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A SINONÍMIA LÉXICA - PAULO MOSÂNIO

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Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos

A SINONÍMIA LÉXICA
Paulo Mosânio Teixeira Duarte (UFC)
[email protected]

RESUMO
Nosso artigo versa sobre sinonímia lexical. Nele nos deteremos em autores de
gramáticas normativas portuguesas para em seguida focarmos linguistas como Ul-
mann (s/d), Palmer (s/d) e Lyons (1979). Nosso propósito é mostrar que a sinonímia
“real” é caso raro por entrarem em jogo fatores de natureza diatópica, diastrática e
diafásica. Fatores como emotividade, valoração, intensidade, previstos no léxico serão
avaliados, e concluímos que só de uma perspectiva “intelectiva”, referencial, melhor
dizendo, pode-se falar em sinonímia nos dois primeiros fatores, dado que, para nós,
um fator como a intensidade descarta a existência de sinônimos.
Palavras-chave: Sinonímia. Léxico. Palavras evocativas. Emotividade. Valoração.

1. Introdução
Um dos assuntos mais polêmicos em semântica é a sinonímia, de-
vido à variedade de fatores que interferem no fenômeno, acerca dos quais
falaremos oportunamente.
Bloomfield (1933), respeito dela, assevera:
Nosso pressuposto fundamental implica que cada forma linguística tem
um significado constante e específico. Se as formas são foneticamente diferen-
tes, supomos que os significados das mesmas também são diferentes (1933, p.
145) (tradução nossa).

Bréal (1992), num capítulo “A Lei da Repartição”, põe em dúvida


a existência da sinonímia. Convém, antes, definir o que Bréal chama de
repartição: “A ordem intencional em virtude da qual as palavras que de-
veriam ser sinônimas, e que o eram efetivamente, tomaram, entretanto
sentidos diferentes e não pode mais ser empregada uma por outra” (1992,
p. 33).
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Afirma o autor que a linguagem tem valor para a troca de ideias,
para a expressão dos sentimentos e a discussão dos interesses e, por isso,
ele se recusa a aceitar uma sinonímia que seria inútil. Ou os termos sinô-
nimos diferem ou um deles desaparece.
Vários fatores interferem na não existência da sinonímia. Um de-
les: quando duas línguas, ou mesmo dois dialetos, entram em contato, há
um trabalho de classificação que consiste em atribuir valores às expres-
sões inicialmente sinônimas. Se um idioma é dado como superior ou in-
ferior, seus termos podem adquirir prestígio ou ficar desprestigiados. Na
Bretanha, verbi gratia, segundo Bréal, os jardins eram denominados
courtils. Uma vez conhecida a palavra jardin, um sentimento de desprezo
se associou à denominação rústica.
A influência das ciências, da filosofia e da literatura pode também
ter influência decisiva. Por exemplo: Platão, no âmbito filosófico, sentiu
necessidade de distinguir dois termos que antes eram sinônimos: archai
(dos princípios) e os stoicheia (os elementos: fogo, terra, ar).
Outro fator a ser considerado é a evolução conceitual na psicolo-
gia dos povos. Um exemplo é a raiz man, que parece ter servido no prin-
cípio para denominar as operações mentais em sua totalidade, o pensa-
mento ou a paixão. Com o passar do tempo, estabeleceram-se distinções,
em nível verbal, entre as duas citadas operações.
Posto isto, vamos falar mais detidamente no fenômeno sinonímia,
aqui no domínio lexical, vez que há a sinonímia frasal ou paráfrase, que,
dada a complexidade, merece outro trabalho, pois envolve aspectos e fa-
tores bem diferenciados da sinonímia lexical. Começamos por incursio-
nar na sinonímia nas gramáticas tradicionais de língua portuguesa para
em seguida adentrarmos a sinonímia na visão da linguística moderna,
com referência a autores como Ulmann (s/d), Palmer (s/d) e Lyons
(1979).

2. A sinonímia nas gramáticas normativas


Existem autores que se limitam a definir a sinonímia em diversos
termos. Dividi-los-emos nos seguintes aspectos:
a) Sinonímia em termos conceituais: Cunha (1986, p. 96) fala de
sinônimos quando as palavras apresentam uma semelhança
geral de sentido, como próximo/perto, feliz/ditoso.

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b) Sinonímia em termos conceituais e tipologia: Pereira (1943,
p. 171-172) se refere à sinonímia quando há palavras diversas
na forma e idênticas ou semelhantes na significação. Sem de-
finir os tipos, apresenta dois tipos: sinônimos perfeitos, como
cara/rosto, beiço/lábio, mortal/letal e sinônimos imperfeitos,
a exemplo de bom/ misericordioso, cavalo/corcel.
c) Maciel (1911, p. 351) remete a palavras com a mesma ideia
ou afirmação (paráfrase). Depois corrige o que assevera afir-
mando haver semelhança, não identidade de sentido. Reco-
nhece, pois, como geral a sinonímia imperfeita, sendo rara a
perfeita.
d) Sinonímia em termos conceituais, tipologia e fatores interve-
nientes: Silva Jr. e Andrade (1894, p. 173) estranhamente fa-
lam de sinônimos como palavras que pertencem à mesma ca-
tegoria gramatical e idêntico sentido, mas depois admite a ne-
cessidade de existir a mesma classe gramatical e reconhece
que, no uso, há nuanças diversas de sentido. Identifica como
fator interveniente a mesma extensão, no sentido lógico do
termo. Reconhece sinônimos perfeitos, a exemplo de ava-
ro/avarento, arroto/ eructação, espectro/abantesma e imper-
feitos, mas não exemplifica. Admite como fatores para a si-
nonímia: a polionomia, a tendência para nomear diversamen-
te os objetos, a renovação erudita via cultura literária, a cria-
ção vernácula com suas potencialidades, a importação estran-
geira, o vocabulário plebeu e a gíria e as diferenças dialetais.
A sinonímia perfeita é, para os autores, fato raro, devido à
restrição de sentido, como em nédio/nítido, rezar e recitar.
Maciel (1911, p. 105-109) acolhe os sinônimos como vocábulos
de significação idêntica ou semelhante: júbilo/contentamento, regozi-
jo/alegria, identifica os de natureza perfeita e os de natureza imperfeita,
podendo haver os de mesma raiz ou orgânicos ou de natureza imperfeita
ou raízes distintas.
Cegalla (1983, p. 203) reconhece a existência de identidade ou
semelhança de sentido. No segundo caso, interfere: a maior ou menor
amplitude de significados (veículo/carro), o uso corrente ou literário,
técnico ou científico. Só uma ressalva: hiperônimos como veículo, que
contém o termo carro só se dão no nível do texto não do léxico.
Lima (1976, p. 448-451) apresenta uma exposição densa e enxuta.
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Acolhe a sinonímia imperfeita como predominante, pois interferem a
tecnicidade ou usualidade da palavra, o emprego corrente ou literário o
uso nobre ou plebeu, que é, reconheçamos, critério vago. Não há registro
literário apenas porque a palavra é erudita. O termo plebeu.
Notamos que os gramáticos referidos se atêm aos significados di-
tos referenciais. Basta que vejamos os exemplos de Cunha (1986) fe-
liz/ditoso, sendo o segundo vocábulo de cunho formal. Silva Jr. e Andra-
de (1894) sinonimizam regozijo, de natureza formal, e alegria, da lingua-
gem corrente em termos de frequência. Chega a dar como sinônimos fan-
tasma e abantesma, este último de caráter arcaico. Pereira (1943) dá co-
mo sinônimos mortal e letal, este mais formal.

3. A sinonímia em perspectiva linguística


3.1. A perspectiva de Ulmann
Ullmann (s.d.) reconhece que há uma grande dose de verdade nas
afirmações contrárias à possibilidade de uma completa sinonímia. Admi-
te, porém, que não é verdade inquestionável. Exemplifica com a lingua-
gem técnica. Dá como exemplos os termos da Fonética espirantes e fri-
cativas, que o mesmo autor, segundo ele, pode usar indiferentemente.
Exemplifica também com os termos da Linguística: semântica e semasio-
logia, e da Medicina: cecitus e typhlites (inflamação do intestino cego).
Em alemão, temos: Lautlehre e Phonetik, (Fonética), Formenlehre e
Morphologie (Morfologia), Bedeutungslehre e Semantik ou Semasiologia
(Semântica). Não concordamos com Ullmann in totum. Basta que tome-
mos como exemplo a Química e a Farmácia. O que na primeira se chama
ácido clorídrico na segunda se chama cloreto de hidrogênio. Os exemplos
podem se multiplicar entre estas duas ciências referidas e a mineralogia.
Ullmann, porém, remete a recentes estudos sobre formação de
terminologias industriais, os quais mostraram que vários sinônimos sur-
giram em torno de uma invenção.
Ullmann admite, contudo, que, feita a contabilidade, poucas pala-
vras são completamente sinônimas no sentido por não serem permutadas
em qualquer contexto, sem que isto acarrete a mais leve alteração do sig-
nificado objetivo. Apoia-se nas conclusões de Collinson, que podem ser
assim estabelecidas:
a) um termo é mais geral que outro: recusar/rejeitar;

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b) um termo é mais intenso que outro: repudiar/rejeitar;
c) um termo é mais emotivo que outro: gana/vontade;
d) um termo pode implicar aprovação ou censura moral enquanto
o outro é neutro: parco, frugal/econômico;
e) um termo é mais profissional que outro: óbito/morte;
f) um termo é mais literário que outro: passamento/morte;
g) um termo é mais coloquial que outro: recusar/declinar;
h) um termo é mais local ou dialectal que outro: tangeri-
na/mexerica
i) um dos sinônimos pertence à linguagem infantil: papá/pai.
Podemos esquematizar a proposta de Ullmann conforme o que as-
senta Martins (1989, p. 105-07).
a) Distinção em termos de diferença objetiva: um termo é mais
geral: carro/automóvel, cortar/decepar, morrer/perecer.
b) Distinção em termos de intensidade: berrar/gritar; supli-
car/pedir; gargalhar/rir/sorrir.
c) Distinção quanto ao teor emotivo e avaliativo: abando-
nar/deixar; maníaco/sistemático.
d) Distinção em termos de valores evocativos (que, segundo Bal-
ly (1951, p. 203), dizem respeito à origem ou à variedade so-
ciolinguística de uma palavra):
· um termo é mais profissional que outro: cirurgi-
a/operação; escabiose/sarna.
· um termo é mais literário que outro: venusto/belo; fa-
laz/enganador; ósculo/beijo.
· um termo é mais coloquial ou mais vulgar que outro: ba-
gunça/desordem; boia/comida; unha-de-fome/avaro; mili-
co/soldado.
· um termo é mais real ou dialetal que outro: vas-
quim/escasso; quicé/faça; quengo/cabeça.
Há que destacar-se, como a própria autora reconhece, que é difícil

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traçar uma distinção clara entre os parâmetros b e c porque intensidade e
emotividade se imbricam. Há que se ir mais além: a dificuldade estabele-
cer limites entre intensidade, emotividade e valoração, pois são subespé-
cies da função expressiva da linguagem. Por exemplo, a palavra esquelé-
tico é mais intensa que magro e mais “valorativa” e emotiva. Os três tra-
ços ou dois deles podem comparecer, mas se aparece intensidade, temos
por bem descartar sinonímia.
Se um termo é mais intenso, que outro, não há sinonímia, pois es-
ta conotação já está prevista no léxico, não havendo sobreposição se sen-
tidos mesmo quando nos limitamos à referencialidade.
Ademais, não se pode falar de um termo mais literário que outro
em função do caráter raro do termo, porque o caráter erudito de um termo
não implica sua literariedade, vez que a literatura não se compõe necessa-
riamente de palavras eruditas.
A distinção, em termos caráter evocativo de cunho diatópico, é
um problema porque, se numa região, uma palavra é usada e noutra é
questionável falar de sinonímia a não ser que nos atenhamos a ela em
termos referenciais O mesmo se diga dos valores evocativos.
Apesar do exposto, não se vá inferir que não existam palavras cu-
jos significados não se cruzam. Generoso na expressão rapaz generoso
pode ser substituído sem problemas por bondoso.
A sinonímia parcial pode dar-se em conformidade com o contex-
to. A admissão deste tipo de sinonímia é acatada entre diversos linguis-
tas, a exemplo de Câmara Jr.:
Há necessariamente coincidências múltiplas, e a equivalência significativa
de duas ou mais palavras, possível em princípio, ainda é mais possível numa
dada situação linguística, onde só funciona uma parte do campo semântico
que cada palavra abarca. É fácil afirmar, por exemplo, diferenças de acepção
entre termos como luta e guerra, tomados isoladamente; mas numa frase so-
bre “a guerra na Coreia” se pode usar, em substituição, luta sem qualquer pre-
juízo do alcance informativo (1978, p. 54-5).

Na linguística textual, observou Fávero (1991, p. 24): “o impor-


tante é a identidade referencial, pois a sinonímia não é um problema pu-
ramente léxico, mas textual”. Mas valores conotativos podem interferir e
afetar a sinonímia, repetimos, e podem ter implicação estilística. Em es-
sência, o que pensa Fávero se associa ao mesmo parecer de Guimarães
(1990, p. 31), para quem são lexemas sinônimos os que possuem identi-
dade referencial. Fazemos a mesma ressalva feita a Fávero.

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Assentada a possibilidade da sinonímia parcial como regra, inda-
gamos se existem métodos para aferi-la. Um dos métodos propostos é o
da substituição. Por este método, pode-se inferir sinonímia entre dirigir e
governar em determinados contextos, mas não em todos. Ullmann (s.d.,
p. 296) chama atenção para o fato de que pode não haver sobreposição no
que tange aos aspectos estilísticos. Embora próximos quanto ao signifi-
cado objetivo, dois itens lexicais podem diferir quanto aos registros ou
níveis de estilo, o que interfere obviamente na permutação deles.
A tecnicidade, quando restrita e não divulgada na linguagem co-
mum é questionável. Óbito e escabiose constituem sinônimos de morte e
sarna, respectivamente em termos de referencialidade, mas não em ter-
mos de valores “técnicos”. Salientemos que, quando itens lexicais se dis-
seminam na linguagem quotidiana perdem o caráter técnico e desfazem
sinonímia, a exemplo de mania (doença mental) e mania (hábito), neuró-
tico (oposta à psicose) e neurose (louco, obsessivo), paranoico (transtor-
no delirante) e paranoico (desconfiado). Na linguagem quotidiana, al-
gum sofre redução, como neura e noia, de neurose e paranoia, respecti-
vamente.
Palmer (s.d., p. 77), todavia, não vê com muito entusiasmo o mé-
todo da substituição, pois ele indica somente a possibilidade de coocor-
rência. Por outro lado, não parece que haja necessariamente uma relação
íntima entre essas possibilidades e a proximidade de significado.
Um critério proposto por Ullmann é o da investigação dos opos-
tos. Deste modo, declinar é mais ou menos sinônimo de recusar quando
significa o oposto de aceitar, mas não quando se opõe a elevar-se. Isto,
porém, não descarta o método anteriormente descrito, pois é exatamente
no contexto em que recusar e declinar podem se alternar, porque ambas
tem o antônimo aceitar. Isto sem falar nas diferenças estilísticas e os ní-
veis de registros sempre em jogo. Ou seja: o método de Ulmann depende
da subjetividade do analista.
Ullmann (s.d., p. 297) propõe adicionalmente um método de dife-
renciar sinônimos, que consiste em agrupá-los numa série em que os seus
significados e tonalidades distintivas se destacam por intermédio de con-
traste. Convenhamos, todavia, que nem sempre é fácil estar atento para
sutilezas de tais séries, das mais diversas ordens entre significados. Isto
depende e muito da argúcia daquele que analisa. A distinção é mentalista
e supõe a priori conhecimento das distinções pelo analista, sendo dada,
pois, a posteriori. Mais uma vez, entra em jogo a subjetividade do lin-

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guista.

3.2. A proposta de Lyons


Lyons (1979, p. 476), mais enxuto na classificação da sinonímia,
apela somente com dois conceitos: o de sinonímia total e o de sinonímia
completa. Para o primeiro tipo, estipula uma condição: possibilidade de
intercâmbio em todos os contextos. Para a segunda, usa como parâmetro
a equivalência entre os significados cognitivo e afetivo.
Existem, então, em termos de combinatória, quatro possibilidades:
a) sinonímia completa e total;
b) completa, mas não total;
c) incompleta, mas total;
d) incompleta e não total.
Lyons, na verdade, apenas organiza o que já estabelecera Ull-
mann, quando este afirmava só se considerar como sinônimas as palavras
que se podem substituir em qualquer contexto sem a mais leve mudança
ou no sentido cognitivo ou no afetivo.
Como vemos, Ullmann mistura dois critérios: o contexto e a natu-
reza do sentido (cognitivo ou afetivo), e Lyons os separa.
A admissão das quatro possibilidades combinatórias, inspiradas
em Ullmann, é, no entanto, provisória em Lyons. Vejamos por quê.
O linguista é ciente das objeções feitas à distinção entre significa-
do cognitivo e afetivo. A primeira objeção é a seguinte: os valores afeti-
vos de um lexema não se separam, na linguagem cotidiana, o que nos pa-
rece sujeito à discussão. Para ele, associações afetivas se superpõem fre-
quentemente ao chamado significado intelectual. Contra isso objeta
Lyons (1979).
Não há necessidade de discutir aqui a validade psicológica das distinções
entre as várias “faculdades” mentais sobre que se basearam originalmente as
distinções entre significados “cognitivo” e “não cognitivo” sem necessaria-
mente subscreverem a ideia de que o “intelectual” é profundamente distinto do
“afetivo”. No que diz respeito ao uso da língua, é verdade, sem dúvida, que se
pode preferir uma palavra a outra por causa de suas diferentes associações afe-
tivas e evocativas. Mas a importância disso varia consideravelmente de um es-
tilo ou situação para outra (1979, p. 477).

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Outra objeção apontada por Lyons e, segundo ele, de maior monta
é a seguinte: não há uniformidade conceitual no tratamento de distinção
sinonímia cognitiva/sinonímia não cognitiva. Citamos este exceto de
Lyons (1979).
Mas é sempre a sinonímia “cognitiva” que se define em primeiro lugar.
Ninguém jamais fala de palavras como “sinônimos afetivos”, mas sim, “sinô-
nimos cognitivos”. Bastaria esse fato para mostrar que “afetivo” está sendo
usado como um termo polivalente que engloba um grande número de fatores
bastante distintos e que podem influir na escolha dum sinônimo num contexto
ou numa dada situação. O que é necessário é que se examine cada um desses
fatores nos termos que lhes sejam apropriados. De nada adianta servir-se da
categoria, sem dúvida importante, das conotações “afetivas” para tudo o que
se pode fazer entrar na categoria do significado “cognitivo” (1979, p. 478).

A despeito dos prós apontados em favor da distinção entre signifi-


cado cognitivo e afetivo, Lyons julga preferível restringir o termo sino-
nímia ao que os semanticistas chamam sinonímia cognitiva. Assim, crê
por bem não mais estabelecer diferença entre sinonímia completa e in-
completa.
De fato, a distinção entre significado cognitivo e afetivo é posta
em termos muito vagos. Convém que atribuamos um valor mais opera-
cional ao que se entende por afetivo, caso contrário, dependendo do au-
tor, o termo adquirirá matizes diversos. Ora dirá respeito apenas ao que
implica emoção; ora se vinculará aos aspectos relativos ao emissor, sen-
do neste caso sinônimo de expressivo. Pode-se chegar inclusive ao ex-
tremo de atribuir ao termo afetivo amplo espectro de abrangência: será
inferido por exclusão, por negação do significado intelectual.
Um dos autores que contesta a oposição entre significado cogniti-
vo e emotivo é Palmer (s.d., p. 76). Apresenta, para tanto, três argumen-
tos:
a) nem é fácil determinar com exatidão o que é significado “cog-
nitivo”, nem razoável tentar defini-lo em termos de proprieda-
des físicas. Deveríamos, sobretudo, notar que nesse sentido
muitos verbos e adjetivos têm pouco ou nenhum significado
cognitivo;
b) há, por exemplo, palavras em inglês que são usadas com fins
puramente valorativos, sendo notório o caso dos adjetivos go-
od e bad, embora não se considere que não deveriam ocupar
um lugar especial na linguística;

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c) fazemos juízos de toda a espécie e não apenas em termos de
bom e mau. Fazemos juízos sobre o tamanho e usamos os ter-
mos adequados: gigante/anão, montanha/colina, etc. e faze-
mos ainda outro tipo de juízo quando escolhemos as palavras.
O significado das palavras não é apenas uma questão de factos
“objetivos”; há nele muito de “subjetivo”, e não é possível dis-
tinguir claramente entre uma coisa e outra.
Para muitos autores que acolhem o significado emotivo, há várias
dimensões oponíveis aos chamados significados intelectuais. Queremos
dizer: seria preciso um maior refinamento deste tipo de significado, o que
não é tarefa fácil. Há várias propostas entre as quais a de Eco (1974,
1989). Leech (apud BIDERMAN, 1978, p. 147), um dos autores, por e-
xemplo, oferece os seguintes tipos de significado, entre outros, os quais
se podem contrapor ao significado intelectivo o significado:
a) conotativo: o que é comunicado em razão daquilo a que a lín-
gua se refere;
b) estilístico: o que é comunicado sobre as circunstâncias sociais
dos usos linguísticos;
c) afetivo: o que é comunicado dos sentimentos e atitudes do lo-
cutor/escritor;
d) refletido (sic): o que é comunicado através da associação com
outro sentido da mesma expressão.
Eco (1974, p.42) considera o significado emotivo em meio a vá-
rios tipos de conotação termo que não definiremos aqui por nos levar
demasiado longe. Entre eles, os conexos com a própria definição do le-
xema (Vênus = estrela da manhã), com os valores positivos ou negativos
em torno do lexema (conotações axiológicas), com um dos perfis de sig-
nificado atribuíveis ao item lexical. Ou seja, abrange a valoração tam-
bém. Em outra obra (ECO, 1989), Eco opõe denotação a conotação em
termos imprecisos, o que faz o autor alongar-se, por isso no assunto por
deixar meio nebulosa a noção de denotação. Por isso não trataremos da
extensão do significado emotivo.
Como vimos, o significado emotivo, agora chamado conotação
emotiva, é apenas um aspectos entre outros, que, como halo, ficam em
torno do signo verbal. Dois lexemas podem diferir, por exemplo, quanto
às conotações axiológicas ou emotivas, embora apresentem sinonímia do
ponto de vista estritamente conceptual.
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4. Conclusão
Perini (1995) descrê de uma definição precisa do fenômeno sino-
nímico. Para Perini, “a noção de sinonímia permanece intuitiva e bastante
nebulosa” (1995, p. 249). Afirma o autor que os chamados dicionários de
sinônimos apresentam na verdade palavras de significados muito próxi-
mos, sendo, de fato, dicionários de ideias afins.
O autor tenta estabelecer um critério para a sinonímia, com base
no conceito de implicação mútua: dadas duas palavras A e B, se A impli-
ca B e B implica A, haveria sinonímia. Contra-argumenta com duas pa-
lavras, costume e hábito, cujos significados se implicam reciprocamente.
Todavia, a língua impõe restrições de emprego a uma e outra. Por exem-
plo: é lícito falar de usos e costumes da nossa tribo, mas não usos e hábi-
tos da nossa tribo.
No entanto, apesar de todas as objeções contra a existência da si-
nonímia, existem autores que optam por enfoque menos radical sobre o
assunto, embora admitam que sejam muitos os fatores interferentes, que
limitam a sinonímia e põem em xeque o fenômeno enquanto pura identi-
dade de significados. Se tomada em plano puramente referencial, a sino-
nímia torna-se mais fácil de ser descrita, mas se perdem de vista fatores
de importância referidos aqui.

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