero só português
mais.

CL/4 – Português. [...] Porque lo comércio, português.

CL/6 – Português.[...] Pelas lojas e pelos turistas.

O Informante CL/7 afirma que a língua mais falada na fronteira é o português, porém
ao concluir sua resposta, acaba por citar o portunhol e o espanhol, conforme excerto:

CL/7 – O português. [...] Porque hay na relación, digamo assi, mucha gente brasileira,
falando português, então a gente tem que procurá entendê, se não fica calado, né? Sem
falá, sem nada, eu acho que, o que a gente mais fala é portunhol e espanhol.

Os informantes CL/2, CL/5 e CL/8 apontam as duas línguas (português e espanhol)


como as línguas mais utilizadas na fronteira devido ao comércio entre o Brasil e o Paraguai,
principalmente em Ciudad del Este:

CL/2 – Aqui na frontera, o espanhol e o português. [...] Por causa do comércio e tem
muito turista, eles mais são brasileiros.

CL/5 – Na fronteira? Espanhol e português. [...] Porque é um convívio constante, né?


[...] No trabalho, Cidade do Leste é uma cidade comercial, onde os fregueses, os
cliente são brasileiro, argentino, então constantemente estamos falando em português e
espanhol.

CL/8 – El português, el espanhol é el português. [...] Porque tamos en la frontera case


juntos muy unidos ai a um passo.

Observa-se que em Ciudad del Este existe a combinação do esforço e do desejo de


aprender português, motivado pelo contato linguístico com os brasileiros que, por si só, é
otimizada por atitudes favoráveis com relação à língua falada nesse espaço fronteiriço. Tal
motivação provoca no indivíduo o interesse em adotar vários aspectos comportamentais que
os caracterizem como integrantes de outro grupo linguístico e cultural com que interagem.
Nesse sentido, falar a língua do outro é tornar-se um pouco o outro, sem romper com sua
própria língua, isto é, o falante não nega sua língua de origem, mas procura falar a língua do
outro para se integrar ao outro, com interesse particular de se comunicar com a comunidade
de fala da referida língua (português e espanhol), quer seja por motivos comerciais, turísticos
ou apenas de interação social.
124
Em Puerto Iguazú, os informantes PI/2, PI/3, PI/5, PI/6 e PI/8 dizem ser o português o
idioma mais falado na fronteira, seguido pelo espanhol, portunhol e castelhano:

PI/2 – Português.[...] Porque tem muito brasilero [...].

PI/3 – Português. [...] Porque na zona donde más brasilero hay como turista, como hay
aquí en Puerto Iguazú hay mucho brasilero que mora, que viene a trabalhá en las lojas
para atender a los turistas brasileiros e se uno vá a Foz todo brasileiro, se vá a Paraguai
todo falam português.

PI/5 – A mais utilizada é o português. [...] Porque tem muita gente que vem aqui
consumir o produto argentino[...].

PI/6 – Eu acho que o português mesmo. [...] Trabalhamos mais com as pessoas do
Brasil[...].

PI/8 – [...] é português. [...] E porque, nosotros com mas que dos países vizinhos
somos una sola región. [...] mucha atividá comercial, mucho intercámbio comercial,
especialmente em mucho intercámbio turístico[…].

O informante PI/1 faz referência ao portunhol, mas afirma que o espanhol é o mais
falado. A informante PI/4 destaca o castelhano e o informante PI/7 fala do viveiro linguístico,
das várias etnias, não aponta nenhuma língua como a mais falada na fronteira e descreve a
fronteira como um lugar de manifestação de todas as línguas devido ao grande fluxo de
turistas no local:

PI/1 – [...] é portunhol que eles chamam, seria uma mescla de português com
espanhol, mas o que mais se fala é o espanhol. [...] Porque é o que mas tem, tem
Paraguai que é espanhol e Argentina é espanhol, Brasil é único que tem português
[...].

PI/4 – [...] se usam quase todo dia guarani, português e espanhol se usa mucho. E
obrigadamente castelhano obrigadamente. [...] La escuela é, no se permite porque se
tem que hablar castelhano.

PI/7 – Aqui na fronteira nós temos, eu chamo isso de viveiro. [...] Um vivero, ou talvez
uma panela muito grande que tem ingredientes culturais tão diferentes e
permanentemente ele está fervendo, e nesse, nesse, nessa cocina, dessa panela, tem
língua diferente, espaço cultural múltiplo e diferente a vez, que faz que isso seja um
grande valor agregado da região [...].

Observa-se que há a crença de que sempre se fala a língua do estrangeiro, isto é, a


maioria dos argentinos e paraguaios afirma que fala português nas interações com os

125
brasileiros e os brasileiros acreditam falar o espanhol. Percebe-se que, embora os falantes
afirmem falar português, quando inquiridos, é forte a influência da língua materna (espanhol),
ou a mudança de código linguístico em suas falas. Quanto aos brasileiros, não se pode fazer a
mesma observação, pois os inquéritos foram feitos em português.
O Quadro 13 resume a realidade observada nas três comunidades.

Quadro 13 – Línguas mais faladas na Tríplice Fronteira52

Cidades
Foz do Iguaçu Ciudad del Este Puerto Iguazú Total
Línguas

Português 01 04 05 10
___ ___
Brasileiro 01 01
___ ___
Castelhano 01 01
___
Espanhol 04 01 05
___ ___
Portunhol 02 02
___ ___
Português e espanhol 03 03
___ ___
Português, espanhol e portunhol 01 01
___ ___
Todas as línguas 01 01

Total 08 08 08 24

De acordo com estudos feitos com base em pesquisas realizadas na fronteira


(BARRIOS, 1996; ELIZAINCÍN, 1992; RABOSSI, 2004; RONA, 1963), é comum que em
muitas comunidades ocorram conflitos entre grupos linguísticos diferentes, com o objetivo de
estabelecer qual variedade de fala que mais se sobressai, ou qual a que deve ser mais utilizada
nas relações de fronteira, porém não ficou evidente nas três comunidades pesquisadas.
Constata-se, nas declarações dos informantes e nos momentos de interação, nos contatos
realizados na fronteira, pela busca dos informantes que se enquadrassem nos critérios
apontados na metodologia, que a Tríplice Fronteira se sente orgulhosa de ser o que é, isto é,
um caldeirão linguístico. Dessa forma, a avaliação da própria língua pelos usuários se torna
importante, pois aponta para as crenças que os informantes têm a respeito de si mesmos. A

52
Registra-se no quadro a denominação brasileiro usada pela informante durante a entrevista para se referir
ao português, mas como ela mora no Brasil, em sua concepção, fala brasileiro. Conforme transcrição da
entrevista na página 123.
126
maioria dos falantes, com raras exceções, apontou o português seguido do espanhol como a
língua mais falada na fronteira, porque avaliam positivamente a comunidade de fala à qual
pertencem, isto é, 50% dos informantes de Foz do Iguaçu afirmam ser o espanhol, enquanto
50% dos informantes de Ciudad del Este e 62,5% dos informantes de Puerto Iguazú afirmam
ser o português.
Embora a fronteira seja vista como local de conflito, devido à violência, tráfico,
contrabando, entre outros fatores negativos, o que se pode destacar é que, atualmente, esse
estigma não é só característico da fronteira, mas de grandes centros urbanos nacionais e
internacionais em que produtos importados se façam presentes ou não.
A variante dialetal falada na fronteira pode ser definida não como uma modalidade que
reflete influência do espanhol sobre o português, mas uma variedade linguística que mostra a
influência do português sobre o espanhol que resulta numa forma de falar conhecida por
portunhol, assumida por poucos informantes.
Apesar de todos os informantes se considerarem falantes do português, percebe-se a
frequente alternância do código linguístico (português/espanhol). Essa ocorrência permite
verificar a situação de contato linguístico vivenciada hoje no Paraguai, em Ciudad del Este,
devido à coexistência dessas duas línguas que afloram na região de fronteira, principalmente
em Ciudad del Este e Foz do Iguaçu.
Partindo dessas reações ou posicionamentos linguísticos nas comunidades
investigadas, foi possível observar que os informantes acreditam falar a língua do outro e,
consequentemente, identificam-se com o grupo que a concretiza. Como consequência disso,
formam-se uma ou mais comunidades de fala que, como já foi definido por Bloomfield (1933,
p. 42), se trata de um grupo de pessoas que interagem, por meio da fala, pois que conhecem e
compartilham ao menos uma variedade linguística.

Pergunta 6. Em que ocasiões as pessoas brasileiras/ argentinas/ paraguaias falam


espanhol/ castelhano/ yopará/ guarani/ português/ árabe etc.? Por quê?
Sabe-se que a região de fronteira reúne diversas etnias, conforme mencionado
anteriormente, porém o objetivo desta pergunta é saber se, nas diversas interações sociais, há
alternância no código linguístico, em que ocasiões o bi/multilinguismo se manifesta e o que
isso representa.
Todos os informantes inquiridos em Foz do Iguaçu apontam para o espanhol como a
língua utilizada no comércio, no contato com turistas e quando vão às compras nos países

127
vizinhos, conforme recorte de alguns excertos retirados das falas dos informantes FI/1, FI/4 e
FI/8:

FI/1 – É, na verdade a gente fala entre nós o português, tá certo? Mas, aqui a gente
recebe muito turista argentino, paraguaio, boliviano, toda América do Sul aqui ou
pessoas que vêm de outras regiões também, de outros continente, mas esse pessoal
quando vem aqui, a recepção e o pessoal que trabalha na frente todos falam espanhol
fluente[...]

FI/4 – Ah, não! A gente vê as pessoas falando, né? No comércio pra atender uma
pessoa de fora eu acho assim. Quando você vê que se não tão falando português é o
espanhol.

FI/8 ‒ Quando estão no Paraguai, por exemplo. Quando vão à Argentina se eles sabem
o espanhol, então eles vão utilizar esse aí que é mais fácil a comunicação, ou quando
eles vêm para o Brasil [...].

Os informantes inquiridos manifestam atitudes positivas em relação ao espanhol, e


novamente o espanhol é visto na fronteira como a língua do comércio, do turismo e das
relações sociais com os moradores de Ciudad del Leste e de Puerto Iguazú. A partir dessas
respostas, é possível depreender que há motivação integrativa, o indivíduo se apropria do
espanhol para desempenhar determinadas funções ou obter algum tipo de ganho social,
considerando que toda língua é investida de cultura e subjetividade. Uma vez que o indivíduo
busca apropriar-se da língua para uma finalidade específica, sua motivação advém de uma
atitude linguística favorável com relação ao grupo falante da língua, pois ela surge de um
interesse e de uma necessidade individual.
Ao tratar da mesma questão com os informantes de Ciudad del Este, observa-se que,
além do espanhol, eles apontam o guarani, o yopará. O yopará, segundo eles, é mais utilizado
no contexto familiar e com os amigos, pois, conforme foi visto anteriormente, o yopará é
falado por pessoas não escolarizadas de um nível socioeconômico baixo, como ilustram os
trechos a seguir:

CL/1 – Yopará sim. É que fala...(Risos) que fala espanhol e guarani, alguma vezes se
lembra como que era no espanhol e fala guarani, yopará.

CL/4 – Quando estão juntos, pra se comunicá, a comunicação dos paraguaio é yopará.
[...] É uma mescla de espanhol com guarani, dos palavra em guarani e o restante em
espanhol. [...] Em todo o tempo, é o que mais se fala. Guarani, guarani mesmo que se
estuda na escola, ninguém fala, ninguém entende também, parece chinês. Nem eu
entendo o guarani mesmo.
128
CL/5 – Yopará,[...] a gente fala mais com a família, com a família sempre a gente ta
falando o yopará. Com os amigos também, ma, mas com a família assim. E eu
costumo falar mais yopará assim quando têm clientes ou pessoa, perto de pessoa
donde de repente é, são paraguaio, ou são argentino, porque tem argentino que aqui
perto da fronteira falam também o guarani, ou seja falam mas yopará do que o guarani.
Misturam bastante espanhol com o guarani.

A informante CL/6 fala da crença de adaptação à língua do outro, no comércio, pois,


se o vendedor quiser vender seu produto precisa falar a língua do outro:

CL/6 – É mais pelo trabalho mesmo, de repente você trabalha com árabe, com chinês
ou trabalha com brasileiro, você vende, se você é vendedora, você tem que ver o
cliente em que língua fala e tem que se adaptá.

O informante CL/7 traz uma definição do que ele entende por yopará. Apresenta
também a sua compreensão relacionada ao portunhol, que é o que ele chama de a língua
fronteiriça, que seria, de acordo com a sua crença, uma espécie de yopará entre o português e
o espanhol. A informante CL/8 se refere ao yopará como a língua falada cotidianamente e
pode-se inferir que até os brasileiros que vão a Ciudad del Este falam yopará:

CL/7 – O yopará, é aqui a língua paraguaia, o yopará é aquela mistura que faz entre o
espanhol e o guarani, que solo Paraguai pode falar, brasileiro não consegue falar
yopará. Agora, o que o brasileiro fala é aquela língua fronteriça que é o yopará entre o
espanhol e o português. [...] o yopará [...] aprende no ambiente, na rua mesmo, todo
mundo fala de um jeito, num espanhol mal falado. [...] Claro, não na mistura, a gente,
se eu te falo uma coisa assim em espanhol, você não vai entender, erúla sília, sília
(espanhol), erúla (guarani). Significa trazer na cadeia, né? Entendeu? Aí, é o
yopará[...].

CL/8 – Em todo momento, em todo momento fala-se. Lo brasileiro que vivem acá,
Paraguai mesmo habla e, em yopará.

Em Puerto Iguazú, os turistas buscam outros atrativos, como: as Cataratas do Iguaçu,


Aldeias Indígenas, Museu de Esculturas, minas de pedras semipreciosas, cassinos e o Parque
Temático. De acordo com os informantes, a cidade apresenta um comércio que se reduz aos
gêneros alimentícios, artigos de couro, vinhos e ao setor gastronômico e recebe turistas de
todos os países. Constatou-se que são os brasileiros que mais frequentam o comércio em
Puerto Iguazú e a língua mais utilizada de acordo com os informantes PI/1, PI/2 e PI/3 é o
português:

129
PI/1 – Espanhol eu falo aqui, porque a maioria só fala espanhol, e quando falo
português é quando cruzo a fronteira, quando vou fazer compras, quando vô no
Paraguai, falo mais o português prá pessoa também ter mais facilidade de trato,
né?[...].

PI/2 – Nós falamos o português e quando vem uma pessoa de fora que fala, só nessa
ocasiões. [...] Só quando vem brasileiro. [...].

PI/3 – El castelhano falam em todo momento, não, é la língua donde más comunicação
hay con la família, com… Se uno vá al banco, ao correio, oficina de trabalho, oficina
pública. [...] O português más en el comercial [...] el centro comercial con los turistas
para vender, para oferecer mercaderías, servicios a los turistas extranjeros.

O informante PI/7 diz que o espanhol é a língua do dia a dia, porém quando se depara
com brasileiros, procura falar português:

PI/7 – Si, que são as más comunes, bom, aqui as pessoas argentinas que moramos aqui
falamos todos los dias em espanhol, todo dia, mas tendo presença de pessoas assim
brasileiras, assim como você, nós procuramos aprimorar o português porque achamos
que é uma língua de duzentos milhões, e o espanhol é um complemento desse
continente que é o Brasil [...]

A informante PI/8 fala da importância do interlocutor para saber qual língua utilizar na
comunicação, menciona o guarani e diz que é bastante utilizado em reuniões sociais e nas
relações familiares, informando que os argentinos sempre se preocuparam em falar português
nas interações com os brasileiros. Destaca que, por outro lado, em Foz do Iguaçu não há a
mesma preocupação, pois alguns vendedores não demonstram nenhum interesse em falar o
espanhol:

PI/8 – Bom, depende com quem que es tu interlocutor, las circunstancias que estás
viviendo, logicamente todo de acordo com las limitaciones de cada uno, nó? Pelo te
reitero que la gente que vive a cá, habla mucho guarani, especialmente, por exemplo la
gente de guarani, yo note, quando hay reuniones sociales, aniversários algum festejo.
[...]. Todos los argentinos, vendedores argentinos, comerciantes argentinos,
praticamente hablavam a sus clientes todo em português, e se esforçavam por aprender
português, hablava na vereda quando passava, senhor, senhora, freguês, jaqueta, calça,
sacola, tudo utilizando o idioma totalmente em português. Coisa que não acontecia
durante muchos años com lo comércio em Foz do Iguaçu. El comércio em Foz do
Iguaçu, siempre hablo em português [...].

O Quadro 14 traz uma síntese das respostas dos informantes das três comunidades,

130
informando as ocasiões em que as pessoas brasileiras, argentinas e paraguaias utilizam
português, espanhol, guarani, yopará, árabe ou necessitam se adaptar a língua do interlocutor.

Quadro 14 – Ocasiões em que o bi/multilinguísmo se manifesta

Cidades
Foz do Iguaçu Ciudad del Este Puerto Iguazú

Línguas

Diariamente com os No comércio com os turistas No comércio, quando


Português colegas, em casa e brasileiros cruzam a fronteira e com
com as pessoas turistas brasileiros
conhecidas

No comércio, com ___ Diariamente na


Espanhol os turistas e nos comunidade
países vizinhos
___ ___
Castelhano Dois informantes dizem
falar diariamente

Na escola Uma informante diz que


___ nas reuniões sociais,
Guarani festas, interações
familiares
___ ___
Yopará Diariamente, com a família,
com os amigos e na rua

Outras Um informantes diz Uma informante fala da Uma informante fala da


falar árabe em necessidade de se adaptar à necessidade de se adaptar
restaurante árabe e língua do interlocutor, no à língua do interlocutor
nos negócios no comércio com árabes e
Paraguai chineses

Após analisar as repostas, observa-se que, em uma comunidade bi/multilíngue, a


língua pode ser usada como forma de inclusão ou exclusão, principalmente no comércio, nas
reuniões sociais, quando um grupo quer excluir outro, juízos de valor que falantes
monolíngues apresentam em relação a usuários de outras variedades da mesma língua, yopará
e guarani. De acordo com Moreno Fernández (1998, p.180)53, “as atitudes lingüísticas estão
relacionadas com as próprias línguas e com a identidade dos grupos que as utilizam”.
Portanto, as atitudes linguísticas dizem respeito à identidade de um grupo, e está
relacionada às reações subjetivas desse grupo diante da(s) língua(s) que o(s) falante(s) usa(m)
e influencia na aquisição da língua estrangeira ou de segundas línguas. Observa-se que, falar

53
“Se puede decir que las actitudes lingüísticas tienen que ver con las lenguas mismas y con la identidad de
los grupos que las manejan.” (MORENO FERNÁNDEZ 1998, p. 180).
131
ou não a língua do outro, ser influenciado ou não, essa escolha vai mais além do que
estabelecer relações sociais, está ligada ao poder, prestígio e aos benefícios dessa inter-
relação, principalmente na Tríplice Fronteira.
No que diz respeito às atitudes dos informantes de Foz do Iguaçu, em casa, com os
amigos a língua falada é o português. Ao interagir com os moradores do Paraguai e da
Argentina, eles se autodenominam receptivos aos falantes do espanhol, e que, as pessoas
costumam interagir em espanhol quando conhecem a língua.
Os informantes de Ciudad del Este falam yopará em casa e com os amigos, espanhol e
guarani em reuniões sociais e interagem com os brasileiros em português.
Em relação às línguas utilizadas em casa e com os amigos em Puerto Iguazú, os
informantes disseram que usam o espanhol. Na interação com os brasileiros, eles procuram
falar português, embora, na fala de alguns informantes estivesse presente também o portunhol,
o que mostra que as respostas não são uniformes. Os grupos distinguem-se quanto ao uso e à
avaliação destas línguas, conforme visto nos excertos que ilustraram as falas dos informantes.
A próxima questão trata das dificuldades linguísticas encontradas no uso da língua
falada na fronteira.

Pergunta 7. Quais as dificuldades linguísticas que você o (a) senhor (a) encontra no
uso da língua falada na fronteira? Por quê?
Com essa pergunta, pretende-se saber quais são as dificuldades enfrentadas, sejam elas
relacionadas ao preconceito linguístico, dificuldade de se expressar, de compreender o outro e
de ser compreendido. Enfim, quais são os obstáculos encontrados ao se deparar com falantes
de uma língua estrangeira e qual é a atitude dos informantes diante das dificuldades
encontradas.
Os oito informantes de Foz do Iguaçu dizem que as dificuldades são várias, alguns têm
dificuldade em se expressar na língua do outro; outros compreendem, mas não falam, porque
a maioria dos informantes aprendeu espanhol ouvindo, na rua, no ambiente de trabalho; a
maioria não estudou nenhuma língua estrangeira; apenas um informante diz ter feito curso de
espanhol e inglês, mas, mesmo assim, encontra algumas dificuldades na escrita.
Para o informante FI/1, a maior dificuldade reside em falar; ele entende o que está
sendo dito, mas não fala. Embora ele não faça referência ao idioma, pode-se inferir que se
trata do espanhol e a informante FI/2 cita, além do espanhol, o inglês, explicando que a
dificuldade reside na falta de estudo desses idiomas:

132
FI/1 – [...] eu entendo bem o que eles estão falando, mas para mim falá eu... Eu
encontro, sim, dificuldade.

FI/2 – [...] O inglês, o espanhol. [...] Por causa, tipo assim, a gente não faz nenhum
curso, então eu estou se habituando, então é bem complicadinho.

O informante FI/3 faz referência às dificuldades encontradas em entender os vários


idiomas falados na fronteira e declara que, desses idiomas, o que ele entende um pouco é o
espanhol.
A informante FI/4 diz não ter dificuldade. A explicação consiste em dizer que, por
trabalhar na cozinha do hotel, ela praticamente não tem contato com pessoas falantes de
outras línguas, logo, ainda não percebe nenhuma dificuldade, pois a ausência de dificuldade
está relacionada à ausência de contato linguístico.
O informante FI/5 diz que a maior dificuldade está em escrever porque para falar ele
não encontra dificuldade por se expressar bem. A informante FI/6 encontra dificuldade em
entender, pois alguns falantes do espanhol falam rápido, utilizam gírias e palavras em guarani
e isso dificulta a compreensão:

FI/5 – De escrevê. [...] Porque também não sei te falá, poxa. (Risos) Olha eu consigo
falá e me expressá muito bem, perguntá, mas na hora de escrevê, porque eu não tenho
muita... apesar do espanhol, sê como você fala mesmo você escreve, o inglês já não é,
você fala de uma maneira, mas escreve de outra muitas palavras, né? Então é essa
dificuldade.

FI/6 – [...] Entendê o que a pessoa que fala espanhol fala, porque uns falam mais
rápido, e usam gírias que a gente não entende, e às vezes até na fronteira misturam um
pouco do guarani, então, às vezes o sotaque é carregado do guarani e são usadas
palavras em guarani também.

O informante FI/7 acaba por emitir um julgamento a respeito do espanhol falado na


cidade. Para ele as pessoas se dizem falantes de espanhol, mas na verdade não o são.
Responsabiliza os veículos de comunicação visual, como outdoors e as placas, por fazer
circular textos mal escritos contra os quais se têm manifestado os educadores, tentando mudar
esse cenário linguístico:

FI/7 – Dificuldade nem tanto [...] e assim, é uma cobrança dos educadores da região,
né? Todo mundo acha! – Ah, eu falo espanhol – Não! Não fala! Pouca gente sequer
escreve em espanhol, então, essa é uma dificuldade pelas coisas mal feitas, as placas,
133
outdoors nas avenidas todos mal feitos, mal escritos, sabe até, às vezes dificulta a
comunicação, porque a pessoa tá tentando falá uma língua e não fala nem uma, nem
outra, essa é uma dificuldade que nós temos assim, embora se comuniquem, se
ajeitam, mas é uma coisa mesmo de fronteira, mesmo assim.

A informante FI/8 faz referência ao cuidado que se deve ter com o léxico e os falsos
cognatos em que as palavras parecem ter um significado, mas na realidade apresentam outro
significado, e essa situação pode se tornar embaraçosa para o falante quando usa uma língua
estrangeira:

FI/8 – São inúmeras as dificuldades que existem, por exemplo, mesmo o próprio
espanhol, castelhano, lá, paraguaios e argentinos já são diferentes, né? Por exemplo, o
brasileiro, quando ele fala também tem diferença, porque, por mais que você conheça
por exemplo, você fala o espanhol o castelhano, você não conhece as variações que ela
possui, dentro do próprio país [...].

Ao analisar as respostas dos informantes de Ciudad del Este, verifica-se que alguns
informantes assumem que encontram dificuldades na hora de interagir com um estrangeiro,
porém outros dizem não ter dificuldade nenhuma, embora tivessem deixado transparecer
dificuldades relacionadas à compreensão do português durante a aplicação dos inquéritos,
conforme podemos depreender na resposta do informante CL/1:

CL/1 – É que é mais difícil é o inglês, né? Essa daí que é. [...] Mais o menos, tem mais
o menos ele fala espanhol, mais o menos é, meio difícil também só uma coisa assim.

A informante CL/2 acrescenta que as dificuldades estão relacionadas aos brasileiros


falando o espanhol, por isso a atitude de eles falarem português para ser mais receptivos aos
brasileiros:

CL/2 – Os brasileiros falando espanhol, pra vocês são muito difícil porque não só
quando no... A minha família vai ou nós vamos ao Brasil nós falamos português, mas
quando você vem pra aqui, nós falamos também o português é pra acomodar a vocês.

O informante CL/3 diz não encontrar nenhuma dificuldade na língua falada na


fronteira, porém nota-se que apresenta dificuldades na compreensão das perguntas realizadas,
isso significa que algumas pessoas têm dificuldade em assumir suas dificuldades linguísticas
impossibilitando muitas vezes a comunicação.
A informante CL/4 acredita que a língua do futuro, no comércio e nas negociações,
134
será o chinês, portanto a atitude seria estudá-la para as futuras interações comerciais. O
informante CL/5 afirma não encontrar dificuldade no uso da língua falada na fronteira, faz
referência ao português, língua que ele aprendeu com os amigos e que foi aperfeiçoada no
trabalho:

CL/5 – De repente podia se o português, né? Porque, não é meu idioma oficial, mais
eu sinto, eu tenho vários amigos assim, brasileiro e de repente eu, eu acho que falo
certo, mai tem vez, que quando tô falando tudo errado, acho que eles dizem assim
porque sou paraguaio e como falar eu aprendi falando só com meus amigos,
primeiramente foram com amigos, e depois fui aperfeiçoando assim com, trabalho
essas coisa.

Por sua vez, o informante CL/7 declara que a mistura linguística enriquece a fronteira
e que não se deve fazer opção por uma língua e, sim, assumir a atitude de aprender a falar
todos os idiomas:

CL/7 – No, eu acho que a gente tiene, fica enriquecido, falando toda a língua
fronteiriça. Acho melhor, não tem como diferenciar, fica com uma sola língua, tem que
falar de tudo.

Ao conversar com os informantes de Puerto Iguazú, nota-se que nem todos apresentam
dificuldade relacionada às línguas estrangeiras faladas na fronteira, como é o caso do
informante PI/1 que, declara ter aprendido português por meio dos programas assistidos por
emissoras de televisão brasileiras:

PI/1 – Pra mim não tem muita dificuldade. [...] Porque português pra mim é fácil,
desde pequeno eu falo português, me criei assistindo TV brasileira, pra mim não é tão
difícil, [...] não é tão complicado pra mim.

A informante PI/2 diz que sua dificuldade reside na compreensão do guarani que,
segundo ela, é uma língua falada pelos paraguaios e cuja pronúncia é muito fechada. Para o
informante PI/3, a dificuldade está em falar mal todas as línguas por causa da mescla
linguística que ocorre nas interações e o informante PI/5, por sua vez, declara que o português
tem uma pronúncia fechada e que o guarani é um idioma muito difícil de ser falado e escrito:

PI/2 – A dificuldade é o guarani. [...] É muito difícil pra falar. [...] E os Paraguaio, os
Paraguaio falam demais é muito fechado. [...] Sim, mas esse é muito difícil pra falar.
[...] Não, pouco e nada. É muito difícil.
135
PI/3 ‒ E a dificultad que uno tiene es que muchas vezes fala mal, el castellano, el
portugués, el guarani, se mezcla muito.

PI/5 – A dificuldade que eu tenho, é no... Num... Num vocabulário que eu tenho. [...] O
português é mais cerrado pra falá e o guarani é uma, um idioma muito difícil pra
escrever e pra falá.

O informante PI/7 aborda as dificuldades encontradas nas transações comerciais, pois,


a falta de conhecimento linguístico faz com que tome a atitude de buscar uma pessoa que
domine o idioma e estabeleça essa interação, o que o faz reforçar a atitude de falar mais de
uma língua para interagir nessas ocasiões:

PI/7 – Muita, muita, muita dificuldade, por exemplo, no dia-a-dia, [...], o chinês fala
sua própria língua, e eu fizer uma transação comercial com o chinês, que ele faz se
assessorar com outro em chinês porque eu não sei o que ele está falando, é
complicado. Aqui na fronteira eu vejo, que às vezes essa falta de conhecimento, em
profundidade da língua ela traz muita, muita é fragilidade, nas questões da convivência
econômica, social, cultural, política [...].

A informante PI/8 declara que a dificuldade reside na mistura de três idiomas muito
fortes, português, espanhol e guarani, e que, na hora da dificuldade, a atitude a ser tomada é a
linguagem gestual que tem auxiliado nesses momentos:

PI/8 – E é la mistura de três idiomas, três idiomas muy fortes como, muy entrelaçados,
logicamente, el português porque és la língua madre del Brasil, el espanhol es nuestro,
el Paraguai que tiene su espanhol, pero muy arraigado también el guarani, [...], e nadie
deixa de hablar su idioma, entonces bueno, língua temo quando encontramo que hable
solo espanhol, solo guarani, solo português, nó, e bueno, logicamente las senhas, los
gestos, el linguage gestual és algo que ajuda mucho el nel momento de apuro.

As atitudes linguísticas estão relacionadas à maneira com que os informantes agem


diante das dificuldades encontradas na língua falada na fronteira. Do ponto de vista social, a
função da língua não é estabelecer apenas relações sociais, mas também tem a função de
transmitir informações sobre o falante.
O Quadro 15 sintetiza as dificuldades linguísticas encontradas nas línguas faladas na
fronteira, de acordo com os informantes das três comunidades de fala.

136
Quadro 15 – Dificuldades linguísticas na Tríplice Fronteira

FOZ DO IGUAÇU CIUDAD DEL ESTE PUERTO IGUAZÚ

 Expressar-se na língua do  Interagir com o  Compreender os idiomas


outro e não falar espanhol estrangeiro; guarani e português: o guarani é
e inglês por não ter  Compreender os um idioma muito difícil de ser
estudado; brasileiros falando o falado e escrito e o português
 Interagir, já que, alguns espanhol; que tem uma pronúncia fechada;
compreendem, mas não  Falar outro idioma, como  Falar mal todas as línguas por
falam; por exemplo o inglês; causa da mescla linguística,
 Entender os vários idiomas  Entender o português ausência de vocabulário e falta
falados na fronteira, pois porque não é o idioma de conhecimento linguístico;
alguns falantes do oficial.  Misturar os três idiomas muito
espanhol falam rápido, fortes, português, espanhol e
utilizam gírias e palavras guarani. A falta de
em guarani; conhecimento em profundidade
 Falar uma língua e não da língua fragiliza a convivência
falar nenhuma e nem outra; econômica, social, cultural e
 Lidar com os falsos política.
cognatos e variações
linguísticas do espanhol e
do castelhano;
 Escrever.

Conforme visto, a fronteira está constituída não só pelas línguas nacionais (o


português, o espanhol e o guarani), mas também pelas práticas linguísticas decorrentes do uso
dessas línguas.
Quando o informante não consegue usar o idioma, sua atitude é a de utilizar a
linguagem gestual, ou de contratar um intérprete falante de outras línguas (inglês, chinês,
árabe, francês, etc.), conhecedor do idioma para que haja a interação.
Após analisar esse segundo grupo de respostas, verifica-se que alguns informantes
sentem a necessidade de estudar outro idioma, fato não percebido no primeiro grupo de
respostas.
Os indivíduos organizam sistemas simbólicos para conhecer e reconhecer essa
realidade, formando, assim, uma consciência sobre o mundo, os seres que o habitam, as coisas
e sobre eles mesmos. Um desses sistemas é a língua. À medida que tais sistemas são
particulares a determinado grupo, pode-se reconhecer um modo particular de viver de tais
indivíduos e caracterizá-los como detentores de uma identidade cultural própria.
Gumperz (1971, p. 99) afirma que a estrutura linguística tem um importante efeito
sobre o modo como se percebe a realidade, pois a linguagem ajuda a formar as bases dos
estereótipos que justificam as crenças e atitudes de alguém. Os indivíduos, quando aprendem
a língua materna, adquirem também a forma com que seu grupo avalia essa língua e as línguas
137
dos outros. Os estereótipos estão baseados em valores que a comunidade possui.
Existe a crença de que as línguas receptoras são quase sempre línguas faladas por
países econômica e politicamente dependentes, como é o caso de Ciudad del Este e Puerto
Iguazú, cuja economia se mantém devido ao grande fluxo de brasileiros que compram as
mercadorias ofertadas por esses países, e a língua utilizada nessa transação é o português
brasileiro não-padrão, isto é, o português falado informalmente pelo processo da simplificação
e com uso de gírias.
A maioria das pessoas que compram mercadorias nesses dois países, geralmente com o
objetivo de revendê-las no Brasil, são pessoas que praticam o comércio informal e, algumas
vezes, com baixa escolaridade e isso influencia o contato linguístico que se manifesta no
portunhol falado, tanto por paraguaios quanto pelos argentinos.
O espanhol, por outro lado, não se manifestou na fala de nenhum brasileiro residente
em Foz do Iguaçu, porque as entrevistas foram feitas em português. Caso tivessem sido feitas
em espanhol, para os informantes falantes do português, essa modalidade linguística poderia
ter se manifestado na fala dos brasileiros. Isso comprova a crença de que as línguas receptoras
são sempre as minoritárias, de países dependentes economicamente e que a Tríplice Fronteira
é uma região que apresenta diglossia.
Identificar-se com uma língua ou uma variedade linguística é antes querer fazer parte e
tomar para si um ideal social formado pela tradição, pelos padrões determinados e
convencionados como mais prestigiosos e adequados. A não identificação com estes modelos
gera a insegurança de ser quem é e falar como se fala. Seus efeitos são mediados por uma
gama de variáveis, destacando-se dentre elas as atitudes, que são moldadas pelos fatores
sociais.
Os comportamentos linguístico-sociais dos informantes se revelam de duas formas:
alguns são voltados para a própria fala (atitudes positivas) e outros são em relação à fala do
outro (atitudes negativas). A própria língua é valorizada quando o indivíduo fala ou acredita
falar. Nessa questão de valores surgem os sentimentos de segurança e insegurança linguística,
vistos no decorrer deste trabalho, mas que vale a pena retomar, de acordo com Calvet (2002,
p. 72)

[...] segurança linguística quando, por razões sociais variadas, os falantes não se
sentem questionados em seu modo de falar, quando consideram sua norma a norma.
Ao contrário, há insegurança linguística quando os falantes consideram seu modo de
falar pouco valorizado e têm em mente outro modelo, mais prestigioso, mas que não
praticam.

138
Esse fato se constata nas respostas da maioria dos informantes que, devido à sua
insegurança linguística, não se autodenominavam falantes do portunhol. Labov ([1972] 2008,
p. 372) afirma que, “me inclino a acreditar que o desenvolvimento de diferenças linguísticas
tem valor positivo na evolução cultural humana – e que o pluralismo cultural pode até ser um
elemento necessário na extensão humana da evolução biológica.” Por isso, alguns moradores
da fronteira sentem a necessidade se conscientizar de suas dificuldades para conviver com as
diferenças em relação à sua fala e à fala do outro.
A diversidade linguística é fato não apenas na Tríplice Fronteira, mas em todas as
comunidades de fala que mantêm contato linguístico e a riqueza da diferença consiste em
assumir sua maneira de falar, aceitar-se, aceitar o outro, buscar formas de convivência e não
reveladoras de preconceito. Para superar as dificuldades linguísticas encontradas e
apresentadas no Quadro 15, é importante procurar formas de conhecimento linguístico por
meio dos vários instrumentos de escolarização disponíveis no mercado, cursos presenciais, à
distância, autoconhecimento, enfim existem muitos recursos para superar as dificuldades,
basta apenas buscá-los.

6.1.3 Grupo 3 – Interferência linguística guarani x espanhol x português

O terceiro grupo reúne as respostas a quatro perguntas:


8. No dia-a-dia, dizem que as pessoas misturam as línguas: ora falam espanhol, ora
guarani, ora português, ora árabe. É verdade que isso acontece?
9. O que você o (a) senhor (a) acha dessa mistura de línguas? É comum aqui as
pessoas dizerem as mesmas coisas em diferentes línguas para melhor se fazerem entender?
Saberia dar exemplos?
10. Você o (a) senhor (a) acha importante essa pluralidade linguística na fronteira?
Por quê?
11. Onde você o (a) senhor (a) convive mais frequentemente com essa realidade
linguística (as pessoas falando línguas diferentes em diferentes ocasiões?) na família; na
escola: colegas/colegas, professor/alunos; no trabalho: relação com clientes, no convívio
patrão/empregado; no comércio: quando vai as compras; na igreja e nas relações de
amizade.
Segue-se, no exame deste grupo de respostas, o mesmo procedimento: as respostas são

139
tratadas, inicialmente, de forma individual e a seguir reunidas em um comentário único.
Com as questões 8 e 9, pretende-se saber o pensamento dos informantes a respeito da
mistura das línguas. A análise destas respostas pode esclarecer de que forma essa mistura
acontece, se é intencional, isto é, o habitante da fronteira faz uso das diversas línguas para que
o interlocutor compreenda o que está sendo dito ou a mistura acontece naturalmente pela falta
de vocabulário.

Pergunta 8. No dia-a-dia, dizem que as pessoas misturam as línguas: ora falam


espanhol, ora guarani, ora português, ora árabe. É verdade que isso acontece?
Pergunta 9. O que você o(a) senhor (a) acha dessa mistura de línguas? É comum
aqui as pessoas dizerem as mesmas coisas em diferentes línguas para melhor se fazerem
entender? Saberia dar exemplos?
Nas respostas dos informantes de Foz do Iguaçu, há unanimidade em dizer que há a
mistura das línguas em diversas situações. O informante FI/1 diz que as pessoas misturam as
línguas e ele gosta dessa mistura, mas no seu caso o faz como uma espécie de brincadeira,
uma forma de mostrar conhecimento, porque ele faz curso de inglês e essa mistura está
presente no local de trabalho:

FI/1 – Acontece e muito, às vezes até na brincadeira, [...] a gente começa falando
português, depois fala alguma coisa em espanhol ou inglês é uma brincadeira assim,
mas mistura sim e bastante. [...] Eu acho legal, eu acho legal. [...] Ah, então, eu tenho
um exemplo sim, eu fazia um curso de inglês ai no centro e tem um pessoal aqui, que
fazia o curso junto comigo, aí... essa turma aqui dentro do hotel, a gente falava em
inglês e quem tava e quem não tem o conhecimento, não sabia o que a gente tava
falando a gente falava pra praticá e mostrá que a gente tava fazendo inglês, mas
estávamos aprendendo.

A informante FI/2 afirma que com ela não acontece isso, porém vê na mistura das
línguas uma forma de aproximação. Percebe-se na receptividade dos informantes das três
comunidades que há um relacionamento de amizade, não de arrogância ou intolerância por
não falarem a mesma língua. A informante faz referência também à aprendizagem porque,
quando o estrangeiro pede alguma coisa que ela não entende, a comunicação passa a ser
gestual. Dessa forma ela compreende o que está sendo pedido e vai aprendendo novas
expressões, tendo em vista que a palavra precede o gesto e esse tipo de comunicação acontece
no local de trabalho:

140
FI/2 – Comigo não. (Risos). [...] É legal, porque a gente vai se conhecendo vai
aprendendo mais. Eles mostram com a mão, mostram no cardápio, né? E a gente
entende.

A crença do informante FI/3 é de que as pessoas misturam as línguas porque se


confundem, pois há muitas etnias em Foz do Iguaçu que circulam nos três países. Ele acredita
que, no dia-a-dia, as pessoas se confundem e que a mistura é mais frequente onde há
aglomerado de pessoas, como no ponto de ônibus, local frequentado pelo informante. As
pessoas que lá se encontram não utilizam as diferentes línguas para melhor se fazer entender.
Segundo o informante, há uma acomodação linguística devido aos afazeres diários, todos
estão voltados a sua individualidade e não se importam com o semelhante que está ao seu
lado, tanto que muitas vezes acabam por falar seu próprio idioma independentemente se o
ouvinte compreenderá ou não:

FI/3 – Acontece sim. Aqui como tem uma variedade grande de línguas, então as
pessoa, às vezes tão acostumada, de repente entra num ponto de ônibus, alguém vai
pedir informação eles falam aí, (inint.) tem alguns brasileiros que moram na Argentina
e no Paraguai, aí quando cê diz, eles falam espanhol, “a desculpe” eles esquece onde
estão e se atrapalham com a língua, que devem falar, no caso, pensam que tão
falando... fazem uma pergunta em português e falam em espanhol. E às vezes os árabe
também, [...] Eu acho que é por causa do dia-a-dia, né? As pessoa se confundem,
como são vários idiomas que existem [...]. Acho que não.

A informante FI/4 traz o portunhol como resultado da mistura das línguas, suscita a
questão lexical e comenta que o léxico utilizado em diferentes regiões do Brasil pode ter o
mesmo significado para os paraguaios. Essa percepção da informante pode ocorrer devido ao
contato linguístico e cultural, pois falantes de diferentes idiomas se utilizam do mesmo léxico
em algumas ocasiões, e muitos desses elementos lexicais são oriundos de variantes regionais
brasileiras, também percebidas no uso da língua falada na fronteira. Dessa mistura, novas
lexias vão surgindo como resultado do contato de diferentes línguas e culturas em ambientes
em que várias etnias se fazem presentes:

FI/4 – Portunhol. [...] Com certeza (risos). Sim. Ah, [...] têm muitas palavras que por
exemplo, o gaúcho fala, que o paraguaio tem, [...] parece que tem uma parte do
Paraná, Santa Catarina, Rio, que têm palavras deles que não sei se o brasileiro copiou
do espanhol ou vice-versa [...].

O informante FI/5 fala que mistura as línguas e considera boa a mistura linguística,

141
contudo, muitas vezes, as pessoas pensam que estão falando uma língua estrangeira, mas não
estão falando nem uma língua, nem outra, e que a mistura acontece no local de trabalho:

FI/5 – Muito, eu me pego toda hora falando em espanhol. [...] Acredito que seja bom
até, apesar do povo falar que fala a língua que na realidade não é, só porque acha que
mora perto do Brasil, do Paraguai e da Argentina ele acha que fala alguma coisa, mas
às vezes acaba não saindo nem o portunhol sai o um outro dialeto que é inventado ali
[...]. Aqui no trabalho sim, mas fora do trabalho não.

A informante FI/6 diz que não acontece com ela nem com seu grupo a mistura
linguística, mas a considera interessante, enriquecedora, que muitos estrangeiros acabam por
utilizar itens lexicais diferentes e gestos para se fazer entender em seu local de trabalho:

FI/6 – Claro, né? Mais no dia-a-dia aqui, espanhol eu acho que só é utilizado nesses
momentos mesmo, de conversa com pessoas que falam espanhol, [...] não no meu
grupo [...]. Acho interessante. De certa forma, acho que enriquece. [...] Hã... vem
muito americano, e americano geralmente usa gestos, né? Eles quase nunca
conseguem falá uma palavra ou tentá falá em espanhol, né? Acontece também alemão
que tenta falá em inglês, né? Que acham que a gente vai entender melhor ou em
espanhol, sempre usando um dos dois idiomas [...].

Para o informante FI/7, a mistura das línguas muitas vezes causa um desconforto
porque na opinião dele é intencional, principalmente quando ocorre no comércio. Isso
demonstra que a alternância linguística na fala do patrão com o funcionário para que o cliente
não o entenda é uma forma de exclusão. Embora o informante tenha se sentido enfurecido por
não compreendê-los quando dialogam em línguas diferentes, ele vê a mistura linguística, que
acontece nas interações cotidianas, positiva para a região:

FI/7 – Isso acontece sim. Se você entra numa loja e a loja é de um árabe, e ele tá
falando com outro árabe colega de trabalho dele, ele tem que fala com você que é em
português, ele tem que falá com outro empregado dele que é um argentino, que é um
paraguaio, então você vê essas linguagens todas, e quando você não entende a língua,
aí você fica muito bravo [...] Acontece em Foz do Iguaçu, no Paraguai, na Argentina
isso acontece no cotidiano, no cotidiano a gente vive isso lá. [...] Eu acho saudável.

A informante FI/8 considera natural a mistura linguística por ser um contexto de


fronteira e que, pelo fato de muitas vezes não compreender o que estão falando, ela aprende,
devido ao esforço feito em entender o que o outro está falando:

142
FI/8 – Ah! Tem sim. [...] Por exemplo, no Brasil, ele é paraguaio, trabalha no Paraguai
e mora aqui no Brasil, então, o próprio sotaque, às vezes ele conversa contigo em
português, mas de vez em quando ele introduz palavras em espanhol. [...] Eu acho
natural [...]. É um aprendizado e aos poucos mesmo que ela seja produzida, mesmo
que às vezes você sinta dificuldade por não conhecer, você começa a partir dali a
conhecer aquela palavra, então isso já ajuda.

Os informantes de Ciudad del Este também afirmam que há muita mistura das línguas
nas mais diversas ocasiões, seja para se fazer entender ou como forma de expressar,
demonstrar o que está sentindo. O informante CL/1 diz que ocorre a mistura, porque é uma
cidade bilíngue e quando ocorre o esquecimento de alguns termos em espanhol, então, esses
elementos são expressos em guarani:

CL/1 – Acontece também, né? Dependendo da pessoa, né? Porque tem só que falá
guarani e otro só que falá espanhol, né? [...] é bom, [...] que mucha vece a pessoa no
se lembra do que tava falando em espanhol. [...] No se lembra no espanhol, então
coloca ai o guarani... (Risos) aí, entra o guarani. Faz como que é um engate aí...
(Risos) uma mistura.

Para a informante CL/2, a mistura linguística é positiva porque acaba por tornar o
falante mais fluente na língua do outro, o comércio local requisita de seus funcionários a
fluência em pelo menos dois idiomas e quem fala mais de um idioma é mais valorizado e são
maiores as oportunidades de emprego:

CL/2 – Si, acontece é o mesmo que expliquei pra você. [...] é bom, porque assim, as
pessoas vão facilitando mais a sua língua, pode falar com mais fluidez a língua de
outro... de otro país. [...] Sim, acho, acho importante. [...] Porque aqui na Cidade de
Leste o comércio é o que mais move, agora pra você conseguir um trabalho você tem
que ter pelo menos duas línguas é mais fácil se você falar sua língua materna e outra
língua, é... as pessoa valora mais.

O informante CL/3 faz referência à mistura linguística que acontece na cidade e


considera tranquila, porém nunca aconteceu com ele. Já a informante CL/4 reconhece que há
mistura das línguas e se coloca como exemplo, pois fala com seu esposo em espanhol e xinga
seus filhos em guarani, quando está com as amigas fala em yopará e afirma que, ao falar em
guarani, ela expressa a verdade, isto é, demonstra o que está sentindo.
Pode-se dizer que a diversidade linguística nesse caso é imbuída de significado, o uso
das diferentes línguas não acontece ao acaso, como a própria informante traz em sua resposta.
Ao dizer que a verdade é expressa em guarani, demonstra sua crença relacionada à língua
143
materna, vista como símbolo de amor, dedicação e verdade, logo, ela diz que quando as
pessoas falam em guarani, expressam-se em guarani, demonstram o que sentem e tornam-se
autênticas:

CL/4 – Na minha casa eu falo em espanhol porque meu marido é argentino e quando
eu xingo meus filhos eu falo em guarani. [...] Porque eu expresso a verdade, né? Eu
falo em guarani. E quando eu falo com as minhas amigas, falo yopará. [...]Abre muito
a inteligência [...]. Eu posso tá concentrada, eu posso aprendê, eu posso estar atenta,
eu percebo. A língua faz isso, quando você fala várias línguas, abre muito a mente da
pessoa.

Para o informante CL/5, a mistura linguística acontece devido à agitação de seu


trabalho, que reflete em casa, com os amigos e que, em certas ocasiões, essa mistura acaba
virando brincadeira e motivo de piada:

CL/5 – Acontece, acontece. Porque muitas vezes, acontece de repente pela agitação,
né? Você tá falando com um brasileiro, tá falando com um argentino, chega um gringo
e te fala também, aí você, aí, acaba misturando e muita vez você leva isso pra sua casa
também. [...] Eu acho bom, porque quanto mais língua uma pessoa falá eu acho que é,
são mais porta que se abrem pra pessoa, né? Poder assim, enfrentá uma situação ou de
repente, pra cultura mesmo da pessoa. [...] Aqui sim. Tem coisa por exem... que eu
falo assim, com meus amigos [...]

Para a informante CL/6, a mistura linguística acontece sim, diariamente e ela acha
engraçada. Já para o informante CL/7, a mistura acontece cotidianamente, é muito salutar e
reconhece que o contato com culturas diferentes traz muita aprendizagem conforme se pode
notar:

CL/7 – Acontece, tudo dia, acontece, de repente fica falando com uma persona que só
fala português, fala o chinês también e o japonês. Um tiempo aqui eram forte. [...]
Acho bom, uma cultura diferente, a gente va aprendiendo vai se formando em tudas
coisa, aprende a falar. [...] Isso que você tem na mano é caneta, aqui em espanhol, em
espanhol seria bolígrafo. Em yopará seria lápis.

A informante CL/8 afirma que a mistura acontece sim, durante a comunicação, pois,
por estar na fronteira, isso é comum. Além do mais, ela acredita que as pessoas devem falar
um pouco de cada idioma, não só português e espanhol, e acrescenta que pela fronteira
passam pessoas do mundo inteiro:

144
CL/8 – Si, é, é. [...] Es bien, para la comunicación está también. [..] Sí, se usa. Es
necesario mais de una língua, porque se llegan de todo el mundo, no solamente Brasil
e Paraguai vário más europeu, sueco, todo, de toda la parte del mondo. Por (inint.) um
poquito mais difícil com lo europeu aí que manejar el inglês, manejar otras línguas.

Com relação à cidade de Puerto Iguazú, os informantes reiteram que os falantes


misturam as línguas, no dia-a-dia, e que isso dá um colorido típico à região, citando quando e
onde isso acontece. O informante PI/1 aponta que encontra dificuldade ao falar com pessoas
mais velhas, porque a maioria fala guarani e, segundo ele, não é fácil falar e entender guarani.
Quando conversa com brasileiros, ao buscar expressões em português para entendê-los, para
ele, esse gesto é uma maneira de mostrar afeto, receptividade e fazer novas amizades, logo ele
considera positiva a mistura linguística:

PI/1 – Acontece em alguns lugares, porque aqui tem muita mescla, tem muito, aqui
nessa cidade tem muito brasilero, tem paraguaio mesclado [...] a pessoa mais de idade
do Paraguai, falam mais guarani, guarani eu não entendo nada quase, guarani é um
idioma muito difícil pra mim, pero português não, português sim é fácil. [...] Eu acho
bom. Um exemplo de amizade, para fazer amizade. [...]. Por exemplo, pra ir comprá,
talheres, que falam, essas coisa pra mim é fácil, tênis, aqui é sapatilha, é diferente todo
aqui [...].

Para a informante PI/2, a mistura linguística é positiva, acontece frequentemente no


trabalho e a considera complicada, pois se sente atrapalhada em determinadas situações como
sucede em seu trabalho onde há momentos em que usa o seu próprio idioma para que o outro
não a entenda:

PI/2 – Acontece, por exemplo, você tem cinco membros, um fala português, outro
espanhol, outro inglês e aí você atrapalha tudo, você chegou na mesa que o português
fala inglês e fica te olhando e cê lembrou que não é essa. Aí ele fala que não fala
português, daí então, assim... tem momento que é muito trabalho. [...] Muito
complicado, mas muito boa também pra quem entende. (Risos) [...] Por exemplo,
cê tá falando com alguém e vem... vem... você sabe que não entende a língua e você
fala outra pra que no entenda. [...]

Para o informante PI/3, a mistura linguística é negativa, principalmente na escola,


quando professora e alunos falam castelhano e informa também que a mistura linguística
acontece no ambiente gastronômico:

PI/3 – Es verdad. […] Es bom não misturar para uno tener más conocimiento, […]
en el caso, aquí de Puerto Iguazú castellano, no, pasa en la escuela, a la maestra, a los
alumnos, falam todo.[…] Es común, es común. Aquí en la zona siempre...
Principalmente en las comidas, cuando uno va al restaurante pide las comida para que
145
el garçon posa entender tiene que falar la mesma cosa[…].

Os informantes PI/4 e PI/5 afirmam estar acostumados a essa mistura e concordam que
a mistura acontece diariamente em diversos lugares. O informante PI/5 considera a mistura
linguística positiva, pois dessa forma pode falar um pouco de várias línguas:

PI/5 – É verdade, porque aqui falam muito portunhol, guaranhol eles mesclam
tudo.[...] Eu acho legal (Risos) eu gosto. [...] quando você vive na fronteira você tem
que sabê tudo, eu sei português, guarani, inglês e castelhano.

Para a informante PI/6, a mistura das línguas acontece de maneira negativa porque,
com isso, as pessoas se expressam mal, mas ela procura entender, ser entendida por meio de
gestos e exemplifica:

PI/6 – Sí, si elas misturam si, si mistura muito. [...] Que às vezes se expressa muito
mal às pessoas tudo misturado, não está falando bem, né? Não, é um idioma tudo
misturado. [...] Eu acho que tem diferentes maneira de expressar-se, mas sim tratamos
de entender às veces procuramos uma maneira de chegar a entender, procuramos uma
palavra que nos possa entender também. [...] eu aprendi assim também saber o que
significava isso, mas por meio de senha que eu fui aprendendo.

O informante PI/7 afirma que a mistura linguística acontece de maneira positiva, em


reuniões, em diferentes ambientes sociais, na convivência com os amigos, e isso se torna,
muitas vezes, motivo de brincadeira, tendo em vista os falsos cognatos, como exemplifica:

PI/7 – É verdade, acontece, mas eu quero significar que, isso acontece e eu acho isso
muito bom, mas acontece só para as reuniões, as convivências sociais, [...] mais para
os acontecimentos assim, que tenham outro perfil, seja jurídico comercial, juridico
político, aí, aí a gente tem muita dúvida. [...] Por exemplo, vocês têm o término, o
termo esquisito, “isso é esquisito”, nossa senhora, você fica de olho, não dá pra... pra
confiar nisso aí; “é muito esquisito” alguma coisa está errada; prá nós “exquisito” [...]
é algo muito delicioso, muito bom. Partindo desse exemplo muito simples, tem muitas
coisas sim que são importantes, que são necessário conversa o mesmo termo pra se
fazer entender melhor.

Para a informante PI/8, a mistura das línguas é positiva e dá um colorido típico que
identifica a região. A maioria dos jovens domina os três idiomas devido ao contexto de
fronteira e ao turismo que abre as portas para esse ramo na região, ao passo que as pessoas
mais velhas apresentam maior dificuldade por não terem esse domínio linguístico.

146
PI/8 – Bueno, yo creo que le da um color típico a la zona, cierto, a mi me agrada
personalmente ir a Brasil e entender a brasileiro, me gusta que venga a cá, me há
passado, encontrar-me com gente brasilera, em outros lugares lejanos que a cá, e ver-
los por exemplo que tiene dificultad em dar-se a entender, e trato de assistir-lo [...].
Hablo de região, no hablamos de três fronteiras para mim és uma só região. [...] É aqui
vai caso que te dizia, em Iguazú la gente que mora aqui, sempre hecho esforço por
entender los outro idioma, especialmente el português, no hablemos quiça de línguas
estrangeiras mais lejanas, cierto, pero hoy dia, reitero hablo Iguazú que é muy típico
na atividad turística, no é lo mismo ahora de case trinta años atrás. Hoy los jovenes, la
mayoria maneja dos o três idiomas [...].

Pode-se perceber nas respostas dos informantes que a maioria tem o mesmo discurso
sobre a mistura linguística, e isso é exemplificado pela prática da experiência sociolinguística.
Seus argumentos são recheados de exemplos que são facilmente compreendidos. Para esse
fato, chama atenção Schlieben-Lange (1993, p. 95) ao afirmar que

[...] o discurso público sobre língua(s) contém principalmente avaliações, isto é,


julgamentos sobre ‘bonito’ e ‘feio’, ‘bom’ e ’ruim’, eficiente, etc. Mas também
contém elementos de saber, como sobre a distribuição das línguas no tempo e no
espaço (por exemplo, ‘cada vila tem um dialeto diferente’), sobre situações e tipos
de textos, para os quais uma e outra língua (ou forma linguística) é mais adequada.

Compreende-se, então, que o informante, ao manifestar sua opinião sobre a sua língua
e sobre outras línguas, ou a mistura linguística que ocorre no cotidiano, explicita o seu saber
que é baseado em sua vivência. Há percepção de que todos possuem características
semelhantes que vão desde o uso de palavras até o jeito de expressá-las. Tal semelhança é
conferida pelos anos de convivência desses falares na Tríplice Fronteira, resultando em uma
mistura linguística. A compreensão das crenças e atitudes em relação à(s) própria(s) língua(s)
e à(s) língua(s) do outro é de suma importância, porque a partir dessa compreensão, pode-se
delinear o possível quadro linguístico dessas comunidades.
Com o entendimento de que as atitudes linguísticas dos informantes são dotadas de
sentido, considera-se nas respostas da maioria dos inquiridos das três comunidades que há
uma voz que diz que o homem da fronteira possui uma fala característica, o portunhol. Na voz
dos demais informantes, que a região não possui uma fala característica, e sim que possui
muitas influências linguísticas.
Observou-se que a influência linguística é penetrada de cultura e nessa inter-relação,
elas se interpenetram e se refletem como se estivessem diante de um espelho. Dessa forma,
por meio da mistura linguística, hábitos, ideias, costumes, fatos, visões do mundo, crenças e
147
atitudes refletem as características gerais das comunidades que formam a Tríplice Fronteira,
como forma de identificação deles mesmos e dos outros; portanto, a mistura linguística é uma
marca característica das comunidades locais.
Em Foz do Iguaçu, 87,5% dos informantes concordam que há mistura linguística na
Tríplice Fronteira, porém, 12,5% consideram a mistura linguística negativa. Afirmam que as
pessoas se confundem, pensam estar falando um idioma e na verdade falam outro. Esse fato,
apesar de ser percebido por apenas um informante, demonstra que a língua orienta grande
parte das atitudes e comportamentos dos falantes, sem que haja consciência disso.
A partir do momento que um indivíduo faz parte de uma comunidade de fala, em que
diferentes idiomas se fazem presentes, ele acaba por internalizá-los pelo processo de
assimilação. Sem se dar conta, na ausência de vocabulário, o indivíduo acaba por fazer uso de
vocábulos de outras línguas, fato esse muito comum na aprendizagem de línguas estrangeiras,
principalmente quando o contato linguístico ocorre de forma natural.
Em Ciudad del Este, 100% dos informantes consideram a mistura linguística positiva,
por veicular o conhecimento, as crenças e atitudes características da realidade da Tríplice
Fronteira. Os informantes percebem a mistura linguística e a associam ao trabalho, adotando
concepções positivas de usar estratégias fáceis de comunicação, com a crença de se sair bem
nas tarefas cotidianas da fronteira, entre outras razões. O fato de misturar as línguas é a
melhor estratégia para estabelecer relações sociais e comerciais com o estrangeiro e funciona
como contrapartida para reforçar as crenças implícitas sobre como lidar com a mistura
linguística na Tríplice Fronteira.
Em Puerto Iguazú, 62,5% dos informantes consideram a mistura linguística positiva e
37,5% dos informantes consideram a mistura linguística negativa. Conforme visto, a
informante PI/2 considera “complicada, trabalhosa, boa apenas para quem entende”; o
informante PI/3 afirma que “é bom não misturar as línguas, pois para que haja entendimento,
há que se falar o mesmo idioma”; para a informante PI/6, “as pessoas se expressam muito
mal”, porém ela busca uma maneira de se fazer entender por meio de gestos.
A atitude desses informantes diante da mistura linguística faz com que se identifiquem
as ideologias implícitas, suposições de senso comum, cristalizadas às formas convencionais
de agir linguisticamente dentro desse ambiente. Se o informante as reconhece, significa que
pode romper com essas amarras que a tradição linguística impõe e optar, de maneira
consciente, por aceitar ou não a mudança. Com base na compreensão crítica de todo o
contexto geográfico no qual o falante se encontra, a escolha linguística será por opção e não

148
por falta de alternativas, destacando-se que não há como impedir a mistura linguística a partir
do momento que a mudança faz parte da comunidade de fala.
A mistura linguística é algo automático e direto, portanto é normal nesse processo que
algumas pessoas se defrontem com resistências. Essas resistências estão conectadas ao
conhecimento implícito da mistura linguística, apontado como fator negativo por 16,66% do
total dos informantes. Logo, há uma complexidade em meio ao contato entre as línguas, que
envolvem fatores afetivos que ali transitam. O pensamento que representa a crença, composto
tanto do conhecimento cognitivo, quanto do saber fazer, agir que representa a atitude.
A partir dessas considerações, pode-se dizer que a língua é a manifestação dos valores,
crenças e atitudes das pessoas. Inclui a mistura linguística utilizada pelo grupo da qual fazem
parte. Representa um papel importante no modo como usam, não somente a língua materna,
mas também como lidam com os outros idiomas. É por meio das atitudes linguísticas que se
compartilha com os outros a cultura, respeitando as idiossincrasias, experiências de cada um;
portanto, a mistura linguística é fato na Tríplice Fronteira.
A mistura linguística deixou de ser concebida como restrita a pequenos grupos e
passou a ser vinculada à constituição de contextos conversacionais maiores, tornando-se um
ingrediente propulsor de possíveis mudanças linguísticas, culturais e sociais.
O Quadro 16 traz a síntese de como é vista a mistura linguística na fronteira.

Quadro 16 – Mistura linguística na Tríplice Fronteira

Cidades Foz do Iguaçu Ciudad del Este Puerto Iguazú


Mistura Linguística
Existe 08 08 08
Positiva 07 08 05
Negativa 01 --- 03

Ao analisar as respostas das perguntas 10 e 11, busca-se saber como é vista a


pluralidade linguística na fronteira e em que situações essa pluralidade se manifesta com mais
intensidade. Como foi referido várias vezes, há imigrantes de vários países que residem em
Foz do Iguaçu e em Ciudad del Este, fato ao qual se agrega a intensa movimentação de
turistas na fronteira que vão às compras no Paraguai e uma outra parte desses turistas, que é
muito significativa, que busca visitar os pontos turísticos das três fronteiras. A partir do
conhecimento dessa realidade da região é que foi feita a seguinte pergunta:

149
Pergunta 10. Você / o(a) senhor (a) acha importante essa pluralidade linguística na
fronteira? Por quê?
Os informantes de Foz do Iguaçu consideram importante a pluralidade linguística na
fronteira, ressaltam também a importância de conhecer outras culturas e que o conhecimento
advindo desse intercâmbio linguístico é de grande importância para todos, conforme se pode
observar por meio da transcrição dos excertos dos informantes FI/5 e FI/7.
Para o informante FI/5, a pluralidade é importante, porém ele ressalta a importância
das línguas mais utilizadas na fronteira que são o português e o espanhol. Sua crença consiste
em dizer que as pessoas pensam que sabem falar a língua por pronunciarem alguns vocábulos
aprendidos no dia a dia e isso não significa que saibam o idioma. Afirma também que não
adianta aprender outras línguas que não as do contexto, porque essas línguas jamais serão
utilizada pelo falante:

FI/5 – É importante.[...] As pessoas acham que falam, não vão atrás pra buscá falá
aquilo bem, acabam achando que sim e acabam quebrando a cara achando que falam
alguma coisa. É importante, mas tem que saber, né? [...] não adianta você querê falá
uma língua que você nunca vai vê. Aqui se você quiser aprendê espanhol é muito fácil
você se formou e vai três vezes no Paraguai você vai tomá interesse por falá espanhol,
apesar deles tentarem falá o português, os paraguaios falarem português. [...]

Na visão do informante FI/7, além da pluralidade linguística presente na fronteira, traz


a questão da variação linguística, que segundo ele também merece destaque:

FI/7 – Acho muito importante, é muito rico, enriquece, só enriquece, embora penso
que nós devemos sempre valorizá questões regionais, pontuais, ali, o Norte do Paraná
fala assim, o Sul, o catarina fala assim, o nordestino fala assim, tem um cantar muito
marcante, na língua, na fala, mas é importante também o contato com outras falas e até
outras línguas de outros países.

Em Ciudad del Este, os informantes consideram importante a pluralidade linguística, e


também apontam para o contato com diferentes culturas. Destaca-se a resposta dos
informantes CL/4 e CL/5, para exemplificar essa questão.
A informante CL/4 considera importante, mas enfatiza que não é bom, sua crença
reside no falar bem a língua, que não basta aprendê-la no cotidiano, ela aponta para a
necessidade da escolarização quando se quer falar uma língua estrangeira:

CL/4 – É importante, só que não é bom, isso que eu queria falar [...] Porque se tem que
150
falá uma língua, tem que falá bem, tem que aprendê bem, porque a pessoa que vai falá
tem que estudá, tem que aprendê, falá, escrevê, e lê.

Para o informante CL/5, a pluralidade é importante e ele acredita que as pessoas que
têm negócios na fronteira devem falar alguns vocábulos em todas as línguas para melhor
receber seus clientes, e que essa necessidade de falar outras línguas é natural:

CL/5 – Claro que sim, porque é uma cidade, Cidade do Leste é uma cidade
cosmopolita, aonde têm várias culturas, tem chinês, coreano, tem um pouco de tudo,
então a gente tem que sabê no mínimo como cumprimentá uma pessoa no idioma dele,
ou seja, eu sinto necessidade de falar por exemplo:[...] vem um japonês falo pra ele
“Kon'nichiwa”, então a gente faz de tudo, a gente vai falando assim, a gente tem uma
necessidade natural de sabê como é, como é que é a palavra prá cumprimentá eles.

Ao analisar as respostas dos informantes de Puerto Iguazú, em que todos consideram


importante a pluralidade linguística, destaca-se a resposta do informante PI/7. O informante
aponta para os conflitos gerados por não entender a fala do outro, as diferentes culturas e as
fronteiras linguísticas. Ele destaca a situação de um brasileiro que fala perfeitamente o
espanhol, porém, ao se deparar com argentinos e paraguaios que falam determinada variante
do espanhol, encontra limites na conversação:

PI/7 – É importante porque ela é uma particularidade que, por naturalidade, deve-se
conviver na fronteira. [...] Participando de um workshop em Assunção, capital do
Paraguai, ma lá tem um grupo de vinte sete pessoa, já passaram dez turma, tá, e a dez
turma sempre estão misturada, é participantes paraguaios, de distinta região do
Paraguai e argentino, aqui do estado de Misiones, mas os facilitadores são brasileiros,
o facilitador tentando falar um espanhol perfeito para dois países que têm diferença no
espanhol [...].

Percebe-se na resposta de todos os informantes selecionados das três localidades,


divergentes opiniões relacionadas à pluralidade linguística. A maioria dos entrevistados expõe
suas crenças a respeito da diversidade de línguas nas comunidades, apesar de essas crenças
não estarem fundamentadas em teorias. Suas atitudes linguísticas se pautam no que os
informantes consideram adequado e inadequado para a fronteira.
Observa-se, nos excertos destacados, a presença da afetividade dos informantes no que
diz respeito aos diferentes falares nas três comunidades. A pluralidade linguística pode
conduzir as pessoas a diversas crenças por ser apresentada como um caleidoscópio mental, em
que as pessoas dão sentido ao mundo ao seu redor, expressando suas crenças, tradições,

151
sentimentos e emoções por meio das atitudes linguísticas.
Desta forma, a idéia de valoração dos falares é evidenciada pelos sentidos que
produzem as atitudes linguísticas dos informantes. De um lado, tem-se o próprio falar elevado
a uma condição superior; do outro, tem-se a pluralidade linguística enquadrada numa
condição menor, em que se aprendem alguns termos, vocábulos e expressões para poder
interagir. Dessa forma, muitas vezes o falante enfrenta constrangimentos que limitam sua
articulação efetiva e revela também atitudes linguísticas de superação em situações concretas,
conforme se procura resumir no Quadro 17.

Quadro 17 – A importância da pluralidade linguística na Tríplice Fronteira

FOZ DO IGUAÇU CIUDAD DEL ESTE PUERTO IGUAZÚ

Todos consideram importante a Todos consideram importante a Todos consideram importante a


pluralidade linguística e também pluralidade linguística e também pluralidade linguística e também
apontam para o contato com apontam para o contato com diferentes apontam para o contato com
diferentes culturas. culturas. diferentes culturas.

PORÉM, alguns informantes PORÉM, alguns informantes destacam: PORÉM, alguns informantes
destacam: destacam:
 a importância de falar bem a
 a importância pelo português e língua, não bastando aprendê-la no  a geração de conflitos por
espanhol como as línguas mais cotidiano; não entender a fala do
utilizadas na fronteira;  a necessidade de escolarização para outro;
 a necessidade de aprender falar uma língua estrangeira;  as fronteiras linguísticas,
outras línguas, que não as do  a necessidade de os comerciantes isto é, o conflito entre
contexto, pois jamais serão falarem alguns vocábulos em todas falantes do espanhol padrão
utilizada pelo falante; as línguas para melhor receber seus diante de falantes de outras
 a questão da variação clientes. variedades da língua
linguística. espanhola .

Com a pergunta 11, pretende-se saber um pouco mais a respeito da pluralidade


linguística e localizar os lugares em que essa realidade linguística é mais frequente:

Pergunta 11. Onde você / o (a) senhor (a) convive mais frequentemente com essa
realidade linguística (as pessoas falando línguas diferentes em diferentes ocasiões?) na
família, na escola (colega/colegas, professor/alunos), no trabalho (relação com clientes, no
convívio patrão/empregado), no comércio, quando vai as compras, na igreja, nas relações
de amizade.
Em Foz do Iguaçu, constata-se que, para a maioria dos informantes, a pluralidade
linguística tem se destacado mais no local de trabalho. Alguns acreditam que a pluralidade se
manifesta nos momentos de descontração, quando estão com amigos, porque, como se
autodenominam falantes de mais de uma língua, sentem-se à vontade para falar em outros
152
idiomas; os demais apontaram a rua, ponto de ônibus, conforme veremos nos excertos
destacados.
Para os informantes FI/1, FI/2, FI/3 e FI/6, a pluralidade linguística se manifesta no
local de trabalho, e o informante FI/1 se sente à vontade ao afirmar que fala outros idiomas
com os colegas de trabalho, ao jogar futebol e na escola, conforme destaque dado ao excerto:

FI/1 – Nos futebol, nas escola, certo? Desde quando você tá jogando bola cê vai de
repente chamar a atenção do colega seu, cê fala em espanhol, fala em inglês com ele é
mais ou menos por aí. Aqui no hotel também, né? Com os colega fora do horário de
serviço cê fica jogando conversa assim.

A informante FI/4 destaca que a pluralidade linguística está presente em toda parte, no
dia a dia das pessoas. A crença da informante perpassa pelas diferentes culturas e pelos
hábitos de cada um. Cita exemplos como tomar tererê, que é tomado frio e está ligado aos
habitantes de Ciudad del Este e o chimarrão (típico da região sul do Brasil) que é tomado
quente e é montado com erva-mate moída mais fina que a erva do mate tererê:

FI/4 – Em toda parte, até na rua assim, que a gente mora, entendeu? Sempre tem
alguém misturado, né? [...] Tá tomando tererê, tá tomando chimarrão, aí cê vê que se
falam, né?

Na resposta do informante FI/5, a pluralidade linguística se manifesta sobretudo nos


ambientes noturnos, conhecidos por baladas, local onde os jovens se reúnem para dançar,
beber e conversar. Nesse caso, a crença está associada a falantes dos três países que se
encontram nesses locais em Foz do Iguaçu, em Ciudad del Leste e em Puerto Iguazú. As
danceterias e bares são bastante populares na fronteira e frequentados pelos moradores da
região, falantes das mais diversas línguas: espanhol, árabe, japonês, chinês, coreano, guarani,
porém o intercâmbio linguístico mais frequente é entre o português e espanhol

FI/5 – Balada também é interessante esse tipo de coisa, porque os brasileros vão pros
outros países e o pessoal dos outros países vem pro Brasil. Então se você quer ir numa
balada aqui tem a... principalmente na Argentina tem, você chega lá e só encontra
brasileiro, né? E se você não precisa procurá muito e no Brasil você encontra muito
paraguaio e argentino, entende?

Os informantes FI/7 e FI/8 acreditam que a pluralidade linguística ocorre bastante no


próprio local de trabalho já que ambos são professores. Como referido em seções anteriores,

153
Foz do Iguaçu é conhecida pelas diversas etnias que lá se fazem presentes e a escola se torna
um ambiente propício para a percepção da pluralidade linguística na fala das crianças e dos
jovens. Por ser região de fronteira, os informantes não se deparam apenas com falantes do
Paraguai e da Argentina, mas também com falantes de outros países e encontram dificuldade
como a apontada pelo informante FI/7, para entender os falantes de outros idiomas no
comércio local:

FI/7 – Eu convivo na escola onde eu trabalho, na escola onde minha filha trabalha tem
árabe, tem chinês, que eu não citei aqui prá você que é um problema, às vezes lá, você
tá em um posto de gasolina abastecendo, o dono é um chinês, daí, fala em chinês com
o outro aí você qué intendê, então é uma loucura, tem o chinês, o coreano, que é
diferente, não é chinês, são línguas distintas, então situação do dia a dia ali em Foz do
Iguaçu, normalmente no comércio, né? Na escola [...] Você tem ali os alunos árabes, os
alunos coreanos, os alunos chineses, os alunos paraguaios, alunos brasileiros, e
brasileiros de várias regiões do Brasil, interessante citá isso, então a gente convive no
dia a dia mesmo com outras línguas.

Em Ciudad del Este, também houve a confirmação, por parte dos informantes, de que
a pluralidade linguística ocorre, porém é percebida entre o guarani, espanhol e português.
Para o informante CL/1, o uso das diferentes línguas acontece mais no interior de
Ciudad del Este, isto é, na zona rural. Ele acredita que as pessoas do interior, ao se dirigirem à
Ciudad del Este para trabalhar ou para as compras e não falam espanhol, apenas guarani
misturam as línguas para explicar em guarani o que não foi entendido em espanhol, ou
explicar em espanhol o que não foi entendido em guarani:

CL/1 – Ah, na verdade aqui no, no interior do país, que é que têm pessoas que só
falam guarani e espanhol nada, e aí que, é uma vez um tem que explicá em guarani por
isso.

Os informantes CL/2, CL/5 e CL/7 percebem que a pluralidade linguística está


presente no centro da cidade, local onde o comércio está localizado e por isso o fluxo de
turistas é intenso. Para os informantes CL/4 e CL/6, o uso das diversas línguas acontece no
local de trabalho, a informante CL/8 afirma que a pluralidade linguística é comum na fronteira
e o informante CL/7 faz referência ao comércio, dizendo que as pessoas misturam todas as
línguas para se fazer entender:

CL/7 – No comércio, no comércio que vai aparecer isso e no interior donde mora

154
brasileiros, japoneses e outras nacionalidades. Aí tem outro jeito diferente de novo.
Ma, aí comercialmente, a gente mistura todo. Cê escuita o chinês e o árabe tentando
falá o guarani, tentando falá o português, o espanhol, e aquela persona que é o
paraguaio tentando falar outro idioma, de alguna qualquer maneira tentando se fazê
entendê um com outro.

Ao inquirir os informantes de Puerto Iguazú sobre a pluralidade linguística e onde é


mais latente, surgem as mais diversas respostas. Observa-se que o turismo é mencionado, nas
respostas dos informantes, como forma de referendar a pluralidade linguística em locais como
restaurantes, a feira e no comércio em geral.
Para o informante P/1, no centro da cidade há uma concentração maior de turistas e,
como há muitos brasileiros residindo em Puerto Iguazú, ele acredita que a pluralidade
linguística é inevitável:

PI/1 – No centro, na avenida você encontra brasileiro, encontra holandês e alemão,


japonês, porque aqui é uma cidade de muito turismo estrangeiro. [...]

Os informantes PI/2, PI/4 e PI/6 têm a crença de que a pluralidade linguística é mais
frequente nos eventos relacionados ao trabalho, para o informante PI/7, a pluralidade
linguística é recorrente em Foz do Iguaçu, Ciudad del Este e Puerto Iguazú. Ele acredita que
na fronteira a pluralidade das línguas é saliente, principalmente nos eventos, congressos que
acontecem na região e é necessário conhecer um pouco de todas as línguas para que ocorra a
interação com o estrangeiro e aproveitamento maior do evento:

PI/7 – Ok, é... Aí eu recebo um convite para assistir a uma palestra em Foz do Iguaçu,
e tem por exemplo um congresso internacional, que são muitos, os que passam pela
región, tanto pros de Puerto Iguazú, quanto Foz do Iguaçu e Ciudad del Este também.
[...]Você tem aí um encontro de pessoa, falando um distinto idioma com um distinto
ênfase, e com distinta e você fica aí, no meio, curioso [...]isso, é atinge a qualidade do
encontro, do congresso por exemplo, porque ele poderia gerar um cem por cento, de
resultado positivo, mas acaba gerando um... quarenta, cincoenta, talvez isso é positivo
mas dentro da dúvida idiomática.

O informante PI/5 foi o único dos vinte e quatro informantes a trazer o ambiente
familiar como local onde a pluralidade linguística aparece, fez referência a ambientes como
supermercado, danceterias e centro comercial, onde há interação com paraguaios e brasileiros:

PI/5 – Mais na família, nos cliente, no supermercado ou você vai na danceteria vai

155
aqui vem muito brasileiro e paraguaio e mais aqui no centro comercial em Porto
Iguaçu.

Para a informante PI/8, a pluralidade linguística acontece no supermercado local, onde


destaca a presença de vários turistas de todas as partes do mundo e faz referência às
características físicas que os identificam. Cita os restaurantes e vinhoteca onde a presença de
turistas merece destaque. Acredita-se que os preços baixos e a qualidade dos produtos têm
atraído turistas de todas as partes e com isso a frequência dos diferentes idiomas é constante
nesses locais:

PI/8 – Bueno, aqui em Iguazú normalmente acontece quando vão ao restaurante, que
hay de tudo, ora também no supermercado que também acontecia ante por uma
questão cambiária, pero que hoy, em uma vinhoteca que tiene muchos brasileiro
especialmente, bueno, no supermercado aqui. Estava esperando para pagar su cuenta e
adelante um falando italiano, outro francês, hablava japonês, oriental por sus ojo, otro
que hablava guarani, se ali, em qualquer negócio que se tá em lá espera se escucha
três, quatro idioma ao mesmo tiempo.

Na região da Tríplice Fronteira há uma mistura linguística, em que a pluralidade


linguística e cultural se torna evidente, pois integra, na mesma região, pessoas oriundas de
diversas localidades, além do incansável vai-e-vem de turistas e consumidores de todas as
partes do globo terrestre.
A pluralidade linguística resultante do convívio com os diferentes falares da fronteira,
de culturas distintas é o que identifica esse lugar com traços típicos e o diferencia das demais
regiões e faz perceber que o falar das três cidades estudadas é, tipicamente, misturado.
O Quadro 18 apresenta uma síntese dos lugares que os informantes apontam em que a
pluralidade linguística está mais presente. Percebe-se que as cidades de Foz do Iguaçu e
Puerto Iguazú são mais frequentadas pelos turistas que vão em busca de lazer e descanso. Em
Ciudad del Este são citados apenas alguns locais, já que a cidade é bastante procurada para as
compras, são poucos os espaços destacados em que a pluralidade linguística se manifesta.
Dentre os espaços mencionados, os informantes destacam o interior da cidade, zona rural,
devido ao uso do yopará, aspecto esse que não foi destacado nas demais localidades
pesquisadas.

156
Quadro 18 – Lugares em que a pluralidade linguística se manifesta

FOZ DO IGUAÇU CIUDAD DEL ESTE PUERTO IGUAZÚ

A pluralidade linguística se A pluralidade linguística se A pluralidade linguística se


manifesta: manifesta: manifesta:
 no trabalho  no interior do país  nos restaurantes
 no futebol  no centro da cidade  no comércio
 na escola  no comércio  na feira
 com amigos  no trabalho  no centro da cidade
 no ponto de ônibus  na fronteira  nos eventos
 nos bares  nas palestras
 nos restaurantes  nos congressos
 nas danceterias  nos supermercados
 nas danceterias
 no centro comercial
 na família
 na vinhoteca.

As análises do conjunto de respostas do Grupo 3 apontam que a mudança de contexto


e a situação sociocultural são fatores que contribuem para a pluralidade linguística das
comunidades investigadas, em perfeita consonância com o que afirma Calvet (2002, p. 68-
69):

Se os usos variam geograficamente, socialmente e historicamente, a norma


espontânea varia da mesma maneira: não se tem as mesmas atitudes linguísticas na
burguesia e na classe operária, em Londres ou na Escócia, hoje e cem anos atrás.

Quando os informantes manifestam atitudes positivas com respeito aos turistas e/ou
moradores da Tríplice Fronteira pertencentes às diversas etnias, tal fato, promove uma atitude
de aproximação das pessoas em função da mistura linguística para interagir com o outro,
proporcionando, assim, o exercício do convívio social. Nesse sentido, observa-se que as
atitudes positivas, manifestadas por 83,33% dos informantes, superam as atitudes negativas
presentes em 16,67% dos informantes no que se refere à mistura linguística, conforme
registrado no Quadro 16, que traz uma síntese das respostas dos informantes das três
comunidades.
Assim, os informantes evidenciam atitudes linguísticas positivas e/ou negativas, de
acordo com os objetivos e/ou interesses situacionais. Revelam atitudes linguísticas positivas
quando o assunto versa sobre atividades turísticas, educacionais e sobre o comércio nas três
comunidades, marcadas por traços que vão desde a igualdade no trato, à necessidade de
adequar-se à situação e à pessoa.
A cultura assim como a língua, não nasce pronta e acabada, ela está sempre
157
interferindo e sofrendo interferências, principalmente em regiões em que o contato linguístico,
entre diferentes etnias, é intenso. Esse contato linguístico e cultural é responsável por
influenciar no comportamento, nas crenças e nas atitudes das comunidades de fala. De acordo
com Hall (2005, p. 74), “à medida que as culturas nacionais tornam-se mais expostas à
influências externas, é difícil conservar as identidades culturais intactas ou impedir que elas se
tornem enfraquecidas através do bombardeamento e da infiltração cultural.”
No que diz respeito à dinâmica da Tríplice Fronteira, constatou-se que o convívio entre
cidadãos de distintas nacionalidades nos mais diversos ambientes é inevitável e positivo para
a região. Observa-se que a pluralidade linguística permite algumas vantagens, como a prática
das diversas línguas que lá se fazem presentes. As pessoas podem circular livremente no
espaço das três fronteiras, têm acesso a três culturas, à culinária, aos produtos importados, ao
lazer e ao turismo.

6.1.4 Grupo 4 – As escolhas linguísticas

O Grupo 4 reúne sete perguntas que se inter-relacionam, elencadas na seguinte ordem:


12. Que língua(s) deve(m) ser mais usada(s) para se ter sucesso na fronteira? Por
quê?
13. Na contratação de empregados, por exemplo, os patrões dão preferência a
candidatos que saibam se comunicar mais em que línguas?
14. É possível que seja julgado melhor pela(s) língua(s) que fala do que pela
inteligência?
15. Para você o (a) senhor (a) quem fala melhor o idioma? As mulheres ou os
homens? Por quê?
16. No seu trabalho, é preciso escolher um jeito e uma língua diferente para lidar
com cada pessoa? Como? Por quê?
17. Uma pessoa que tem bastante instrução fala melhor que uma pessoa que tem
pouca ou nenhuma instrução escolar?
18. Se você/ o (a) senhor (a) tivesse que escolher entre os diferentes falares na
fronteira, em sua opinião quem fala melhor e por quê?
As respostas a essas perguntas são tratadas, a princípio, individualmente e ao final,
sobre o conjunto se apresenta um comentário único, conforme procedimento tomado em
respostas aos grupos anteriores.

158
Ao constatar que a pluralidade linguística é evidente na fronteira, principalmente no
comércio, fez-se necessário saber, então, que idioma ou idiomas dariam conta da interação
comercial e profissional na fronteira. Para tanto, perguntou-se:

Pergunta 12. Que língua(s) deve(m) ser mais usada(s) para se ter sucesso na
fronteira? Por quê?
Em Foz do Iguaçu, os idiomas que devem ser falados na fronteira, segundo os
informantes, são o inglês e o espanhol devido ao grande fluxo de turistas de todos os países.
Os informantes FI/1 e FI/3 destacam o inglês e espanhol porque são, no seu entender,
as mais faladas pelas pessoas que visitam a fronteira. O informante FI/1 dá ênfase ao “falar
bem” o idioma, porque em Foz do Iguaçu, as pessoas estão habituadas a falar algumas
expressões em diversos idiomas. Porém se for para estabelecer uma interlocução mais
demorada, não há sequência, justamente por que não há o domínio da língua que permita
fluência na comunicação. Ele faz considerações ao português, dizendo que também deve ser
valorizado.
O que se pode inferir, desse depoimento, sobre a valorização do português é que as
pessoas, de outros países que frequentam a fronteira, necessitam falar um pouco do português
para interagir com o habitante de Foz do Iguaçu. O informante FI/1 afirma que os habitantes
de Foz do Iguaçu devem aprender inglês e espanhol também, principalmente, para quem
trabalha com o turismo, conforme trecho retirado da entrevista:

FI/1 – Eu acho que não aqui só na fronteira, mas no mundo inteiro inglês, né? Inglês e
espanhol, eu acho que tem que ser bem falado, mas a gente tem que valorizar o nosso
idioma também, certo? Mas, a gente tem que ter conhecimento do inglês e espanhol,
principalmente, gente que trabalha na área de turismo.

A informante FI/2 faz referência ao “brasileiro”, inglês, espanhol e aponta para o


árabe, que, segundo ela, também é muito utilizado em Foz do Iguaçu, mas considera muito
difícil. A informante deixa subentendido que essas seriam as línguas que deveriam ser usadas
para se ter sucesso na fronteira porque são línguas faladas pelos habitantes do local:

FI/2 – Olha o brasileiro, inglês e espanhol. [...] Por que é como fala as pessoas que
mais convive aqui, o árabe agora tem bastante, né? E é bem difícil.

A informante FI/4 cita o árabe, o espanhol e o inglês como fundamentais, porém se

159
fosse para escolher um idioma para falar, escolheria o francês. Percebe-se na resposta dela a
afetividade pelo idioma francês, ela faz referência ao que os outros devem falar e se exclui do
grande grupo ao fazer sua escolha. Esse fato é resultado da ausência de contato linguístico
dela com os turistas e demais pessoas que ali labutam. A informante trabalha num recinto
fechado (a cozinha do hotel), então, FI/4 vê na escolha da língua uma satisfação pessoal e não
uma necessidade social, de acordo com o seu relato:

FI/4 – Se for seguir a sociedade eu acho que a árabe, né? [...] O espanhol. [...]. E o
inglês, o inglês é fundamental, mas o que eu gostaria de falar é o francês eu acho,
outro idioma não.

O informante FI/5 também considera o inglês e o espanhol necessários, porém afirma


que, se a pessoa com mais de trinta e cinco anos não fala inglês, ela vai tentar falar em
espanhol. Esse dado apontado pelo informante documenta a diferença que separa as gerações,
pois, segundo ele, as pessoas da segunda geração não se dispõem a falar outro idioma que não
seja o que elas dominem. Por isso, o interlocutor deve se adequar à fala do estrangeiro, isto é,
o morador local necessita conhecer mais de um idioma para interagir nessas situações em que
o estrangeiro não domine o inglês, língua considerada hegemônica, ligada ao turismo e às
grandes transações comerciais e políticas. FI/5 aponta o mandarim e o francês como as
línguas também faladas na Tríplice Fronteira:

FI/5 – Apesar de ser fronteira, é cidade turística, né? Do mundo. Inglês e espanhol.
Óbvio, né? Mas eu vejo hoje que eles falam mandarim, né? Mandarim e francês. [...]
Se o cara já passou de trinta e cinco ou quarenta anos ele não fala inglês, talvez ele
possa até arriscá espanhol, mas inglês ele não fala [...] não adianta tentá conversá
inglês com eles que eles não conversam, eles não sabem, né?

Percebe-se, na afirmação de FI/5, que a faixa etária é vista como um fator negativo na
aprendizagem de línguas. Sabadin (2006, p.152) reforça o que Dulay e Burt (1977) falaram,
quanto mais cedo a pessoa “tiver contato com a língua estrangeira, melhor será seu
aprendizado relacionado à pronúncia, podendo, entretanto, variar muito conforme a pessoa” e
o ambiente linguístico em que estiver exposta, porém não significa que exista uma faixa etária
ideal para o aprendizado de outro idioma. Sabe-se que o fator faixa etária impõe alguns
limites, mas não impede a aprendizagem e o conhecimento linguístico.
A informante FI/6 destaca o espanhol como a língua falada para se ter sucesso na
fronteira, pois ela tem a crença de que ninguém aprende português para vir para o Brasil, já
160
que o Brasil está localizado entre dois países falantes do espanhol:

FI/6 – Espanhol. [...] Por causa da... exatamente, da fronteira, a gente tem Argentina, e
Paraguai, né? E boa parte das pessoas que vêm pra cá, já vêm com o idioma, o
espanhol. Ninguém aprende português pra vir pro Brasil, eles aprendem espanhol.

Para o informante FI/7, não existe idioma certo para se ter sucesso na fronteira e, no
seu entender, tudo depende das circunstâncias. Comenta que, se tivesse de eleger um idioma,
isso implicaria admitir “o certo” e “o errado” na língua, mas se tivesse mesmo que escolher,
sua opção seria o espanhol, porque são duas as cidades em que os habitantes são falantes
nativos do espanhol, contra uma, cujos habitantes falam português:

FI/7 – Vai dependê, da realidade do momento, não dá prá dizê que língua que é, se eu
dissesse isso era a mesma coisa que dizê que nós temos qui... Um determinado padrão
de língua, prá estabelecê um padrão no Brasil, como aquele é o correto, como não tem
o correto, ali também não vai tê o correto [...] Então, não tem uma língua específica,
ali na fronteira não tem, eu diria que o interessante seria o espanhol, porque eu tenho
dois países de língua espanhola, e um país de língua portuguesa [...].

Para a informante FI/8, a língua a ser utilizada deve ser o espanhol, primeiro pela
localização e segundo por considerar o português difícil. De acordo com a informante, os
brasileiros encontram dificuldades em se comunicar dentro do Brasil, e também ao se
dirigirem a outras regiões, tendo em vista a variação linguística:

FI/8 – [...] acredito que seja o espanhol. [...] Português já é considerado uma língua
mais difícil de assimilação pelas várias... né? Variantes que nóis temos, e o guarani,
que é até pouco usado pelo próprio Paraguai, que se utiliza muito mais do espanhol,
né? Então... Acho que, acredito, embora eu não fale, mais eu acho que é mais fácil a
língua espanhola de ser entendida do que o próprio português. [...] por exemplo, os, os
gaúchos, eles falam, rancho, eles falam, vou fazê o rancho. [...] pra mim era uma casa
simples, não tinha a menor ideia que rancho significava ir ao mercado. Se dentro do
nosso país, nós já temos essa dificuldade, então o português pra eles seria uma
dificuldade bem maior[...].

Percebe-se a crença de que o português é uma língua difícil de ser aprendida porque
apresenta regionalismos. Sobre essa questão, Bagno (1999, p.13) comenta que a frase “o
português é muito difícil”, repetida em todo país, é “uma grande bobagem”, por não ter
sustentação científica. Tal fato deriva dos equívocos historicamente criados entre língua viva e
concreta e as regras gramaticais. Destaca-se ainda que os regionalismos não são exclusivos do

161
português, pois toda língua viva sofre variação, mudança e apresenta peculiaridades dialetais.
Ao conversar com os informantes de Ciudad del Este, não houve unanimidade na
escolha do idioma, isso resulta do fato de a cidade ser povoada por várias etnias, grande fluxo
de turistas e isso dificultou a escolha do idioma. Os informantes apontam o inglês, o
português, o espanhol e o chinês, conforme se pode observar na transcrição dos excertos das
entrevistas com os informantes.
Os informantes CL/1 e CL/2 destacam o inglês como idioma mais importante, porém o
informante CL/1 faz referência ao português como uma das línguas a serem faladas para ter
sucesso na fronteira:

CL/1 – É, na verdade o português e o inglês, né? [...] (Risos) E porque... é porque,


porque já falei pra você que aqui têm muitos fregueses e pra o mundo também o inglês
que é muito importante, né?

Para a informante CL/4, a língua selecionada deve ser o chinês porque a cidade conta
com uma população de chineses bem significativa. A escolha linguística destacada perpassa a
crença de que o português falado pelos chineses, na fronteira, não é adequado por ser mal
falado:

CL/4 – Aqui na cidade é chinês. [...] Porque tem mais chinês que árabe, paraguaio, que
brasilero e o chinês a comunicação do chinês é português, um português mal falado,
porque não é correto, né?

O informante CL/5 destaca o inglês como língua universal e o espanhol porque são
línguas utilizadas por outros países de acordo com as estatísticas. Conforme a escolaridade,
acredita-se na necessidade de aprender mais de um idioma, nas regiões em que é frequente a
presença de turistas de outros países. Não há preocupação momentânea de atender somente os
habitantes da fronteira, optando pelo português ou espanhol, e sim, de aprender mais de um
idioma para acolher a todos que ali se fizerem presentes, independentemente da
nacionalidade:

CL/5 – Com certeza o inglês, o inglês e o espanhol. [...] estatisticamente são as língua
mais utilizada, eu acho falada e também na Europa, por exemplo, que tem a Espanha
um país muito importante que fala o espanhol e o inglês, o inglês que é universal, cê
fala em todos os país, eu acho que eles estuda o inglês o...uma língua que você tem
que saber pelo menos o básico...

162
A informante CL/6 destaca o português e o informante CL/7 faz referência ao
português e espanhol:

CL/7 – Não tem, não tem uma predileção certa, mas se você aqui não fala português e
espanhol você fica fora.

A informante CL/8 diz que a língua a ser usada deve ser o espanhol, em virtude de
estar se inserindo no mundo dos negócios e para ter sucesso na fronteira.
Ao analisar as respostas dos informantes de Puerto Iguazú, observa-se que houve
unanimidade ao apontar o inglês como língua que deve ser usada para se ter sucesso na
fronteira, porém alguns informantes destacaram, em segundo plano, o português seguido do
espanhol.
Para o informante PI/1, o inglês deve ser a língua mais usada, tendo em vista o
constante fluxo de turistas estrangeiros, portanto os trabalhadores e profissionais do local
também deveriam ser proficientes em inglês. Segundo PI/1, o movimento de brasileiros na
cidade é bem significativo, por isso aponta o português como uma das línguas que devem ser
faladas em Puerto Iguazú:

PI/1 – Eu acharia que primeiro lugar o inglês. [...] Pelo turismo, só pelo turismo, pero,
em segundo lugar o português. Português e inglês seria pra mim os dois idioma. [...]
Então se você sabe inglês, consegue mais trabalho aqui na fronteira, trabalho no hotel,
restaurante, guia de turismo, tudo essas coisa, por isso eu to falando inglês, não é
porque eu gosto do idioma inglês, é o que é fundamental ter o inglês e o português.
Português porque tem muito turismo brasileiro também aqui [...]

As informantes PI/2, PI/4, PI/6 e PI/8 afirmam que o inglês deve ser falado na
fronteira e também referendam o intenso fluxo de turistas estrangeiros. Os informantes PI/3 e
PI/5 destacam o português, justificando que os brasileiros são os que mais frequentam a
cidade e afirmam que até o turista estrangeiro aprendeu a falar algumas palavras em
português. Tal afirmação perpassa a crença de que, se os estrangeiros falam português, os
habitantes de Puerto Iguazú têm quase que o dever de falar o idioma também:

PI/3 – Português. [...] Son los que más turista hay, lo que más se habla, português, o
mesmo estrangero que... Que está vivendo a lá, aquí a las zona de catarata ele vem por,
por Brasil, por Rio e ya está, estan pegando pequeñas palavras para falar en português
(risos).

163
Para o informante PI/7, as línguas que deveriam ser utilizadas são o inglês, o
português e o espanhol, por considerá-las línguas de prestígio social e por utilizá-las em seu
trabalho. Novamente, percebe-se a crença na necessidade de aprender mais de um idioma para
ter sucesso profissional:

PI/7 – Deveriam ser faladas as línguas mais universais, eu acho que deve-se falá
espanhol, português, inglês [...].

Na resposta dos vinte e quatro informantes das três localidades, constata-se que as
atitudes de aceitação de uma língua e rejeição a uma delas andam lado a lado; geralmente
impostas pelo “falar correto”. Percebe-se, por meio das respostas analisadas, que há
necessidade de estudar outro idioma para formalizar a aquisição linguística oriunda das ruas e
do contato linguístico com os turistas. Assim, com uma pronúncia e compreensão mais
apurada do inglês, do espanhol e do português, o falante se sente mais prestigiado perante os
outros, pela crença de que uma língua pode ser mais importante ou ter maior destaque social
do que outra, pelo grupo que a utiliza.
A língua inglesa foi considerada a língua que deve ser usada para o falante ter sucesso
na fronteira, seguida do espanhol, do português e demais línguas, conforme visto na questão
anterior.
Observa-se que, onde convivem diferentes grupos culturais e sociolinguísticos, as
pessoas adotam atitudes que revelam suas crenças relacionadas ao prestígio de determinado
idioma, de acordo com suas escolhas linguísticas. As diferenças linguísticas, reinantes entre
todos, direcionam à adoção de atitudes também diferentes. Na seleção de uma língua que deve
ser mais usada para ter sucesso na fronteira, instaura-se o preconceito linguístico que reflete
relações de poder. Há que se pesar que as peculiaridades linguísticas e culturais de cada grupo
oferecem oportunidades para adoção de atitudes também divergentes.
Ao perguntar aos informantes a respeito das línguas mais faladas na fronteira eles
enumeraram o português, seguido pelo espanhol, porém, ao afirmarem a respeito da língua a
ser falada para ter sucesso na fronteira, nem o português nem o espanhol foram associados ao
sucesso. Em Puerto Iguazú, o espanhol foi citado por um informante juntamente com outras
línguas, mas não de forma exclusiva, fato esse constatado também em Foz do Iguaçu. Essa
constatação pode revelar a crença de que é o inglês que deve ser ensinado na escola. Desde o
primeiro momento em que o aluno tem contato com o inglês, a professora reproduz o discurso
dos documentos nacionais, que norteiam a educação. Os documentos afirmam que a língua
164
inglesa apresenta prestígio social, poder, é a língua do comércio internacional, da mídia,
dentre outros argumentos para convencer o aluno da necessidade de aprendê-la.
Pode-se dizer que os informantes percebem a força, o prestígio do português e do
espanhol na Tríplice Fronteira, embora o inglês tenha sido destacado por alguns informantes
como o idioma a ser falado para ter sucesso na fronteira. O destaque dado ao inglês finda por
desprestigiar as demais línguas, que são usadas diariamente pelas comunidades. Os idiomas
referendados pelos informantes das três localidades demonstram que as línguas faladas por
eles no dia-a-dia estão distantes de serem eleitas, ao passo que a língua do sucesso, a língua
que abre as portas das grandes transações internacionais, é o inglês.
Dos vinte e quatro informantes, 29% dos informantes se referiram ao inglês, 12% dos
informantes apontam o português, 12,5% dos informantes afirmam ser o espanhol entre outras
línguas citadas. Os dados revelam que a língua inglesa, aos poucos, pode estar perdendo a
supremacia, abrindo espaço para as línguas faladas pelas comunidades locais (português e
espanhol). Pode-se dizer também que, até pouco tempo, o português e o espanhol não eram
prestigiadas socioeconomicamente e agora começam despontar na Tríplice Fronteira, fato esse
intensificado após o acordo linguístico firmado pelos países que fazem parte do MERCOSUL.
Ao analisar o Quadro 19, observa-se que, ao somar as vezes em que o inglês, o
espanhol e o português foram citados juntos a outras línguas pelos informantes e não de forma
isolada, têm-se os seguintes dados 62,5% inglês, 41,66% espanhol e 33,33% português.
Constata-se que o inglês é considerado a língua para alcançar sucesso na Tríplice Fronteira,
seguida pelo espanhol e pelo português.

Quadro 19 – As línguas usadas para se ter sucesso na Tríplice Fronteira

Cidades
Foz do Iguaçu Ciudad del Este Puerto Iguazú Total
Línguas
___
Espanhol 02 01 03

Inglês 01 02 04 07
___
Português 01 02 03
___ ___
Chinês 01 01
___
Português e inglês 01 01 02
___
Inglês e espanhol 03 01 04
___ ___
Português e Espanhol 01 01
___
Português, inglês e espanhol 01 01 02
___ ___
Mandarim e Francês 01 01

165
Com a pergunta 13, pretende-se saber qual é a preferência linguística dos patrões na
contratação de empregados. Esta pergunta pode confirmar ou não se os patrões também
preferem empregados que saibam falar inglês.

Pergunta 13. Na contratação de empregados, por exemplo, os patrões dão


preferência a candidatos que saibam se comunicar mais em que línguas?
As respostas a essa pergunta podem confirmar o que foi dito anteriormente, isto é, se a
língua que os informantes elegeram para ter sucesso na fronteira é a mesma que os patrões
dão preferência na contratação de empregados.
Em Foz do Iguaçu, 75% dos informantes FI/2, FI/3, FI/5, FI/6, FI/7 e FI/8 disseram ser
o espanhol e o inglês. O informante FI/1 afirma ser o inglês a língua a que os patrões dão
preferência na contratação de empregados:

FI/2 – Que tem inglês e espanhol.

FI/3 – Aqui, principalmente o espanhol e o inglês.

FI/5 – Básico, né? Que é inglês e espanhol.

FI/6 – Espanhol e inglês, além do português é lógico.

FI/7 – É claro, evidente, você domina o espanhol, eu domino uma língua inglesa,
porque nós temos muito estrangeiros da Europa, né? Da América do Norte [...].

FI/8 – Ah, não tenho dúvida, aqui principalmente em Foz, você tem que pelo menos
saber o espanhol, né? Um pouquinho de inglês vai ajudar muito mais do que uma
pessoa que só sabe um pouco do português, né?

Os informantes acreditam que é a língua do outro que deve ser falada, isto é, o
espanhol, a língua oficial dos países vizinhos. Há uma atitude positiva de respeito e
cooperação em receber o estrangeiro. Observa-se, de acordo com os depoimentos, que não há
a crença de que é o estrangeiro que deva se adaptar ao português.
No entanto a informante FI/4 enumera uma série de línguas que deveriam ser faladas
pelos empregados, dentre elas, também o inglês e o espanhol, e declara que não tem muito
contato com os turistas, porém que todos deveriam saber pelo menos o básico de cada idioma:

FI/4 – Inglês, depois espanhol, alemão, né? Italiano [...] é totalmente importante desde
o mensageiro. [...] Por exemplo, e... é o alemão num sabe se fala, fala japonês, uma
166
chinesa, eles não sabem já a recepcionista sabe, né? Mas o certo é que todo mundo
tivesse um básico, né? Pra uma empresa mesmo teria que... todo mundo sabê e ter
contato, né? Mas no nosso caso é cozinha, num tem muito contato, mas quem tem
contato por menor que seja tinha que fazer pelo menos um básico [...].

Em Ciudad del Este, 50% dos informantes CL/1, CL/4, CL/5 e CL/7 afirmam que os
patrões dão preferência a falantes do português. A informante CL/4 cita o inglês, porém
conclui que é o português. O informante CL/7 faz referência a todos os idiomas que o
contratado deve falar de acordo com o idioma do patrão para poder interagir, porém chega à
conclusão de que os patrões dão preferência aos falantes do português, porque os grandes
fregueses são brasileiros:

CL/4 – Maior preferência prá quem fala inglêis, né? Que tem um bom salário, mais
como tem aqui cheio de brasilero comprando, é português.

CL/5 – Aqui na Cidade do Leste é muito importante falar em portuguêis, se a pessoa


sabe falar, tem um portuguêis fluido é uma vantagem muito grande, porque é uma
língua muito necessária aqui, é indispensável.

CL/7 – [...] quem contrata, a gente, todo mundo fala um poco de tudo, então não és
muito difícil de você entendê ou falá. Má tem uma coisa assim prá você trabalhá no
comércio aqui, você tem que falar portuguêis, o patrão vai exigi que você fale
portuguêis, a razão é que a gente que vem comprá aqui a maioria é brasilero [...].

Dois informantes CL/2 e CL/6 fazem referência aos três idiomas, português, inglês e
espanhol; para o informante CL/3, no entanto, os idiomas são português, espanhol e guarani e
a informante CL/8 cita o espanhol como a língua preferida pelos patrões na contratação de
funcionários.
Nas respostas dos informantes de Ciudad del Este, também se verifica a crença
estabelecida em saber o idioma do outro para melhor recebê-lo, a atitude positiva dos
informantes frente à língua portuguesa.
Em Puerto Iguazú, 37,5% dos informantes PI/1, PI/5 e PI/7 fazem referência ao
português e inglês como as línguas preferidas pelos patrões na contratação dos empregados.
Tendo em vista o contexto em que se encontram, e após acordo assinado pelos países do
MERCOSUL, essas línguas são ainda mais exigidas:

PI/1 – Bom, aqui é portuguêis e inglêis [...] portuguêis é o básico, portuguêis que todo
mundo sabe falá [...] e inglêis, para consegui um bom trabalho [...].

167
PI/5 – Em português, tem sabê o primero requisito português [...] o comércio sim, o
turismo inglês [...].

PI/7 – [...] nóis temo o MERCOSUL, mais ainda não temo muito, muita prática, de
utilizar empregado da internacionalidade [...] a maioria das empresas estão procurando
hoje, pessoas que falem inglês, fale portuguêis, é fundamentalmente esses dois
idiomas [...].

As informantes PI/2 e PI/8 citam o inglês; os informantes PI/3 e PI/6 fazem referência
ao português e a informante PI/4 afirma ser o inglês e o castelhano as línguas preferidas pelos
patrões na contratação de empregados.
Constata-se nas respostas que 25% dos informantes afirmam que as línguas preferidas
pelos patrões na contratação de empregados na Tríplice Fronteira é o português.
Ao somar todas as vezes que o português, o inglês e o espanhol/castelhano
(considerados pela pesquisadora como a mesma língua) foram citados pelos vinte e quatro
informantes, têm-se o seguinte resultado: 50% dos patrões dão preferência aos empregados
que saibam falar português, 45,83% dão preferência aos falantes de espanhol e 41,66%
acreditam que os patrões dão preferência, na contratação dos empregados, aos candidatos que
saibam falar inglês.
Esses dados revelam que a maioria dos informantes apresenta atitude positiva em
relação ao português seguida pelo espanhol e inglês. Para ter sucesso na fronteira é preciso
dominar o inglês, conforme registro dos dados do Quadro 19, porém a língua a que os patrões
dão preferência na contratação de empregados é o português, como se mostra no Quadro 20.

Quadro 20 – A língua utilizada na contratação de empregados

Cidades Foz do Iguaçu Ciudad del Este Puerto Iguazú Total

Línguas
___ ___
Espanhol 01 01
___
Inglês 01 02 03
___
Português 04 02 06
___ ___
Português e inglês 03 03
___ ___
Inglês e espanhol 06 06
___ ___
Inglês e Castelhano 01 01
___ ___
Guarani 01 01
___
Português, inglês e espanhol 01 02 03

168
De acordo com os informantes, o português é a língua da preferida dos patrões na
contratação dos empregados, seguida pelas demais línguas, incluindo o guarani, que antes não
havia sido citado. Conforme referido anteriormente, os informantes têm a crença da
preferência do idioma associado à hegemonia, ao poder. O inglês representa status social,
prestígio, sucesso, porém, quando o assunto é trabalho, essa crença por parte dos informantes
abre espaço à atitude linguística carregada de significado, isto é, o brasileiro é maior
consumidor nas três fronteiras, logo os informantes mostram atitude positiva para com o
português.
Os informantes têm no trabalho, a sobrevivência, a oportunidade de emprego, e para
tanto destacam as línguas faladas no dia-a-dia. Os turistas americanos e europeus, entre
outros, movimentam a região, mas o forte ainda é o comércio. Portanto, na escolha linguística
para a contratação de empregados, nota-se que a pluralidade linguística ainda é muito forte,
considerando-se esses dois fatores – comércio e turismo.

Pergunta 14. É possível que seja julgado melhor pela(s) língua(s) que fala do que
pela inteligência?
A complexidade das relações sociais e culturais em territórios registrados pela
presença de várias etnias e nacionalidades é marcada pela língua, que se torna um fator que
demarca atitudes positivas e negativas de acordo com a língua falada pelo seu usuário. Com
essa pergunta, busca-se saber se, diante da diversidade linguística constatada, é possível ser
julgado melhor pela(s) língua(s) que fala do que pela inteligência.
Em Foz do Iguaçu, 75% dos informantes não consideram a hipótese de ser julgado
melhor pelas línguas que fala do que pela inteligência, enquanto 25% consideram possível ser
julgado melhor pelas línguas que falam por terem presenciado tal fato. Para o informante,
FI/1, a pessoa inteligente vai aprender outros idiomas, apesar de ele não afirmar, subentende-
se que a inteligência desperta o interesse pelo conhecimento de outro idioma:

FI/1 – Eu acho que a pessoa inteligente ela vai aprendê falá otros idiomas também, né?
Então é, a pessoa tem que ser inteligente, mas ela vai entendê, mas se ela fala outro
idioma isso vai ser bastante útil eu penso assim.

Os informantes FI/2, FI/4, FI/6, FI/7 e FI/8 afirmam que falar outro idioma nem
sempre é sinal de inteligência, pode estar associado ao conhecimento, ao interesse pessoal, e

169
que, não é por não dominar outros idiomas que uma pessoa é denominada como desprovida
de inteligência, conforme excertos das entrevistas destacados:

FI/4 – [...] se você aprende três ou quatro idiomas você vai falar, não quer dizer que
você seja inteligente [...], você aprendeu aquilo, né? Mais é óbvio que não pode
comparar... você... porque você foi, se... se instruiu mais [...].

FI/7 – Ah, eu não creio, não creio, o cara pode ter lá facilidade prá aprendê línguas e
sê um poliglota e de repente, ele não ter facilidade prá mais nada [...].

FI/8 – Graças a Deus não, porque eu só falo português [...]. Isso é questão de
conhecimento, de estudo que, eu acredito que qualquer pessoa que seja disposta, ela
consegue aprender [...].

Os informantes FI/3 e FI/5 consideram possível as pessoas serem julgadas melhor


pelas línguas que falam por presenciar situações em que isso ocorre, porém eles não
concordam com tal julgamento. Segundo esses informantes, o fato de um candidato falar
outros idiomas pode ajudar a conseguir emprego, mas não significa inteligência:

FI/3 – É meio difícil porque, [...] quando as pessoas falam vários idiomas, eles têm
mais facilidade de conseguir emprego, mas isso não significa que a pessoa seja
inteligente porque aprendeu várias línguas [...]. As pessoas dão mais importância as
pessoas que falam vários idioma do que a pessoa que seja inteligente.

FI/5 – É possível que a gente vê [...]. Não é porque ele sabe falá otra língua que ele
seje inteligente[...] A pessoa foi contratada pela língua, mas a inteligência não
coincidiu [...].

Em Ciudad del Este, 62,5% dos informantes consideram que uma pessoa pode, sim,
ser julgada melhor pelas línguas que fala do que pela inteligência, enquanto 37,5% não
consideram o fato de ser julgado pelo idioma do que pela inteligência. Os informantes CL/2,
CL/4, CL/5, CL/6 e CL/8 afirmam que os empregadores valorizam mais pessoas que falam
mais de um idioma, antes de verificar sua inteligência, fato presenciado e que às vezes causa
transtornos:

CL/4 – Aqui preferem pessoa que fala mais de uma língua, porque falá mais de uma
língua tem abertura de ser inteligente, porque se você fala mais de duas língua é mais
fácil aprendê qualquer otra coisa, porque a língua é o que faz, abertura da mente [...].

CL/5 – Ih! Sei lá, teve uma vez, que pegaram uma recepcionista porque ela falava tão
bem, mas tão bem o portuguêis, e depois despediram ela porque ela era muito assim,
170
com um QI muito baixo de grado [...].

CL/8 – Sí, quem habla mais língua é mais inteligente, claro que si.

Os informantes CL/1, CL/3 e CL/7 acreditam que não, conforme recorte da entrevista
destacado:

CL/7 – Acho que não, se a gente é inteligente vai falá tudo a língua que tem, não vai tê
problema, o julgamento vai fica prá nada.

Em Puerto Iguazú, 50% dos informantes consideram possível ser julgado melhor pelas
línguas que fala, 37,5% acreditam que não, pois segundo eles, a língua, o conhecimento de
outros idiomas é produto do intelecto. Uma informante, representando 12,5%, fez uma série
de considerações e não deixou evidente se é possível ser julgado melhor pelas línguas que fala
do que pelo idioma.
Os informantes PI/2, PI/3, PI/4 e PI/5 afirmam ser possível serem julgados melhor
pelas línguas que falam, principalmente no trabalho, e que há pessoas com habilidade apenas
para línguas, conforme se observa nos excertos:

PI/2 – Pode e muito. [...] nós quando fazemos uma entrevista pra trabalho é assim.
Você pode saber demais, mas se você no sabe inglês, no sabe computação cê não
trabalha.

PI/3 – É posible, es posible. […] Hay pessoas que são inteligentes para aprender las
lengua, pero não são inteligentes en otras cosas […].

PI/4 – Sí, lamentavelmente si.

PI/5 – Sempre julga mais por la língua aqui, sempre [...].

Os informantes PI/1, PI/6 e PI/7 creem de que, as pessoas são julgadas melhor pela
inteligência, pois se a pessoa tem inteligência consegue trabalho, tem facilidade em aprender
idiomas e a língua está ligada à inteligência das pessoas, de acordo com os trechos das
entrevistas:

PI/1 – [...] pela inteligência, porque se o cara não é inteligente, a moça não é
inteligente, não vai trabalhá só porque sabe inglêis e portuguêis[...].

PI/6 – Não, eu acho que pela inteligência, porque se você é inteligente você pode

171
chegá a compreendê rápido o idioma. Eu acho que se você ver que tem facilidade de
aprendê [...].

PI/7 – Nó, eu acho que nó, eu acho que a língua, a fala da língua, é um produto da
capacidade intelectual, a expressão linguística, é uma, uma referência da capacidade
da inteligência das pessoas.

Para a informante PI/8, dependendo da função que a pessoa vai assumir, o


conhecimento de outros idiomas é fundamental:

PI/8 – Logicamente tendrerá que ver que función vai assumir esta persona, se vá ir a
trabalhar por exemplo, na recepción de um hotel, o ser numa parte turística de um que
tiene que acompanhar a um grupo de turistas ou recepcionar-los no aeropuerto,
logicamente, el idioma és fundamental [...]

Ao analisar as três comunidades de fala para saber se é possível alguém ser julgado
melhor pelas línguas que fala do que pela inteligência, observa-se que, em Foz do Iguaçu,
75% dos informantes afirmam que as pessoas são julgadas melhor pela inteligência e 25%
dos informantes dizem pelas línguas que falam. Segundo eles, é por meio da inteligência que
mostram seu conhecimento, suas habilidades e atitudes para aprender novos idiomas.
A questão linguística em Ciudad del Este e Puerto Iguazú é bem evidente, pois,
novamente o comércio e o turismo ditam as normas na Tríplice Fronteira. 62,5% dos
informantes em Ciudad del Este e 50% dos informantes de Puerto Iguazú acreditam que, se as
pessoas têm habilidade para falar diferentes idiomas, as oportunidades de trabalho são
maiores. 37,% dos informantes de Ciudad del Este e 37,5% dos informantes de Puerto Iguazú
referem-se à inteligência e associam-na à capacidade de falar outros idiomas. 12,5% dos
informantes de Puerto Iguazú não souberam responder.
As crenças dos informantes a respeito de ser julgado melhor pela língua que fala do
que pela inteligência revelam como as relações sociais são entendidas, principalmente no que
se refere ao comércio, ao turismo e à rede hoteleira na Tríplice Fronteira. Esses setores
definem o que os trabalhadores façam ou digam em determinadas situações, pois acabam por
fazer os trabalhadores acreditarem que as pessoas são julgadas melhor pelas línguas que
falam. Essa constatação decorre do fato de a maioria dos informantes aceitar passivamente as
normas estabelecidas culturalmente, sem refletir sobre as atitudes linguísticas das pessoas em
determinadas situações, pois não basta saber vários idiomas, é preciso inteligência para pô-los
em prática. Por conseguinte, falar mais de um idioma é regra estabelecida socialmente para

172
conseguir trabalho nas três fronteiras.
As pessoas são julgadas pela forma de se comportar, maneira de se vestir, forma de
falar, classe social a que pertencem, religião que professam, línguas que falam, inteligência,
etnia, opção sexual e profissão. Para emitir um julgamento, primeiro é preciso compreender,
apreender o significado do que se quer julgar, para então julgar. Essa seria uma forma sensata
de emitir julgamento.
Observa-se que, muitas vezes, as pessoas são julgadas injustamente, isto é, julgadas
pelo preconceito, pela intolerância, pelo estereótipo e pelos rótulos que a própria sociedade
estabelece. A capacidade de compreender o outro é um ato de inteligência e a apreensão do
significado está ligada ao intelecto, logo, ter a capacidade de falar outras línguas está
conectada à inteligência. Para fundamentar essa afirmação, busca-se, em GARDNER (1995,
p.14), a compreensão de inteligência, que é “a capacidade para resolver problemas ou elaborar
produtos que sejam valorizados em um ou mais ambientes culturais ou comunitários”.
Gardner considera a inteligência como possuidora de vários talentos, capacidades e
habilidades mentais.
Considera-se, também, a referência que dois informantes fazem à adequação das
línguas às diferentes funções, que são moldadas de acordo com a realidade do sujeito.
Portanto, a inserção do indivíduo em uma situação, submete-o a julgamentos não apenas por
falar mais de uma língua, mas também pela maneira como ele se porta diante das situações
que exigem um grau de conhecimento mais elevado (a inteligência).
Na Tríplice Fronteira, o indivíduo tem contato com diversos idiomas e, a partir de
então, compreende a importância de utilizá-los adequadamente, conforme a situação,
contexto, ambiente em que estiver inserido, não apenas para se comunicar e expressar-se com
clareza, mas para maior integração situacional. É interessante esclarecer que, de acordo com o
contexto social em que estiver inserido, principalmente no que diz respeito ao trabalho, são
exigidas atitudes inteligentes para estabelecer conexões com clientes, colegas e superiores
ligados ao ambiente de trabalho. Para que o sujeito consiga se estabelecer no mercado de
trabalho, isto é, um emprego em um estabelecimento comercial dos mais diferentes ramos,
faz-se necessário que possua conhecimento linguístico de mais de um idioma.
O Gráfico 7 traz um resumo das respostas dos informantes das três cidades a respeito
de o indivíduo ser julgado melhor pelas línguas que fala do que pela inteligência.

173
Gráfico 7 – É possível ser julgado melhor pelas línguas que fala do que pela inteligência?

80% 75%
62,5%
60% 50% Pelas línguas
37,5% 37,5%
40% Pela
25% inteligência
20% 12,5% Indefinido
0% 0%
0%
Foz do Iguaçu Ciudad del Puerto Iguazú
Este

Pergunta 15. Para você o (a) senhor (a) quem fala melhor o idioma? As mulheres
ou os homens? Por quê?
Com essa pergunta, busca-se saber quais são as crenças e atitudes linguísticas das três
comunidades de fala, relacionada a quem fala melhor, se a mulher ou o homem.
Na comunidade de Foz do Iguaçu, 75% dos informantes consideram que a mulher fala
melhor, é mais cuidadosa, é mais estudiosa. Tal fato revela que a escolaridade se fez bastante
presente nas respostas. Os informantes afirmam que a mulher tem mais tempo para estudar e
12,5% afirmam ser o homem que fala melhor e 12,5% dos informantes não veem diferença.
Ao questionar sobre quem fala melhor o idioma, a mulher ou o homem, em
praticamente todos os casos, a pergunta provocava risos. Mexia de certa forma com o lado
afetivo dos informantes, alguns se contorciam, coçavam a cabeça, olhavam para o lado,
mostravam certa indecisão, cruzavam braços e pernas, ficavam numa postura mais relaxada.
A pequena porcentagem que não soube ou não quis se posicionar mostrou um pouco de
inquietação diante da pergunta. Os informantes FI/1, FI/2, FI/3, FI/4, FI/7 e FI/8 consideram
que a mulher fala melhor, de acordo com os depoimentos:

FI/1 – (Risos) Eu não sei, eu acho que depende da situação, têm pessoas que falam
melhor porque estudou mais ela pode falá melhor qualquer outro idioma [...] as
mulheres, geralmente, falam um pouquinho melhor.

FI/2 – Eu acho que mulher. [...], sabe se expressá melhor.

FI/3 – Olha, eu acho que as mulheres se dedicam mais, eu acho que sim.[...] Se você
for analisá a mulher tem mais tempo de escola do que os home no geral [...].

FI/4 – [...] mulher fala mais, fala melhor [...]. Eu num sei mais, mais delicada [...].

FI/7 – [...] eu penso que a mulher é mais cuidadosa pelo menos, agora dependendo da

174
situação, o homem vai falá melhor, a mulher também dependendo da situação vai se
cuidá mais com a linguagem [...]

FI/8 – [...] acho que a mulher se comunica bem melhor, ela tem mais maneira de se
comunicar [...].

O informante FI/5 afirma que são os homens que falam melhor o idioma, pois eles têm
facilidade em se comunicar, tanto com homens, quanto com mulheres, de acordo com seu
depoimento:

FI/5 – [...] os homens se comunicam melhor. [...]Talvez pela facilidade que o homem
tem de abordá tanto homem quanto mulher [...]

A informante FI/6 não vê diferença, ao considerar que é muito subjetivo e aponta para
as diferenças individuais, como se vê na sua entrevista:

FI/6 – Não vejo diferença, eu acho que isso aí é subjetivo, é uma forma... Cada um
tem uma facilidade diferente de capta e de se comunicá.

Nas respostas obtidas em Ciudad del Este, 87,5% dos informantes afirmam que são as
mulheres que falam melhor o idioma, porque elas têm jeito em lidar com os clientes,
apresentam clareza na fala, são inteligentes, delicadas, charmosas e engraçadas. 12,5% dos
informantes consideram os dois em igualdade de condições:

CL/1 – Aqui por exemplo têm muitas mulheres que fala bom mesmo. [...] É porque é
no momento aqui nos negócios[...].

CL/3 – A mulher fala mais. [...] Eu acho que a mulher é mais rápido de aclará sua
palavra, mas como o homem fala sim muito rápido.

CL/4 – As mulheres. [...]Coloca sotaque, tem jeito... jeito engraçado, né?... Pelo
charme mesmo, né? Mulher...

CL/5 – De repente, eu acho que as mulheres. [...] Porque eu escuto assim, várias
paraguaias, assim... vendedoras, essas coisas, convencendo o cliente [...].

CL/6 – As mulheres eu acho. [...] Não sei, são mais delicadas.

CL/7 – Têm mulheres que falam muito bem e tem homem que fala muito bem também
[...] a gente que geralmente vai falá as melhor coisa as mulheres, a mulher leva... vai
ganhá a batalha porque sempre a mulher tem uma preferência especial.

175
CL/8 – Las mujeres. [...] Las mujeres son mais inteligentes.(Risos)

A informante CL/2 afirma serem os dois, que falar melhor ou pior está ligado à
inteligência e à habilidade linguística de cada um, conforme depoimento:

CL/2 – Ai no sei, ai é eu acho que os dois. [...] Porque cada um aprendeu e ele nasceu
assim, se criou e aprendeu a sua língua, eu acho que os dois dependendo da
inteligência de cada um e do..da praticidade que ele tem com a língua, eu acho que os
dois.

Em Puerto Iguazú, 75% dos informantes afirmam que é a mulher quem fala melhor o
idioma. Destacam o fator escolaridade como marca dessa diferença, consideram que a
mulheres são mais delicadas, se expressam melhor e que os homens são atrapalhados, entre
outras caracterizações que são identificadas nas transcrições. Uma informante, PI/6,
representando 12,5%, afirma que os dois falam bem e também aponta o fator escolaridade
como definidor e outra informante, PI/8, que representa 12,5%, afirma que é o homem quem
fala melhor, porque ele é mais decidido, auto-confiante, a mulher é mais tímida e
perfeccionista.Tais características fazem com que a mulher crie barreiras psicológicas para se
expressar.

PI/1 – Eu acharia que é mais a mulher para mim. [...] a mulher é mais dedicada ao
estudo [...] é muito inteligente, né? Ela aprende mais rápido fala prá mim o inglêis, o
portuguêis, tem mais inteligência que o homem [...].

PI/2 – As mulheres têm mais capacidade que os homem. [...] Por que sim, porque as
mulheres aprendem sempre, sair e aprender [...].

PI/3 – Ah... Acho que las mulheres. [...] A mulher é sempre más delicada, presta más
atención para hablar, para expresarse, para hacerse entender […].

PI/4 – As mulheres. [...] Porque os homens se atrapalham muito. (Risos)

PI/5 – As mulheres, têm homens, mas a mulher fala melhor. [...] Ela pronuncia melhor,
tem mais fonética as mulheres.

PI/7 – Com uma clareza eu acho que a mulher pode falar melhor, mais... [...] acho que,
que por exemplo: a minha filha, se meu filho me disse “papai” eu adoro, mais se
minha filha diz “papai” eu me derreto (risos) (inint.)

A informante PI/6 considera que, desde que haja estudo, os dois falam bem, de acordo
com excerto retirado da entrevista:
176
PI/6 – Eu acho que os dois podem falar bem, mas se tem um bom estudo, um idioma.
Não tenho preferência na mulher e no homem. (Risos) Se estudam falam bem, sim.

Para a informante PI/8, o homem fala melhor o idioma que a mulher porque ele é auto-
confiante, enquanto que a mulher é mais retraída, conforme excerto destacado:

PI/8 – Yo creo que el hombre. Voy analizar de mi ótica. El hombre es más cara dura,
chamamos que se anima más, la mujer, lembro do que me acontece errores o que me
daba vergüenza, de hablar mal e de cometer porque soy un tanto perfeccionista em
vocabulário […] no pela inteligência (inint.) creo que é uma questão de atitud, atitud,
no de inteligência.

O Gráfico 8 apresenta dados em que os informantes das três cidades consideram a fala
feminina de maneira positiva, enumerando uma série de atributos como, escolaridade,
delicadeza, charme, habilidade, clareza, musicalidade.
Dos vinte e quatro informantes, 8,33% dos informantes, FI/5 e PI/8 referem-se à fala
masculina como a melhor, apresentam uma fala machista por associar o falar melhor aos
galanteios masculinos, à forma de conquistar, de conversar e abordar alguém. De um lado,
FI/5, em seu depoimento, percebe-se que só o homem poderia fazer este tipo de abordagem,
enquanto que a mulher, por ser mulher, por este viés, não apresentaria tal facilidade, logo,
para o informante FI/5, o homem se expressa melhor do que a mulher. De outro lado, nota-se
no trecho da entrevista da informante PI/8, também resquícios machistas, pois ela enaltece a
fala masculina, afirma que o homem é mais decidido, ao passo que a mulher necessita de
amparo, por ser mais indecisa, e que a hipercorreção ao falar deixa a mulher numa posição
fragilizada. O Gráfico 8 ilustra que são mulheres que falam melhor o idioma.

Gráfico 8 – As mulheres falam melhor o idioma na Tríplice Fronteira

100% 75% 87,5%


75%
80%
60% Foz do Iguaçu
40% Puerto Iguazú
12,5% 12,5% Ciudad del Este
20% 12,5% 12,5% 12,5%

0%
Mulheres Homens Os dois Não vê
diferença

177
Esse ponto marcado pelos informantes, de que a mulher está numa posição mais
fragilizada, faz retomar a cultura nacional, que sempre espanhol priorizou as diferenças entre
homens e mulheres em nome do resguardo da identidade feminina. Por exemplo, um
palavrão, um xingamento, uma atitude mais decidida, sempre foram aceitáveis vindos de um
homem, do que partindo de uma mulher. O comportamento linguístico das mulheres sempre
foi muito vigiado pela educação tradicional e depois pelas próprias mulheres, com vistas a
preservar a diferença comportamental e linguística. A educação tradicional, que repreendeu
muitas mulheres, deixou marcas que até hoje se manifestam nas vozes femininas,
principalmente no que diz respeito às três fronteiras, onde há mistura dos idiomas.
A informante PI/8 fala tranquilamente que se sente envergonhada de se auto-corrigir,
deixa perceptível o pudor vitalício que impera em sua fala, que desde a infância se fez
presente. A escola da época, segundo a informante, representa mais um elemento castrador da
identidade, dizia que não podia falar nem português nem castelhano que deveria falar. Assim,
na Tríplice Fronteira, intensificam-se as experiências e os contatos linguísticos e, nessa
mistura, para a informante, o homem é que fala melhor o idioma por ser mais auto-confiante e
ter mais atitude.
Tanto a segurança quanto a insegurança linguística podem ter suas consequências. No
caso da insegurança, conforme visto anteriormente, leva à hipercorreção, o que faz com que
as pessoas normalmente passem por situações constrangedoras perante os outros. Em alguns
casos, o excesso de segurança linguística pode levar ao pedantismo linguístico, revelador de
preconceitos linguísticos, relacionado às pessoas desprovidas do domínio da variedade padrão
e seu uso. Não basta dominar as regras gramaticais, há necessidade de saber estabelecer as
devidas conexões entre as regras, a fala e o contexto. Os trechos retirados das respostas de
alguns informantes ilustram o que se vem descrever:

FI/8 – O nosso português? O nosso português é difícil de ser falado por qualquer um,
tanto falando em questão de norma, né? A gramática normativa, agora de se
comunicar, acho que a mulher se comunica bem melhor [...]

CL/7 – [...] a qualidade depende da gente, do jeito de falá, a gente que geralmente vai
falá as melhor coisa as mulheres, a mulher leva... vai ganhá a batalha porque sempre a
mulher tem uma preferência especial.

PI/8 – [...] siempre me gusto que me hijos hablen bem, que no se coma ou consiga
sacar las eses finales cuando me corresponde com ela, percebe por ejemplo, Paraguai
adolece su idioma, que la gente tem um grave problema com las eses finales, pone
onde não debe e saca la que tiene que poner, exatamente e a mi me choca
178
terriblemente, que quando escuto soy como le me (inint.) Entonces sempre ensisti a mi
hijos que hablen bien, que pronuncien las letras bien. Entonces porque soy mui
exigente, por isso que sou mais vergonhosa e por isso que devo ser mais cometida,
meu marido que é mais cara dura [...].

Portanto, a escolha linguística de quem fala melhor, se o homem ou a mulher, tem por
base atitudes sociais, veiculadas pela mídia. Algumas vezes, julga-se o falante e não a fala,
como se depreende das respostas dos informantes, considerando a inserção social dos homens
e mulheres no mercado de trabalho da Tríplice Fronteira.

Pergunta 16. No seu trabalho, é preciso escolher um jeito e uma língua diferente
para lidar com cada pessoa? Como? Por quê?
Com essa pergunta, busca-se saber se nas requeridas situações de interação, definidas
como apropriadas para o trabalho, é preciso escolher um jeito e uma língua diferente para
lidar com cada pessoa, em função da formalidade da situação e do assunto a ser tratado entre
os interlocutores. As respostas a essa pergunta podem revelar atitudes de hierarquia, poder e
autoridade que estão associadas às variantes de prestígio, isto é, variantes que dão status aos
seus usuários. Enquanto as variantes desprestigiadas são utilizadas pelos subordinados, com
pessoas com pouca ou nenhuma qualificação profissional, vistas negativamente, este uso
contribui para rebaixar os falantes, estabelecendo, assim, o preconceito linguístico e a
discriminação socioeconômica.
Em Foz do Iguaçu, 50% dos informantes, FI/2, FI/4, FI/5 e FI/6 afirmam que utilizam
línguas diferentes de acordo com o interlocutor, ou a situação. Outros 50% dos informantes,
FI/1, FI/3, FI/7 e FI/8, afirmam que não escolhem um jeito ou uma língua diferente para lidar
com cada pessoa, que eles procuram se fazer entender independentemente da pessoa. Para o
informante FI/3, seu trabalho não exige o contato com outras pessoas, logo, ele não vê a
necessidade de adequar a sua maneira de falar, conforme excerto:

FI/3 – Não, porque a gente num tem contato direto com as pessoas, nosso trabalho não
inclui falar com pessoas diferentes não.

Para a informante FI/4, a variação na hora de falar é inevitável, porém,


hierarquicamente, há casos em que ela não tem contato com o proprietário, pois o poder é
estabelecido também pelo distanciamento, revelado pela ausência de contato linguístico com
os superiores, conforme trecho destacado da entrevista:

179
FI/4 – É o certo, né? Quando eu falo com um amigo de setor é uma coisa, quando eu
falo com minha chefe é outra, gerente, com dono, às vezes a gente nem fala, né? Então
é diferente.

O informante FI/5 afirma que varia constantemente e enfatiza que, ao falar espanhol,
apresenta um forte sotaque e procura se policiar, por este ser motivo de preconceito perante
outros falantes de espanhol. Ao falar com os amigos, não têm a preocupação de se policiar
linguisticamente, porque quando erra, se os amigos o corrigem, não considera tão
constrangedor. O informante fala de maneira diferenciada com os hóspedes e quando o
interlocutor abre espaço para que ele se sinta mais à vontade, a linguagem flui mais
facilmente, isto é, não tão formal quanto era no princípio da conversa.
Outro ponto a destacar na fala do informante FI/5 é a atitude positiva relacionada à
variedade padrão e à língua inglesa, entendida nas entrelinhas e percebida pelo termo polite,
utilizadas em seu local de trabalho, o demonstra a crença relacionada às variantes mais
prestigiadas socialmente. Percebe-se, também, a visão preconceituosa do informante
relacionada ao idioma dos argentinos e paraguaios. A atitude negativa demonstrada, ao se
referir aos moradores dos países vizinhos, aponta para a crença carregada de preconceito em
relação ao sotaque dos falantes do espanhol do Paraguai e da Argentina, conforme trecho
retirado da entrevista:

FI/5 – Sim, até pelo meu sotaque de argentino, [...] eu acabo me policiando pra não
falar no sotaque, no acento deles [...] um paraguaio falando espanhol é muito difícil de
entender pelo acento que eles têm também, rau, rau, rau caipirão [...] Aqui no trabalho
tem que ser mais polite (Risos) [...] mas quando você vê que a pessoa te deu uma
brecha, que a pessoa é jovem, que a pessoa é antenada... é.. você muda a maneira de
falar e com os amigos é diferente, cê fala sem ter medo de errar [...] Se o cara te
corrigir vai ser uma coisa mais leve, você vai se senti não tão pesado, mas muda sim.
Aqui dentro com os hóspedes e com os colegas de trabalho e fora também.

Para a informante FI/6, a variação linguística está associada à paciência, à timidez e à


tolerância, pois cada pessoa tem um jeito próprio de ser. Infere-se que muitas vezes esse fato
se reflete nas atitudes linguísticas. Pelo que diz a informante no trecho seguinte, não há uma
referência à língua, mas ao comportamento social:

FI/6 – [...] todas as pessoas que visitam Foz, praticamente passam aqui, né? Shopping
é o lugar de qualquer estrangeiro. Em qualquer lugar que você vá pra fora do país é o

180
shopping que você procura porque é muita... misturado, é um jeito de você se sentir
um pouco em casa eu acho.[...] Por que as pessoas são diferentes. [...] aqui na livraria,
tem gente que tem menos paciência de esperá, outros tem mais curiosidade que
precisam de mais tempo, outros são mais tímidos, né? Então, são diversos tipos de
pessoas, né? Independente de origem.

O informante FI/7 afirma não variar a maneira de falar de acordo com o interlocutor,
para ele é questão de adaptar a linguagem. Porém se o informante vai adequar a sua
linguagem à dos interlocutores, ele escolhe um jeito diferente de falar. Como acontece ao se
referir à linguagem que ele utiliza durante as aulas aplicadas ao terceiro ano do ensino médio
não ser a mesma linguagem utilizada no ensino fundamental. Infere-se que deve ficar mais
próxima da variedade padrão, tendo em vista que são alunos de uma faixa etária mais elevada
e que se encontram próximos do vestibular, então, o informante FI/7 se utiliza da variedade de
maior prestígio social, embora não admita, conforme se observa no trecho em destaque:

FI/7 – Não, você estabelece uma linguagem para determinada turma. Se eu tô na


quinta série, eu vô utilizar uma linguagem inteligível para a quinta série, se eu for pra
um terceirão, terceiro ano do ensino médio, que eu tenho, eu falo uma linguagem do
nível deles, uma linguagem pra trabalhar com a pessoa ali.[...] Não, uma linguagem só.

Em Ciudad del Este 87,5% dos informantes afirmam que é preciso escolher um jeito e
uma língua diferente para lidar com cada pessoa e apenas 12,5%, isto é, o informante CL/7
não considera o fato de escolher uma maneira diferenciada para falar com cada pessoa. O
informante CL/1 diz que não tem um jeito diferente, porém os três idiomas são necessários
para dar atenção aos clientes. Percebe-se a crença negativa do informante relacionada ao
falante do guarani, a referência que é feita a esses falantes que, de acordo com o informante,
vêm do interior:

CL/1 – Não aqui eu uso as três língua, né? Quem vem o brasilero fala o português
quem vem o argentino fala o espanhol e têm aqueles caras que vêm de, do interior, né?
Ai tem que falá o guarani. [...] Em atenção a cliente, né?

A informante CL/4, como se depreende de suas afirmações transcritas a seguir, afirma


que fala de diversas formas de acordo com os clientes, demonstra sua crença ao lidar e se
comportar com as pessoas que se relaciona:

CL/4 – Eu falo, são vários jeito. [...] Eu tenho monte de freguês de diferente tipo, por

181
exemplo, uma... uma freguesa que seja religiosa, pela roupa eu já sei que é uma
religiosa, não uma monja assim, uma, uma pessoa de igreja, eu já percebo, né? Aí, já
falo com língua religiosa. Para oferecê meu artigo. [...] então uso vários jeito, e se é
uma pessoa de muita idade, também com muito respeito, (risos), falo mais na alma que
no ouvido.

Em Puerto Iguazú, 87,5 % dos informantes afirmam que em seu trabalho é preciso
escolher um jeito e uma língua diferente para lidar com cada pessoa. 12,5% dos informantes,
não concordam. O informante PI/1 deixa transparecer a crença de que a maneira diferente de
falar ou tratar o outro pode revelar preconceito, logo, ele trata todos igualmente:

PI/1 – É, no meu trabalho não, porque, eu falo sempre da mesma forma como tô
falando com você, com todos os meu cliente eu falo da mesma forma, porque eu não
posso ser diferente com um, com outro porque ficaria mal. Sempre trato a pessoa bem,
da melhor forma possível e, no meu trabalho eu tenho que ser, sempre educado e eu
não posso trata diferente uma pessoa da outra, sempre o mesmo trato [...].

Para a informante PI/2, o jeito de falar vai depender da língua estabelecida pelo
cliente, a informante PI/6 diz que depende da pessoa, de seu jeito, sua faixa etária para que
ocorra a escolha do jeito certo para lidar e o informante PI/7 afirma que há necessidade de um
jeito diferente, inteligência, “conhecimento neurolinguístico”, mas, não uma língua:

PI/2 – Sim. [...] Depende da pessoa, tem pessoa que vem e diz, não, eu falo português
e só português, no quero que você fale espanhol. Já aconteceu muitas vezes, e tem
aquele que vem dizer eu falo inglês e só inglês se arruma como puder se souber e se
não souber sinto muito.

PI/6 – Não, depende da pessoa que vem, você nota se é uma pessoa amável, você trata
de conversá mais tranquilo, se você ver que é uma pessoa meia pesada, você trata de
falar um poco mais direto, [...] a gente trata de procurá palavras como senhor, senhora
mais educado, sim, sim vai mudando.

PI/7 – É. Eu acho um jeito diferente, mas não uma língua diferente, um jeito diferente
até porque, cada pessoa é um universo diferente da outra. Eu acho que tem que haver
si, um, um conhecimento neurolinguístico para se referir entre pessoas, não é a mesma
coisa falar entre homens e dependendo do tema também o jeito é diferente, tem, tem
que ter a inteligência de procurar o jeito mais apropriado.

A informante PI/8 reconhece a necessidade de escolher um jeito, uma forma de falar


com cada pessoa, relacionada ao trabalho, por se deparar com inúmeras situações em que as
pessoas são bastante heterogêneas. Distribuem-se desde as que não apresentam nenhuma

182
escolaridade até profissionais das mais diversas áreas e de nível sócio-cultural diferentes. A
informante acredita ter sido selecionada entre os diferentes profissionais da área jurídica para
lidar com questões judiciais que lhe competem. E por dispor de um vocabulário que lhe
possibilita ter facilidade em se comunicar com qualquer pessoa, independentemente da faixa
etária e/ou classe social que lá se faça presente, e também por apresentar flexibilidade para se
adaptar aos diferentes contextos a que é submetida. O conhecimento linguístico unidos à
sensibilidade faz com que a informante escolha um jeito para lidar com cada pessoa:

PI/8 – Acontece [...] em mi trabalho vem gente desde analfabeta, profisionales porque
tiene questão judiciales que le aconteceram, aí viene de todo el mondo. Porque soy
uma persona aberta em me despacho, porque soy la juez e em meu despacho entra
todo mundo, humilde, limpo, com cheiro de perfume o com cheiro não agradável,
qualquer um, porque a todo mundo eu atendo[...] Trato de adapatar-me al interlocutor
que tengo, se es uma persona com poca cultura, com poco vocabulário,
indubitavelmente utilizo um vocabulário sensijo [...] trato de ser didática para que la
gente que vino averiguar algo se vaya com la resposta clara. [...] com palavras bien
conocidas quando tieno um interlocutor que se da cuenta, com sua cultura permite.
Bueno, que se de conta del câmbio del vocabulário normal, creo que uno reconosca la
formação que tengo um vocabulário mais fluido de uno que de outro, então es mais
común que vá quem que tenga que assumir.

O Gráfico 9 ilustra a necessidade de escolher um jeito e uma língua diferente para


lidar com cada pessoa no trabalho, de acordo com os informantes.

Gráfico 9 – Escolha linguística e jeito diferenciado para lidar com as pessoas no trabalho

87,5% 87,5%
90%
80%
70%
60% 50% 50%
50%
40% Sim
30% Não
20% 12,5% 12,5%
10%
0%
Foz do Iguaçu Ciudad del Puerto Iguazú
Este

Ao estudar as três comunidades de fala, constata-se a variação linguística presente na


fala da maioria dos informantes. A necessidade de adaptação à língua do outro no trabalho é
fato, mesmo para os informantes que disseram falar da mesma forma, independentemente da
pessoa ou da situação. Há momentos, durante os inquéritos, que os informantes acabam por se
183
contradizer, apresentando situações reais em que o jeito diferente de falar e lidar com cada
pessoa se fez presente.
Há a crença, em 25% dos informantes, de que, se existe mudança na maneira de falar
para se adaptar à situação, essa mudança é vista de forma negativa por estar associada ao
preconceito. Infelizmente essa visão é bastante equivocada, pois a variedade padrão é
ensinada nas escolas, justamente para que a pessoa, no seu dia-a-dia, faça essa adaptação
linguística, de acordo com os mais diversos contextos situacionais e o conhecimento
linguístico possibilita esses ajustes.
A atitude do falante relacionada à língua nunca é neutra, porque envolve questões
afetivas relacionadas a sua língua e à língua do outro, que acabam por criar estereótipos e
preconceitos. É o caso registrado no depoimento do informante FI/5 quando faz referência ao
sotaque do espanhol falado pelos argentinos e pelos paraguaios vistos de maneira negativa e
desprestigiada, ao afirmar que o falante paraguaio tem um sotaque “caipirão”.
Na avaliação social, sobre as variedades linguísticas, constrói-se uma hierarquia, em
que se estabelecem os modos de falar prestigiados e desprestigiados. Nesse campo, Alkmim
(2001, p. 42) destaca aspectos relevantes, como se transcreve a seguir:

Aprende-se a variedade a que se é exposto, e não há nada de errado com essas


variedades. Os grupos sociais dão continuidade à herança lingüística recebida. Nesse
sentido, é preciso ter claro que os grupos sociais situados embaixo da escala social
não adquirem a língua de modo imperfeito, não deturpam a língua ‘comum’. A
homogeneidade lingüística é um mito, que pode ter consequências graves na vida
social. Pensar que a diferença lingüística é um mal a ser erradicado justifica a prática
da exclusão e do bloqueio do acesso aos bens sociais. Trata-se sempre de impor a
cultura dos grupos detentores do poder (ou a ele ligados) aos outros grupos – e a
língua é um dos componentes do sistema cultural.

A atitude positiva da escolha da língua, para lidar com diferentes pessoas ficou
estabelecida a partir do momento em que o informante consegue interagir com o interlocutor
no trabalho ou em qualquer outra situação. Conforme visto nos depoimentos, a escolha
linguística à adaptação do contexto social vai além do ouvido, mexe com os sentimentos, as
emoções do falante e, de acordo com a informante CL/4, sua fala “vai além do ouvido”, pois
fala “na alma da pessoa”.

Pergunta 17. Uma pessoa que tem bastante instrução fala melhor que uma pessoa
que tem pouca ou nenhuma instrução escolar?
Nas respostas a essa pergunta, pode-se identificar as crenças e atitudes dos informantes

184
diante da fala do outro e da sua própria fala, ao assinalar quem fala melhor, se é uma pessoa
instruída ou com pouca ou nenhuma instrução. Sabe-se que todo falante nativo, de qualquer
língua, conhece sua língua de maneira intuitiva e a utiliza naturalmente.
As regras básicas do bom funcionamento da língua são incorporadas a partir do
momento em que o indivíduo começa a falar, no colo de sua mãe, ou da primeira pessoa com
quem tem contato linguístico. A criança vai formulando as primeiras frases a partir da
observação e do ouvir o outro. Mais tarde, esse conhecimento linguístico passa a ser
formalizado, isto é, ela vai para a escola para aprender as normas, as regras da variedade
padrão, que só farão sentido a partir do momento em que são ensinadas dentro de um contexto
de uso e não de forma decorada e fragmentada.
Em Foz do Iguaçu, 62,5% dos informantes creem que as pessoas instruídas falam
melhor. 25% dos informantes acreditam que nem sempre uma pessoa instruída fala melhor do
que uma pessoa com pouca ou nenhuma instrução. E 12,5%, um informante, considera
relativo. A informante FI/4 afirma que fala mal, fala “errado” devido às suas origens, apesar
do pouco estudo ela informa que escreve bem, como se vê trecho da entrevista em destaque:

FI/4 – Ah, é com certeza. Porque eu, eu escrevo bem, mais falo errado fui criada...
minha família é mineira fala aquelas palavra errado uai,[...]

Na resposta, a informante se auto-penaliza em virtude dos regionalismos que ela


internalizou, citando a expressão “uai”, nota-se que devido a baixa escolaridade, ela
desconhece o que a variedade padrão considera adequado e inadequado. Esse fato remete à
escola que, muitas vezes, ao ensinar a variedade padrão, acaba por estigmatizar as variedades
populares, pois em alguns casos, o profissional da educação e o material didático utilizados
pelo docente não deixam claro sobre a realidade linguística brasileira. É claro que é a função
da escola ensinar a variedade padrão, mas é sempre bom lembrar que além da variedade
padrão há a variedade popular. O fato de não deixar claro ao aluno essa diferença pode gerar
preconceito linguístico, Normalmente a fala está associada ao nível social, intelectual,
regional e a mídia reforça esse preconceito, principalmente nas regiões mais estigmatizadas,
como é o caso, citado pela informante, do interior de Minas Gerais.
Percebe-se que uma das características dos programas de humor é fazer uso da
variedade linguística estereotipada, caricata, típicas de regiões de Norte ao Sul do país, que
apresentam fortes traços regionais. Porém os programas humorísticos utilizam as marcas
linguísticas regionais de forma negativa, para estigmatizar o outro, nunca de maneira positiva.
185
As diferenças regionais, sociais, culturais, entre outras, são postas como forma de exclusão e,
nas entrelinhas fica perceptível que, se o indivíduo continuar falando determinada variedade
estigmatizada, ele será ridicularizado socialmente e jamais conseguirá prestígio social. O
prestígio está associado ao poder, ao domínio da variedade padrão e, se possível, sem nenhum
sotaque que identifique sua procedência.
Os regionalismos são sempre apresentados de forma preconceituosa e discriminativa,
fazendo com que as pessoas internalizem esse preconceito linguístico reforçando a idéia de
“certo” e “errado” (SILVA-CORVALÁN, 1988, p. 12). A escola reconhece a variação
linguística no Brasil, porém ainda falta preparo, embasamento teórico e conhecimento para
trabalhar com o tema, logo, continua-se impondo a variedade padrão como única opção
linguística, desconsiderando as demais variedades.
A diversidade linguística brasileira é trabalhada superficialmente em sala de aula,
como forma de cumprir o planejamento escolar. Estabelece relação com algumas obras
literárias e não com a sociedade que se apresenta em forma de um mosaico linguístico tão
importante na composição linguística do cenário nacional.
Para os informantes FI/5 e FI/7, uma pessoa com instrução não significa que fale
melhor que as pessoas menos instruídas, pois pessoas instruídas, de acordo com eles, podem
ter outro conhecimento, mas não significa que falem melhor, conforme excertos retirados das
entrevistas:

FI/5 – Não, eu acho que não. Têm pessoas que já são formadas aqui, já estudaram as
línguas e falam pior do que muitos que não tão formados ou que entraram agora. Força
de vontade, né?

FI/7 – Não. Ela pode usar um maior número de palavras, ele é um acadêmico, então
provavelmente o número de palavras, soma o número de palavras que eles usam vai
ser bem maior, três, quatro, cinco mil palavras, não quer dizer que ele fala melhor, não
quer dizer que ele se comunica melhor. Aí teria que questionar o que é falar, mas eu
não creio.

A informante FI/8 defende as duas partes, isto é, pessoas instruídas e pessoas com
pouca instrução. Ela demonstra a crença de que existe uma língua considerada mais bonita,
que é a língua ensinada nas escolas, explicada por meio da variedade padrão e por outro lado,
que se deve respeitar o jeito de falar da outra pessoa. O fato de não “dominar” a gramática
normativa não significa que o falante não saiba se comunicar com clareza, pois há pessoas
que têm domínio da norma e apresentam dificuldades ao se comunicar, transmitir o conteúdo,

186
conforme registrado na entrevista:

FI/8 – Ela tem um português mais bonito, uma colocação melhor, é... vai atingir o
objetivo com mais clareza, com mais rapidez, né? Então, vai ter uma linguagem bem
mais fácil de se comunicar. Vai atingir, né? Mas isso não quer dizer que a outra pessoa
que não domina a gramática normativa também não saiba se comunicar.

Em Ciudad del Este, 75% dos informantes consideram que uma pessoa com instrução
fala melhor que uma pessoa com pouca ou nenhuma instrução, enquanto que 25% consideram
relativo, tendo em vista que nem sempre uma pessoa com instrução fala melhor que uma
pessoa com pouca ou nenhuma instrução. Para o informante CL/1, a pessoa precisa estudar
para falar direito, porque senão acaba por misturar as línguas, devido à falta de vocabulário, e
o informante associa o falar “ruim” à classe social como fator negativo, pois, para ele, o
yopará é uma variante desprestigiada socialmente:

CL/1 – Não, aí... tem que... só... um tem que estudá mesmo, né? Porque é... aquele que
no estuda, até fala, tudo ruim assim, né? Essas classes de pessoas é aquele que fala
yopará, né? Porque é quando no sabe de um idioma passa do outro [...].

O informante CL/1 apresenta atitude negativa, pois demonstra seu preconceito étnico e
social perante os falantes do yopará, tão importante para a formação da língua de uma
comunidade. O informante desconhece a mudança linguística e as adaptações que os falantes
fazem na língua tendo em vista a constante evolução linguística.
A informante CL/4 considera relativo uma pessoa com instrução falar melhor que uma
pessoa com pouca instrução, principalmente na fronteira, lugar onde as pessoas trabalham
mais que estudam. Para ela, a fala está associada à língua, traz exemplos entre os moradores
da capital, Assunção, e os moradores de Ciudad del Este. Deixa transparecer a crença de que
existe uma língua espanhola, que ela considera de prestígio, falada pelos intelectuais, por
pessoas preparadas academicamente, e que esse espanhol não é falado na fronteira:

CL/4 – É relativo, relativo aqui na fronteira, porque em Assunção por exemplo as


pessoas são mais intelectuais, estuda mais, tem mais preparação acadêmico, que aqui
na cidade, aqui na cidade as pessoa é tudo trabalho, trabalho, estudam pouco. Pouco,
pouco, mais aqui fala melhor que na Assunção, em português, né? Em Assunção fala
melhor o espanhol. Aqui as pessoa vieram do interior, do guarani já foram pra
português, sem aprendê falá espanhol, ou seja, o paraguaio que está na fronteira não
sabe falá o espanhol, falam pouco.

187
De acordo com o depoimento de CL/4, o fator escolaridade em Ciudad del Este e
Assunção explicam a existência da diferença entre os falantes da variedade desprestigiada do
espanhol que compõe a maior parte da população de Ciudad del Este que mescla espanhol
com guarani. Os falantes escolarizados falam a variedade prestigiada do espanhol, sem
interferência do guarani, que é o espanhol falado, de acordo com a informante, em Assunção.
O fato de saber o espanhol se torna relativo na hora de se comunicar em Ciudad del Este,
porque a maioria fala português. A pessoa pode saber a língua, falar melhor, mas se o seu
interlocutor não partilhar da mesma língua não haverá comunicação.
Em Puerto Iguazú, 50% dos informantes acreditam que fala melhor quem tem
instrução. 50% consideram esse fato relativo porque, de acordo com os informantes, há
muitas pessoas sem instrução que aprenderam a falar no comércio, na rua e falam melhor do
que muitas pessoas instruídas.
O informante PI/1 afirma que há muitas pessoas que não sabem se expressar
adequadamente por falta de estudo, e não conseguem um bom emprego. Ele afirma que seu
pai nunca estudou, fala melhor do que muitas pessoas instruídas porque sempre lidou com o
comércio. O contato linguístico constante com diferentes pessoas, no trabalho do pai do
informante, proporciona aprendizagem, conhecimento linguístico e faz com que ele se
expresse bem, seja com pessoas instruídas ou com pouca instrução, sem discriminar ou sofrer
qualquer discriminação, de acordo com o trecho retirado da entrevista:

PI/1 – Lamentavelmente sim [...] têm casos que a maioria não sabe expressar-se bem
por causa que não estudaram, não sabem ler nem escrever [...]. Não é discriminá nem
nada, mas não vai consegui um bom emprego [...] não é estar em contra essa pessoa,
mas é a realidade. Meu pai não tem estudo, mais é, fala como um senhor, qualquer um,
como pode ser um empresário ele pode falá igual, porque ele se criou assim já aqui,
trabalhando com comércio, porque ele tem comércio, então sempre aprende, né? Sem
nada de estudo, eu to falando. Por isso, tem pessoa e tem pessoa. Tem pessoa que não
qué aprendê nada, então esse sempre vai sê, vai falá mal, vai sê burro, então, não sei o
que posso dizê, é o que eu penso, né?

Para os informantes PI/7 e PI/8, o fato de uma pessoa instruída falar melhor que uma
pessoa com pouca ou nenhuma instrução é relativo. Apontam para o lado semântico da
expressão “falar melhor”, porque uma pessoa instruída pode ter conhecimento aprofundado
em normas gramaticais, em assuntos filosóficos, vocabulário, porém pode se tornar prolixa
em seu discurso e encontrar dificuldade em ser compreendida. Por outro lado uma pessoa
menos instruída, algumas vezes pode ser sábia, sensata, humilde, falar pouco e dizer muito;

188
portanto para os dois informantes, fala melhor quem consegue se comunicar, porque às vezes
as pessoas com muita instrução falam por um longo período com um discurso sem significado
algum, segundo depoimento extraído das entrevistas:

PI/7 – Depende, o que seria falar melhor, é, pode ter muita profundidade, muita
filosofia, a pessoa muito instruída, pode ter muita filosofia e talvez uma pessoa que
não tenha instrução fale pouco, mais o justo com clareza e objetividade, eu acho que...
olha... não sê, quem fala pouco e disse muito eu admiro.

PI/8 – Do ponto de vista linguístico ou gramatical si. Provavelmente si, porque el


estudo las verbo, formación de la oración, sujeito e predicado, como se formam, no
solo como habla, mas como escribe, cierto, isso vino con la formación de uno. Quiçá
se vamos hablar de contenido el motivo emocional nó. Porque uma persona muy
humilde quizá, com dos palabras nos dão exemplo de sensatez, humildad de amor al
próximo sin tener mucho discurso, entendiste? Uma coisa es la formación dela oración
correta, la utilización de sinônimo, de verbo, e outra coisa el contenido te lo te digo, se
yo estou dizendo burrice dizem ustedes (risos) o algo parecido, o coisas frias sem
sentido, podo dicir muchas palavras e não digo nada, e uma persona muy humilde
quiçá com um gesto disse mucho más do que lo disse em duas horas, sem coração e
sem sentimento.

De acordo com os depoimentos dos vinte e quatro informantes, das três localidades,
pode-se dizer que 62,51% dos informantes consideram que fala melhor uma pessoa que tem
bastante instrução. 29,16% dos informantes consideram essa realidade relativa. De acordo
com os depoimentos, uma pessoa sem instrução pode falar tão bem quanto uma pessoa com
bastante instrução e que uma pessoa instruída pode ter conhecimento do funcionamento
linguístico, porém pode ter dificuldades para se expressar. Observa-se que 8,33% dos
informantes afirmam que não, isto é, uma pessoa instruída não fala melhor do que uma pessoa
sem instrução.
Os dados do Gráfico 10 revelam que as línguas devem ser vistas como realmente são,
principalmente em contexto de fronteira, em que a diversidade linguística é maior do que em
outras localidades, causada pela complexidade étnica presente na região. O fato de uma
pessoa bastante instruída falar melhor, de acordo com os dados, não se apresenta unânime.
Percebem-se outros dados apontados pelos informantes que estão ligados à faixa etária, à
situação socioeconômica, ao status social, à região, ao contato linguístico para que uma
pessoa fale melhor que a outra.

189
Gráfico 10 – Uma pessoa bastante instruída fala melhor na Tríplice Fronteira

29,16%
Sim
Não
É relativo

8,33% 62,51%

De acordo com o os dados registrados, as respostas não se mostram homogêneas, pois


a crença de que fala melhor quem têm bastante instrução é relativa de acordo com os
informantes. Afinal, nem todas as pessoas têm acesso à instrução nas três cidades pesquisadas,
e os que chegam à escola se deparam com o desconhecido, isto é, a língua ensinada é
diferente da língua usada. Muitos não dão sequência aos seus estudos por causa do trabalho,
isto é, ou trabalham ou estudam, portanto não conseguem conciliar trabalho e estudo,
principalmente quem pertence às classes menos favorecidas socialmente.
Observam-se, nas respostas de alguns informantes, atitudes linguísticas carregadas de
preconceito linguístico, de acordo com Bagno (1999, p. 13-69) relacionado à posição social,
origem, falantes de determinadas variedades menos prestigiadas socialmente, consideradas
por esses informantes como forma de falar, errada, feia, deficiente e quem fala dessa forma
ser considerado desprovido de inteligência entre outros adjetivos. Uma classe social
desprestigiada, marginalizada, sem acesso à educação formal é passível de preconceito
linguístico e social.
Para evitar o preconceito linguístico, a escola deve mostrar que as diferenças existem
e que devem ser respeitadas, a maneira do outro falar é consequência do ambiente do qual faz
parte. Toda variedade linguística atende às necessidades da comunidade de fala que a
emprega. Ao deixar de atender, a língua inevitavelmente sofrerá mudanças para se adequar às
novas necessidades.
A crença de que pessoas que têm bastante instrução falam melhor, porque tiveram
acesso à educação formal, deve considerar a presença de regras variáveis em todas as
variedades linguísticas, inclusive da variedade padrão. A fala se apresenta de forma
heterogênea e a pessoa não precisa saber escrever e ler para se comunicar, pois, conforme
visto, existem pessoas que nascem, crescem, e se comunicam sem jamais terem sido
alfabetizadas. No entanto, são falantes e apresentam competência linguística em suas línguas
nativas, faladas em casa e faladas socialmente, fato esse devido ao contato linguístico
constante.
190
Outro fato apontado pelos informantes é que há pessoas que conhecem as regras,
porém na hora de se comunicar, não conseguem aplicá-las. Esse fato se deve à aprendizagem
baseada nos preceitos gramaticais, no hábito de decorar as regras gramaticais, sem
compreendê-las, o que torna a fala fragmentada e artificial.

Pergunta 18. Se você/ o (a) senhor (a) tivesse que escolher entre os diferentes
falares na fronteira, em sua opinião quem fala melhor e por quê?
Com essa pergunta, pretende-se saber dos informantes a atitude linguística relacionada
a quem fala melhor na Tríplice Fronteira, já que são três cidades com distintos idiomas, Foz
do Iguaçu (BR) fala português, Puerto Iguazú (AR) fala espanhol e Ciudad del Este (PY)
cidade bilíngue fala guarani e espanhol.
A maioria dos informantes das três comunidades de fala mostra atitudes positivas
perante a sua língua, isto é, em Foz do Iguaçu, 50% dos informantes afirmam que quem fala
melhor, é quem fala português porque é a língua que eles dominam, caracterizando-a como
linda, maravilhosa, de maior nível, língua nativa. 37,5% dos informantes consideram o
espanhol falado pelos argentinos. 12,5%, uma informante, FI/6, cita a mistura linguística e
não se refere a nenhum idioma especificamente. Os informantes FI/1, FI/2, FI/5 e FI/8
indicaram como a melhor fala, o português, conforme transcrição de trechos das entrevistas:

FI/1 – Eu acho que quem fala melhor é o português porque eu falo português, certo.
Não sei se tá correto meu português, mas eu entendo melhor quando tão falando
comigo em português.

FI/2 – Eu escolheria Foz. [...]Porque é o lugar onde a gente vive, tipo assim nasceu,
cresceu, né? (Risos)

FI/5 – O brasileiro, mas assim o porquê eu não sei. [...] a cultura do brasileiro é mais,
maior nível.

FI/8 – Olha, eu vou ficar com o português, porque é... eu acho maravilhoso, eu acho
lindo, fantástico, sempre tem alguma coisa... sempre estamos aprendendo e porque eu
não tenho domínio de outra língua[...]

Constata-se nas respostas dos informantes que a atitude linguística varia em razão
direta do prestígio atribuído ao vernáculo. Os informantes FI/3, FI/4 e FI/7 fazem referência
ao país no lugar das comunidades e consideram que quem fala melhor é quem fala o espanhol
falado na Argentina. O informante FI/3 compara o espanhol falado na Argentina com o

191
espanhol falado no Paraguai e considera que é misturado e o espanhol falado pelos argentinos
é mais puro. Para a informante FI/4, os brasileiros fazem usos de muitas gírias e as pessoas
preferem o espanhol falado pelos argentinos.
Em Ciudad del Este, 62,5% dos informantes consideram que quem fala melhor são os
falantes do espanhol. 25% dos informantes, CL/3 e CL/4, afirmam ser os falantes do guarani
porque gostam e por ser a língua nativa. 12,5%, uma informante, CL/2, afirma ser o português
porque os falantes das demais línguas mesclam muito e ela credita que essa mistura não
acontece com o português.
Os informantes CL/1, CL/5, CL/6, CL/7 e CL/8 consideram o espanhol, de acordo
com o informante CL/1, são dois países que falam o espanhol. O informante CL/5 afirma que
o espanhol falado pelos argentinos é melhor, porque eles falam bem e utilizam uma linguagem
persuasiva. A informante CL/6 considera o espanhol, tendo em vista que nem todas as pessoas
sabem falar português. O informante CL/7 aponta para o espanhol e diz que a pessoa tem que
estar preparada para falar outros idiomas, conforme trecho destacado:

CL/7 – A língua, vai ter que ser espanhol [...] Não pode ficar com um só, vai ter que
falar espanhol e vai ter que falar português, e inglês também se for preciso.[...] Eu falo
preparada aquela persona que, que fala toda a língua posible.

A maneira como é formada a Tríplice Fronteira influencia na visão que o(s)


indivíduo(s) faze(m) de si mesmo(s), de sua origem e, portanto, ajuda na constituição de
sua(s) identidade(s). Nota-se a crença da nação paraguaia, formada por indígenas (menos
prestigiados socialmente) e espanhóis. Em nenhum momento se referiram ao yopará ou ao
portunhol, conforme se pode observar. Isso demonstra a crença de serem variantes menos
prestigiadas na fronteira, apesar de ser a realidade linguística da região, constatada em
depoimentos anteriores.
Em Puerto Iguazú, 75% dos informantes consideram o espanhol; 25% dos
informantes, PI/3 e PI/4, fazem referência ao castelhano e 50% ao espanhol (50% + 25% =
75%) porque embora os moradores deem denominações diferentes, trata-se do mesmo idioma.
25% representado pelos informantes PI/7 e PI/8 que afirmam ser o portunhol, é a língua mais
falada na fronteira.
O informante PI/1 afirma ser o espanhol e argumenta que a Tríplice Fronteira é
formada por dois países falantes do espanhol, um país cujo idioma é o português e acrescenta
que são poucos os países que falam português. Os informantes PI/2 e PI/5 afirmam ser o

192
espanhol por considerarem uma língua mais fácil de falar e PI/5 completa que, se for ao
Paraguai falando português, ninguém vai entendê-lo porque em Ciudad del Este falam
espanhol. A informante PI/6 afirma ser o espanhol porque é uma língua que não apresenta
sotaque.
Verifica-se, nas respostas dos informantes, a exclusão das diversas etnias que formam
a Tríplice Fronteira e apresentam a crença de que quem fala melhor o idioma é quem fala seu
próprio idioma. O Gráfico 11 apresenta os dados das respostas à pergunta “Se você/ o(a)
senhor(a) tivesse que escolher entre os diferentes falares na fronteira, em sua opinião quem
fala melhor e por quê?

Gráfico 11 – Quem fala melhor na Tríplice Fronteira?

80%
70% 62,5% Fo z do Iguaçu
60% 50% 50%
50% Ciudad del Este
40% 37,5%
30% 25% 25% 25% P uerto Iguazú
20% 12,5% 12,5%
10%
0%
P o rtuguês Espanho l Guarani Castelhano P o rtunho l Não
identifico u

O contato linguístico das diversas etnias, na Tríplice Fronteira, proporciona um


cenário plurilíngue, em que diversas línguas são faladas por moradores das comunidades de
fala pesquisadas, português, espanhol/castelhano, guarani, portunhol e demais línguas não
identificadas pelos informantes. Quem fala melhor o idioma, de acordo com as respostas dos
vinte e quatro informantes, é o falante do espanhol (58,33%) seguido pelo português (20,83%)
guarani (25%), portunhol (25%) e demais línguas não identificadas (4,16%) línguas
minoritárias, faladas pelas demais etnias localizadas neste cenário.
Verifica-se que várias línguas coexistem, mantêm contato e que desse contato
linguístico resultaram três variedades de uso conhecidas por portunhol, yopará e o
guaraportunhol. Essa realidade linguística foi comprovada por vários pesquisadores das zonas
de fronteira conforme referido no embasamento teórico deste estudo. O que se percebe é que
essas variantes são estigmatizadas pelos próprios falantes, que não atentaram para a riqueza
linguística proporcionada pelo contato linguístico. Há necessidade de conscientizar os falantes
da importância da interação com a diversidade linguística presente na região e tirar o máximo
de proveito desse contexto plurilíngue, isto quer dizer, estar aberto ao conhecimento
193
linguístico e sociocultural presente nesse cenário.
Ao analisar o conjunto de respostas pertencentes ao grupo 4, percebe-se que os
informantes apresentam uma crença multifacetada da língua, composta de partes que formam
um caleidoscópio linguístico, o qual os moradores da fronteira devem dominar por completo.
Não se pode esquecer que essa crença está associada ao reflexo da comunidade multiétnica da
qual fazem parte.
A atitude de optar pela língua inglesa, ao contrário das demais línguas que fazem parte
do cotidiano dos informantes, contribui não apenas para uma melhor compreensão dos
aspectos da diversidade linguística do local, como para uma visão mais ampla de se falar a
língua estrangeira das transações internacionais.
A análise das respostas dos informantes, das três localidades, a respeito da língua
utilizada para ter sucesso na fronteira revela que no cômputo geral, considerando-se todas as
línguas citadas, 62,5% dos informantes elegeram o inglês seguido pelo espanhol 41,66%, pelo
português 33,33% entre outras línguas.
Alguns informantes apresentam a crença de que aprender um desses três idiomas é
saber sobre a estrutura linguística e adquirir conhecimentos a esse respeito é suficiente para a
interação. Essa crença tem origem na experiência linguística na Tríplice Fronteira que exerce
grande influência na manutenção dessa crença, de forma geral vista como o domínio das
regras gramaticais, não abrindo espaço para uma concepção mais holística da linguagem.
Diferentes culturas podem adequar-se às ideias de aprender línguas conforme seu
histórico econômico e sociocultural. A opção linguística para o sucesso na Tríplice Fronteira
mostra a crença de que eles possuem uma visão idealizada do inglês, como a língua
hegemônica. Os informantes apresentam uma visão simplista de língua e linguagem,
consideradas como o acúmulo de vocabulário e estruturas gramaticais.
As representações que os informantes têm sobre a língua a ser usada refletem a
tradição de mecanismos de poder centrados no comércio internacional, que expressam crenças
comuns sobre a escolha linguística para ter sucesso no mundo dos negócios e não
especificamente na Tríplice Fronteira.
Esse fato aponta para análise das respostas da questão que trata da língua escolhida
pelos patrões na contratação de empregados. A tradição linguística na fronteira está associada
ao mercado de trabalho local, que indica o roteiro a seguir e os moradores se habituam a isso.
Por meio das respostas dadas pelos vinte e quatro informantes, em que se somou o número de
vezes em que as línguas foram citadas, concomitantemente com outras línguas, têm-se: 50%

194
dos patrões dão preferência aos empregados que saibam falar português, 45,83% dão
preferência aos falantes de espanhol e 41,66% acreditam que os patrões dão preferência na
contratação dos empregados, aos candidatos que saibam falar inglês, entre outras línguas.
A respeito da preferência linguística dos patrões na contratação dos empregados, nota-
se por meio das respostas, reações positivas com relação à escolha do português. Verifica-se
que a escolha linguística está associada aos grandes consumidores da fronteira que são os
brasileiros, logo os patrões dão preferência aos funcionários que saibam falar português.
No que diz respeito às línguas de sucesso e às preferidas pelos patrões, percebe-se que
a Tríplice Fronteira está se movendo em direção progressiva ao português e espanhol, não
apenas como línguas de interação cotidiana. Constata-se que, hoje, mais paraguaios e
argentinos usam português em suas transações comerciais e que o status do inglês é mantido
como língua instrumental e internacional.
Observa-se que as atitudes positivas em relação à língua não são suficientes para
preservar a sua manutenção, especialmente em situações de contato linguístico intenso. De
acordo com os depoimentos dos informantes, os patrões de países onde o espanhol é a língua
oficial tendem a subestimá-la na hora de contratar empregados por dar preferência aos
candidatos que tenham conhecimento do português. Embora esses resultados não sejam
unânimes, pode-se dizer que as atitudes linguísticas dos informantes com relação às línguas
de sucesso e da contratação de empregados são positivas.
Constata-se que, no dia a dia, nas interações comerciais e turísticas na fronteira, as
pessoas usam o portunhol, embora não tenha sido destacado pelos informantes. É fato o uso
do portunhol na Tríplice Fronteira, devido à preferência linguística dos patrões na contratação
de empregados. Em Foz do Iguaçu os patrões preferem empregados que falem espanhol,
Ciudad del Este e Puerto Iguazú dão preferência a funcionários falantes do português e são
poucos os que têm domínio linguístico, logo a saída é mesclar os idiomas.
Nas respostas à pergunta para saber se é possível ser julgado melhor pelas línguas que
fala do que pela inteligência, verifica-se que 75% dos informantes de Foz do Iguaçu acreditam
que as pessoas são julgadas pela inteligência. Segundo eles, não adianta a pessoa falar vários
idiomas se ela não souber se comunicar, se não conseguir desempenhar a função a ela
designada. Em Ciudad del Este (62,5%) e em Puerto Iguazú (50%) os informantes creem que
as pessoas são julgadas melhor pelas línguas que falam que pela inteligência. Tal crença
aponta para uma visão diferenciada na Tríplice Fronteira, pois as duas comunidades de fala
apresentam visão positiva relacionada às línguas que falam. Esse fato demonstra a crença de

195
que tais comunidades cumprem sua função comercial, pois, o importante é receber turistas e
clientes no comércio, em atividades que exijam pouco ou nenhum esforço intelectual, porém
se esquecem que o fato de falar mais de uma língua está associado ao intelecto. O fato de
alguém falar mais de um idioma demonstra sua capacidade intelectual à aprendizagem de
línguas.
Os informantes das três cidades apresentam crenças que refletem atitudes carregadas
por fatores considerados positivos e negativos: i) positivo, quando em sua atividade
profissional o indivíduo desempenha bem sua função mostrando propriedade intelectual e
linguística, falando mais de um idioma; e ii) negativo, se o indivíduo apresenta apenas
conhecimento de mais de um idioma e não sabe como lidar com isso; sabe falar, porém não
consegue desempenhar sua função, não consegue compreender pequenas tarefas que lhe são
atribuídas.
Pode-se dizer que o indivíduo, de acordo com o contexto social em que estiver
inserido, procura adequar-se à necessidade de interação linguística e do próprio ambiente. Isso
possibilita sua inserção no mercado de trabalho e facilita seu convívio social.
Ao tratar a respeito de quem fala melhor, se o homem ou a mulher, os informantes
davam seu depoimento com um leve sorriso nos lábios, todos eles manifestavam sua opinião
por meio de gracejos.
Em Foz do Iguaçu, 75% dos informantes consideram que a mulher fala melhor.
Segundo os informantes ela é mais cuidadosa, é mais estudiosa. O item escolaridade se fez
bastante presente nas respostas, grande parte afirmou que a mulher tem mais tempo para
estudar.
Nas respostas obtidas em Ciudad del Este, 87,5% dos informantes também afirmam
que são as mulheres que falam melhor o idioma. De acordo com os informantes, as mulheres
têm jeito em lidar com os clientes, apresentam clareza na fala, são inteligentes, delicadas,
charmosas e engraçadas.
Em Puerto Iguazú, 75% dos informantes afirmam que é a mulher quem fala melhor o
idioma, destacam o fator escolaridade como marca dessa diferença, consideram que são mais
delicadas, se expressam melhor, que os homens são atrapalhados, intrépidos, mas é a mulher
quem fala melhor o idioma.
Tal atitude para com a fala feminina revela uma reação favorável, positiva. As
mulheres, até bem pouco tempo atrás, eram consideradas um grupo minoritário, de menor
poder aquisitivo, com menos acesso aos bens culturais, intelectuais e com acesso profissional

196
restrito a algumas profissões, destinadas apenas para mulheres. A ascensão econômica e o
desenvolvimento da urbanização impulsionaram as mulheres a conquistar novos campos de
trabalho, assumir profissões que antes eram dedicadas apenas aos homens e, hoje, pode-se
dizer que as mulheres conquistaram seu espaço, como foi demonstrado por meio da avaliação
linguística. Essa atitude linguística demonstra a valorização e o prestigio da mulher na
sociedade; rompe com a crença de que a mulher é valorizada apenas pela aparência, que lugar
de mulher é em casa, que mulher foi feita para procriar e outros estigmas e preconceitos
estabelecidos, que fragilizava a mulher socialmente, desenvolvendo sentimentos de vergonha
e auto-depreciação. Hoje o preconceito ainda existe, porém, com menos intensidade, em
locais em que as pessoas têm pouco conhecimento, convívio social e acesso ao mercado de
trabalho.
Ao questionar os informantes sobre a necessidade de escolher um jeito e uma língua
diferente para lidar com cada pessoa, verifica-se que, em Foz do Iguaçu, 50% dos informantes
afirmam que utilizam línguas diferentes de acordo com o interlocutor, ou a situação. Os outros
50% dos informantes declaram que não escolhem um jeito ou uma língua diferente para lidar
com cada pessoa, que eles procuram se fazer entender independente da pessoa.
Em Ciudad del Este, 87,5% dos informantes afirmam que é preciso escolher um jeito e
uma língua diferente para lidar com cada pessoa e apenas 12,5%, isto é, um informante não
considera o fato de escolher uma maneira diferenciada para falar com cada pessoa.
Em Puerto Iguazú, 87,5 % dos informantes afirmam que, em seu trabalho, é preciso
escolher um jeito e uma língua diferente para lidar com cada pessoa, contra um informante,
que representa 12,5%, que não concorda. O informante deixa transparecer a crença de que a
maneira diferente de falar ou tratar o outro pode revelar preconceito, logo ele trata todos
igualmente.
Ao perguntar aos informantes se uma pessoa com bastante instrução fala melhor do
que uma pessoa que tem pouca ou nenhuma instrução escolar, nota-se que, em Foz do Iguaçu,
62,5% dos informantes têm a crença de que as pessoas instruídas falam melhor. 25% dos
informantes acreditam que nem sempre uma pessoa instruída fala melhor do que uma pessoa
com pouca ou nenhuma instrução e 12,5%, um informante, afirma ser relativo.
Em Ciudad del Este, 75% dos informantes consideram que uma pessoa com instrução
fala melhor que uma pessoa com pouca ou nenhuma instrução, enquanto que 25% consideram
relativo, pois afirmam que nem sempre uma pessoa com instrução fala melhor que uma
pessoa com pouca ou nenhuma instrução.

197
Em Puerto Iguazú, 50% dos informantes acreditam que fala melhor quem tem
instrução, enquanto, outros 50% consideram esse fato relativo porque, de acordo com os
informantes, há muitas pessoas sem instrução que aprenderam a falar no comércio, na rua e
falam melhor do que muitas pessoas instruídas.
Com a pergunta a respeito dos diferentes falares na fronteira, se o informante tivesse
que escolher quem fala melhor, em Foz do Iguaçu, 50% dos informantes afirmam que fala
melhor quem fala português porque é a língua que eles dominam, caracterizando-a como
linda, maravilhosa, de maior nível, língua nativa. 37,5% dos informantes consideram o
espanhol falado pelos argentinos e 12,5%, uma informante, cita a mistura linguística e não faz
referência a nenhum idioma especificamente.
Em Ciudad del Este, 62,5% dos informantes consideram que quem fala melhor são os
falantes do espanhol, 25% dos informantes afirmam ser os falantes do guarani, porque gostam
e por ser a língua nativa. 12,5%, uma informante, afirma ser o português porque os falantes
das demais línguas mesclam muito e essa mistura não acontece com o português.
Em Puerto Iguazú, 75% dos informantes consideram o espanhol e 25% dos
informantes afirmam ser o portunhol a língua mais falada na fronteira.
A explicação geral dos resultados das crenças e atitudes linguísticas desse grupo tem
por base pressupostos de que as línguas podem ser comparadas, porém o julgamento consiste
na diferença subjetiva dos depoimentos dos informantes que revelam o distanciamento social
dos grupos etnolinguísticos principalmente em comunidades bilíngues (espanhol e guarani). O
espanhol é considerado melhor do que o guarani, porque é falado pelos grupos mais
prestigiados socialmente. O portunhol, que é visto com menos prestígio pelos informantes, foi
considerado positivamente por dois informantes universitários da segunda faixa etária de
Puerto Iguazú.

198
7 ANÁLISE DOS RESULTADOS

Após a análise dos dados, pode-se dizer que a primeira hipótese foi confirmada, pois
as atitudes linguísticas não são estáticas, os falantes mudam de atitudes quando percebem que
se beneficiam com o emprego de determinada variedade, desde que tais atitudes sejam
coerentes com seus valores e com suas crenças. Constata-se que algumas atitudes são firmes,
seguras e outras são momentâneas. Tal fato faz com que os informantes se adaptem aos
comportamentos linguísticos da comunidade de fala e/ou ao contexto ao qual pertencem. Essa
adaptação vai desde a velocidade da fala, intensidade da voz, gestos, sotaque, olhar, sorriso e
expressões faciais, conforme se pode observar durante as entrevistas e nas respostas dos
informantes na análise dos dados. Desse modo, suas atitudes se manifestam na interação com
o outro.
Durante a interação, os indivíduos revelam atitudes positivas e negativas relacionadas
à variação linguística na Tríplice Fronteira, como se passa com relação ao espanhol e ao
guarani. Constata-se que alguns informantes, falantes do espanhol, variedade considerada de
prestígio, não falavam nem entendiam o guarani, porém os falantes do guarani, variedade
desprestigiada, tanto em Ciudad del Este quanto em Puerto Iguazú, entendiam e falavam o
espanhol de acordo com o que exigisse a situação. Eles procuram adaptar sua fala ao
interlocutor, isto é, mesclavam as línguas para se fazer entender por meio do yopará e
guaraportunhol. As atitudes linguísticas desses informantes podem influenciar na mudança
linguística.
Ao se referirem à mudança linguística na Tríplice Fronteira, a maioria dos informantes
aponta o sotaque tanto como fator positivo como negativo. O espanhol falado pelos argentinos
é visto positivamente, enquanto o espanhol falado pelos brasileiros e paraguaios é visto
negativamente, pois, de acordo com os informantes, o brasileiro fala portunhol e os
paraguaios apresentam um sotaque muito carregado, com uma pronúncia estridente.
Pode-se dizer que, se um falante tem atitudes positivas diante da língua do outro, ele
aprende a falá-la mais rapidamente, ainda mais quando a língua é vista como uma forma de
integração entre as três comunidades de fala. Observa-se a função determinante das atitudes
no processo de escolha da variedade mais prestigiada.
As atitudes dos moradores da fronteira, devido ao contexto plurilíngue no qual se
encontram as distintas línguas, principalmente relacionado ao contato linguístico frequente do
português e do espanhol, apontam para uma situação de diglossia vivenciada pelo português e

199
o espanhol. O contato linguístico dessas duas línguas revela uma mistura falada pelo morador
da Tríplice Fronteira denominada de portunhol, conforme referido várias vezes durante este
estudo que comprova a segunda hipótese relacionada à diglossia em Foz do Iguaçu, Ciudad
del Leste e Puerto Iguazú, situação essa que já havia sido comprovada no Paraguai por
Fishman, em 1967, entre o espanhol e o guarani.
As atitudes dos informantes diante da sua própria variedade, considerando as distintas
da sua e frente aos dialetos de seu próprio país, estabelecem relação com a identidade dos
falantes. Conforme visto nos depoimentos, em que os informantes conseguem identificar a
origem deles, de acordo com o sotaque e a variedade linguística utilizada, qualificando-a
como de maior ou menor prestígio social.
Quando duas variedades têm diferentes níveis de prestígio, os seus usuários
distinguem a variedade prestigiada da menos prestigiada. A variedade prestigiada está
relacionada ao status, à religião, à educação, à profissão ou a situações formais; a variedade
menos prestigiada que está ligada aos interesses grupais, à família, aos amigos e às situações
informais. Estas variedades podem ocorrer entre diversas línguas, dialetos da mesma língua
ou variedades funcionalmente distintas. É evidente como os moradores da Tríplice Fronteira
valorizam suas próprias variedades linguísticas. A origem da forte identidade explica-se pelas
guerras travadas, por razões históricas e ideológicas dos três países, sua colonização, o cultivo
da erva mate, das grandes madeireiras, das disputas pela terra, entre outros fatores, que
diferenciam a Tríplice Fronteira do resto do país.
Hoje, nas três fronteiras, há uma concepção diferente da língua associada ao trabalho,
pois a sociedade mercantilista local valoriza o falante de mais de um idioma. Logo, o morador
sente a necessidade de aprender mais de um idioma para conseguir emprego/trabalho que é
fonte de benefício pessoal, porém, sabe-se que o centro do trabalho também é fonte de
alienação, quando não se reflete sobre o que se faz.
Nesse contexto, há atitudes positivas diante do português, pois o comércio de Ciudad
del Este e Puerto Iguazú vende grande parte de seus produtos aos brasileiros, falantes do
português. Os trabalhadores do comércio local falam português, mas não sabem escrever em
português. Tal fato sugere que o domínio de escrita do português utilizada no comércio até
então não era prestigiado, porque não contribuía para a elevação socioeconômica. Com o
acordo do MERCOSUL, conforme visto anteriormente, nos países que fazem fronteira com o
Brasil, as escolas têm o dever de incluir em suas grades curriculares o ensino do Português e
as escolas brasileiras devem incluir o ensino do Espanhol.

200
Verifica-se a atitude negativa quando o interlocutor faz opção por falar outro idioma
como o árabe, o chinês, ou o guarani, línguas faladas por alguns comerciantes residentes nas
três fronteiras, mais especificamente no comércio de Ciudad del Este e alguns casos em Foz
do Iguaçu. Esses comerciantes fazem uso de outro idioma com seus subordinados para não
serem entendidos por seus clientes, ou, em outra situação social, para que os outros não o
compreendam, utilizam-se de outra variedade para excluir um dos interlocutores.
O português falado na zona das três fronteiras apresenta-se mesclado com outras
línguas, pois contém lexias e sotaques de outras variedades linguísticas do português
brasileiro, originárias de diferentes regiões do Brasil, e também, de falantes de outras línguas
que são originários de outros países que ali se fazem presentes. Este fato confirma a terceira
hipótese que admite que, por se tratar de um contexto plurilíngue, os falantes de português de
Puerto Iguazú e Ciudad del Este aproximam sua fala à do carioca, à do gaúcho ou à de outros
falantes de outra região do Brasil, que lá se tenha feito presente, principalmente durante a
construção da Hidrelétrica de Itaipu e nos últimos anos devido ao comércio de Ciudad del
Este em que muitas pessoas foram para a Tríplice Fronteira buscar melhores condições de
trabalho e remuneração. A presença de brasileiros de distintas regiões na fronteira acaba por
influenciar na fala do portunhol, que se apresenta com marcas linguísticas das diferentes
pessoas que lá residem. O português falado nesta área geográfica é completamente
heterogêneo. É possível identificar o falante das três fronteiras por apresentar uma fala com
nuances específicas, a fala é mesclada, apresenta características peculiares por causa do
contato linguístico com diferentes etnias, essas marcas linguísticas se destacam na fala dos
moradores locais que não apresentam uma fala homogênea.
A comprovação das hipóteses que orientaram a pesquisa, documentam as crenças e
atitudes de falantes do espanhol em relação ao português e vice-versa.

201
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo em vista tratar-se de um trabalho inserido no âmbito da Sociolinguística


variacionista, o objetivo geral foi identificar e analisar as crenças e atitudes linguísticas de
vinte e quatro informantes oriundos de Foz do Iguaçu, Ciudad del este e Puerto Iguazú.
Comprova-se o fato de que as três comunidades estudadas mantêm um intercâmbio
linguístico, isto é, são plurilíngues no sentido de conhecerem a língua falada pelo seu vizinho
e de se expressarem por meio dela, conforme observado durante as análises. Observa-se,
ainda, que as interinfluências das línguas em contato comprovam uma situação de diglossia
presenciada na Tríplice Fronteira, entre as três cidades que falam português e espanhol. A
interferência linguística de uma língua sobre a outra criou uma interlíngua conhecida por
portunhol, conforme exposto no decorrer desta tese.
As interinfluências das línguas em contato, geradas por seus falantes, são percebidas
em diversos níveis, de acordo com os depoimentos dos informantes durante as entrevistas
realizadas nas três localidades examinadas na seção que trata da análise dos dados. Segundo
Weinreich (1953, p. 1), os casos de desvio da norma de ambas as línguas, nos falantes
bilíngues, é resultado da familiaridade que os falantes têm com as línguas de que se utilizam.
Essa mistura linguística é resultado da combinação da estrutura gramatical de uma língua com
alguns vocábulos da outra.
Nos depoimentos dos inquiridos, sobre as línguas mais faladas na fronteira, constata-
se que os informantes de Foz do Iguaçu acreditam ser o espanhol e para os informantes de
Ciudade del Este e Puerto Iguazú é o português, indicam que se trata de uma região em que
ocorre a heterogeneidade linguística. Conforme referido várias vezes a Tríplice Fronteira é
uma região que apresenta diglossia, além do portunhol, foi registrado falantes do yopará e do
guaraportunhol, não pesquisadas neste estudo e que podem servir de insumo para outras
pesquisas na área da Sociolinguística.
Nota-se, ao olhar a Tríplice Fronteira, que é uma região miscigenada, integradora e
sincrética. Os movimentos históricos que mesclaram a região, as interinfluências das línguas
em contato, fazem hoje com que a receptividade e a absorção de traços linguísticos de outras
línguas não seja apenas tolerável, mas também indicadores necessários para o progresso
intelectual. As atitudes linguísticas dos informantes demonstram que não há a crença de
proteção linguística com medo de descaracterizar a sua forma. Há sempre de se pensar à
língua por meio de seus falantes, já que o contato linguístico se dá entre os falantes de

202
determinadas línguas.
As atitudes não se criam por si só, mas, ao contrário, são construídas historicamente,
ou seja, são elaboradas a partir de uma série de fatores que circundam o indivíduo: fatores
sociopolíticos, socioeconômicos, socioculturais e socioeducacionais.
Conforme visto na seção 4.1 que conceitua as crenças e atitudes linguísticas, constata-
se que as atitudes são formadas por um componente cognitivo, um afetivo e um
comportamental. De acordo com a análise dos dados é perceptível que a aceitação do
portunhol seja motivada tanto pelos estereótipos aplicados ao outro (fala misturada) quanto
pelos sentimentos adquiridos perante a própria língua e a língua do outro. Tudo isso foi
moldado ao longo dos anos, sendo, portanto, o resultado das interinfluências das línguas em
contato.
Apesar das falhas e limitações desta pesquisa, acredita-se, porém, ter alcançado os
pontos traçados nos objetivos da investigação, o que dá uma profunda satisfação frente aos
resultados obtidos após um longo processo de pesquisa, estudo, análise e reflexão.
Esse estudo fez compreender que todas as diferentes etapas do processo são muito
importantes. Na verdade, a pesquisa é concluída apenas em termos, para fins de tese. O
processo continua e reclama por novos estudos. Os resultados obtidos poderão ser retomados
para o prosseguimento do estudo em dimensões mais amplas, nas quais sejam contemplados
todos os aspectos implicados na análise das crenças e atitudes linguísticas. A quantidade de
insumo linguístico presente na Tríplice Fronteira é fonte inesgotável para a realização de
pesquisas na área da Sociolinguística.

203
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213
ANEXO A – Ficha do Informante

Projeto de tese: Crenças e Atitudes Linguísticas: Aspectos da


Realidade da Tríplice Fronteira
Ficha do Informante
(Aplicação da Ficha de Informante do Projeto ALiB)

DADOS PESSOAIS DO INFORMANTE


1. NOME: 2. ALCUNHA:

3. DATA DE NASCIMENTO: 4. SEXO: A. ( ) M B. () F 5. IDADE:

6. ENDEREÇO:

RUA e Nº:

BAIRRO:

CEP:
7. ESTADO CIVIL: A . ( ) solteiro B. ( ) casado C. ( ) viúvo D. ( ) outro

8. NATURALIDADE: 9. COM QUE IDADE CHEGOU A ESTA CIDADE? (CASO NÃO SEJA NATURAL
DA LOCALIDADE)

10. A. DOMICÍLIOS, ÉPOCA E TEMPO DE PERMANÊNCIA FORA DA LOCALIDADE:

B. MOTIVO DO(S) AFASTAMENTO(S)

11. ESCOLARIDADE: 12. OUTROS CURSOS:

A. ( ) especialização B. ( ) profissionalizante C. ( ) outros

13. NATURALIDADE: 14. FOI CRIADO PELOS PRÓPRIOS PAIS?

da mãe: A. sim B. não


15. EM CASO NEGATIVO, POR QUEM FOI CRIADO?
do pai:
NATURALIDADE:
do cônjuge:
A. da mãe adotiva:
B. do pai adotivo:

16. ONDE EXERCE SUA PROFISSÃO (CARACTERÍSTICAS SÓCIO-ECONÔMICAS SUMÁRIAS DO BAIRRO, CIDADE):

17. OUTRAS PROFISSÕES/OCUPAÇÕES: 18. PROFISSÃO:


A. do pai:
B. da mãe:
C. do cônjuge:
D. do informante:

RENDA

19. TIPO DE RENDA: A. ( ) individual B. ( ) familiar

CONTATO COM OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO

214
20. ASSISTE 21. PROGRAMAS PREFERIDOS: 22. TIPO DE
TV? A. ( ) novelas D. ( ) noticiários G. ( ) outro TRANSMISSÃO:
A. ( ) todos os ( ) rede gratuita
dias B. ( ) esportes E. ( ) programa religioso ( ) parabólica
B. ( ) às vezes C. ( ) programa de auditório F. ( ) filmes ( ) tv por assinatura
C. ( ) nunca
23. OUVE RÁDIO? 24. PROGRAMAS PREFERIDOS:
A.( ) todos D.( ) parte do dia G.( ) enquanto trabalha A.( ) noticiário geral D.( ) noticiário policial
os dias G. ( ) outro
B.( ) às E.( ) o dia inteiro H.( ) domingo à tarde B.( ) esportes E.( ) música
vezes
C.( ) nunca F.( ) enquanto viaja C.( ) programa religioso F.( ) programa com
participação do ouvinte
25. LÊ JORNAL?
A. ( ) todos os dias B. ( ) às vezes C. ( ) nunca D. ( ) semanalmente E. ( ) raramente
26. NOME DO(S) JORNAL(IS): Gazeta 27. SEÇÕES DO JORNAL QUE GOSTA DE LER:
A.( ) editorial D.( ) programa cultural G.( )
A. ( ) local B. ( ) estadual
classificados
C. ( ) nacional
B.( ) esportes E.( ) política H.( ) outra
C.( ) variedades F.( ) página policial

28. LÊ REVISTA? A.( ) às vezes B.( ) semanalmente C.( ) mensalmente D.( ) raramente E.( ) nunca

29. NOME/TIPO DE REVISTA: ____________________________________

PARTICIPAÇÃO EM DIVERSÕES

FREQUENTEMENTE ÀS VEZES RARAMENTE NUNCA


A.( ) B.( ) C. ( ) D. ( )
30. CINEMA
A. ( ) B. ( ) C. ( ) D. ( )
31. TEATRO
A. ( ) B. ( ) C. ( ) D. ( )
32. SHOWS
A. ( ) B. ( ) C. ( ) D. ( )
33. MAN.
FOLCLÓRICAS
A. ( ) B. ( ) C. ( ) D. ( )
34. FUTEBOL
A. ( ) B. ( ) C. ( ) D. ( )
35. OUTROS ESPORTES
A. ( ) B. ( ) C. ( ) D. ( )
36. OUTROS

37. QUE RELIGIÃO OU CULTO PRATICA?

215
PARA PREENCHIMENTO APÓS A ENTREVISTA

38. CARACTERÍSTICAS PSICOLÓGICAS DO INFORMANTE:

A. ( ) tímido B. ( ) vivo C. ( ) perspicaz D. ( ) sarcástico

39. ESPONTANEIDADE DA ELOCUÇÃO:

A. ( ) total B.( ) grande C. ( ) média D. ( ) fraca

40. POSTURA DO INFORMANTE DURANTE O INQUÉRITO:

A. ( ) cooperativa B. ( ) não cooperativa C. ( ) agressiva D. ( ) indiferente

41. CATEGORIA SOCIAL DO INFORMANTE:

A.( ) “A” B. ( ) “B” C.( ) “C” D. ( ) “D”

42. GRAU DE CONHECIMENTO ENTRE INFORMANTE E INQUIRIDOR:

A.( ) grande B.( ) médio C. ( ) pequeno D.( ) nenhum

43. INTERFERÊNCIA OCASIONAL DE CIRCUNSTANTES:

A. ( ) sim B.( ) não

44. CARACTERIZAÇÃO SUMÁRIA DO(S) CIRCUNSTANTE(S):

45. DADOS SOBRE A FAMÍLIA DO INFORMANTE:

46. AMBIENTE DO INQUÉRITO:

47. OBSERVAÇÕES:

48. NOME DOS INQUIRIDORES: 48. LOCAL DA ENTREVISTA: 49. DATA DA


ENTREVISTA:
INQ: CIDADE:
AUX: UF:
AUX2: 50. DURAÇÃO:
___________________________________________

216
ANEXO B – Questionário das Atitudes Linguísticas do Brasil com o Paraguai e com a
Argentina

1. Que língua você o(a) senhor (a) aprendeu na família?

2. Em que língua você o(a) senhor (a) mais fala? Por quê?

3. Em que língua você o(a) senhor (a) lê e escreve?

4. Pode-se reconhecer a origem de uma pessoa pelo seu jeito de falar? Cite exemplos?

5. Qual a língua mais utilizada na fronteira? Por quê? Em que ocasiões essa língua é mais
utilizada?

6. Em que ocasiões as pessoas brasileiras/ argentinas/ paraguaias falam espanhol/


castelhano/jopará/guarani/ português/árabe etc.? Por quê?

7. Quais as dificuldades linguísticas que você / o(a) senhor (a) encontra no uso da língua
falada na fronteira? Por quê?

8. No dia-a-dia, dizem que as pessoas misturam as línguas: ora falam espanhol ora
guarani ora português ora árabe. É verdade que isso acontece?

9. O que você / o(a) senhor (a) acha dessa mistura de línguas? É comum aqui as pessoas
dizerem as mesmas coisas em diferentes línguas para melhor se fazerem entender? Saberia dar
exemplos?

10. Você / o(a) senhor (a) acha importante essa pluralidade linguística na fronteira? Por
quê?

11. Onde você / o(a) senhor (a) convive mais frequentemente com essa realidade
linguística (as pessoas falando línguas diferentes em diferentes ocasiões?) na família, na
escola (colega/colegas, professor/alunos), no trabalho (relação com clientes, no convívio
patrão/empregado), no comércio, quando vai as compras, na igreja, nas relações de amizade.

12. Que língua(s) deve(m) ser mais usada(s) para se ter sucesso na fronteira? Por quê?

13. contratação de empregados, por exemplo, os patrões dão preferência a candidatos que
saibam se comunicar mais em que línguas?

14. É possível que seja julgado melhor pela(s) língua(s) que fala do que pela inteligência?

217
15. Para você / o(a) senhor (a) quem fala melhor o idioma: As mulheres ou os homens?
Por quê?

16. No seu trabalho, é preciso escolher um jeito e uma língua diferente para lidar com
cada pessoa? Como? Por quê?

17. Uma pessoa que tem bastante instrução fala melhor que uma pessoa que tem pouca ou
nenhuma instrução escolar?

18. Se você/ o(a) senhor (a) tivesse que escolher entre os diferentes falares na fronteira,
na sua opinião quem fala melhor e por quê?

218
ANEXO C – Temas para discursos semi-dirigidos

1. Relate um acontecimento marcante em sua vida (casamento, namoro, profissão...)

2. De que programa de televisão você / o(a) senhor (a) mais gosta? Por quê?

3. Você / o(a) senhor (a) trabalha em quê? Fale um pouco sobre seu trabalho.

4. Conte um caso/ um fato de seu conhecimento (de que tenha ouvido falar, que tenha
acontecido com um amigo, etc.)

219
ANEXO D – Texto para Leitura

PARÁBOLA DOS SETE VIMES

Era uma vez um pai que tinha sete filhos. Quando estava para morrer, chamou-os a todos e,
depois de ter olhado inquieto e tristemente para o céu, disse-lhes:
– Já não tendes mãe e eu sei que não posso durar muito; mas antes de morrer, desejo que cada
um de vós me vá buscar, no Campo do Moinho, um vime seco.
– Eu também? Perguntou o mais novo – um garoto esbelto de quatro anos que estava,
inocentemente, brincando ao sol com duas moedas num velho chapéu de feltro.
– Tu também, Tiago.
Quando os filhos voltaram com os vimes, o pai pediu ao menor deles:
– Quebra esse vime.
Ao ouvir isto, o pequeno partiu o vime sem nada lhe custar.
– Agora parte os outros, um a um.
O menino obedeceu.
– Trazei-me, todos, outro vime! Tornou o pai, logo que viu o menino partir o último sem
dificuldade alguma.
Quando os rapazes apareceram de novo, enfeixou os sete vimes soltos, atando-os com o fio.
– Toma este feixe, Paulo. Parte-o! ordenou o pai ao filho mais velho – o homem mais valente
da cidade.
Vendo que já lhe doíam as mãos de tanto se esforçar por partir o feixe, acrescentou:
– Não foste capaz! O osso é duro de roer!...
– Não, senhor, não fui, e já me doem as mãos, respondeu o moço.
Todos os outros tentaram em vão.
– Se fossem mil vimes em vez de sete, pior seria, exclamou o pai. Quer sejam vimes ou
corações, lembrai-vos sempre que a união faz a força. Se estiverdes sempre unidos, ninguém vos fará
mal.
Ao acabar de dizer isto, morreu. Fiéis ao bom conselho paterno, até ao fim da vida, foram
sempre felizes e fortes como leões, os sete irmãos desta história.

(TRINDADE COELHO. Os meus amores. Apud LACERDA, A. de, HAMMARSTRÖM, G. Transcrição


fonética do português normal. Coimbra: [s.n.], . p. 27-28. Texto com adaptações. Fonte: COMITÊ NACIONAL
DO PROJETO ALIB, Atlas Linguístico do Brasil. Questionários 2001. Londrina: UEL, 2001. p. 47).

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