admin,+Moeda,+Preços+e+o+Futuro
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Como se pode depreender pela leitura dos jornais e pelas entrevistas de economistas,
parece que todos somos monetaristas atualmente no Brasil. Nesse caso, é muito importante
registrar os resultados recentes obtidos em pesquisas teóricas e empiricas de economistas
monetaristas como Barro, Lucas, McCallum, Sargent e outros, os quais têm implicações
diretas sobre os efeitos macroeconômicos do choque.
Uma redução forte e não-antecipada no estoque de moeda afeta o nivel de preços (para
baixo) e o nivel de produto real (para baixo), sendo que a distribuição desse impacto é
duvidosa, mas provavelmente recai muito mais sobre o produto do que sobre os preços. Até
os monetaristas reconhecem uma rigidez nos preços na direção descendente, o que por sinal
é bem diferente de reconhecer uma rigidez inercial na taxa de inflação. Cabe lembrar que,
no Brasil, salários nominais não podem ser reduzidos, sem falar na rigidez de vários preços
públicos. A surpresa da contração monetária acaba atuando sobre as quantidades vendidas.
O choque monetário se transforma num choque real pela contenção imprevista da demanda
agregada.
Já uma expansão antecipada e anunciada da liquidez na economia - por exemplo,
um crescimento mensal de x% a partir daquele estoque baixo inicial - pode não exercer
nenhum efeito sobre a taxa de crescimento do PIB real e transbordar inteiramente sobre a
taxa de inflação. Mais precisamente, qualquer crescimento monetário acima de 0,5 % ao mês
(que seria a taxa histórica do PIB real) pode resultar em fortes pressões inflacionárias.
Além disso, a inflação é influenciada não s6 pela expansão monetária anunciada e
efetivamente verificada, como também pelas expectativas de crescimento futuro da moeda.
Nesse contexto, convém lembrar que esse é o principal canal (expectativas) pelo qual o
déficit público afeta a inflação. Ao contrário do que dizia David Ricardo, a divida pública
não costuma equivaler no Brasil a impostos futuros, mas sim à expansão monetária futura.
A reforma monetária - juntamente com o restante do Plano - praticamente não reduziu a
divida pública, apenas promoveu o seu alongamento, podendo alimentar a inflação por esse
canal de expectativas indefinidas com relação à politica fiscal, particularmente o lado das
despesas governamentais.
Se esses movimentos macroeconômicos fazem sentido, temos um tipo de armadilha
de liquidez a ser enfrentado pelas autoridades monetárias. O choque monetário inicial não-
antecipado pode provocar uma hiper-recessão. Já as torneiras abertas a seguir - juntamente
com a pressão salarial de março - podem resultar em aumentos de preços e de filas, até
mesmo hiperinflação e desabastecimento, praticamente sem nenhum impacto sobre a
atividade econômica real. A chamada oferta agregada - o lado da produção - pode estar
deprimida e inelástica em relação aos novos estimulos (antecipados) monetários.
Isso é o que diz a teoria monetária moderna. Este choque pode não exercer nenhum
efeito sobre a taxa de inflação, apenas sobre o nivel do produto (e, em menor escala, o nivel
dos preços). O segundo estágio do choque será mais ou menos inflacionário, dependendo
das taxas anunciadas e praticadas de crescimento da moeda e das expectativas sobre a sua
expansão no futuro (que estão relacionadas à divida pública e a seu serviço). Mas, infeliz-
mente, esse segundo estágio pode ser incapaz de tirar com rapidez o Pais da recessão
provocada pelo choque inicial.
E se M4 não for o conceito relevante da moeda? E se o conceito relevante for apenas
a base monetária - ou então a base monetária acrescida da divida pública que, afinal no
Brasil, reflete a futura expansão monetária? Neste caso, diminui o risco de termos uma
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panhada de uma reaceleração da inflação a partir de junho ou julho de 1990, esta última
provocada por novas injeções monetárias e crediticias, as quais se revelariam incapazes de
tirar o País da recessão inicial. Seria a chamada estagflação, acompanhada de fenômenos
como filas e desabastecimento por falta de produtos.
Se esta hipótese de fato ocorrer, o País vai ter de enfrentar um grave problema: como
organizar a saída ou a desimobilização da poupança financeira. É evidente que, se o Plano
não der certo, terá de ser encontrada uma saída para os US$ 80 bilhões que se encontram
depositados em cruzados novos por 18 meses à ordem do Banco Central. Da mesma forma
que foi dificil e penoso sair do congelamento de preços nos três planos anteriores, será
doloroso e delicado sair desta imobilização.
Há concordância entre muitos economistas de que este Plano, independentemente do
seu maior ou menor impacto sobre a atividade econômica e sobre a inflação, abalou
profundamente a confiança das pessoas físicas ou jurídicas no que diz respeito às aplicações
financeiras em moeda nacional, com sérias conseqüências a médio e longo prazos. Qualquer
mecanismo de sarda terá de levar em conta este fato provocado pelo Plano, e terá de
conseguir reabilitar a confiança na poupança em cruzeiros.
Fala-se muito nas semelhanças entre o Plano brasileiro de 1990 e a reforma monetária
alemã de 1948, em face da decisão de confiscar ou imobilizar os depósitos e os ativos
financeiros das pessoas. Mas é interessante examinar com atenção o que está acontecendo
atualmente na Alemanha de 1990, porque ali parece residir uma idéia-chave para a eventual
sarda no caso brasileiro.
Como se sabe, as duas Alemanhas serão unificadas nos próximos meses e uma das
questões mais importantes diz respeito à taxa de câmbio que será fixada para se transformar
a moeda da Alemanha Oriental em marcos alemães, ou seja, na moeda da Alemanha
Ocidental. O que está em jogo é precisamente o valor real das poupanças dos alemães-orien-
tais. Quanto maior a taxa de câmbio (por exemplo, 5 por 1 contra 1 por 1), menor será aquele
valor real quando for traduzido em marcos alemães. Tudo indica que o acerto entre as duas
Alemanhas caminha para uma troca de dois ostmarks por cada marco alemão, sendo que
para os primeiros 3.000 ou 4.000 marcos de cada poupador a troca será de 1 por 1.
A saída brasileira poderia se basear nesta solução alemã de 1990, com algumas
adaptações. É possível fixar-se uma tabela diária de taxas de câmbio entre o cruzado novo
e o cruzeiro que começasse, por exemplo, em 3 por 1 e terminasse - após 12 meses, por
exemplo - em 1 por I, tomando-se fixa a partir daí neste valor de paridade. As pessoas
estariam totalmente livres para converter, com base nesta tabela. Ao mesmo tempo, para
impedir que os eventuais recursos convertidos se transformassem inteiramente em MIou
mesmo Mo, a taxa de juros em cruzeiros teria de ser utilizada, com todo o seu poderio, para
reabilitar a poupança financeira nas duas moedas.
Note-se que este mecanismo de saída é perfeitamente capaz de ativar eficientemente
as forças de mercado via taxa de juros e taxa de câmbio. Para o seu funcionamento adequado,
porém, a taxa de juros dos cruzados novos teria de ser liberada, deixando de ser correção
monetária mais 6% ao ano. Na verdade, para se manter o equilíbrio entre as aplicações em
cruzados novos, seria necessário que a taxa de juros diária para cruzados novos fOSSe
determinada pela taxa livre diária de juros dos cruzeiros menos a vali. rização diária na taxa
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NCz$/Cr$ mais um pequeno deI ta adicional, para refletir o prazo alongado e até desestimular
a conversão.
Com a fixação da taxa cambial diária e a liberação dos juros em cruzados novos, é
razoável supor que não haveria uma avalanche de conversões. Mas é importante lembrar
que, mesmo no caso desta sardn representar um aumento inicial no estoque de moeda em
cruzeiros, o seu efeito seria sobre o nível dos preços - e não sobre a taxa de inflação. Da
mesma forma que a redução verificada no estoque de ativos financeiros em março de 1990
não exerceu influência para baixo na taxa de inflação, mas sim sobre o nível geral dos preços
e de uma s6 vez.
O principal determinante da inflação é a taxa futura de expansão monetária. O que vai
ocorrer com a inflação dependerá da firmeza do Governo no controle das suas contas e das
expectativas do público com relação a este momento. Isto não tem praticamente nenhuma
relação com a imobilização dos recursos financeiros do setor privado verificada em março
de 1990, da mesma forma que teria pouca relação com uma eventual conversão (controlada
via mercado) de cruzados novos em cruzeiros, por ocasião desta saídn do Plano.
Apenas a título de resumo de nossa análise da reforma monetária podemos dizer o
seguinte: se é M4 que interessa, então a reforma vai gerar uma recessão, mas não vai ter
influência direta sobre a inflação. Se é Mo que interessa, então a reforma não terá grande
impacto recessivo, mas irá rapidamente alimentar a inflação. Se a verdade está no meio
destas hipóteses, deve-se dizer que o dano causado pela reforma em termos de perda de
confiança e de credibilidade na poupança financeira pode ter sido absolutamente desneces-
sário e inútil. Como escreveu Don Patinkin, maior economista de Israel: •Se um economis ta
diz que tem uma idéia nova, ou ela não é nova ou então está errada.· Fica a dúvida.