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ASPECTOS CLÍNICOS E ABORDAGEM TERAPÊUTICA EM CÃO

NATURALMENTE INFECTADO POR Trypanosoma evansi


Mariana Feltrin Canever1*, Ana Carolina Vieira de Jesus2, Renato Simões Moreira3, Nathália
Anderson Calomeno1, Carolina Reck4, Paulo Eduardo Ferian5
1
Mestrandas do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal, Centro de Ciências Agroveterinárias, Universidade do
Estado de Santa Catarina - CAV/UDESC; 2Médica Veterinária, Estudante de Pós-Graduação em Diagnóstico por
Imagem em Pequenos Animais, Qualittas, Porto Alegre, RS, Brasil; 3Doutorando do Programa de Pós-Graduação em
Ciência Animal, Centro de Ciências Agroveterinárias, Universidade do Estado de Santa Catarina - CAV/UDESC;
4
Médica veterinária, Laboratório Vertà, Curitibanos, SC, Brasil; 5 Professor adjunto do curso de Medicina Veterinária,
Centro de Ciências Agroveterinárias, Universidade do Estado de Santa Catarina - CAV/UDESC.
*Laboratório de Hemoparasitas e Vetores, Centro de Ciências Agroveterinárias, Universidade do Estado de Santa
Catarina, Av. Luiz de Camões, 2090 - Conta Dinheiro - Lages – SC, Brasil, 88520-000, +55 (49) 3289-9100, E-mail:
[email protected]
RESUMO
Este trabalho apresenta o relato de caso de um cão infectado naturalmente por Trypanosoma evansi
no município de São Borja – Rio Grande do Sul. Na anamnese foi relatado que o animal apresentava
anorexia há 15 dias, apatia, emagrecimento progressivo, cansaço, vômito, poliúria e polidpsia. Ao
exame clínico, o animal apresentava mucosas pálidas, petéquias na região abdominal e temperatura
corporal de 39,2°C. Foi realizado hemograma completo e bioquímica sérica e esfregaço sanguíneo
periférico, no qual, a lâmina apresentou acentuada quantidade de parasitas do gênero Trypanossoma
por campo. Foi realizada a PCR, que confirmou a espécie como T. evansi. O animal foi internado e
instituiu-se o tratamento de suporte associado ao dipropionato de imidocarb aplicado semanalmente
até a redução da carga parasitária. Após quarenta e cinco dias de tratamento, o animal apresentou
normorexia, escore corporal normal e ausência de sinais clínicos, indicando que o imidocarb é um
possível candidato para o tratamento da infecção por T. evansi em cães.
Palavras-chave: dipropionato de imidocarb, anemia, aceturato de diminazene.
INTRODUÇÃO
Trypanosoma evansi está associado a infecções em cães, bovinos, quatis, capivaras, entre
outros animais (SILVA et al., 1995; HERRERA et al., 2004). Em 1994, um trabalho desenvolvido no
estado do Mato Grosso - Brasil, alertou sobre a importância de cães como reservatórios de T. evansi
(FRANKE et al. 1994). Publicações mais recentes, relataram a ocorrência da doença causada por T.
evansi, em cães no estado do Rio Grande do Sul – Brasil (COLPO et al., 2005; FRANCISCATO et
al, 2007). Na década de 80, Mahmoud e Gray, relataram a tripanossomíase causada por T. evansi em
cães, como uma doença potencialmente fatal (MAHMOUD; GRAY, 1980). Nos relatos de caso
descritos, não há um consenso de um protocolo terapêutico único para o tratamento da
tripanossomíase em cães. COLPO et al. (2005) relataram o uso de aceturato de diminazene para o
tratamento de um cão acometido pela doença, porém possivelmente devido à toxicidade do fármaco,
o animal veio a óbito após a administração do medicamento.
Este trabalho, apresenta a abordagem terapêutica em um cão com sinais clínicos causados por
T. evansi, no município de São Borja - Rio Grande do Sul.
METODOLOGIA
Um cão, macho, não castrado, sem raça definida, com cerca de cinco anos de idade, pesando
21 kg, foi atendido em uma clínica veterinária no município de São Borja/RS, sendo relatado à
anamnese que há cerca de quinze dias apresentava anorexia, apatia, emagrecimento progressivo,
cansaço, vômito, poliúria e polidpsia. Ao exame clínico, o animal apresentava mucosas pálidas,
petéquias na região abdominal, temperatura corporal de 39,2°C, linfonodos sem alterações,
desidratação menor que 5%, frequências cardíaca e respiratória dentro dos parâmetros normais.
Foi realizado hemograma completo no equipamento BC-2800 Vet (MINDRAY®) e
bioquímica sérica no equipamento BA-88A (MINDRAY®). No esfregaço sanguíneo de ponta de
orelha, corado com Panótico Rápido®, foi detectada acentuada quantidade de parasitas do gênero
Trypanossoma. Uma amostra de sangue com anticoagulante foi enviada ao Laboratório de
Hemoparasitas e Vetores (LABHEV), localizado no CAV/UDESC, para realização da confirmação
da espécie de Trypanosoma spp. por meio da PCR, conforme descrito por CLAES et al. (2004).
O animal foi internado e instituiu-se o tratamento com doxiciclina (5mg/kg q 12h), prednisona
(1mg/kg q 12h), fluidoterapia intensiva, atropina (0,02mg/kg), dipropionato de imidocarb (6,6mg/kg
q 1semana) e metoclopramida (0,8 mg/kg q 8h) via subcutânea.
RESULTADOS
Os resultados demonstraram anemia normocítica hipocrômica com intensa leucopenia e
trombocitopenia, o que levou a instituição da terapia e internação do animal. Após uma semana de
internação, o animal obteve alta com melhora no quadro clínico. Foi solicitado retorno em uma
semana para reavaliação. Na semana seguinte, o animal retornou à clínica com quadro de anorexia e
vômito. No esfregaço sanguíneo periférico, ainda havia acentuada carga parasitária. O animal foi
internado novamente e realizado transfusão sanguínea, sendo que após alguns dias os episódios de
vômito cessaram, o animal voltou a apresentar normorexia, porém mantinha no hemograma anemia
e trombocitopenia. O diagnóstico molecular confirmou a presença de T. evansi.
Após um mês de tratamento o animal, estava com quadro estável, normorexia, ganho de peso,
ausência de petéquias na região abdominal, mucosa rosa pálida e esfregaço sanguíneo com menor
carga parasitária. Com quarenta e cinco dias de tratamento, o animal já apresentava normorexia, boa
disposição, escore corporal normal e havia uma baixa carga parasitária no esfregaço sanguíneo - entre
1 e 2 parasitas por campo. Não foi possível zerar a carga parasitária no esfregaço até o momento,
porém, atualmente, o paciente encontra-se saudável, sem sinais clínicos e bastante ativo.
DISCUSSÃO
Existem inúmeros casos relatados na literatura da ocorrência de infecção por T. evansi em
cães, porém a abordagem terapêutica é bastante controversa. A literatura mais antiga recomenda o
uso de aceturato de diminazene para terapia de cães infectados com T. evansi (PEREGRINE, 1994),
porém este medicamento apresenta potencial para causar intoxicações (MARTINS, et al., 2015).
O dipropionato de imidocarb é um babesicida utilizado principalmente para o tratamento de
Babesia spp. em bovinos, e seu mecanismo de ação ainda não é completamente conhecido (SPINOZA
et al., 2006). A administração de imidocarb foi testada em Rattus norvegicus infectados
experimentalmente com T. evansi, sem bons resultados, com a ocorrência de recidivas após o
tratamento (DA SILVA et al., 2008).
Devido a debilidade do animal do presente relato, foi optado por fazer tratamento de suporte,
além da administração de imidocarb, visto que o uso de aceturato de diminazene poderia agravar o
quadro do animal, conforme já relatado na literatura (COLPO et al., 2005). Os resultados obtidos
após a terapia com imidocarb, demonstraram que este princípio ativo, associado à terapia de suporte,
é possivelmente uma boa alternativa para redução dos sinais clínicos e da parasitemia.
CONCLUSÃO
Mediante aos resultados observados nesse relato de caso, sugere-se que o dipropionato de
imidocarb, na dose prescrita, possa ser uma alternativa no tratamento da infecção por T. evansi em
cães, associado à terapia de suporte. Mais estudos são necessários para determinar as características
farmacológicas do imidocarb na infecção por T. evansi.
REFERÊNCIAS
CLAES, F. et al. Variable Surface Glycoprotein RoTat 1.2 PCR as a specific diagnostic tool for the
detection of Trypanosoma evansi infections. Kinetoplastid Biology and Disease, v. 3, n. 1, p. 3,
2004.
COLPO, C. B. et al. Infecção natural por Trypanosoma evansi em cães. Ciência Rural, v. 35, n. 3,
p. 717-719, 2005.
DA SILVA, A. S. et al. Aceturato de diminazeno e dipropionato de imidocarb no controle de infecção
por Trypanosoma evansi em Rattus norvegicus infectados experimentalmente. Ciência Rural, v. 38,
n. 5, p. 1357-1362, 2008.
FRANCISCATO, C. et al. Dog naturally infected by Trypanosoma evansi in Santa Maria, RS, Brasil.
Ciência Rural, v. 37, n. 1, p. 288-291, 2007.
FRANKE, C. R.; GREINER, M.; MEHLITZ, D. Investigations on naturally occurring Trypanosoma
evansi infections in horses, cattle, dogs and capybaras (Hydrochaeris hydrochaeris) in Pantanal de
Poconé (Mato Grosso, Brazil). Acta tropica, v. 58, n. 2, p. 159-169, 1994.
HERRERA, H. M. et al. Enzootiology of Trypanosoma evansi in Pantanal, Brazil. Veterinary
Parasitology, v.125, p.263-275, 2004.
MAHMOUD, M. M.; GRAY, A. R. Trypanosomiasis due to Trypanosoma evansi (steel, 1885)
balbiani, 1888. a review of recent research. Tropical Animal Health and Production, v. 12, n. 1, p.
35-47, 1980.
MARTINS, D. B. et al. Intoxicação por aceturato de diminazeno em cães: O que é preciso saber?.
CIÊNCIA&TECNOLOGIA, v. 1, n. 1, p. 29-39, 2015.
PEREGRINE, A. S., 1994. Chemotherapy and delivery systems: haemoparasites. Veterinary
Parasitology. 54, 223-248
SILVA, R. A. M. S. et al. Pathogenesis of Trypanosoma evansi in dogs and horses: hemathological
and clinical aspects. Ciência Rural, v.25, p.233-238, 1995.
SPINOZA, H. S.; GORNIAK, S. L.; BERNARDI, M. M. Farmacologia aplicada à Medicina
Veterinária, 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. 897 p.

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