ESPAÇO, GÊNERO E RAÇA OS MOVIMENTOS SOCIAIS E OS DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS

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DOI 10.31418/2177-2770.2020.v12.n.34.

p32-53 | ISSN 2177-2770


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ESPAÇO, GÊNERO E RAÇA: OS MOVIMENTOS SOCIAIS E OS


DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS

Antonia dos Santos Garcia1

Que no hay patria en que pueda tener el hombre más


orgullo que en nuestras dolorosas repúblicas americanas
(José Marti, 1891)

“Por um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres”
(Rosa de Luxemburgo)
Negritude: “O despertar de dignidade, rejeição da opressão, lutar contra a desigualdade”
(Aimé Cesaire)

Resumo: Neste artigo vamos refletir sobre as origens e histórias comuns da América
Latina, Caribe e África considerando-se que o sistema colonial escravista moldou nossas
sociedades e cidades, e o Brasil nesse contexto. A construção eurocêntrica das sociedades
e cidades no chamado Novo Mundo, tem seu tripé no colonialismo-escravismo,
patriarcalismo-racismo e no mercantilismo-capitalismo, que também produziu modelos
explicativos que alimentam até hoje uma perversa engrenagem teórico-ideológica-
política que favorece a reprodução de desigualdades e a perpetuação no poder dos grupos
brancos hegemônicos. Enfrentar a metodologia da omissão na perspectiva da raça,
gênero, classe e espaço nesses continentes é crucial para projetos de emancipação humana
e superação do sistema de opressão universal.

Palavras-chave: Eurocentrismo; Capitalismo; Gênero; Raça, Espaço

SPACE, GENDER AND RACE: SOCIAL MOVEMENTS AND


CONTEMPORARY CHALLENGES

Abstract: In this article we will reflect on the origins and common histories of Latin
America, the Caribbean and Africa considering that the slave colonial system shaped our
societies and cities, and Brazil in this context. The Eurocentric construction of societies
and cities in the so-called New World has its tripod in colonialism-enslavement,
1
Socióloga e mestre em Geografia pela UFBA, doutora em urbanismo pela Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ), pós-doutora e pesquisadora associada/NEIM/PPGNEIM/FFCH/UFBA e
coordenadora do OBSERVATÓRIO LUIZA MAHIN/Grupo Espaço Livre/UFBA/CNPq, Centro da
Mulher Baiana (CEM) e fundadora e ex-diretora executiva da Federação das Associações de Bairros de
Salvador – FABS. E-mail: [email protected] ; ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3536-8705

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patriarchalism-racism and mercantilism-capitalism, which also produced explanatory
models that feed to this day a perverse theoretical-ideological-political gear that favors
the reproduction of inequalities and the perpetuation in the power of hegemonic white
groups. Facing the methodology of omission from the perspective of race, gender, class
and space in these continents is crucial for projects of human emancipation and
overcoming the system of universal oppression.

Keywords: Eurocentrism; Capitalism; Gender; Race, Space

ESPACIO, GÉNERO Y RAZA: MOVIMIENTOS SOCIALES Y DESAFÍOS


CONTEMPORÁNEOS

Resumen: En este artículo reflexionaremos sobre los orígenes e historias comunes de


América Latina, el Caribe y Africa considerando que el sistema colonial esclavo dio
forma a nuestras sociedades y ciudades, y a Brasil en este contexto. La construcción
eurocéntrica de sociedades y ciudades en el llamado Nuevo Mundo tiene su trípode en el
colonialismo-esclavitud, patriarcalismo-racismo y mercantilismo-capitalismo, que
también produjo modelos explicativos que alimentan hasta el día de hoy un perverso
equipo teórico-ideológico-político que favorece la reproducción de las desigualdades y la
perpetuación del poder de los grupos blancos hegemónicos. Enfrentar la metodología de
omisión desde la perspectiva de la raza, el género, la clase y el espacio en estos
continentes es crucial para los proyectos de emancipación humana y la superación del
sistema de opresión universal.

Palabras clave: Eurocentrismo; Capitalismo; Género; Carrera, Espacio

ESPACE, GENRE ET COURSE: MOUVEMENTS SOCIAUX ET DÉFIS


CONTEMPORAINS

Résumé : Dans cet article, nous réfléchirons sur les origines et les histoires communes de
l’Amérique latine, des Caraïbes et de l’Afrique, considérant que le système colonial des
esclaves a façonné nos sociétés et nos villes, et le Brésil dans ce contexte. La construction
eurocentrique des sociétés et des villes dans le soi-disant Nouveau Monde a son trépied
dans le colonialisme-esclavage, le patriarcat-racisme et le mercantilisme-capitalisme, qui
a également produit des modèles explicatifs qui alimentent à ce jour un pervers
l’engrenage théorique-idéologique-politique qui favorise la reproduction des inégalités et
la perpétuation du pouvoir des groupes blancs hégémoniques. Face à la méthodologie
d’omission du point de vue de la race, du sexe, de la classe et de l’espace sur ces
continents est crucial pour les projets d’émancipation humaine et de surmonter le système
d’oppression universelle.

Mots-clés: Eurocentrisme; Le capitalisme; Le genre; Course, Espace

INTRODUÇÃO

Este artigo parte das reflexões realizadas durante o seminário da CLACSO –

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Conselho Latino Americano de Ciências Sociais em 20192 e artigo apresentado sob o
título Os Movimentos Sociais e os Desafios Contemporâneos: Negritude, Capitalismo e
Escravidão. Pensar o Brasil na perspectiva da raça, gênero, espaço no contexto na
América Latina, Caribe e África é fundamental para projetos de emancipação humana.
Como militante dos movimentos urbanos e de mulheres negras da periferia de Salvador,
primeira cidade e capital do Brasil colonial, cidade mais negra demográfica e
culturalmente fora da África busco compreender as raízes das desigualdades sociorraciais
e de gênero3, de classe social no espaço. Em nossas pesquisas temos buscado a
interseccionalidade destas categorias e o espaço urbano e creio que precisamos realizar
mais pesquisas e reflexões sobre as origens dos nossos países a partir de uma matriz
colonialista e escravista visando a desconstrução desses paradigmas, dessas teorias
opressivas. Entender o Brasil, também de maioria negra no contexto da América Latina,
Caribe e África é crucial considerando-se que o sistema colonial escravista moldou nossas
sociedades e durou mais de três séculos no Brasil (um pouco menos na maioria dos países
colonizados). Foi o país que recebeu o maior número de escravizados e o último a se
libertar do sanguinário sistema escravocrata que produziu o maior genocídio da
Humanidade, durante os séculos de escravidão e na abolição inacabada como mostram
vários estudos.
A escravidão aberta ou disfarçada de índios e índias, negros e negras na
encomienda, hacienda, plantation, engenho, fazenda e outras modalidades de organização
social e técnicas das relações de produção e das forças produtivas no chamado Novo
Mundo, embora contraditório com o que ocorria na Europa onde se expandia a
manufatura e depois a grande indústria generalizando-se o trabalho livre (IANNI, 1988,
p.16), forjou nossas sociedades cujas consequências sofremos até hoje. O motor desse
processo mais amplo era o capital comercial, que subordinava a produção de mercadorias
na Europa e nas colônias do chamado Novo Mundo e em outros continentes. Em

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Seminário 1905 - Raza/negritud y humanidad. Traducciones interculturales entre América Latina, el Caribe
y África me coloquei- o objetivo de ampliar meus conhecimentos sobre América Latina, Caribe e África,
buscando interlocuções pouco comuns nos estudos brasileiros sobre nossa origem, história comum, nossas
cidades, e parte deste artigo resulta também do artigo apresentado.
3
A relevância e atualidade da questão de gênero está na pesquisa no Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD) que analisou 75 países que representam 80% da população global. Nesta
pesquisa se constata que que nove a cada dez pessoas, inclusive mulheres, têm preconceito de gênero. E o
Brasil é um dos piores países da América Latina, chegando a 89,50%. “Em torno de 90% da população
mundial, sem importar o sexo, têm preconceito contra as mulheres”.

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decorrência, expandia-se o capital comercial, criavam-se as condições estruturais no seio
das quais iria desenvolver-se o capitalismo, afirma o autor.
Para Marx, o tráfico negreiro constituía-se de um método de acumulação primitiva
comandado pela Inglaterra, na medida em que: “Liverpool empregava 15 navios no
tráfico negreiro, em 1730; 58, em 1751; 74, em 1760; 96, em 1770, e 132, 1792 e a
indústria algodoeira têxtil ao introduzir a escravidão infantil na Inglaterra impulsionava
ao mesmo tempo a escravidão negra dos Estados Unidos que, antes era mais ou menos
patriarcal, num sistema de exploração mercantil. A escravidão dissimulada dos
assalariados na Europa precisava fundamentar-se na escravatura sem disfarces, no Novo
Mundo (MARX, apud IANNI, 1988, p.16).
Para (STEIN apud IANNI, 1988, p.60), em 1853, “ao afirmar que a escravidão
não atrasou a industrialização, a comissão de preços admitia que a maioria era mão de
obra escrava”. Aliás, em meados do século XIX Marx já havia assinalado o caráter
‘anômalo’ e ‘formalmente burguês’ da formação social nas Américas e Antilhas (IANNI,
1988):

A escravidão dos negros – uma escravidão puramente industrial – que desaparece


de um momento para o outro e é incompatível com o desenvolvimento da
sociedade burguesa, pressupõe a existência de tal sociedade: se junto a essa
escravidão não existissem outros estados livres, com trabalho assalariado, todas
as condições sociais nos estados escravistas assumiriam formas pre-civilizadas
(MARX apud IANNI, 1988, p.33).

Entre os séculos XVI e XIX a Europa impôs o comércio triangular entre os


continentes: África, Europa e Américas (do Norte, do Sul e Central), cujo principal
elemento foi o tráfico negreiro, com o aprisionamento dos povos africanos, forma de
exploração do ser negro que fizeram do mundo atlântico um negócio bastante lucrativo.
A expansão do capitalismo mercantil cria, mantém e desenvolve contradições
representadas pela coexistência do trabalho escravo e trabalho livre no âmbito do
mercantilismo e as formações sociais escravistas tornaram-se organizações político-
econômicas altamente articuladas com seus centros de poder, independentemente dos
graus e maneiras de vinculação e dependência das colônias em face da metrópole. E
assim, desde o século XVI, quando se iniciou o tráfico de africanos e africanas “entre os
grupos escravizados as mulheres eram cerca de 20% inferior ao número de homens
transportados” (SCHUMAHER, 2007, p.16) para o chamado Novo Mundo, até o século

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XIX, quando cessou esse tráfico e terminou formalmente a escravatura, teriam sido
trazidos da África cerca de 9.500.000 negros e cerca de 4 milhões para o Brasil (IANNI,
1978, p.19), que construíram nossos países, nossas cidades, nossas riquezas apropriadas
pelo colonizador desde então.
Como dito anteriormente, europeus e suas metrópoles como Portugal, Espanha,
Inglaterra e França garantiram através do tráfico negreiro e o trabalho forçado de
indígenas, negros e negras, o funcionamento do próprio sistema econômico mercantilista
para produzir excedente e riqueza de suas metrópoles estabelecendo as bases do
desenvolvimento capitalista com relações de subordinação e hierarquias que forjaram
nossas sociedades como mostra a figura 1, abaixo.
Como periferia do capitalismo hegemônico, o desenvolvimento do modo de
produção capitalista no chamado Novo Mundo, foi mais lento, embora a industrialização
tivesse se iniciado na segunda metade do século XIX, ainda sob o escravismo nas nossas
sociedades e sob a liderança da Inglaterra. Na Bahia, por exemplo, a fábrica têxtil
instalada em Plataforma (1875), Salvador, Bahia, onde mulheres e crianças negras foram
a mão de obra principal, conviveu-se simultaneamente com os dois sistemas.
A diáspora africana durante o tráfico transatlântico de escravizados e
escravizadas, além da escravização de indígenas marca a extrema violência (torturas,
morte e doenças) que os europeus impuseram a estes povos e sem paralelo na história. A
magnitude dessa grande tragédia humana de pessoas oriundas da África, seu sofrimento,
torturas, doenças, mortes, precisa ser objeto de denúncia permanente como ocorre com o
Holocausto judeu e ações nos países afetados pelo longo processo de escravização e suas
consequências na contemporaneidade onde racismo e sexismo entrelaçados continuam
produzindo as desigualdades sociorraciais e de gênero e dando sustentação aos projetos
de dominação social com extrema exploração. E como afirma Kabengele Munanga
(2004), o racismo é indissociável da raça, mesmo quando não é proclama e os estudos
atuais sobre gênero, sexismo precisam dar conta desta realidade vivida por milhões de
pessoas no mundo.

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Figura 1 - Mercantilismo-Escravismo-Capitalismo

Fonte: Antonia Garcia – Elaboração própria - 2006

Portanto, o racismo e as teorias que o justificam como aponta Kabengele Munanga


(2004), desde sua origem marca decisivamente a vida humana: uma religiosa e a outra
pseudo científica: 1) o mito bíblico de Noé do qual resulta a primeira classificação
religiosa da diversidade humana entre os três filhos de Noé ancestrais das três raças: Jafé
(ancestral da raça branca), Sem (ancestral da raça amarela) e Cam (ancestral da raça
negra). Os calvinistas baseiam-se nesse mito para justificar e legitimar o racismo
antinegro; 2) se origina na classificação dita científica derivada da observação dos
caracteres físicos (cor da pele, traços morfológicos (MUNANGA, 2004, p. 24-25).
O conceito de raça, construído socialmente deu sustentação ideológica ao processo
de formação das nossas sociedades no chamado Novo Mundo. “É um conceito carregado
de ideologia, pois como todas as ideologias ele esconde uma coisa não proclamada: a
relação de poder e de dominação. O racismo como fenômeno híbrido e multifacetado, se
combina com outros fenômenos, como o nacionalismo, o imperialismo, o etnocentrismo,
o classismo, etc” (MUNANGA, 2004, p.27).
Corroborando com esta visão Aníbal Quijano afirma:

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Na América, a ideia de raça foi uma maneira de outorgar legitimidade às relações
de dominação impostas pela conquista. A posterior constituição da Europa como
nova id-entidade depois da América e a expansão do colonialismo europeu ao
resto do mundo conduziram à elaboração da perspectiva eurocêntrica do
conhecimento e com ela à elaboração teórica da ideia de raça como naturalização
dessas relações coloniais de dominação entre europeus e não-europeus.
Historicamente, isso significou uma nova maneira de legitimar as já antigas ideias
e práticas de relações de superioridade/inferioridade entre dominantes e
dominados. Desde então demonstrou ser o mais eficaz e durável instrumento de
dominação social universal, pois dele passou a depender outro igualmente
universal, no entanto mais antigo, o intersexual ou de gênero: os povos
conquistados e dominados foram postos numa situação natural de inferioridade,
e conseqüentemente também seus traços fenotípicos, bem como suas descobertas
mentais e culturais. Desse modo, raça converteu-se no primeiro critério
fundamental para a distribuição da população mundial nos níveis, lugares e papéis
na estrutura de poder da nova sociedade. Em outras palavras, no modo básico de
classificação social universal da população mundial (QUIJANO, 2005, p.118).

Comparando o Brasil com outros países da América Latina, Hasenbalg (1993,


p.52) aponta dois eixos em torno dos quais se estabelecem as semelhanças entre o Brasil
e as outras sociedades latino-americanas, forjadas no chamado Novo Mundo:

a) a concepção desenvolvida por elites políticas e intelectuais a respeito de seus


próprios países inclui a caracterização através da harmonia e tolerância, e
ausência de preconceito e discriminação racial (concepção que coexiste, em todos
os casos, com a subordinação social ou virtual da desaparição dos descendentes
de africanos); b) o embranquecimento, entendido tanto como projeto nacional
implementado em políticas de povoamento e imigração, como em termos da
obsessão em representar as respectivas sociedades como essencial, ou
predominantemente brancas e de cultura hispânica, ou de forma mais inclusiva,
europeia (HASENBALG, 1993, p.52).

De acordo com Carlos Eduardo Moreira (2006), “parte da história da escravidão


atlântica foi vivenciada em paisagens urbanas ou semiurbanas” (MOREIRA, 2006, p.7)
a exemplo de Buenos Aires, Caracas, Charlleston, Nova Orleans, Nova York, Havana,
Recife, Rio de Janeiro, Salvador entre outras. As estratégias de branqueamento das elites
brancas brasileiras foram fracassadas, embora permaneça no imaginário popular os
critérios da do mito da democracia racial representada pelo grande percentual de
pardos/as. Atualmente, nas regiões metropolitanas do Brasil, a população parda-preta é
majoritária em: Belém (maior percentual de pardos), Salvador (a mais negra demográfica
e culturalmente e com o crescimento dos pretos), Recife e Belo Horizonte,
respectivamente, Norte, Nordeste e Sudeste (BH), única nesta região, sendo que o Rio de
Janeiro tem uma distância racial menor entre negros e brancos desta região (52% brancos
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contra 48% de pardos e pretos) que São Paulo (60% de brancos). Por outro lado, o Sul é
branco onde Curitiba tem quase 80% de brancos e Porto Alegre com 80% é a mais branca
em todo Brasil (PNAD/IBGE, 2006). Contudo, a divisão racial do espaço afirmado por
Lélia Gonzales permanece no Brasil contemporâneo onde “O lugar natural do grupo
branco dominante” (GONZALEZ e HASENBALG, 1982, p.15), continua.
Analisando a segregação urbana das duas maiores cidades brasileiras, Reinaldo
de Oliveira (2013) afirma: “Compreendo que espaço e raça estão vinculados aos
problemas da cidade”(OLIVEIRA, 2013, p.47) e das suas regiões metropolitanas onde
“da senzala às favelas, cortiços, porões, invasões, alagados e conjuntos ‘habitacionais’
temos a permanência da “divisão racial do espaço.” Ou, seja, a estrutura urbana de Norte
ao Sul tem o mesmo padrão: os brancos e ricos vivendo em espaços valorizados (auto
segregação) de um lado, e os pretos e pardos segregados nas periferias onde as políticas
públicas não chegam, do outro. Cabe a pergunta de Reinaldo: Por que não há
questionamentos sobre a ausência ou silêncio sobre o espaço urbano e raça? (OLIVEIRA,
2013, p. 47). A divisão racial do espaço afirmado por Lélia Gonzales permanece no Brasil
contemporâneo onde os bairros brancos são os mais valorizados e ricos. Os bairros negros
nas pequenas, médias e grandes cidades, e em particular, na cidade de Salvador, foram se
constituindo em razão da história do trabalho escravo e da sociedade urbana industrial,
por meio da expulsão e segregação dos negros e pobres nas periferias, territórios e lugares
de menor valor no mercado imobiliário (CUNHA, 2019). Esta é uma questão fundamental
no Brasil cada vez mais urbano e negro (fracasso das políticas de branqueamento) nossas
pesquisas e análises não podem continuar ignorando a centralidade que deve ter o
racismo, sexismo e classimo na produção das desigualdades sociorraciais e segregação
racial e urbana e seu enfrentamento.
A metodologia da omissão das ciências e políticas públicas colonizadas tem sido
uma estratégia bastante eficiente para não estudar a cidade patriarcal e racista e isso tem
contribuído com a falta de prioridade e compreensão sobre a questão urbana, entrelaçada
com as categorias gênero, raça classe e geração. Além disso, devemos ter estratégias
acadêmicas e políticas na perspectiva de Milton Santos para quem o espaço: “(...) o espaço
deve ser considerado como uma totalidade a exemplo da própria sociedade que lhe dá
vida” (SANTOS, 1985, p.5).
Para Manuel Castells, um dos mais renomados estudiosos da questão urbana em
prefácio ao livro “Alicia Ziccardi, Ciudades latinoamericanas: la cuestión social y la

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gobernanza local” com o título: De los movimientos sociales a la política urbana: La
investigación indispensable de Alicia Ziccardi, afirma:

Numa época em que, mais uma vez, as cidades latino-americanas estão


indignadas com suas condições de vida diante do cinismo e da corrupção das
elites urbanas, é essencial ler e reler a obra de Alicia Ziccardi, porque foi ela, ao
longo de uma distinta carreira acadêmica na Argentina, Brasil e México que,
melhor do que qualquer outro estudioso do assunto, identificou a interação entre
os movimentos reivindicatórios dos assentamentos populares e a formação de
políticas urbanas. Apesar de prestar atenção aos projetos de mudança social que
surgiram a partir do protesto social, ele não idealizou tais movimentos como
novas formas revolucionárias que viriam para substituir as construções
ideológicas de um proletariado de valor que mal era deu nessas latitudes – e que
quando existiu era peronista (CASTELLS, 2020, p. 61).

A civilização capitalista-imperialista com séculos de atrocidades dentro e fora da


Europa, passando pela violência colonial às duas guerras mundiais são provas cabais de
que seus valores não contribuíram para um mundo mais justo, mais igualitário e fraterno,
muito pelo contrário. Nesse cenário, para superação dos valores escravistas, racistas e
patrimonialistas, partriarcais e sexistas, os desafios dos e das oprimidas de todo o mundo,
é criar e/ou reforçar os instrumentos de transformação através das ciências, dos
movimentos sociais antirracistas, anti sexistas, anticolonialistas, anti-homofóbicos e anti-
lesbofóbicos e movimentos políticos mais amplos.
Assim, para a compreensão do problema racial no chamado Novo Mundo e suas
interfaces com a formação das nossas sociedades, a formação da sociedade capitalista, o
desenvolvimento das classes sociais e de suas implicações com a cristalização das raças,
se faz necessário partir do debate histórico que se dá nas ciências em geral, principalmente
as Ciências Sociais e suas interpretações coloniais e escravistas para a descolonização do
saber e do poder.
Na contemporaneidade, o sistema capitalista e suas prioridades absolutas de
mercado, de políticas neoliberais que destroem as conquistas da classe trabalhadora que
empreendeu ao longo do tempo muitas lutas e negociações por um Estado de Bem Estar
Social em países desenvolvidos, mas conseguido às custas dos países não desenvolvidos
e não por acaso são os do chamado Novo Mundo com exceção dos EUA, que os
substituíram em parte no pós-guerra, porém, de grande exploração da classe trabalhadora
como é a lógica capitalista.

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No que diz respeito a atual fase do capitalismo global, Thomas Piketty (2013)4,
mostra como a repartição das riquezas constitui um problema político fundamental para
a estabilidade das sociedades democráticas modernas, e esta questão é muitas vezes
discutida sem números precisos. O estudo é baseado numa compilação de variados dados
históricos disponíveis, por exemplo, nos arquivos fiscais franceses. É um livro de
economia que estuda a dinâmica da repartição dos rendimentos e da riqueza nos países
desenvolvidos desde o século XVIII e tem uma enorme relevância para os estudos sobre
as desigualdades socioespacial e sabemos que são principalmente sociorracial.
A riqueza que é produzida pela classe trabalhadora do mundo e a apropriação da
mais-valia pela burguesia, onde as mulheres é a parte maior da superexploração pelo
capital à medida que parte é trabalho não pago e outra mal paga. Isso quer dizer que o
capitalismo global concentra riqueza de forma escandalosa e desafia todas as sociedades
que buscam igualdade e democracia. A nossa “Democracia em Vertigem”5 e ameaças de
golpe na América Latina é prova disso. O nosso continente vive em permanente
sobressalto pelo histórico de golpes no passado e no presente pelos imperialistas de
plantão.
Nossas estratégias de combate ao racismo e ao sexismo além da divisão de classes
nas nossas sociedades passa pelo enfoque epistemológico de afro-centralidade em que os
povos de África e sua diáspora devem ser o centro dos estudos e dos fenômenos sociais,
ou seja, sejam protagonistas da sua própria história em todas as dimensões. Nessa
perspectiva, destacamos os eventos históricos em que os povos africanos e
afrodescendentes foram protagonistas da própria história, mas sempre invisibilizados,
sobretudo em relação às mulheres negras. Desse modo, questionar as classificações
sociais universais impostas pelo eurocentrismo no tempo e no espaço é fundamental para
formação das nossas identidades e estratégias de superação do modelo de sociedade
imposto pelo capitalismo desde sua acumulação primitiva até a contemporaneidade, onde
o proletariado é cada vez mais inútil ao capital no capitalismo financeiro e proporciona
maior exploração com um imenso exército de reserva, jamais visto.

4
O Capital no século XXI (Le Capital au XXI e siècle) é um livro de economia escrito por Thomas Piketty
e publicado pela primeira vez em França em 2013 pela editora Éditions du Seuil. Neste livro, o Autor estuda
a dinâmica da repartição dos rendimentos e da riqueza nos países desenvolvidos desde o século XVIII.
5
O documentário de Petra Costa que concorreu ao Oscar e fez muito sucesso, trata da interrupção do
mandato de Dilma Rousseff , do golpe de 2016, dos governos do PT, e mais uma vez um dos momentos
mais dramáticos e turbulentos da História do Brasil.

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Portanto, a crise do capitalismo atual com as políticas neoliberais que tem
provocado grandes concentração de renda e riqueza em poucas mãos, desigualdades
urbanas expressas nas periferias, assim como a informalidade, o desemprego, a fome, a
mobilidade espacial em várias escalas e motivos6 e mostra a complexidade do momento
histórico que vivemos. Entretanto, apesar desse cenário, a direita e extrema direita tem
avançado nas políticas neoliberais que tiram direitos, destroem o Estado de Bem Estar
onde foi conquistado. Na América Latina o império americano continua apoiando e
promovendo ataques a governos progressistas e socialistas para impor seus interesses
imperialistas7. Ou seja, o capitalismo nunca deixou de ser selvagem.
O arsenal político, ideológico e econômico da classe dominante branca que trata
as políticas públicas fundamentais como saúde, educação, alimentação, moradia decente,
como gastos e usa a caridade para submissão total dos grupos mais vulneráveis
socialmente, mas como vimos, somente através das lutas pretéritas e contemporâneas
podememos derrotar a opressão de gênero, raça e classe.

OS DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS PARA A CONSTRUÇÃO DE


SOCIEDADES-CIDADES IGUALITÁRIAS EM MÚLTIPLAS DIMENSÕES

Ao contrário do que as narrativas eurocêntricas e falocêntricas propagam no seu


imenso arsenal político-ideológico-cultural-econômico e epistemológico, as lutas
libertárias negras e indígenas que ocorreram ao longo dos séculos de escravidão no
chamado Novo Mundo, mostram que nossos ancestrais (homens e mulheres) contestaram
a escravidão e buscaram alternativas. A Revolução Haitiana, (“Uma História Impensável”
como analisa Michel-Rolph Trouillot, 1995, p.70), no século XVIII, levando à destruição
da escravidão e à independência do Haiti, um momento decisivo na história do povo
africano no chamado Novo Mundo é dos mais emblemáticos. De outro olhar “Sequência
de eventos históricos ocorridos na antiga colônia francesa de Saint Domingue, atual Haiti

6
Os dados da ONU revelam um drama crescente de refugiados/as em razão dos conflitos nacionais
existentes em várias partes do mundo, seu aumento exponencial: em 2014, chegou a 59,5 milhões de
pessoas, cerca de 22 milhões a mais em comparação com a década anterior e metade dos refugiados é menor
de idade. A África concentra o maior número dos principais conflitos atuais e de refugiados/as. Pode-se
imaginar o crescimento da crise humanitária com a Pandemia do Coronavirus com a indiferença como
tratam estes grupos humanos especialmente a África por um racismo estrutural histórico e muitas vezes não
declarado.
7
O Brasil sofreu um golpe de Estado em 2016, onde foi derrubada a presidenta Dilma Rousseff, primeira
mulher a governar o país, Venezuela continua sendo ameaçada, Cuba (bloqueio histórico), entre outros.

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na passagem entre os séculos XVIII e XIX e constitui o marco inicial da extinção da
escravidão negra nas Américas” (LOPES, 2004, p.574). Antes, o Quilombo dos Palmares,
no Brasil (século XVII, resistiu por mais de 100 anos), sendo, porém, destruído pelo
império português.
A Revolta dos Búzios, final do século XVIII (1798-1799) ou Conjuração Baiana,
também conhecida como Inconfidência Baiana, Revolta dos Búzios, na capitania da
Bahia, no Brasil, para se libertar da Coroa Portuguesa, embora também derrotada foi
fundamental nas lutas antiescravistas, e contribuíram com as lutas abolicionistas, durante
o século XIX. A historiografia, contudo, ignora em grande medida estes e outros
movimentos que tiveram grande contribuição às lutas libertárias antiescravistas e
antirracistas protagonizadas pelos oprimidos e pelas oprimidas. A Inconfidência Mineira
(1789-1792), ocorrida na Província de Minas Gerais, ao contrário da Conjuração Baiana
é amplamente difundida, com feriado nacional no dia 21 de abril, e Tiradentes herói
nacional cultuado, tendo suas imagens semelhantes à de Jesus Cristo. Reconhecimento
justo, porém, é uma prova do racismo estrutural e institucional ao não tratar com o devido
reconhecimento as lutas negras.
Por outro lado, a Revolução Francesa, em 1789-1799, mesmo período da
Inconfidência Baiana e a Inconfidência Mineira (1789-1792) que foi um movimento
liderado pela burguesia francesa é considerada como um dos mais importantes
acontecimentos da história da Humanidade porque dela iniciou-se o processo de
universalização dos direitos sociais e das liberdades individuais, previstos na Declaração
dos Direitos do Homem e do Cidadão (e a mulher?)8. Além disso, implantou o
republicanismo na Europa e a democracia representativa, fatos de muita relevância para
as sociedades. Contraditoriamente, porém, os protagonistas destas conquistas, mantinham
o processo escravocrata no chamado Novo Mundo e combatiam ferozmente as lutas
negras e indígenas em processo etnocidas e genocidas das sociedades e suas culturas.
Durante a escravidão no “Novo Mundo” a organização de quilombos rurais ou
urbanos foi uma das táticas muito utilizadas. De acordo com Clovis Moura, citando
Edison Carneiro, as formas de lutas escravas se caracterizam pela tomada do poder que
encontrou sua expressão nos levantes dos negros malês da Bahia (1807-1835), a

8
Novas Abordagens no Ensino da Revolução Francesa: Inserção das temáticas de racismo e gênero por
meio da obra de Olympe de Gouges. Livro publicado pelo NEAB-UFU no ano de 2012.

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insurreição armada, especialmente no caso de Manuel Balaio em 1839, no Maranhão e os
quilombos tão bem exemplificados no Quilombo dos Palmares. Moura acrescenta as
guerrilhas e a participação em movimentos que mesmo não sendo seus, adquirira novo
conteúdo. “O quilombo foi, incontestavelmente, a unidade básica de resistência do
escravo. Pequeno ou grande, estável ou de vida precária, em qualquer região em que
existisse a escravidão lá se encontrava ele como elemento de desgaste do regime servil”
(MOURA, 1988, p.103). O fenômeno do quilombismo espalhou-se pelas Américas onde
hoje há descendentes de quilombolas que vivem em enclaves no Caribe, América Central
e América do Sul. Costumavam refugiar-se em bosques e regiões pantanosas, então
abundantes nas Américas. E faziam-no não apenas em busca da necessária proteção.
Quilombolas estabelecidos próximos das cidades negras como Recife, Salvador e Rio de
Janeiro, atuavam em várias atividades, inclusive comerciais. Quilombolas eram muito
atuantes em todas as atividades, contudo, só mais recentemente têm sido reconhecidos a
exemplo de Zeferina que em 1826, liderou a revolta do Quilombo do Urubu, no subúrbio
de Salvador. Além disso, a influência dos povos negros e indígenas se organizavam de
variadas formas e “Na primeira metade do século XX, vários estudos antropológicos
sobre os impactos culturais nas Américas...” (MOREIRA, p. 14, 2006)
À luz das Epistemologias do Sul é que devemos analisar as os sujeitos sociais,
buscando o resgate dos múltiplos significados de suas práticas coletivas a exemplo do
quilombismo9, abolicionismo, Ubuntu y Ubuntu criollo, das revoluções negras com
destaque para as lutas feministas incorporando os feminismos negros, afro-latinos.
Na perspectiva de Abdias Nascimento: “Os quilombos são uma das primeiras
experiências de liberdade nas Américas. Eles tinham uma estrutura comunitária baseada
em valores culturais africanos. Sua organização política era democrática. Seu modelo
econômico era o contrário do modelo colonial” 10
Milton Santos considera que

O espaço como uma instância da sociedade ao mesmo título que a instância


econômica e a instância cultural-ideológica. Isso significa que, como instância
ele contém e é contido pelas demais instâncias, assim como cada uma delas o
contém e é por elas contida. A economia está no espaço, assim como o espaço
está na economia. O mesmo se dá com o político-institucional e com o cultural-
ideológico (SANTOS, 1985, p.1)

9
No quilombo do Urubu Zeferina, liderou a revolta como grande guerreira.
10
No 2º Congresso de Cultura Negra das Américas (Panamá, 1980), Abdias apresenta sua tese do
quilombismo. Ver IPEAFRO. Ipeafro.org.br.

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Ao discutir os desafios fundamentais para o futuro da África e suas diásporas,
Maria Paula Meneses (2016) propõe pensar “de forma radical uma interculturalidade
cosmopolita a partir da exigência de descolonização dos sabres e do sentido de ser” A
descolonização dos saberes passa por exigir o direito à própria história e nessa perspectiva
existem dois desafios principais: “um de natureza ontológica – a renegociação das
definições do ser e dos seus sentidos – e, outro, epistémico, que contesta a compreensão
exclusiva e imperial do conhecimento” (MENESES, 2016, p. 27-28).
Devemos como Frantz Fanon (2009), problematizar o carácter racial da
epistemologia eurocêntrica, buscando as Epistemologias do Sul, como caminhos teóricos-
metodológicos que possibilitam um diálogo intercultural, não hierárquico, que aponta
para novos marcos civilizatórios e superação de relações hierárquicas e desiguais Norte-
Sul como propõe Boaventura de Souza, por exemplo, ao questionar as teorias coloniais
dominantes ou não.
Nesse sentido, a universalidade do sistema de dominação exige também
explicações e práxis universais e particulares, numa relação dialética entre os povos
oprimidos. Nesse contexto, a universalidade da dominação masculina também deve ser
questionada não somente pelos estudos feministas que têm marcos teóricos
fundamentados para uma nova epistemologia que coloca a mulher como sujeito da
história e das Epistemologias do Sul. Nessa perspectiva vamos, a seguir refletir sobre os
desafios coletivos do nosso devir, considerando “O movimento dialético entre forma e
conteúdo, a que o espaço, soma dos dois, preside, é igualmente, o movimento dialético
do todo social apreendido na e através da realidade geográfica” (SANTOS, 1985, p.2).

ROMPENDO AS AMARRAS: FEMINISMO, FEMINISMO NEGRO E


TERRITÓRIOS

As mulheres africanas foram sequestradas e escravizadas no chamado Mundo


Novo, nas últimas décadas do século XVI e tal como os homens negros sofreram com a
violência colonial até o final do século XIX, quando as lutas abolicionistas aboliram a
escravidão oficialmente. Nas senzalas, nos quilombos ou nas cidades constituíram formas
diversas de resistência, participando também de todas as revoltas, revoluções, mas foram
invisibilizadas pelas historiografias coloniais, burguesas-imperialistas, embora estudos

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recentes tenham trazido ao conhecimento mais amplo o protagonismo delas
sistematicamente ignorado.
As sociedades burguesas constituídas com o paradigma colonial-escravista e
patriarcal, diferenciaram o mundo da produção e o da reprodução. Na ordem burguesa o
mundo da produção tornou-se dos homens e o da reprodução das mulheres, e entre outras
questões fundamentais para entender o desenvolvimento capitalista e a ausência do
recorte de gênero nos estudos, destacamos o trabalho feminino e a integração dos
elementos sociais e econômicos em distintos períodos históricos, o que viabilizou a
destruição das formas pretéritas da divisão social e espacial do trabalho, considerando-se
que, antes da industrialização a família formava uma unidade produtiva onde seus
membros, homens e mulheres e crianças produziam, isto é, trabalhavam. Foi com a
implantação generalizada do modelo de produção capitalista que se iniciou a distinção
entre as atividades de produção mercantil e atividades de subsistência, ou seja, trabalho
remunerado (considerado produtivo) e trabalho doméstico considerado improdutivo
(MATINEZ et al, 1995, p. 89).
Cabe ressaltar que as mulheres negras são pioneiras no mercado de trabalho,
mesmo que informal, vendendo todo tipo de produtos em esquinas ou como ambulantes
durante séculos e em feiras livres nas cidades pequenas, médias, grandes ou metrópoles
atuais. Continuam sendo majoritárias nessa condição, assim como o trabalho doméstico
e sustentam com sua força de trabalho não paga o capitalismo na sua fase financeira que
destrói o trabalho e leva a classe trabalhadora ao desemprego e as mulheres com uma
sobrecarga ainda maior. Contudo, não podemos esquecer que a força de trabalho não paga
das mulheres em geral sustenta o capitalismo e sem mudanças na propriedade privada dos
meios de produção a metade da população do planeta vai continuar a sustentar a
acumulação de riqueza para os homens e brancos da classe dominante de uma forma mais
perversa e bárbara do que com os homens brancos e negros da classe trabalhadora, sendo
que os últimos são os mais explorados, principalmente nas Américas pela forma como
foram formadas nossas sociedades.
Assim, as sociedades-cidades forjadas no chamado Novo Mundo sob a égide do
colonialismo e escravismo, mostram que a discriminação contra a mulher no passado e no
presente baseia- se no patriarcado, no racismo e na sociedade de classe capitalista como
um conjunto de sistemas: econômico, sociocultural e simbólico, que precisa ser
enfrentado em todas as suas dimensões visando a construção de novos marcos

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civilizatórios (SAFIOTTI, 1992, p.195). Para Ana Alice Costa:

A exclusão de gênero, assim como outras exclusões, por exemplo a de classe e a de raça,
foram o elemento dominante no processo de formação da classe burguesa como elite
emergente, interessada em afastar as velhas elites aristocráticas e garantir, assim, seu
domínio sobre os estratos populares (COSTA, 1998, p.230).

Nesse contexto, devemos destacar que historicamente, o movimento feminista foi


protagonizado pelas mulheres brancas desconhecendo que nós mulheres negras temos
ascendência africana de mulheres que foram sequestradas pelo império colonial e toda a
sua violência histórica e presente. Ou seja, nós mulheres negras, carregamos o peso das
violências colonialista-escravistas em todas as suas dimensões e queremos romper com
todas as visões e práticas coloniais e pós-coloniais. Contudo, ao longo do tempo-espaço,
as afrofeministas, afrolatinas colocaram o dedo na ferida da “mulher universal” e
reivindicam, propõem e constroem um feminismo negro, como aponta Sueli Carneiro:

Nessa perspectiva, a luta das mulheres negras contra a opressão de gênero e raça
vem projetando novos contornos para a ação política feminista e antirracista,
enriquecendo tanto a discussão da questão racial quanto a questão de gênero.
Esse novo olhar feminista e antirracista está integrado à tradição de luta dos
movimentos negros, bem como o do movimento das mulheres, e afirma essa nova
identidade política que resulta da condição específica de ser mulher e negra. O
movimento atual das mulheres negras trazendo para o cenário político as
contradições resultantes das variáveis raça, classe e gênero está movendo a
síntese de bandeiras de luta que historicamente foram levantadas por movimentos
e movimentos negros de mulheres do país, escurecendo por um lado as
reivindicações feministas para torná-las mais representativas de toda a mulher
brasileira, e, por outro lado, promovendo a feminização das propostas e
reivindicações do movimento negro (CARNEIRO, 2017:111 )

Portanto, é necessário enegrecer os movimentos feministas em toda parte, é


necessário que as Ciências Sociais deem centralidade à questão fundamental da opressão
maior imposta às mulheres negras e indígenas, fortalecendo suas demandas e principais
instrumentos de resistência ao sexismo e ao racismo frente às raças e classes dominantes.
Trata-se de um movimento complexo, de busca da unidade na diversidade que envolve
diferenças sociais, de classe, políticas, regionais, compreendendo que o colonialismo
como espinha dorsal da sociabilidade moderna (capitalista) expõe as reificações presentes
nas representações da civilização capitalista como expressão universal do gênero humano
e o feminismo tem o dever de superar a lógica colonialista e pós-colonialista para a
construção do novo projeto de sociedade. A descolonização do saber implica a crítica

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profunda a concepção humanista burguesa, de um lado, e o direito à própria história e a
constituição das teorias afro feministas e antirracistas, anti-classistas, do outro, como
instrumentos importantes para criação de novos paradigmas, nova cosmovisão, novas
epistemologias, novas práticas que rompam com o processo de dominação em amplas
dimensões.
Neste contexto, as epistemologias, os estudos feministas descoloniais do Sul
elaboradas por afro feministas e feministas apontam outro referencial civilizatório nos
aspectos culturais, religiosos, políticos, económicos e epistêmicos. Portanto, é importante
que os movimentos sociais em geral e os feministas, em particular, não caiam nas
armadilhas criadas pelo colonialismo e pós colonialismo, nos particularismos e avance na
sua identidade historicamente negada e parafraseando o grito marxista pelo projeto de
emacipação humana devemos buscar “Mulheres do Mundo Uni-Vos”! Trabalhadores e
Trabalhadoras do Mundo, Karine Biseca, em “A Revolução será Feminista ou não Será: a
pele da arte feminista descolonial”, aponta as várias possibilidades de transformação
social na perspectiva das mulheres: africanas, palestinas, latino-americanas, caribenhas...
Descolonizar o feminismo é também construir uma proposta global de transformação
social, política, econômica, respeitando-se a diversidade em contraposição às
experiências coloniais e pós-coloniais excludentes. Descolonizar as cidades e campos é
preciso, enfrentado o racismo estrutural, o sexismo e classismo que estão na base das
práticas públicas e privadas.
Nessa perspectiva, ainda que limitada, a Década Internacional Afrodescendente
(2015- 2024) que tem como tema: “Afrodescendentes: reconhecimento, justiça e
desenvolvimento”, pode ser uma oportunidade tanto para questionar e combater todas as
formas de racismo, discriminação racial, sexismo, xenofobia e qualquer tipo de
intolerância relacionada, como para exigir dos governantes políticas públicas de
promoção da igualdade de gênero e raça, criação e/ou funcionamento de instrumentos
com enfoque de gênero-raça transversalisados em todas as políticas públicas.
Restam apenas 4 anos para acabar a década e se faz necessário uma avaliação do
que já foi feito para propor avanços. Em geral existem, entretanto, o neofacismo tem
imposto derrotas às políticas de igualdade de gênero, raça e classe, em muitos países do
Norte e do Sul e o Brasil, particularmente, vive um momento dramático ao eleger um
presidente, machista, racista, homofóbico, ou melhor, um neofascista que está
desmontando todas as políticas públicas, acirrando as violações e o desrespeito aos

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direitos sociais, políticos, ambientais e econômicos, conquistados desde a derrubada da
ditadura militar de 1964, aprovação da Constituição Cidadã de 1988, especialmente nos
13 anos de governo do Partido dos Trabalhadores – PT, quando políticas para mulheres,
negros, indígenas, educação que incluiu estes segmentos, LGBTs, combate à fome, à
exclusão dos historicamente excluídos de direitos fundamentais. Buscando romper o
silenciamento sobre a África negada pela “democracia racial”, em 2003 o presidente Luiz
Inácio da Silva, sancionou a Lei 10.639/03, para que o sistema educacional ensine a
história e a cultura afro-brasileira e africana no Brasil. Já com 16 anos de vigência, esta
grande conquista dos movimentos negros brasileiros, enfrenta enormes obstáculos na sua
aplicação, especialmente nesse momento da nossa história, embora a determinação de
muitas e muitos educadoras e educadores lutem cotidianamente para sua efetivação.

O sentimento que é descoberto no mundo hoje mantém algumas semelhanças


com os cenários que o discurso colonial montado no tempo de Fanon. É como se
o perigo minimalista das potências globais espreitasse cena nas metrópoles, e se
aproximou tão rapidamente que diante de nossos olhos o zoom está se
aproximando: o mundo é perigoso; a casa é perigosa e, finalmente, a mente
capturada também é perigosa. A geografia do terror estreita, respira na parte de
trás da cabeça (BIDASECA, p. 43, 2018).

Considero que ocorreram alguns avanços nas Ciências Sociais e políticas públicas
no reconhecimento do racismo e sexismo como estruturantes das desigualdades
socioespaciais, no entanto, a maioria dos estudos urbanos não tornaram a cidade sexista
e racista como objeto de estudo e nem as políticas públicas urbanas. Com efeito, esta
omissão joga na invisibilidade e na cidadania de segunda classe a grande maioria das
pessoas que constroem a cidade e não gozam dos direitos mais fundamentais (GARCIA,
2013, p.101).

CONCLUSÃO

Nesse artigo tentamos de um lado, refletir sobre a sociedade colonial-escravista,


estruturada na tríade senhores de escravos brancos de origem europeia, escravos/as
negros/as de origem africana e ameríndios deslocados dos seus territórios de origem ou
exterminados, que permeia nossa história. Compreendo, como autoras e autores com os
quais dialogo nesse artigo, que a gênese do chamado Novo Mundo tem seu tripé no
colonialismo-escravismo, patriarcalismo-racismo e no mercantilismo-capitalismo, que
moldou as sociedades nas Américas, negando todas as organizações pretéritas das
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sociedades indígenas e negras em seus territórios exige de todas as pessoas propor e
construir novos projetos civilizatórios.
A construção eurocêntrica das sociedades e cidades no chamado Novo Mundo,
também produziu modelos explicativos que alimentam até hoje uma perversa engrenagem
teórico- ideológica que favorece a reprodução de desigualdades e a perpetuação no poder
dos grupos brancos hegemônicos. “A este modelo interessa a omissão da simbiose
patriarcado-racismo-capitalismo que engendra a discriminação da mulher e que o
patriarcado e o capitalismo, sendo o sistema político e econômico não podem ser vistos
isoladamente, pois é um sistema de dominação com “faces distintas do mesmo modo de
produzir e reproduzir a vida” (SAFFIOTI apud COSTA 1998, p.39-40).
Assim, sexismo e racismo ao hierarquizar os indivíduos segundo atributos físicos
em superiores e inferiores, estruturam os modos de vida e são determinantes na formação
sócio-histórica em todas as sociedades. Nesse sentido, a ideia de raça tem sido eficaz para
manter a dominação multissecular no chamado Novo Mundo, assim como “patriarcado-
racismo-capitalismo” em manter a mulher subalterna, especialmente as afro-
latinoamericanas, afroamericanas, indígenas e caribenhas. Portanto, uma análise sobre o
fenômeno do sexismo e racismo, fenômenos universais, construídos historicamente,
impõe muitos desafios teóricos-metodológicos e políticos.
Por outro lado, buscamos compreender a relevância dos movimentos sociais em
geral e os movimentos negros e afrofeministas, históricos e contemporâneos e em
particular, a partir da história de África (origem da humanidade), que cria as possibilidades
de diálogo intercultural e a descolonização do saber estratégico para as lutas populares
contra todas as formas de opressão e a filosofia africana como um referencial
fundamental:

Ubuntu é a raiz da filosofia africana. A existência do africano no universo é


inseparavelmente ancorada sobre ubuntu. Semelhantemente, a árvore de
conhecimento africano deriva do ubuntu com o qual é conectado indivisivelmente.
Ubuntu é, então, como uma fonte fluindo ontologia e epistemologia africana. Se
estas últimas forem as bases da filosofia, então a filosofia africana pode ser
estabelecida em e através do ubuntu. Nosso ponto de partida é que ubuntu pode
visto como base da filosofia africana (RAMOSE, 1999, 1).

Assim, as teorias feministas e antirracistas, são instrumentos importantes para


criação de novos paradigmas, novas epistemologias, novas práticas que rompam com o
processo de dominação de gênero, raça e classe social. As teorias feministas e antirracistas,

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são instrumentos importantes para criação de novos paradigmas, novas epistemologias,
novas práticas que rompam com o processo de dominação.
Nessa perspectiva, “Construyendo las Epistemologías del Sur: para un
pensamiento alternativo” proposto por Boaventura de Souza Santos (2018), e os aportes
dos feminismos, especialmente dos feminismos negros é o caminho para a constituição
de projetos estratégicos em todas as lutas libertárias contemporâneas.
A questão racial-étnica e de gênero são fundamentais para os estudos e práxis
descoloniais nas perspectivas afrofeministas, afrocaribenhas, afrolatinas, etc. Para a
materialização de tudo que refletimos neste artigo, é o fortalecimento das experiências
contemporâneas dos movimentos negros, movimentos afrofeministas, feministas,
Ubutun, Ubutum Criolo para construção de um mundo novo, de um humanismo novo, de
práticas libertadoras de todas as amarras coloniais e pós-coloniais impostas
historicamente aos povos negros e indígenas principalmente que deve ser nosso objetivo.
Por fim, reafirmar, à luz do que refletimos neste artigo, que as lutas na atual fase
do capitalismo globalizado, igualmente racista e sexista exige um anticolonialismo, anti-
imperialismo, anti-nacionalismos e antifundamentalismo, e unidade na diversidade, a
partir de uma pedagogia dos povos oprimidos.

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Recebido em: 22/09/2020


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