6 Execucao de Medidas Socioeducativas 29
6 Execucao de Medidas Socioeducativas 29
6 Execucao de Medidas Socioeducativas 29
1 INTRODUÇÃO:................................................................................................................................3
2 EXECUÇÃO PENAL X EXECUÇÃO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS...................................................4
3 O QUE É O SINASE?.........................................................................................................................8
4 COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO.........................................................................................9
5 COGNIÇÃO DO JUÍZO DA EXECUÇÃO...............................................................................................9
6 PRINCÍPIOS GERAIS APLICÁVEIS À EXECUÇÃO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS (ART. 35 DA LEI
N.º 12.594/2012)..................................................................................................................................11
7 ENTIDADES DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO EM MEIO FECHADO, NUMERUS CLAUSUS E
SUPERLOTAÇÃO CONFORME O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL:............................................................14
8 O PLANO INDIVIDUAL DE ATENDIMENTO: ELABORAÇÃO E EXECUÇÃO..........................................15
9 O INCIDENTE DE REAVALIAÇÃO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS..................................................18
10 O ATINGIMENTO DA MAIORIDADE E A EXECUÇÃO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS.................21
11 A UNIFICAÇÃO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS.......................................................................24
12 AS INFRAÇÕES DISCIPLINARES E SUA REPERCUSSÃO NA EXECUÇÃO..........................................27
13 O ATENDIMENTO À SAÚDE DO EXECUTADO COM TRANSTORNO OU DOENÇA MENTAL.............28
14 DISPOSITIVOS PARA CICLOS DE LEGISLAÇÃO..............................................................................29
15 BIBLIOGRAFIA UTILIZADA..........................................................................................................29
ATUALIZADO EM 26/02/20231
1 INTRODUÇÃO:
a) Deve-se ter conhecimento da execução penal comum. Para quê? Para não usar os seus paradigmas
aqui, exceto para servir de limite de tratamento (o adolescente ou jovem executados não pode receber
tratamento pior do que aquele dado ao adulto em cumprimento de pena- Princípio da legalidade, previsto
no art. 35, inciso I, da SINASE);
b) Deve-se compreender o ECA e a Lei n.º 12.594/2012 (SINASE) como um microssistema de proteção
do adolescente e do jovem que cumprem uma MSE. Diversos conceitos e conclusões demandam idas e
vindas entre uma lei e outra;
c) Deve-se compreender que o eixo da execução não está no ato infracional praticado, no tempo de
duração da medida, nem no “bom comportamento” do adolescente, mas na elaboração e na execução do
Plano Individual de Atendimento, o famoso “PIA”.
Abaixo, segue uma listinha de itens que você pode usar como checklist, para saber como está a sua
intimidade com a execução de medidas socioeducativas.
1
As FUCS são constantemente atualizadas e aperfeiçoadas pela nossa equipe. Por isso, mantemos um canal aberto de
diálogo ([email protected]) com os alunos da #famíliaciclos, onde críticas, sugestões e equívocos,
porventura identificados no material, são muito bem-vindos. Obs1. Solicitamos que o e-mail enviado contenha o título
do material e o número da página para melhor identificação do assunto tratado. Obs2. O canal não se destina a tirar
dúvidas jurídicas acerca do conteúdo abordado nos materiais, mas tão somente para que o aluno reporte à equipe
quaisquer dos eventos anteriormente citados.
6) As entidades de atendimento socioeducativo, o princípio do numerus clausus e a superlotação;
7) O Plano Individual de Atendimento: elaboração e execução;
8) O incidente de reavaliação de medidas socioeducativas;
9) A internação-sanção como resultado possível da reavaliação;
10) O atingimento da maioridade e a execução de medidas socioeducativas;
11) A unificação de medidas socioeducativas;
12) As infrações disciplinares e sua repercussão na execução;
13) O atendimento à saúde do adolescente executado com transtorno ou doença mental.
As principais diferenças entre a execução de uma sanção criminal por ato cometido por adultos
(imputáveis, portanto) da execução de medidas socioeducativas devem ser compreendidas. Vejamos:
Finalidades distintas: em primeiro lugar, é preciso distinguir as finalidades das penas das finalidades
das medidas socioeducativas. Ignoradas, para esse efeito, as diversas teorias da pena, o Código Penal
estabelece, no seu art. 59, os objetivos de prevenção e de reprovação do crime. As medidas socioeducativas,
por sua vez, têm sua finalidade estabelecida no art. 1º, § 2º, da Lei n.º 12.594/2012: a responsabilização e a
integração do adolescente ou jovem (incisos I e II) e a desaprovação da conduta infracional.
A finalidade pedagógica não é somente educacional, pois a compreensão do conflito com a lei que a
conduta do adolescente ou jovem acarreta depende, também, de atendimento psicossocial especializado.
Nas entidades de atendimento que executam internação e semiliberdade, uma equipe de referência é
designada para cada adolescente, com atendimentos regulares.
#IMPORTANTE: Sobre a dualidade finalidade punitiva x finalidade pedagógica, é preciso que se evite a
supervalorização da segunda, por mais contra intuitiva que seja essa proposição. Ao se considerar que a
medida socioeducativa é um “bem” ao adolescente ou jovem, diversas restrições de direitos são justificadas,
inclusive a privação da sua liberdade, por um discurso de “proteção”. Seguir por essa linha acarreta,
inevitavelmente, a ressurreição da doutrina da situação irregular, pois direitos individuais do adolescente ou
jovem são desconsiderados em favor de uma intervenção estatal que o objetifica. A finalidade pedagógica é,
sim, importante, mas não é preponderante, tampouco sustenta, sozinha, a manutenção de uma medida
socioeducativa, sob pena de subversão do princípio da proteção integral e da prioridade absoluta em
prejuízo daqueles que deveria beneficiar.
Como se estudará adiante, o grande eixo da execução das medidas socioeducativas é o PIA. Uma vez
atingidas as metas do PIA da internação, nada mais justifica a continuidade da privação da liberdade do
adolescente, tampouco a substituição por outra medida. O art. 46, II, da Lei n.º 12.594/2012 é claro: a
medida socioeducativa será declarada extinta pela realização de sua finalidade. Há casos Brasil afora em que,
atingidas as metas do PIA da internação, o juiz “concede” (olha que presentão!) “progressão” para o
“regime” de liberdade assistida. Em outros casos, a situação é pior: substitui-se a internação pela
semiliberdade.
Inexistência de “progressão” e “regressão” 2: a mesma razão que diferencia as medidas
socioeducativas listadas acima dos regimes prisionais é aquela que justifica a inexistência de progressão e de
regressão no sistema socioeducativo.
Bom, mas, se não há progressão e regressão, o que acontece quando um adolescente sai da liberdade
assistida e vai para a internação? Acontece, tecnicamente, uma reavaliação de medida socioeducativa que
culmina com a decretação da internação-sanção.
#RECORDARÉVIVER: Sabe-se que é cabível a internação, conforme o art. 122 do ECA, apenas em três casos:
(i) Para o adolescente ou jovem que pratica ato infracional com violência ou grave ameaça;
(ii) Para aquele que está em reiteração de atos infracionais graves; e
(iii) Para aquele que descumpriu reiterada e injustificadamente medida anteriormente imposta.
Se não há regressão, também não há progressão. Como vimos, atingida a finalidade socioeducativa da
medida, extingue-se o processo. A substituição por medida socioeducativa mais branda não é uma “benesse”
ao adolescente. Pelo contrário, é o reconhecimento de que ele não atingiu integralmente a finalidade da
medida, mas o conteúdo socioeducativo remanescente não justifica a manutenção da medida em curso.
#DEFENSORIAPÚBLICA: Esse é o fundamento da Tese Institucional n.º 119 da DPE-SP: “A Lei n.º 12.594/2012
não estabelece um sistema progressivo de cumprimento de medidas socioeducativas, somente podendo as
mais gravosas ser substituídas por medidas mais brandas, em vez de determinar-se a extinção do processo
de execução, quando as metas do Plano Individual de Atendimento não forem integralmente atingidas
durante o prazo máximo de reavaliação, por conduta atribuível ao adolescente, e a finalidade socioeducativa
remanescente estiver devidamente caracterizada no relatório conclusivo da entidade de atendimento”.
2
Ué, mas eu sempre ouvi falar de progressão e de regressão... Tem até súmula do STJ... Meu caro ou minha cara, o STJ,
na Súmula 265 (“é necessária a oitiva do menor infrator antes de decretar-se a regressão da medida socioeducativa”)
consegue, numa tacada só, chamar adolescente de “menor infrator” e substituição de medida socioeducativa por outra
mais gravosa de “regressão”.
#DEOLHONAJURISPRUDÊNCIA: Imagine que determinado adolescente cumpre medida socioeducativa de
internação. Após seis meses de cumprimento, o parecer psicossocial apresentado pela equipe técnica
manifesta-se favoravelmente à “progressão” para o regime de semiliberdade. O juiz pode decidir de forma
contrária ao parecer e manter a internação? SIM. O parecer psicossocial não possui caráter vinculante e
representa apenas um elemento informativo para auxiliar o magistrado na avaliação da medida
socioeducativa mais adequada a ser aplicada. A partir dos fatos contidos nos autos, o juiz pode decidir
contrariamente ao laudo com base no princípio do livre convencimento motivado. STF. 1ª Turma. RHC
126205/PE, rel. Min. Rosa Weber, julgado em 24/3/2015 (Info 779).
3 O QUE É O SINASE?
O SINASE deve ser compreendido como política pública ou feixe de políticas públicas
multidisciplinares.
A definição do SINASE está na Resolução n.º 119/2006 do CONANDA: trata-se um “conjunto ordenado
de princípios, regras e critérios, de caráter jurídico, político, pedagógico, financeiro e administrativo, que
envolve desde o processo de apuração de ato infracional até a execução de medida socioeducativa”.
Ainda de acordo com o documento do CONANDA, esse sistema nacional “inclui os sistemas estaduais,
distrital e municipais, bem como todos as políticas, planos, e programas específicos de atenção a esse
público”. Em outras palavras, o SINASE engloba um feixe de políticas públicas que vão além do mero âmbito
de limitação jurídica da execução de MSE.
#CASCADEBANANA: O SINASE não se resume ao âmbito jurídico, pois o seu documento (o anexo da
Resolução n.º 119/2006 do CONANDA) engloba conhecimentos políticos, pedagógicos, financeiros e
administrativos aplicáveis tanto às entidades de atendimento socioeducativo quando aos órgãos gestores e
executores dos planos e políticas públicas específicos ao público a que se destina (no caso, adolescentes e
jovens em conflito com a lei e suas famílias). Todo órgão que planeje, faça gestão ou execute plano,
programa ou política pública destinada ao atendimento de adolescentes e jovens em conflito com a lei e suas
famílias integram o SINASE.
A atuação de órgãos mais abrangentes do que essa delimitação só está vinculada ao SINASE no que diz
respeito aos planos, programas e políticas específicas. Por exemplo, o CREAS pode atuar na contenção de
uma “condicionalidade negativa” que o adolescente/jovem e sua família estejam atravessando, ligada à
prática do ato infracional. Apesar disso, a atuação do CREAS é mais ampla do que o atendimento a esse
público; quando atua para executar alguma providência destinada àquele público ou para executar algum
plano, programa ou política pública ligada ao Plano Municipal de Atendimento Socioeducativo, está
vinculado ao SINASE.
Sabe-se que a divisão entre conhecimento e execução pode implicar atribuição de competências
jurisdicionais distintas. Essas competências têm natureza absoluta, porque são uma manifestação de
atribuição de competência funcional. A divisão de funções ocorre, nesse caso, entre a realização da
apuração do ato infracional e a execução da medida socioeducativa aplicada. Acerca da apuração do fato e
aplicação da medida, a competência é atribuída ao juízo do processo de conhecimento; ao juízo executivo,
obviamente, é dada a competência para a execução do julgado. Parece simples?
Deveria ser, mas sempre há formas oblíquas de se violarem essas regras de fixação de competência.
Por meio, por exemplo, do uso de elementos valorados no processo de apuração de ato infracional como
fundamento para a manutenção da medida socioeducativa na reavaliação. Alguns elementos a lei exclui
expressamente, como aqueles previstos no art. 42, § 2º, da Lei n.º 12.594/2012: “a gravidade do ato
infracional, os antecedentes e o tempo de duração da medida não são fatores que, por si, justifiquem a não
substituição da medida por outra menos grave”.
Quando o juízo da execução utiliza elementos referentes à gravidade do fato e aos antecedentes do
adolescente ou jovem, ele, além de violar a competência funcional do juízo do processo de conhecimento,
ofende, também, a coisa julgada e incorre em bis in idem, já que tais fatos já foram ou pelo menos
deveriam ter sido valorados na fase de conhecimento, não cabendo tal análise na reavaliação das MSEs.
Como regra, apenas o Plano Individual de Atendimento (arts. 54 e 55 da Lei n.º 12.594/2012), que é o
eixo principal da execução. Para a reavaliação, especificamente, a cognição se refere às metas pactuadas
entre adolescente e entidade de atendimento e ao seu atingimento pelo executado. O juiz não pode
fundamentar a manutenção da medida, por exemplo, em elementos externos ao plano.
#SELIGA Outro elemento que está dentro dos limites da cognição do juízo da execução é a aplicação do art.
49, II, da Lei n.º 12.594/2012, que estabelece como direito do executado a sua inserção em medida em meio
aberto, se for condenado a medida privativa de liberdade por ato infracional praticado sem violência ou
grave ameaça e não houver, no seu domicílio entidade de atendimento socioeducativo que execute a medida
mais gravosa. Como sabemos, o STJ anda negando vigência àquele dispositivo, relativizando-o.
#DEOLHONAJURISPRUDÊNCIA:
A Lei nº 12.594/2012 (Lei do SINASE) prevê que é direito do adolescente submetido ao cumprimento de
medida socioeducativa "ser incluído em programa de meio aberto quando inexistir vaga para o cumprimento
de medida de privação da liberdade, exceto nos casos de ato infracional cometido mediante grave ameaça
ou violência à pessoa, quando o adolescente deverá ser internado em Unidade mais próxima de seu local de
residência". O simples fato de não haver vaga para o cumprimento de medida de privação da liberdade em
unidade próxima da residência do adolescente infrator não impõe a sua inclusão em programa de meio
aberto, devendo-se considerar o que foi verificado durante o processo de apuração da prática do ato
infracional, bem como os relatórios técnicos profissionais. A regra prevista no art. 49, II, do SINASE deve ser
aplicada de acordo com o caso concreto, observando-se as situações específicas do adolescente, do ato
infracional praticado, bem como do relatório técnico e/ou plano individual de atendimento. STJ, julgado em
17/12/2015 (Info 576).
Além do art. 49, II, dois outros dispositivos, claramente, se submetem à cognição do juízo da execução:
a unificação de medidas socioeducativas (art. 45) e a extinção da execução (que não é automática) pela
existência de processo criminal em curso contra o executado (Art. 46).
LEGALIDADE (art. 35, I, da Lei n.º 12.594/2012): a legalidade na execução de MSE tem dois limites
claros: um é aquele previsto constitucionalmente para as penas, que dependem de cominação legal
(art. 5º, XXXIX, da CRFB), e o outro é explicitado de forma direta no próprio inciso I do art. 35, a
impossibilidade de imposição ao adolescente ou jovem de tratamento mais gravoso do que aquele
destinado à pessoa adulta. O regramento da LEP, apesar das enormes diferenças de finalidade e de
regimes, acaba servindo como limite extremo: se nem mesmo a um preso adulto permite-se uma
situação específica, ao adolescente ou jovem, a proibição se estende.
EXCEPCIONALIDADE DA INTERVENÇÃO JUDICIAL (art. 35, II): trata-se de um princípio que extrapola
os limites da execução de MSE e reforça o caráter de microssistema da Lei n.º 12.594/2012 em
conjunto com o ECA e demais leis esparsas. O inciso II determina a excepcionalidade da intervenção
judicial e da imposição de medidas. Ao se referir à imposição, o comando do dispositivo se dirige ao
juízo do processo de conhecimento, que deve observar a subsidiariedade da intervenção
socioeducativa.
Todos nós conhecemos a previsão do art. 122, § 2º, do ECA (“em nenhuma hipótese será aplicada a
internação, havendo outra medida adequada”), o qual estabelece a subsidiariedade da internação em
relação às demais medidas socioeducativas, mas o art. 35, II, da Lei n.º 12.594/2012 vai além, pois se aplica a
qualquer medida.
PRIMAZIA DA JUSTIÇA RESTAURATIVA (art. 35, III): outro dispositivo direcionado ao juízo do
processo de conhecimento, mas ainda engatinhando na prática. A justiça restaurativa,
processualmente, deve conduzir à remissão, com ou sem medida socioeducativa (quando aplicada,
dirigida à reparação do dano).
#OLHAOGANCHO: Justiça Restaurativa. Trata-se de uma nova perspectiva, oposta à ideia de Justiça
Retributiva (retribuir o mal com outro mal), fundada basicamente na restauração do mal provocado pela
infração penal. A Justiça Restaurativa se materializa através de conjuntos heterogêneos de iniciativas que
visam criar um espaço de comunicação entre a vítima e o ofensor, como forma de buscar a reparação do
delito e seus efeitos psicológicos e materiais, ou seja, visa uma reparação simbólica que vai além da
dimensão meramente pecuniária. Ex.: em crimes contra a honra, um pedido público de desculpas. Essa
vertente parte da seguinte premissa: o crime e a contravenção penal não necessariamente lesam interesses
do Estado, difusos e indisponíveis. Tutela-se com maior intensidade a figura da vítima, historicamente
relegada a um segundo plano no Direito Penal, que sempre se direcionou ao criminoso e à punição como
resposta à sociedade. Dessa forma, relativizam-se os interesses públicos e indisponíveis, advindos com a
prática da infração penal, que de difusos passam a ser tratados como individuais, e, consequentemente,
disponíveis.
A partir daí, o litígio – antes entre a justiça pública e o responsável pelo ilícito penal – passa a ter como
protagonistas o ofensor e o ofendido, e a punição deixa de ser o objetivo imediato da atuação do Direito
Penal. Surge a possibilidade de conciliação entre os envolvidos (autor, coautor ou partícipe e vítima),
mitigando-se a persecução penal, uma vez que não é mais obrigatório o exercício da ação penal. Como
resultado, a justiça restaurativa pode acarretar em perdão recíproco entre os envolvidos, bem como em
reparação à vítima, em dinheiro ou até mesmo com prestação de serviços em geral, a ela
ou à sociedade. Seu foco principal é a assistência à vítima.
Ora, para legitimar a aplicação dos meios de Justiça Restaurativa, é necessária a observância de alguns
requisitos, que têm como objetivo impedir arbitrariedades em desfavor da vítima ou do próprio ofensor:
(i) consentimento válido das partes, que podem desistir a qualquer momento;
(ii) o agressor deve reconhecer a prática do delito;
(iii) pode ocorrer a qualquer momento (desde a investigação até o trânsito em julgado);
(iv) confidencialidade;
(v) o reconhecimento da responsabilidade penal pelo ofensor não pode ser usado contra ele em eventual
processo criminal;
vi)o descumprimento do acordo pelo ofensor não pode ser usado como argumento de acusação a fim de
buscar uma punição mais severa em eventual ação criminal ajuizada.
#OBS: A Justiça Restaurativa embasa-se nos chamados três “R”: restauração, responsabilização e
reintegração (não são os três “R” do CiclosR3 ).
#OBS: Os principais institutos reveladores da Justiça Restaurativa são: Composição dos danos civis, Transação
penal, Suspensão condicional do processo, Suspensão condicional da pena, Possibilidade de fixação de
indenização mínima pelo juiz na sentença, Lei 9.807/99: lei de proteção a vítimas e testemunhas, Medidas de
Proteção da Lei Maria da Penha, Ampliação da participação do assistente de acusação.
NÃO DISCRIMINAÇÃO (art. 35, VIII): trata-se de princípio com implicações mais amplas do que se
imagina à primeira vista. Primeiramente, ele tem a função de impedir a imposição de tratamento
privilegiado a “favoritos” ou “amigos do rei” e de “perseguições” a adolescente ou jovem
determinado. Ele também impede a estigmatização de executados pertencentes a minorias (ex.:
homossexuais, pessoas com deficiência, etc.) no atendimento realizado pela entidade.
FORTALECIMENTO DOS VÍNCULOS FAMILIARES (art. 35, IX): esse é um fundamento que permeia
todo o Direito da Criança e do Adolescente, e, na execução de MSE, manifesta-se nos incisos IV e V
do art. 54 da Lei n.º 12.594/2012. O art. 54 é aquele que estabelece os requisitos do PIA e, naqueles
dois incisos, atribui-se à família um papel parcial na elaboração do plano, em duas vertentes.
A primeira (inciso IV) refere-se “às atividades de integração e apoio à família” e diz respeito ao
atendimento dirigido à família para suprimento de necessidades ligadas, direta ou indiretamente, ao
processo socioeducativo. Por exemplo, se o adolescente ou jovem está internado em uma entidade fora do
seu domicílio, é necessária a previsão no PIA do custeio do transporte dos familiares para a visitação,
quando há autonomia da entidade para a gestão dessa verba, ou a previsão de acionamento da rede
socioassistencial do Município de origem da família, para a mesma finalidade. A segunda (inciso V) diz
respeito às “formas de participação da família para efetivo cumprimento do plano individual”. A família,
nesse inciso, é parceira necessária para que o adolescente ou jovem tenha maiores chances de atingir as
finalidades socioeducativas da medida.
*#DEOLHONAJURIS #DIZERODIREITO #STJ: A Defensoria Pública pode ter acesso aos autos de procedimento
verificatório instaurado para inspeção judicial e atividade correicional de unidade de execução de medidas
socioeducativas. STJ. 6ª Turma. RMS 52.271-SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 19/06/2018 (Info 629).
#DEFENSORIAS
O conteúdo do ato normativo foi objeto de Procedimento de Controle Administrativo no CNJ, que
anulou, em julgado relatado por Herman Benjamin, o artigo que tratava da extrapolação da capacidade
nominal. De ofício, anulou, também, o art. 6º, que estabelece a competência do Poder Executivo para gerir a
ocupação das unidades de medidas socioeducativas, inclusive com enfrentamento das questões relativas à
garantia da lotação ideal desses estabelecimentos. Para o CNJ, a gestão deveria ser atribuída ao juízo caso a
caso.
O TJ-SP impetrou mandado de segurança ao STF (MS 31.902), para obter anulação da decisão do CNJ
(obviamente, na parte referente aos 15%...), mas, no mérito, o STF reconheceu a ilegalidade da decisão do
CNJ apenas em relação à anulação do art. 6º, restabelecendo ao Poder Executivo a gestão das vagas. Não
anulou a decisão no que se refere ao art. 7º, o artigo polêmico, porque também não cabe ao Poder
Judiciário autorizar superlotação em matéria administrativa que não é da sua competência. Em termos
práticos: deve prevalecer o limite nominal e as violações de direitos decorrentes da superlotação são de
responsabilidade do Poder Executivo, que é quem gere as vagas.
Como já antecipado acima, o PIA é um dos elementos que tornam a execução de MSE bastante
diferente da execução de penas, em razão da previsão legislativa de atendimento individualizado
multidisciplinar. A pessoa condenada a pena privativa de liberdade, especialmente numa unidade prisional
superlotada, é apenas um número dentre tantas outras pessoas em condições similares. Em algumas
situações é impossível a realização de atendimento realmente individualizado a cada preso, exceto a
individualização dos processos de execução penal na vara competente.
A execução de MSE é completamente diferente nesse aspecto: cada adolescente ou jovem é atendido
de forma individualizada (pelo menos, no papel!), para que as finalidades da medida sejam atingidas de
acordo com as potencialidades e as fragilidades de cada executado.
É por essa razão que o art. 42, § 2º, exclui da apreciação do juiz, na reavaliação, a gravidade do fato,
os antecedentes e o tempo de duração da medida.
O PIA também é uma garantia para o adolescente ou jovem, porque ele participa ativamente do
processo de elaboração e, uma vez confeccionado o plano, o executado sabe exatamente o que precisa
atingir, para que tenha a sua medida extinta. Obviamente, isso somente ocorrerá, se o PIA for elaborado
adequadamente, porque, quando ele estabelece metas vagas ou genéricas, por mais angelical que seja o
executado, sempre haverá possibilidade de se sustentarem, discursivamente, motivos para a manutenção da
medida.
- REQUISITOS ESSENCIAIS DO PIA: Estão previstos nos arts. 54 e 55 da Lei n.º 12.594/2012:
Art. 55. Para o cumprimento das medidas de semiliberdade ou de internação, o plano individual conterá,
ainda:
I - a designação do programa de atendimento mais adequado para o cumprimento da medida;
II - a definição das atividades internas e externas, individuais ou coletivas, das quais o adolescente poderá
participar; e
III - a fixação das metas para o alcance de desenvolvimento de atividades externas.
Parágrafo único. O PIA será elaborado no prazo de até 45 (quarenta e cinco) dias da data do ingresso do
adolescente no programa de atendimento.
- Os resultados da avaliação interdisciplinar costumam consistir na análise do caso sob o ponto de vista
dos profissionais de psicologia, de serviço social, de saúde e do agente de apoio socioeducativo (no caso de
internação e semiliberdade).
- As atividades de integração social e/ou capacitação profissional também são direcionadas a partir da
avaliação e dos objetivos declarados pelo executado e têm relação direta com a finalidade socioeducativa
prevista no art. 1º, § 2º, II, da Lei n.º 12.594/212.
- As medidas específicas de atenção à saúde dizem respeito às demandas habituais que o adolescente
ou jovem apresenta e que demandam atendimento especializado além do simples acompanhamento pelo
setor de enfermaria da entidade (no caso de internação e semiliberdade). Em caso de necessidade de
acionamento da rede de saúde (inclusive a rede de saúde mental, por meio do CAPS), é nessa seção do plano
que se delineiam as possíveis ações de atendimento. A responsabilidade pelo acionamento dos órgãos de
saúde é da entidade de atendimento, que, para a construção do PIA, deve solicitar diretamente as
providências (com ou sem auxílio do Conselho Tutelar, que tem poder de requisição). Quando houver
negativa de atendimento, é dever da entidade levar a informação ao juízo, para que a medida de atenção à
saúde pendente seja efetivada coercitivamente.
#IMPORTANTE: Quando um ou mais requisitos estão em falta (exemplo mais comum: ausência de previsão
de atividades externas no PIA da internação), deve-se requerer, no PRAZO DE TRÊS DIAS a contar da
abertura de vista do plano, pedido de complementação. Se o requisito estiver presente, mas mal elaborado,
como no caso de metas genéricas, deve-se impugnar o PIA (art. 41, caput, e § 2º).
Ainda sobre as metas: elas, mesmo que passíveis de avaliação quantitativa e qualitativa e mesmo que
vinculadas a programas executados na entidade de atendimento, devem ser passíveis de atingimento
dentro do prazo máximo semestral.
A reavaliação de MSE é o momento mais esperado pelo adolescente ou jovem vinculado à execução. É
por meio desse incidente que se verificam o atingimento das metas do plano e as demais causas de pedir da
reavaliação previstas nos incisos do art. 43, § 1º, da Lei n.º 12.594/2012:
Na execução de MSE, apesar disso, há cognição judicial, ainda que direcionada a elementos bastante
diferentes daqueles apresentados ao juízo no processo de conhecimento. Essa cognição se direciona,
principalmente, à verificação da integridade do PIA e ao seu desenvolvimento. Perceba que são fatos
completamente diferentes daqueles do processo de conhecimento: a formulação das metas do plano, em
construção dialogal entre executado, entidade de atendimento e família do adolescente ou jovem; o
atendimento à família; as medidas específicas de atenção à saúde; o cumprimento pelo executado das metas
pactuadas. Sobre essa cognição, incidem o favor rei e o in dubio pro reo, como veremos adiante – afinal, não
foi sobre esses fatos que cessou a presunção de inocência do adolescente ou jovem internado.
#ATENÇÃO: Apesar de o § 1º mencionar “entre outros motivos”, deve-se considerar que os incisos II e III são
os únicos fundamentos para que se requeira a reavaliação em desfavor do adolescente ou jovem. Por quê?
Porque eles esgotam as possibilidades de abordagem do descumprimento das metas do plano, as quais,
como vimos, são os únicos elementos que vinculam o adolescente à medida.
A manutenção da medida somente pode ocorrer, quando houver descumprimento considerável das
metas do plano decorrente de conduta voluntária do adolescente ou jovem em não realizar as ações
propostas. A não realização de alguma das atividades (ex.: conclusão de curso profissionalizante de padeiro)
pelo seu não oferecimento temporário na entidade de atendimento é fundamento inidôneo para a
manutenção da medida.
Existem descumprimentos de PIAs que vão além da manutenção da medida; quando a MSE em
execução é de semiliberdade ou de liberdade assistida, existe a possibilidade de a reavaliação culminar com a
decretação de internação-sanção (art. 122, III, do ECA), caso haja descumprimento completo e voluntário da
medida.
Se o cumprimento suficiente da medida é verificado antes do prazo máximo de seis meses, qualquer
dos legitimados pode requerer a reavaliação em favor do adolescente ou jovem.
Ele se inicia com a promoção de reavaliação, cujos legitimados são, segundo o art. 43, caput, a direção
do programa de atendimento, o defensor, o Ministério Público, o adolescente/jovem, e seus pais ou
responsável.
A promoção deverá se fundar numa das causas de pedir mencionadas anteriormente e, em qualquer
caso, deve ser apresentada dentro do prazo máximo semestral, o qual, conforme o art. 14 da Resolução n.º
165/2012 do CNJ, é contado desde a apreensão do executado ainda na fase pré-processual. Essa contagem
de prazo é um equivalente, no sistema socioeducativo, da detração.
A natureza jurídica da reavaliação é a de incidente processual cognitivo, que recai sobre fatos
desenvolvidos após o início do cumprimento da medida, referentes à execução do plano (portanto, não são
fatos sobre os quais há a certeza da culpabilidade).
Dessa forma, há que se reconhecer a incidência do princípio do favor rei e do subprincípio do in dubio
pro reo na reavaliação: não é o adolescente quem deve provar que atingiu as metas do plano – os
legitimados para promover a reavaliação em desfavor do adolescente são os sujeitos sobre quem recai o
ônus de prova sobre o atingimento da finalidade socioeducativa.
#SELIGA: Ressalta-se que a Resolução n.º 165/2012 do CNJ autoriza a reavaliação extemporânea (art. 14,
parágrafo único: “Independentemente do escoamento do prazo previsto no caput, a reavaliação pode ser
processada imediatamente após a remessa do relatório enviado pela unidade de internação ou
semiliberdade, ou serviço que execute a medida socioeducativa de liberdade assistida.”).
Em um primeiro momento, você pode pensar que tudo está resolvido com a possibilidade prevista no
ECA de execução de MSE até os vinte e um anos de idade.
A Lei do Sinase (Lei 12.594, de 2012) foi peremptória ao determinar, como causa obrigatória de
extinção da medida socioeducativa, o início de execução de pena em regime fechado ou semiaberto (artigo
46, inciso III) ou, facultativamente, quando o jovem adulto estiver a responder processo penal (parágrafo
primeiro).
Após haver meditado melhor sobre a matéria, passei a entender que a aplicação de medidas socioeducativas
ao jovem adulto, conquanto admissível [e nesse sentido não divirjo da jurisprudência], deve ser vista
sempre cum modus in rebus, atentando-se para as peculiaridades do caso concreto.
Com efeito, a interpretação sistemática e teleológica dos dispositivos do ECA [sempre atendendo-se aos fins
sociais a que a lei se dirige, consoante diretriz exegética inserta na norma do artigo 5º do Decreto-lei nº
4.657, de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro)] possibilita a ilação de que a
superveniência da maioridade torna juridicamente inviável a homologação de remissão cumulada com
medidas em meio aberto, seja como forma de exclusão, seja como forma de extinção do processo.
Com efeito, o já mencionado artigo 2º, parágrafo único do Estatuto encontra-se vazado nos seguintes
termos: Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos,
e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre
dezoito e vinte e um anos de idade.
3
Reflexão retirada do seguinte artigo: https://www.conjur.com.br/2016-fev-09/pedro-lopes-medida-socioeducativa-
jovem-adulto-peculiaridades
Repito: o pleonasmo é de lege lata e é eloquente, devendo balizar a aplicação das normas estatutárias pelo
julgador. No título específico dedicado à prática de ato infracional, o legislador, uma vez mais, foi explícito:
Art. 104. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei.
Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do adolescente à data do fato.
Fixadas tais premissas, cumpre escandir quais dispositivos de lei admitem tal aplicação excepcional [repito:
“em casos expressos”, diz o artigo 2º, parágrafo único do ECA]. Ei-los: Art. 121. A internação constitui medida
privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar
de pessoa em desenvolvimento. § 5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade.
Art. 120. O regime de semi-liberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para
o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial.
[…] § 2º A medida não comporta prazo determinado aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à
internação.
Pertinente ainda a transcrição do artigo 127: Art. 127. A remissão não implica necessariamente o
reconhecimento ou comprovação da responsabilidade, nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo
incluir eventualmente a aplicação de qualquer das medidas previstas em lei, exceto a colocação em regime
de semi-liberdade e a internação.
O próprio parágrafo único do artigo 104, norma que é utilizada como esteio legal para a aplicação
indiscriminada de medidas a jovens adultos, já traz em si o télos da tessitura normativa estatutária: Art. 104.
São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei. Parágrafo
único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do adolescente à data do fato.
A menção a “adolescente” não é meramente expletiva. Deveras, o conceito de “adolescente” é haurido na lei
mesma: Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade
incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre
dezoito e vinte e um anos de idade.
E também não é de acarreto a distinção feita na lei entre “adolescente” e “pessoas entre dezoito e vinte e
um anos de idade”.
Se ao inimputável etário devem ser envidados os esforços estatais no sentido de promover suas aptidões
física, mental, moral, espiritual e social [sobressaindo, pois, o caráter pedagógico sobre o punitivo], ao jovem
adulto, sem prejuízo do anelo educativo, já ganham cores mais fortes os caracteres preventivo e retributivo
imanentes à sanção penal.
Nada impede, todavia, que, concedida ao adolescente remissão cumulada com medida em meio aberto
como forma de suspensão do processo, na eventualidade de seu descumprimento possa o feito ter
prossecução, mesmo em se tratando de jovem adulto. Nesta hipótese, contudo, ter-se-ão as vistas voltadas
para eventual aplicação da semiliberdade ou da internação como medidas socioeducativas cabíveis vis a vis o
ato infracional cometido (“internação definitiva”), tendo por norte a sua gravidade.
É que já não terá cabimento a regressão com a aplicação da “internação-sanção” de que trata o artigo 122,
inciso III do ECA, cujo escopo não é outro senão o de forcejar o cumprimento da medida descumprida,
revestindo-se de caráter evidentemente instrumental.
Ora, se não é viável a aplicação de medida em meio aberto ao jovem adulto, não haveria sentido interná-lo
para obrigar ao cumprimento daquilo que não se poderia impor ab initio. Ao adolescente que recalcitra no
descumprimento deve ser aplicada a regressão (“internação-sanção”) ou a substituição da medida
socioeducativa, mas desde que observada, em qualquer caso, a data limite da maioridade. Após este marco,
devem cessar os efeitos das medidas em meio aberto impostas à força da remissão.
Erige-se, destarte, uma tessitura normativa harmônica de transição do regime dedicado ao inimputável
etário àquele que é imposto ao adulto, evitando-se uma alteração ex abrupto no tratamento que o estado
defere ao indivíduo em conflito com a lei.
A lei, ao vedar a aplicação de medida em meio aberto ao jovem adulto, guardou, pois, coerência com
o leitmotiv estatutário, otimizando os recursos estatais no sentido da precoce intervenção que possa dar
meças ao repto da preservação da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento (ECA, artigo
6º).
Em resumo, somente as medidas mais graves [leia-se: medidas privativas de liberdade] devem ser aplicadas
ao jovem adulto, como ressai da leitura conjunta dos artigos 2º, 104, 120 (§2º), 121 (§5º), 127, in fine, todos
do ECA.
A unificação, na verdade, não se refere às medidas, porque elas não se somam como as penas, mas
aos processos, cujos autos, por determinação da Resolução n.º 165/2012 do CNJ, são reunidos em um só.
Para ser mais específico, arquivam-se as guias anteriores e expede-se uma nova.
Bom, mas como vários processos se tornam um? Por diversas razões e a primeira, para variar, não está
no caput do art. 45, mas no seu § 2º: “É vedado à autoridade judiciária aplicar nova medida de internação,
por atos infracionais praticados anteriormente, a adolescente que já tenha concluído cumprimento de
medida socioeducativa dessa natureza, ou que tenha sido transferido para cumprimento de medida menos
rigorosa, sendo tais atos absorvidos por aqueles aos quais se impôs a medida socioeducativa extrema”. O
parágrafo é tão longo, que demanda segmentação.
Lembram-se das finalidades das medidas socioeducativas? Pois a finalidade pedagógica é o motivo
pelo qual o § 2º do art. 45 existe. Por razões de política socioeducativa, considera-se que, se um adolescente
ou jovem inicia o cumprimento de uma medida socioeducativa e a cumpre, não há finalidade pedagógica na
aplicação de nova medida de internação por ato praticado antes do início da execução da medida
cumprida. Confuso? Acompanhe o raciocínio:
Podemos dar um passinho além e pensar no caso de um adolescente que inicia o cumprimento de uma
medida de internação, tem a sua medida reavaliada com substituição por liberdade assistida e, em seguida,
passa a descumpri-la. É possível a aplicação de internação-sanção? Não, porque, já que a internação absorve
a finalidade socioeducativa da medida aplicada por outro ato, por maior razão, absorverá a finalidade
socioeducativa em relação ao mesmo ato. “Execução pingue-pongue” (internação/liberdade
assistida/internação-sanção) é uma impossibilidade jurídica diante da norma do art. 45, § 2º.
Outro passo além: não é necessário esperar o cumprimento por um número de meses determinado,
para que se extinga o processo de execução referente ao outro ato, pois a internação, assim que for
cumprida, irá absorver, inexoravelmente, a finalidade socioeducativa do outro processo. Perceba que o art.
45, § 2º, da Lei n.º 12.594/2012 não estabelece (nem deveria estabelecer) prazo de cumprimento para que a
internação executada provoque a absorção. Se a internação durou dois meses, ela absorverá a outra (ou as
outras) da mesma forma.
Um passo um pouco maior: se é possível que uma internação seja absorvida, por que uma
semiliberdade, uma liberdade assistida ou outra medida executada em meio aberto (exceto a obrigação de
reparar o dano, que interessa à vítima) não podem ter o mesmo fim? Deve-se reconhecer, dessa forma, que
o art. 45, § 2º contempla, por maior razão, as demais medidas. Quer outro motivo? Abaixo, você verá que o
art. 45, § 1º, somente determina o reinício da medida (outra forma de unificação) quando sobrevém guia de
execução de medida idêntica decorrente de fato praticado no curso da execução. Se foi praticado antes
desse marco temporal, há absorção de medidas idênticas. Se até a liberdade assistida pode absorver outra
liberdade assistida, por que uma internação não pode?
Quatro passos além: e se o processo referente a um dos atos infracionais praticados demorou tanto,
que ainda está na fase de conhecimento, enquanto o adolescente ou jovem cumpre a internação? O
processo de apuração de ato infracional referente a ato anterior ao ingresso do adolescente ou jovem em
programa de internação com certeza não terá a sua medida executada. Isso não depende de dosimetria
média ou de exercício de futurologia: não há como executar qualquer sentença que saia desse processo.
#DEFENSORIAPÚBLICA: É por esse motivo que foi elaborada a Tese Institucional n.º 104 da DPE-SP: “com o
trânsito em julgado da aplicação da medida de internação, ocorre a perda superveniente da pretensão
socioeducativa na apuração de atos infracionais cuja data antecede o início da medida”.
Cinco passos além (se acalmem que está acabando!): e se o início do cumprimento da internação for
de internação-sanção, as consequências são as mesmas? A internação-sanção só recebe esse nome
doutrinariamente, mas, objetivamente, ela é, apenas, o inciso III do art. 122 do ECA, que traz as hipóteses de
internação, sem adjetivos.
Definidas estão, dessa forma, as hipóteses mais comuns de absorção que a internação provoca, seja
sobre outra internação, seja sobre medidas mais brandas. Há, além dessas, mais uma, que não se refere ao
art. 45, § 2º: o advento de uma guia de execução de medida de internação, enquanto o adolescente cumpre
medida mais branda por outro ato. Nesse caso, haverá absorção da medida mais branda pela mais grave, que
se iniciará imediatamente.
Além da absorção entre medidas distintas, existem duas outras formas de unificação de MSE, que
produzem reinício ou absorção entre medidas idênticas diversas da internação sobre a contagem do prazo
máximo de reavaliação (seis meses) e o prazo máximo para liberação compulsória (três anos).
O art. 45, § 1º, da Lei n.º 12.594/2012 estabelece que “é vedado à autoridade judiciária determinar
reinício de cumprimento de medida socioeducativa, ou deixar de considerar os prazos máximos, e de
liberação compulsória previstos na Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do
Adolescente), excetuada a hipótese de medida aplicada por ato infracional praticado durante a execução”.
Esse parágrafo se refere, exclusivamente, aos casos em que a multiplicidade de processos se refere a
medidas idênticas, afinal, para os demais casos, aplica-se a absorção da medida mais branda pela mais
grave. Ainda que tenha sido praticado um ato infracional no curso de uma internação, ele somente terá
algum efeito sobre a execução, se a medida aplicada no processo de apuração de ato infracional também for
de internação. Se for de liberdade assistida ou semiliberdade, a decretação do reinício da medida ultrapassa
os limites sancionadores da sentença da medida mais branda. O reinício da internação somente pode
ocorrer quando sobrevém guia de execução de medida de internação por fato praticado durante a execução
da medida. O mesmo pode acontecer na semiliberdade e na liberdade assistida.
E se o fato que gerou a medida idêntica é anterior ao início da execução da medida em curso? Se a
medida for internação, já tratamos dela há cinco minutos, no começo deste tópico, e você vai se lembrar. Se
for semiliberdade ou liberdade assistida, há absorção da finalidade socioeducativa de uma medida por outra.
A execução de penas, como sabemos, atribui às infrações disciplinares grande importância, pois o
exercício de determinados direitos do preso depende da inexistência de faltas graves. A prática de falta
grave, por exemplo, interrompe o lapso temporal para a progressão de regime. Na execução de MSE, como o
eixo que sustenta a continuidade da medida é o PIA, inexiste vinculação direta entre a prática de falta
disciplinar e a manutenção da medida socioeducativa.
Isso porque o PIA não se elabora, nem se executa instantaneamente, como a prática de uma falta
disciplinar. Acha mesmo que meses e meses de planejamento e execução de um atendimento
multidisciplinar podem ser substituídos tão facilmente pela apuração de uma falta, que sequer é
judicializada? A única influência possível da falta disciplinar sobre a reavaliação da medida pode se referir à
confluência entre o conteúdo da falta e alguma das metas estabelecidas no PIA.
A prática de falta disciplinar, na verdade, possui um regime próprio, com procedimento e sanções
aplicáveis pela própria entidade de atendimento. Indiretamente, a Lei n.º 12.594/2012 indica que não há
relação entre a prática de falta disciplinar e o resultado da reavaliação da medida, diferentemente da
execução de penas, em que a configuração de falta grave interrompe o lapso temporal para a fruição de
direitos do executado. É por isso que a tipificação das faltas e a judicialização do procedimento se justificam.
Na execução de MSE, o PIA é o eixo e apenas ele.
O art. 64 prevê incidente que deverá ser instaurado, caso se constate, no curso da execução, que o
adolescente ou jovem tem transtorno mental ou dependência de álcool ou outras drogas. O caput do artigo
determina que deverá haver avaliação técnica multidisciplinar e multissetorial, e o § 1º indica as normas de
referência do SUS.
A que conclusão podemos chegar? Que essa avaliação deverá ser feita, precipuamente, pelos Centros
de Atenção Psicossocial, o principal elo da Rede de Atenção Psicossocial, no que se refere a diagnóstico em
demandas de saúde mental.
Os tratamentos recomendados pela equipe devem seguir a normativa da Lei n.º 10.216/2001
(especialmente, a prioridade do atendimento extra-hospitalar, a subsidiariedade da internação e a
impossibilidade de internação em entidade com características asilares) são incorporados ao PIA como
“medidas de atenção à saúde” (art. 54, VII), desde que a intervenção seja compatível com a continuidade da
medida. Caso não seja, há possibilidade de se suspender a execução em curso até o adolescente ou jovem se
restabeleça, com reavaliação da suspensão, no máximo, a cada seis meses.
*(Atualizado em 27/03/21) Mesmo que o adolescente, durante o procedimento para apuração da infração
do art. 249 do ECA, adquira a maioridade, ainda assim a multa poderá ser aplicada aos responsáveis A multa
instituída pelo art. 249 do ECA não possui caráter meramente preventivo, mas também punitivo e
pedagógico, de modo que não pode ser afastada sob fundamentação exclusiva do advento da maioridade
civil da vítima dos fatos que determinaram a imposição da penalidade. Art. 249. Descumprir, dolosa ou
culposamente, os deveres inerentes ao pátrio poder familiar ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim
determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar: Pena - multa de três a vinte salários de
referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência. STJ. 4ª Turma. REsp 1.653.405-RJ, Rel. Min. Maria
Isabel Gallotti, julgado em 02/03/2021 (Info 687).
DIPLOMA DISPOSITIVO
Constituição Federal Arts. 227 e 5º, XLIX, L; LIV; LVII
Lei 8.069/1990 Artigo 118 a 128
Lei n.º 12.594/2012 Integralmente
Resolução n.º 165/2012 do Conselho Nacional de Integralmente
Justiça
Convenção Sobre os Direitos da Criança Arts. 37 e 40
Regras das Nações Unidas para Proteção de Jovens Integralmente
Privados de Liberdade
Regras de Pequim Quarta e Quinta Partes
15 BIBLIOGRAFIA UTILIZADA
Zapata, Fabiana Botelho; Frasseto, Flávio Américo; Gomes, Marcos Vinicius Manso Lopes, Coleção
Defensoria Pública Ponto a Ponto Direitos da criança e do adolescente, 2016.