Clínica Ampliada e Fonoaudiologia
Clínica Ampliada e Fonoaudiologia
Clínica Ampliada e Fonoaudiologia
Descritores RESUMO
Serviços de Saúde Mental Objetivo: A prática fonoaudiológica na saúde mental é interrogada pelo desafio de produzir estratégias
Saúde Pública compartilhadas de cuidado para, sobretudo, ampliar as condições e o repertório comunicacional, a circulação
discursiva e social de sujeitos em sofrimento mental. O objetivo deste estudo foi identificar a percepção sobre
Humanização da Assistência escuta clínica de uma equipe de Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (CAPSij), especificando a função
Saúde Mental da fonoaudiologia no cuidado e na escuta dos casos. Método: Trata-se de pesquisa participativa e dialógica.
Fonoaudiologia Utilizou-se grupo de discussão para coleta de dados. Resultados: estão agrupados nas categorias: conceituação
de escuta; escuta e processo de trabalho; efeitos da escuta; fonoaudiologia e escuta. A equipe pensa a escuta
clínica como dispositivo central nos cuidados em saúde mental. A escuta clínica favorece a reflexão acerca de
dinamismos biopsíquicos do cuidado em saúde. Observou-se contribuições da fonoaudiologia em camadas intra
e interinstitucionais, assim como no trabalho clínico-terapêutico da equipe de saúde, dos usuários e familiares.
As competências e conhecimentos do fonoaudiólogo sobre aspectos orgânicos do desenvolvimento infantil, na
opinião dos profissionais, potencializam a escuta clínica. Conclusão: Conclui-se que, sem o trabalho em equipe, o
cuidado no CAPSij não aconteceria de forma qualificada sob os marcos da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)
e do Sistema Único de Saúde (SUS). A escuta clínica é condição de possibilidade do cuidado ofertado pela equipe.
Keywords ABSTRACT
Mental Health Services Purpose: The speech therapy practice in mental health is questioned by the challenge of producing shared care
Public Health strategies to, above all, expand the conditions and the communicational repertoire, the discursive and social
circulation of people with mental suffering. Objective of this study was to identify the perception of clinical
Humanization of Health Care
listening in professionals of Child and Adolescent Psychosocial Care Center (CAPSij), specifying the role of
Speech-Language-Hearing Sciences speech therapy in the care and listening of patientes. Methods: This is a participatory and dialogical research. A
discussion group was used to collect data. Results: were grouped in the following categories: listening conception;
listening and working process; listening effects; speech therapy and clinical listening. These professionals think
of clinical listening as a central device for mental health care. The clinical listening favors reflection on the bio
psychic dynamics of healthcare. It was observed contributions of speech therapy in intra and interinstitutional
scopes, in the clinical-therapeutic work of the health professionals, patients and relatives. The speech therapist’s
skills and knowledge about organic aspects of child development in the opinion of professionals enhance
clinical listening. Conclusion: It was concluded that without teamwork, care in CAPSij would not happen in a
qualified way under the public health policies: Psychosocial Care Network (PSCN) and Unified Health System
(SUS) frameworks. The clinical listening is a condition of possibility of the care offered by the professionals.
Endereço para correspondência: Instituição onde o trabalho foi realizado: Programa de Estudos Pós-graduados em Fonoaudiologia
Caroline Lopes Barbosa. End: Rua: (Doutorado) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP – São Paulo (SP), Brasil.
Bartolomeu Paes, 318. Vila Anastácio. São 1
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP – São Paulo (SP), Brasil.
Paulo – SP CEP: 05092-000. Brazil. 2
Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo – São Paulo (SP), Brasil.
E-mail: [email protected]
Conflito de interesses: nothing to declare.
Recebido em: Agosto 15, 2019. Fontes de financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil - CAPES
PROSUP 88887.151934/2017-00.
Aceito em: Janeiro 14, 2020.
Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons Attribution, que permite
uso, distribuição e reprodução em qualquer meio, sem restrições desde que o trabalho original seja corretamente citado.
Os momentos de incerteza são os mais difíceis para A equipe afirma também que a escuta convoca os núcleos
nos escutarmos em equipe. disciplinares para o campo de jogo da saúde mental.
Dependendo de como se afeta e assume o caso, corre-se Eu acho que a escuta da fonoaudióloga tem um peso no
o risco de ficar sozinho como profissional-referência trabalho com os usuários. Isso tem! A expectativa dos
do usuário. pais para a fala é grande. Mas, entre os profissionais
e na equipe, não tem diferença.
Tem a dificuldade de se colocar, de falar, é um receio
de como serei escutado. A possibilidade de compor saberes para escutar e
cuidar do usuário é importante. É preciso entender
Eu já desisti de falar em nossa reunião de equipe. as diferenças da percepção do psicólogo, enfermeiro
Quando vou falar, interrompem ou me controlam e outros profissionais na composição do trabalho.
dizendo: “para!” Tudo bem, eu não sou letrada, mas
deveria ser uma coisa de equipe. Toda a equipe escuta, mas tem diferença pela especificidade.
O psicólogo vai até certo limite, depois é específico A fonoaudióloga dá suporte técnico do caso para a
do fonoaudiólogo. Somente ele saberá a fundo o que equipe, ajudando no cuidado com o usuário e nas
fazer com um atraso de linguagem, com a disfagia e discussões de caso com a rede.
com outras questões específicas.
É a partir dessa “concretude” que a fonoaudiologia parece
É possível observar que corpo e psiquismo parecem terreno operar na equipe e na construção da escuta aos usuários e à
fértil para pensar a escuta enquanto arena de questões do própria equipe.
campo da saúde mental.
A fonoaudiologia ativa a escuta na equipe ao compor
(...) Eu recordo de um menino que veio encaminhado com um olhar diferenciado e ampliado.
como se tivesse transtorno alimentar, só tomava
líquidos. No processo de avaliação, a fonoaudióloga Eu gostava muito quando a fonoaudióloga entrava
pediu para ele abrir a boca, e não tinha passagem no grupo e falava: “essa criança tem tal dificuldade,
para os alimentos sólidos. O menino tinha amígdalas você pode brincar e trabalhar assim!”
enormes! Não era transtorno alimentar por conta de
questões psicológicas, mas um impedimento orgânico. Eu aprendi muito com a fonoaudióloga, entendi algumas
Se não tivesse uma fonoaudióloga, como psicóloga, dificuldades primárias das crianças, referentes à
eu não pediria para abrir a boca, para mim era uma deglutição, à linguagem e à comunicação, porque ela
questão apenas emocional. compartilhava o conhecimento.