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Patologia Geral

Veterinária
Morte Celular: Necrose, Apoptose e Calcificação Distrófica

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Atilio Sersun Calefi

Revisão Textual:
Maria Cecília Andreo
Morte Celular: Necrose,
Apoptose e Calcificação Distrófica

• Introdução;
• Morte Celular;
• Calcificação Patológica.

OBJETIVOS DE APRENDIZADO
• Abordar a morte celular, que é uma lesão irreversível, que pode ser classificada em necrose
e apoptose;
• Estudar a necrose quanto aos seus aspectos macroscópicos e microscópico, e aos seus tipos
morfológicos, que apresentam diferentes causas, com necrose coagulativa, caseosa, lique-
fativa, gangrena e esteatonecrose;
• Estudar a apoptose sob o ponto de vista patológico, ou seja, quando ocorre em uma doença;
• Avaliar a calcificação distrófica quanto à causa e à ocorrência. Desse modo, a unidade trará a
visão da morte celular, que é comum em diversas doenças.
UNIDADE Morte Celular: Necrose, Apoptose e Calcificação Distrófica

Introdução
Vimos na Unidade anterior as lesões celulares reversíveis, os processos dos quais
elas decorrem, os estímulos lesivos que podem causar as lesões, bem como seus aspec-
tos macroscópicos e microscópicos, certo? Então, vamos lá! Vimos que, quando cessado
o estímulo que causou a lesão, a célula pode voltar ao seu metabolismo normal.
Mas, quando o estímulo lesivo se torna contínuo, ultrapassando a capacidade de a cé-
lula voltar ao seu estado de homeostase, a lesão se torna irreversível, causando a morte
celular, ou necrose.

Uma das principais causas da necrose é a hipóxia, causada por isquemia ou por insuficiência
cardiopulmonar. Saiba mais sobre na unidade “Degeneração celular”.

Nesta Unidade, veremos a morte celular – necrose e apoptose. Estudaremos as cau-


sas da necrose, bem como sua classificação morfológica, com os aspectos macroscópi-
cos e microscópicos. Com relação à apoptose, estudaremos seus tipos, causas e aspec-
tos morfológicos. As calcificações patológicas serão estudadas ao final da Unidade, em
que veremos sua classificação, suas causas e aspectos macroscópicos e microscópicos.

Morte Celular
A morte celular é irreversível, e pode ser definida como um conjunto de alterações mor-
fológicas, microscópicas e macroscópicas, em um tecido de um animal vivo. Nem sempre
é possível definir o ponto em que a lesão deixa de ser reversível. Há duas características que
ocorrem em uma lesão celular irreversível: a incapacidade de restaurar a lesão mitocon-
drial e dano na membrana celular. Existem dois tipos de morte celular: a apoptose, que
é classificada como fisiológica ou patológica, e a necrose, sendo esta última classificada
como necrose de coagulação (coagulativa), necrose de caseificação (caseosa), necrose
de liquefação (liquefativa), necrose gangrenosa (gangrena) e necrose de gordura (gor-
durosa ou esteatonecrose). Cada um desses tipos de necrose apresenta aspectos morfoló-
gicos e causas distintas, o que será visto detalhadamente em breve.

Necrose
A necrose é a morte celular que resulta de uma série de alterações em processos bio-
químicos celulares que afetam núcleo e citoplasma. Ocorre quando o estímulo lesivo é
de tal intensidade e duração que interrompe o metabolismo celular, parando a produção
de energia e a síntese de produtos celulares. Isso altera a integridade das membranas
celulares e, consequentemente, as funções das organelas – os lisossomos, por exemplo,
não conseguem mais conter as enzimas líticas, que são liberadas ao citoplasma, ativadas
por altas concentrações de Ca++, digerindo e os componentes celulares.

Saiba mais sobre Causas da necrose, disponível em: https://bit.ly/3lwrY5I

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Aspecto microscópico da necrose
Ao microscópio óptico, as alterações morfológicas só são detectadas após a morte
celular. Para você ter uma ideia, até 6 horas após a morte celular, as alterações são ul-
traestruturais, ou seja, só podem ser visualizadas em microscopia eletrônica, entre 6 e
12 horas na microscopia óptica na coloração HE, e entre 24 e 48 horas são visualizadas
as alterações macroscópicas!
Falando das alterações microscópicas, no que devemos prestar atenção quando es-
tamos uma lâmina de um tecido necrótico? No núcleo celular! Lembre-se de que ele é
basofílico, ou seja, cora com hematoxilina e apresenta formatos diversos de acordo com
a célula analisada, podendo ser redondo, oval, amplo, pequeno. É muito importante
você se lembrar do núcleo no tecido normal, para assim diferenciar do núcleo da célula
necrótica, certo? Vale enfatizar que, em uma lâmina de um tecido que sofreu um pro-
cesso patológico, normalmente haverá uma área de lesão e outra sem lesão. Para isso,
é importante avaliar o tecido em todos os aumentos, e os detalhes do núcleo devem ser
visualizados no aumento de 400 vezes!
Quais são as alterações visualizadas no núcleo? São, principalmente, aquelas relacio-
nadas à cromatina! Ao observar uma lâmina de necrose, você poderá ver as três altera-
ções nucleares, conforme esquema da Figura 1.
• Picnose: Nessa alteração ocorrem a contração e a condensação da cromatina,
em que há diminuição acentuada do tamanho do núcleo, que fica intensamente
basofílico e homogêneo (uniforme);
• Cariorrexe: Há fragmentação do núcleo, e é possível ver seus fragmentos disper-
sos no citoplasma;
• Cariólise: Há digestão da cromatina, o que torna o núcleo invisível, não sendo
visualizado na coloração HE (de rotina), ficando um aspecto de núcleo fantasma.

Picnose Cariorrexe Cariólise


Figura 1 – Representação esquemática das três
alterações nucleares que ocorrem na necrose

Saiba mais sobre alterações nucleares, disponível em: https://bit.ly/2NCtLdc

Então, por que ocorrem essas alterações? Devido à diminuição acentuada do pH da


célula morta, o que leva à condensação da cromatina, além da ação enzimática, com
as desoxirribonucleases, as quais degradam o DNA, além de proteases, que degrada-
rão proteínas.

E com relação ao citoplasma? Na coloração HE, são pouco visíveis. O que pode ser
visto é um aumento da acidofilia, ou seja, o citoplasma ficará mais eosinofílico, o que

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UNIDADE Morte Celular: Necrose, Apoptose e Calcificação Distrófica

ocorre pela degradação das proteínas, e libera radicais ácidos no citoplasma. Com a evo-
lução do processo, pode ser vista na lâmina histológica uma área amorfa eosinofílica,
homogênea e com limites pouco definidos. Outra característica importante é que você
verá células inflamatórias nas áreas de necrose.

Aspecto macroscópico da necrose


Entre 24 e 48 horas após a morte celular, você vai começar a visualizar as alterações
macroscópicas da necrose. Por que esse intervalo de tempo amplo? Os tecidos são dife-
rentes e podem apresentar constituição diferente – por exemplo, uma célula pode ter mais
mitocôndrias, um tecido pode ter mais gordura. Lembre-se dos diferentes órgãos e dos
diferentes tecidos que os constituem – cada um dos tecidos tem uma característica própria.
Quando vamos examinar um órgão que apresenta foco de necrose, ela se destaca
das demais porque é uma área demarcada, com coloração, aspecto e consistência di-
ferentes do tecido normal. Se avaliamos uma área de necrose no fígado, veremos uma
área pálida, bem demarcada, macia e friável, ou seja, pode ser desfeita com a pressão
dos dedos. Entretanto, os aspectos microscópicos e macroscópicos da necrose podem
variar de acordo com a sua causa, o tempo decorrido da morte celular e o tecido afetado,
conforme veremos a seguir.

Aspecto microscópico da necrose


O tecido necrótico é diferente do tecido normal. Já estudamos as alterações nuclea-
res, as quais poderão ser vistas em uma lâmina de necrose. Também vimos que o tecido
necrótico poderá ficar mais eosinofílico que o tecido normal, o que chamamos de au-
mento de densidade óptica. Como assim? Justamente por ele ficar mais eosinofílico,
a densidade da coloração fica mais evidente, o que o torna facilmente diferenciado do
resto do tecido! Outro processo que poderá ocorrer em um tecido necrótico é a calcifi-
cação distrófica, que veremos ao final desta Unidade.

Tipos de necrose
Vimos os aspectos macroscópicos e microscópicos da necrose. Agora vamos estudar
os tipos de necrose, que são:
• Necrose de coagulação ou coagulativa;
• Necrose de caseificação ou caseosa;
• Necrose de liquefação ou liquefativa;
• Necrose gangrenosa ou gangrena;
• Necrose de gordura ou esteatonecrose.

Necrose de coagulação
É a necrose que ocorre por desnaturação proteica – por isso o termo coagulação, em
que o contorno celular é preservado, ou seja, você consegue reconhecer a célula, embora
haja aumento da densidade óptica (Figuras 2 e 3). O núcleo pode ser visto em picnose, em
cariólise ou em cariorrexe. Essa necrose é vista com menos frequência no tecido nervoso,
sendo possível em todos os demais tecidos. Macroscopicamente, a área de necrose será

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bem demarcada, esbranquiçada, com uma área avermelhada ao redor da lesão (halo de
hiperemia), comumente vista no rim, ou avermelhada, como observada no baço.

O que pode causar a necrose de coagulação?


• Hipóxia tecidual: É a principal causa da necrose de coagulação. Geralmente
ocorre em áreas de perfusão sanguínea deficiente, como em casos de insuficiência
cardíaca. Quando há bloqueio completo, o que chamamos de isquemia, causando
infarto tecidual. Por isso, você pode encontrar o termo “necrose isquêmica” se
referindo à necrose de coagulação. Microscopicamente, você verá um halo de hi-
peremia circundando a área necrosada, que é avermelhado, repleto de hemácias,
para compensar a isquemia. Os conceitos de hiperemia, isquemia e infarto serão
discutidos na Unidade “Distúrbios hemodinâmicos, tromboembólicos e choque”;
• Exotoxinas bacterianas: Como elas se ligam a receptores na membrana celular,
podem desencadear reações metabólicas, incluindo a liberação de enzimas lisossô-
micas, que geram a necrose de coagulação;
• Agentes tóxicos: Eles podem originar reações que geram produção excessiva de
radicais livres, danificando a membrana celular, de forma aguda ou crônica, de
acordo com a dose do agente tóxico e o tempo de exposição.

Saiba mais sobre Necrose coagulativa, disponível em: https://bit.ly/2NCtLdc

Figura 2 – Rim, necrose de coagulação


Fonte: Universidade Cruzeiro do Sul, 2020

Presença de corpúsculo glomerular (seta preta) e os túbulos renais com au-


mento da eosinofilia, com seus contornos demarcados (setas azuis). O tecido
está muito inflamado (células entre os túbulos (setas verdes). Coloração HE,
aumento de 40 vezes.

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Figura 3 – Rim, necrose de coagulação. Detalhe


da lesão, com túbulos necróticos (setas azuis)
Fonte: Universidade Cruzeiro do Sul, 2020

Observar as células inflamatórias entre os túbulos (setas verdes). Coloração


HE, aumento de 400 vezes.

Necrose de caseificação
É a necrose em que, macroscopicamente, você verá uma lesão com limites demar-
cados por tecido conjuntivo fibroso, com aspecto de queijo branco macerado (do tipo
ricota), friável e que range ao corte, porque pode haver calcificação (Figuras 4 e 5).
Você verá no decorrer do curso, que, muitas vezes, as lesões podem ser comparadas
a alimentos para facilitar o entendimento! Chama-se caseosa porque a palavra latina
caseum significa queijo.

Diferentemente da necrose coagulativa, as células perdem seu contorno, então a área


necrótica se torna uma massa homogênea, eosinofílica, com núcleos em picnose ou ca-
riorrexe, por vezes com calcificação distrófica, que fica basofílica. Também é comum
você ver células gigantes multinucleadas, linfócitos e histiócitos ao redor da área necrosa-
da. Por que isso acontece? Bem, esse tipo de necrose é comumente visto na tuberculose,
causada pela bactéria Mycobacterium sp ou na linfadenite caseosa (veja aqui o termo
caseosa!), causada pela bactéria Corynebacterium pseudotuberculosis. Nesses dois casos,
há degradação tardia da parede bacteriana, que vai resultar necrose das células da área
afetada, bem como das células inflamatórias. Esse tipo de processo inflamatório, que é
crônico, é chamado de granulomatoso e será discutido na Unidade “Inflamação e Reparo”.

Saiba mais sobre Necrose caseosa, disponível em: https://bit.ly/2NCtLdc

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Figura 4 – Linfonodo, necrose de caseificação
Fonte: Universidade Cruzeiro do Sul, 2020

Presença de áreas necróticas eosinofílicas (seta azul) e áreas de calcificação


distrófica (seta verde). Coloração HE, aumento de 40 vezes.

Figura 5 – Linfonodo, necrose de caseificação


Fonte: Universidade Cruzeiro do Sul, 2020

Área de calcificação distrófica (seta verde), cápsula de tecido conjuntivo fi-


broso (seta vermelha) e célula gigante multinucleada (seta preta). Coloração
HE, aumento de 400 vezes.

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Necrose de liquefação
Nesse tipo de necrose, você verá uma área pouco demarcada, com consistência gela-
tinosa a mole, por vezes já líquida, com perda da arquitetura celular e tecidual. Ocorrerá
principalmente no sistema nervoso central, causada por hipóxia ou anóxia. O tecido
nervoso (neurópilo) será dissolvido pelas enzimas lisossômicas. Vale lembrar que os
astrócitos também têm como função a sustentação do tecido nervoso, já que há pouco
tecido conjuntivo de sustentação, e tanto os astrócitos quanto os neurônios sofrem ne-
crose – primeiro a necrose coagulativa, e depois, a liquefativa. Se os astrócitos entram
em necrose, também há perda de sua função. Por isso, microscopicamente, a área de
necrose será vista como uma cavidade preenchida por restos lipídicos (lembre-se das
bainhas de mielina que revestem os axônios), restos celulares e líquido, o qual apresenta
coloração eosinofílica discreta. Outra situação em que será vista a necrose liquefativa é
a formação de abscesso, formado por bactérias piogênicas, ou seja, aquelas que geram
pus, que pode ocorrer na maioria dos órgãos.

Saiba mais sobre Necrose liquefativa, disponível em https://bit.ly/2NCtLdc

Necrose gangrenosa
É um tipo de necrose que se inicia como necrose de coagulação, que tem como prin-
cipal causa a hipóxia tecidual. A gangrena pode acometer a pele e outros órgãos, como
pulmão e intestino. Vamos estudar cada um desses tipos.
• Gangrena seca: Geralmente ocorre na pele das extremidades (ponta de orelha,
narina, dígitos, extremidades distais de membros torácicos e pélvicos), por ação de
toxinas bacterianas, fúngicas ou de plantas, e pelo frio. No caso das toxinas, estas
podem induzir vasoconstrição de arteríolas e dano a elas, com formação de trom-
bos – estes vão gerar isquemia e infarto no local afetado. Na lesão por frio intenso,
há congelamento das células do tecido e dos vasos sanguíneos, rompendo-as. De-
pois da necrose de coagulação, começa a haver diminuição da umidade da pele, o
que resulta em mumificação. A pele fica com coloração acastanhada a enegrecida e
fria, porque houve interrupção do fluxo sanguíneo. Não há formação de bolhas de
gás na área lesionada. A coloração ocorre em razão da impregnação por pigmentos
derivados da hemoglobina, o que será visto na Unidade “Inflamação e Reparo”;
• Gangrena úmida (ou pútrida): Ocorre a partir da invasão da área lesionada por
bactérias anaeróbias saprófitas, que liquefazem tecidos mortos e produzem gases
com odor fétido devido ao sulfeto de hidrogênio que os compõe. Na pele, a gan-
grena pode ocorrer em razão de bandagens que comprimem excessivamente uma
área de lesão. No pulmão, pode acontecer por falsa via de medicamentos ou de
conteúdo gástrico ou ruminal, e no intestino, em razão de isquemia e ação de bacté-
rias anaeróbias patogênicas. Quando você vir essa necrose na pele, será uma lesão
escura, brilhante por causa do exsudato e com bolhas. O conceito de exsudato será
discutido na Unidade “Inflamação e Reparo”;
• Gangrena gasosa: É secundária à infecção por Clostridium perfringens e
Clostridium septicum, bactérias anaeróbias que produzem toxinas. Como essas

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bactérias vão contaminar uma ferida? Através de ferimentos perfurantes que atin-
gem tecido subcutâneo e musculatura, que são ambientes anaeróbios (sem oxigê-
nio), fundamentais para a proliferação dessas bactérias. Outra situação em que há
gangrena gasosa é no carbúnculo sintomático, ou manqueira, em que os esporos do
Clostridium chauvoei são ingeridos por bovinos. Os esporos se disseminam por via
hematógena (pelo sangue) a partir do intestino e se alojam nos músculos, ficando
em estado de latência. Quando acontece uma lesão, como traumatismo no manejo,
transporte ou contenção, e os esporo germinam e fermentam o glicogênio do mús-
culo, digerem a proteína muscular, produzindo gás e exotoxinas. Quando você vai
examinar a lesão, verifica que a consistência é crepitante na palpação, ou seja, pa-
rece uma espuma com muito gás, com cor vermelho-escura e com superfície seca.

Saiba mais sobre Gangrena, disponível em: https://bit.ly/2NCtLdc

Necrose de gordura
Esse tipo de necrose ocorre no tecido adiposo, sendo vista principalmente na gor-
dura peripancreática e abdominal. Também é chamada de esteatonecrose. Como pode
acontecer? Vamos lá!
• Pancreatite: É uma inflamação do pâncreas. Lembre-se de que no pâncreas exó-
crino há as lipases, que ficam armazenadas nas células dos ácinos pancreáticos em
forma de zimogênio, que são ativados e liberados no duodeno para sua ação sobre
o bolo alimentar. No caso de inflamação, pode acontecer de haver extravasamento
dessas enzimas dos ductos pancreáticos, causando necrose por digestão enzimática
pelas lipases na gordura peripancreática e na gordura abdominal;
• Trauma abdominal: Quando ocorre um trauma contuso grave em abdome, há
lesão no tecido adiposo, e esse trauma também pode afetar o pâncreas, causando
o mesmo processo descrito anteriormente. Também pode ocorrer em bovinos que
ficam muito tempo em decúbito esternal.

Quando você for olhar uma lâmina de esteatonecrose, vai ver o adipócito necrótico
basofílico, porque ocorre saponificação da gordura devido a uma reação com o íon Ca++
– lembre-se de que o adipócito normal não se cora pela coloração HE. Quando você
vir a esteatonecrose tanto em procedimentos cirúrgicos em abdome quanto em necrop-
sia, verá lesões esbranquiçadas, firmes, irregulares na superfície do tecido lesionado,
lembrando pingo de vela – por isso em alguns livros didáticos você poderá ver o termo
“lesão em pingo de vela”.

Saiba mais sobre Esteatonecrose, disponível em: https://bit.ly/3cJGrYc

Apoptose
É a morte celular programada, que pode ser induzida por lesão do material genético
ou células do sistema imune. Para que isso ocorra, são acionados mecanismos que vão

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UNIDADE Morte Celular: Necrose, Apoptose e Calcificação Distrófica

resultar na morte celular, como a ativação das caspases. Pode ocorrer em tecidos nor-
mais, como no timo, bursa de Fabrícius e fígado. Na apoptose, a célula é fragmentada
e seus fragmentos são fagocitados por células vizinhas, como os macrófagos teciduais,
não sendo vista a inflamação. Cada tecido tem um número de células para que seja
mantida sua função fisiológica. Então os mecanismos de proliferação celular e apoptose
ocorrem para manter a função tecidual. A apoptose pode ser tanto fisiológica quanto
patológica. Vamos ver a diferença?
• Apoptose fisiológica: Ocorre na embriogênese, em que o organismo em desenvol-
vimento vai sendo remodelado até seu nascimento e no período pós-natal. Ocorre
na involução tecidual, por exemplo, no tecido mamário, assim que termina o pe-
ríodo de lactação – as células epiteliais dos ácinos da glândula mamária entram
em apoptose. Por fim, ocorre também no controle da proliferação e diferenciação
celulares, fazendo com que a célula entre em apoptose após cumprir sua função,
tendo como exemplo os linfócitos, que, após um processo inflamatório crônico em
regressão, entram em apoptose. O processo inflamatório crônico será discutido na
Unidade “Inflamação e Reparo”;
• Apoptose patológica: Ocorre em razão de fatores diversos, como infecções virais,
dano ao DNA por radiação, por exemplo, atrofia em órgãos parenquimatosos,
como fígado, e morte de células neoplásicas por linfócitos T citotóxicos.

Aspecto microscópico
Quando falamos de apoptose, diferentemente da necrose, estamos discutindo uma
única célula. Por isso, você não vê uma célula apoptótica sem fazer uma análise mi-
croscópica muito cuidadosa. Para isso, você precisa conhecer as células do tecido que
está vendo ao microscópio. Você verá com mais facilidade em neoplasias, conforme será
discutido na Unidade “Neoplasia”.

Então, qual é o aspecto da célula apoptótica?


• Apresenta condensação do citoplasma e do núcleo
• Cariorrexe
• Formação de bolhas e brotamentos citoplasmáticos
• Fragmentação da célula em múltiplos brotos contendo fragmentos de DNA – cor-
púsculos (ou corpos) apoptóticos

Os corpúsculos apoptóticos são, então, fagocitados por macrófagos teciduais residen-


tes e são intensamente basofílicos.

Morte celular por apoptose, disponível em: https://bit.ly/3qXdb5i


Apoptose em centros germinativos de um linfonodo, disponível em: https://bit.ly/3rfvsLf
Apoptose, disponível em: https://bit.ly/3si8WCJ

A necrose e a apoptose, embora sejam morte celular, apresentam causas e alterações


morfológicas diferentes. Como veremos na Unidade “Neoplasia”, elas podem ocorrer ao
mesmo tempo em neoplasias. Uma diferença bastante importante é que a necrose induz
resposta inflamatória, como vimos nas Figuras 2 e 3, o que não acontecerá na apoptose.

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Veja na Tabela 1 algumas semelhanças e diferenças morfológicas entre necrose
e apoptose.

Tabela 1 – Aspectos comparativos entre necrose e apoptose


Necrose Apoptose
Inflamação Presente Ausente
Número de células envolvidas Múltiplas Uma
Alterações nucleares Presentes Presentes
Ação de agentes patogênicos como causa Pode acontecer Pode acontecer*
Na neoplasia Pode ocorrer** Ocorre
* Na apoptose patológica pode haver a ação de vírus;
** Principalmente em neoplasias malignas

Calcificação Patológica
É a deposição anormal de sais de cálcio em tecidos necróticos ou normais, juntamen-
te com pequenas quantidades de ferro, magnésio e outros sais minerais nos tecidos, por
isso também pode ser chamada de mineralização patológica. Apresenta duas formas:
calcificação distrófica e calcificação metastática. Já vimos a calcificação distrófica
quando estávamos discutindo necrose, então vamos estudá-la com mais detalhes.
A calcificação distrófica ocorre em áreas de necrose e não está relacionada à
calcemia, senso encontrada mais comumente na necrose caseosa, podendo também
ser visualizada nos outros tipos. Isso ocorre porque na morte celular não pode mais ser
regulado o influxo (entrada) de cálcio nas células, que se acumula principalmente na
mitocôndria. A calcificação é um indicador de lesão tecidual – por exemplo, ocorre na
área de necrose, então, antes de haver a calcificação, houve a necrose! Muitas vezes, a
calcificação é tão intensa que não conseguimos ver o tecido necrosado abaixo dela.
A calcificação metastática está relacionada à calcemia, ou seja, à concentração de
cálcio iônico no sangue, ocorrendo em tecidos normais. Para entender esse processo,
você terá que estudar o metabolismo do cálcio.

Saiba mais sobre em Metabolismo do cálcio, disponível em: https://msdmnls.co/2P3XZ9f

As principais causas da calcificação metastática são:


• Insuficiência renal: Há retenção de fosfato, que vai induzir o hiperparatireoidismo
secundário e a consequente hipercalcemia. O cálcio pode se depositar nos múscu-
los intercostais, na mucosa gástrica e nos alvéolos;
• Intoxicação por vitamina D: Pode ocorrer devido à ingestão de plantas calcino-
gênicas por herbívoros, gerando calcificação na aorta, no coração e nos pulmões;
• Hipercalcemia por ação do paratormônio: Observada em linfomas e adenocar-
cinomas, que serão estudados na Unidade “Neoplasias”. Pode haver mineralização
de vasos sanguíneos, rins e pulmões;
• Destruição óssea devido à neoplasia primária (osteossarcoma) ou metastática.

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UNIDADE Morte Celular: Necrose, Apoptose e Calcificação Distrófica

Quando você for analisar um tecido calcificado, verá algumas características, como
a coloração esbranquiçada e uma consistência friável, que range ao corte. Quando você
for observar uma área calcificada na coloração de rotina (HE), verá uma área basofílica,
granular, que pode ser intra ou extracelular (Figura 6).

Algumas vezes, se as áreas de calcificação são pequenas, ou estão espalhadas no


tecido, podem ser confundidas com colônias de bactérias, principalmente por quem está
iniciando os estudos! Como resolver esse dilema? Se o tecido tiver sido colhido por você
em uma necropsia ou em uma biópsia, você verá a macroscopia. Se não, utilize a colora-
ção de Gram para corar as bactérias ou a de von Kossa, que cora fosfatos e carbonatos.

Calcificação patológica, disponível em: https://bit.ly/3s2C1SM


Lesões por plantas calcinogênicas em ruminantes lendo o artigo “Calcinose enzoótica em
ruminantes no Brasil Central”, disponível em: https://bit.ly/3r36IG2

Figura 6 – Rim, calcificação distrófica. Notar áreas de calcificação granulares


e amorfas (seta verde). Coloração HE, aumento de 400 vezes
Fonte: Universidade Cruzeiro do Sul, 2020

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Sites
Departamento de Anatomia Patológica da FCM-UNICAMP
https://bit.ly/2Nxcemv
Departamento de Patologia – UFRJ
https://bit.ly/3lyrhsP
Departamento de Patologia Geral – UFMG
https://bit.ly/3vFEtRf

Vídeos
Apoptose – Morte Celular Programada: Ativação e Execução das Caspases (Patologia Geral)
https://youtu.be/_b2Bg2xFRWs

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UNIDADE Morte Celular: Necrose, Apoptose e Calcificação Distrófica

Referências
CARLOS, S.R.D.L.A. A. Patologia veterinária. 2. ed. São Paulo: Grupo GEN, 2016.

CHEVILLE, N. F. Introdução à patologia veterinária. 3. ed. Barueri: Manole, 2009.

________. Visão geral: lesão, morte e respostas adaptativas. In: CHEVILLE, N. F. Intro-
dução à patologia veterinária. 3. ed. Barueri: Manole, 2009.

GERALDO, B. F. Bogliolo – Patologia geral. São Paulo: Grupo GEN, 2018.

KUMAR, V. Robbins – Patologia básica. São Paulo: Grupo GEN, 2018.

________. A célula como unidade de saúde e doença. In: KUMAR, V. Robbins – Pato-
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MILLER, M. A. Mecanismos e Morfologia de lesão, adaptação e morte celular. In:


ZACHARY, J. F. Bases da patologia em veterinária. São Paulo: Grupo GEN, 2018.

PEREIRA, F. E. L. Introdução à patologia. In: GERALDO, B. F. Bogliolo – Patologia


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ZACHARY, J. F. Bases da patologia em veterinária. São Paulo: Grupo GEN, 2018.

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