Article54
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ISSN: 2764-3417
Recebido: Dezembro 27, 2022 Aceito: Junho 28, 2022 Publicado: Agosto 01, 2022
Resumo
Estudos sugerem que a vida intrauterina é a primeira fase da formação psíquica do feto. Esta pesquisa buscou
investigar a relação entre as experiências e fantasias vividas pela mãe e também pelo feto durante o período
pré-natal e a constituição como sujeito deste bebê após o nascimento, visando-se então, a contribuição no avanço
dos estudos acerca do olhar psicanalítico sobre a vida intrauterina. Foi realizada revisão de literatura, pelos
bancos de dados Medline, Lilacs, Scielo, Index, SES-SP, Binacis, selecionando artigos científicos em português
e espanhol, a partir de critérios de inclusão/exclusão. Foram recuperados e analisados 19 trabalhos, verificando a
relação entre a vivência da gestação materna com a constituição do bebê. Obteve-se resultados de que a
constituição do bebê depende da constituição da própria mulher como mãe, que ocorre a partir de suas mais
primitivas fantasias, o que é fundamental para a constituição de um bebê imaginário, o qual, após o nascimento,
confrontará a mãe em seu narcisismo regredido durante a gestação. O estudo concluiu que é crucial o bem-estar
da mãe, para além do corpo, abrangendo o apoio familiar e social, bem como sua saúde mental, para que ela
tenha condições de receber o bebê e possa desenvolver uma relação saudável com ele, a fim de que ele se
constitua como sujeito que será antes um com ela, e depois um além dela.
Palavras-chave: Psicanálise, Gestação, Bebê.
Abstract
Studies suggest that intrauterine life is the first phase of the psychic formation of the fetus. This research sought
to investigate the relationship between the experiences and fantasies lived by the mother and also by the fetus
during the prenatal period and the constitution as a subject of this baby after birth, aiming at contributing to the
advancement of studies on the psychoanalytical perspective. about intrauterine life. A literature review was
performed using Medline, Lilacs, Scielo, Index, SES-SP, Binacis databases, selecting scientific articles in
Portuguese and Spanish, based on inclusion/exclusion criteria. Nineteen papers were retrieved and analyzed,
verifying the relationship between the experience of maternal pregnancy and the constitution of the baby. Results
showed that the constitution of the baby depends on the constitution of the woman as a mother, which occurs
from her most primitive fantasies, which is fundamental for the constitution of an imaginary baby, which, after
birth, will confront the mother in her narcissism regressed during pregnancy. The study concluded that the
mother's well-being is crucial, in addition to the body, including family and social support, as well as her mental
health, so that she is able to receive the baby and can develop a healthy relationship with him, so that he
constitutes himself as a subject who will be first one with her, and then one beyond her.
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Brazilian Journal of Science, 1(8), 94-104, 2022. ISSN: 2764-3417
Resumen
Los estudios sugieren que la vida intrauterina es la primera fase de la formación psíquica del feto. Esta
investigación buscó investigar la relación entre las experiencias y fantasías vividas por la madre y también por el
feto durante el período prenatal y la constitución como sujeto de este bebé después del nacimiento, con el
objetivo de contribuir al avance de los estudios sobre la mirada psicoanalítica sobre la vida intrauterina. Se
realizó una revisión de la literatura utilizando las bases de datos Medline, Lilacs, Scielo, Index, SES-SP, Binacis,
seleccionando artículos científicos en portugués y español, con base en criterios de inclusión/exclusión. Fueron
recuperados y analizados diecinueve trabajos, verificando la relación entre la experiencia del embarazo materno
y la constitución del bebé. Se obtuvo como resultado que la constitución del bebé depende de la constitución de
la propia mujer como madre, lo que se da a partir de sus fantasías más primitivas, lo cual es fundamental para la
constitución de un bebé imaginario, que después del nacimiento se enfrentará a la madre en su narcisismo
regresivo durante el embarazo. El estudio concluyó que el bienestar de la madre es crucial, además de su cuerpo,
incluyendo el apoyo familiar y social, así como su salud mental, para que pueda recibir al bebé y pueda
desarrollar una relación sana con él, de modo que que se constituye a sí mismo como un sujeto que será primero
uno con ella, y luego uno más allá de ella.
Palabras clave: Psicoanálisis, Gestación, Bebé.
1. Introdução
Freud (1905), em sua Teoria do Desenvolvimento Psicossexual, aborda o início desse desenvolvimento desde a
fase oral, no qual a meta sexual é a incorporação do objeto, e que acontece após o nascimento do bebê, e já faz
referência ao período do recém-nascimento do bebê, quando este já traz consigo germens de impulsos sexuais
que continuam a se desenvolver por algum tempo, e depois são suprimidos progressivamente (Freud, 1905).
No entanto, com o desenvolvimento da ciência, os estudos se voltaram para uma fase anterior ao nascimento, a
chamada fase intrauterina, apontando o olhar da psicanálise para a formação e desenvolvimento do feto (Carletto,
2019).
Winnicott (2000), ao definir a “preocupação materna primária” fala de um estado psicológico que perdura por
toda a gravidez, principalmente no final desta, prolongando-se até algumas semanas após o nascimento do bebê,
e se trata de um estado que seria considerado doença se a mulher não estivesse grávida, pois neste estado a mãe
desenvolve uma sensibilidade excessiva, que é essencial para o desenvolvimento do bebê. Se não tiver saúde
psíquica suficiente, o desenvolvimento e a recuperação desse estado, conforme o bebê não precisa mais dele,
podem ser afetados.
Carletto (2019) aponta que é no período pré-natal que se inicia a capacidade de aprendizagem e sensibilidade do
bebê, encontrando ainda indícios de registros traumáticos, pertencentes ao período pré-natal e ao nascimento,
que perduram por toda a vida do sujeito.
Esta pesquisa de revisão bibliográfica se justifica pela hipótese da relação entre as experiências vividas pela mãe
e também pelo feto durante o período pré-natal e a constituição como sujeito desse bebê após nascer. Visando-se
então, a contribuição no avanço dos estudos acerca do olhar psicanalítico sobre a vida intrauterina.
O adoecimento psíquico materno, como a depressão materna, pode gerar resultados negativos na criança, como
sequelas biológicas, psicológicas e sociais da depressão perinatal, que interferem na constituição e em toda a
vida desse novo sujeito (Carletto, 2019).
Objetiva-se, com essa pesquisa, correlacionar os dados obtidos na literatura existente e contribuir para evitar e
detectar precocemente possíveis danos na constituição psíquica dos bebês, levando em conta a saúde materna,
tornando possível uma relação mãe-bebê mais consciente e de qualidade.
2. Material e Métodos
Para elaborar este trabalho, a partir dos objetivos da pesquisa, foi realizada uma revisão de literatura exploratória,
no período de um mês, junho de 2021, nas bases de dados Medline (Medical Literature Analysis and Retrieval
System Online), SciELO (Scientific Electronic Library Online), Lilacs (Literatura Latino-Americana e do Caribe
em Ciências da Saúde), Index Psicologia – Periódicos Técnicos Científicos, SES-SP (Secretaria do Estado de
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Saúde de São Paulo) e Binacis (Bibliografía Nacional en Ciencias de la Salud Argentina). Como critérios de
inclusão, foram utilizados os artigos originais, de revisão, nas línguas portuguesa, inglesa e espanhola, sendo
pesquisados os seguintes descritores, correlacionando-os: Psicanálise (and) Gestação (and) Bebê.
Inicialmente, o período de tempo referente ao ano de publicação foram os últimos cinco anos, entretanto, por não
haver material disponível, resolveu-se não delimitar período de tempo referente ao ano de publicação do
material.
Os critérios de exclusão foram os trabalhos que exigiam pagamento para se ter acesso; os repetidos, os que não
eram artigos e os que tinham como foco outros assuntos que não a constituição psíquica do bebê como resultado
da relação com o vínculo mãe-bebê.
3. Resultados
Foram encontrados 45 artigos, dos quais, no total, apenas 38 estavam disponíveis por completo. Entre os 38
artigos restantes, 14 foram na base de dados Lilacs; 17 na base de dados Index Psicologia; 03 na base de dados
Scielo.; 03 da base de dados da Secretaria do Estado de Saúde de SP; e 01 na base de dados BINACIS. Destes,
01 era de base de dados internacional; e 38 de bases de dados Nacionais.
Foram retirados 13 artigos repetidos, restando 25 artigos para referência, dos quais 09 foram na base de dados
Lilacs; 12 na base de dados Index Psicologia – Periódicos técnico-científicos; 01 na base de dados Scielo; 02 da
base de dados da Secretaria do Estado de SP; e 01 na base de dados BINACIS.
Os 25 trabalhos restantes foram lidos e, seu conteúdo, avaliado, excluindo-se, assim, 06 artigos, por não se
relacionarem ao assunto da relação entre mãe e bebê, ou por serem teses ao invés de artigos.
A partir dos critérios de inclusão/exclusão foram recuperados e analisados 19 trabalhos, dos quais 02 foram
publicados em 2008; 01 foi publicado em 2009; 02 artigos em 2010; 05 em 2013; 02 em 2016; 02 em 2017; 01
em 2018; 02 em 2019; e 02 em 2020. Conforme as bases de dados, 08 foram na base de dados Lilacs; 07 na base
de dados Index Psicologia – Periódicos técnico-científicos; 02 na base de dados da SES-SP, e apenas 01 na base
de dados Scielo e 01 na base de dados Binacis.
Além dos artigos recuperados, foram incluídas obras relevantes como referencial teórico, em razão de serem de
grande valia para o enriquecimento da fundamentação teórica desta pesquisa, enfatizando autores como Sigmund
Freud e Donald Woods Winnicott.
Total de artigos
gerados pela busca:
(n = 45)
Artigos completos
Motivos de exclusão de(n=38):
artigos: Index PsicologiaSeleção final – 19
(n=17) artigos
- exigiam pagamento
Lilacs
Fonte: Figura das autoras do artigo para
(n=14)
(2021).
ter acesso completoScielo
(n=7)(n=3) - a relação entre a fase
- artigos repetidos (n=14) (n=3) pré-natal conforme
e a autor, ano de publicação e base de
Na Tabela 01, a seguir, os artigosSES-SP
selecionados se organizam título,
- foco não era BINACIS
dados encontrada: relação (N=1) constituição do bebê
mãe-bebê (n=1) como sujeito
- teses ao invés de artigos
(n=5)
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Realizada a análise dos artigos, procuraram-se informações que associassem o período de pré-natal ao
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4. Discussão
Estudos sugerem que a vida intrauterina é a primeira fase da formação psíquica do feto, onde a pulsão surge de
forma satisfatória para a formação do sujeito, ou não, podendo influenciar para que ao longo da vida, aquele
sujeito desenvolva uma série de patologias de desamparo (Carletto, 2019).
A consciência primária fundamental é o primeiro tipo de sentimento de identidade do bebê, que é construído por
meio da empatia materna (Carletto, 2019). Quando há uma falha nessa transmissão, e a mãe emite estímulos
tóxicos em excesso, sem filtrar para o bebê toda essa toxicidade através da placenta, este acaba sendo invadido
por esse contexto tóxico, não tendo condições de desenvolver sua função primária, ser um sujeito (Maldavsky
apud Carletto, 2019).
Daí a importância de se olhar para o processo de constituição da maternidade, que se inicia antes da concepção
do bebê (Silva; Abrão, 2020), ou seja, desde as primeiras relações e identificações da mulher, passando pela
atividade lúdica, infantil, adolescência, o desejo de ter um filho e a gravidez propriamente dita. Relações estas
que imergem o papel da mãe dentro de representações sociais, e que trazem representações de peso, que podem
trazer à mãe uma maior sobrecarga afetiva.
Takano (2017) faz um percurso sobre as exigências feitas pela sociedade à mulher como mãe, passando desde as
críticas de Rousseau ao mito da mãe perfeita, construído por uma sociedade que coloca a mãe como “rainha do
lar” e tem tudo o que um filho precisa, até a mãe mais contemporânea, que atua no mercado de trabalho, tendo
outros objetos de amor conscientes, para além do filho. Essa condição atual pode colocar a mulher em
ambivalência entre seus desejos inconscientes arcaicos de ser mãe e seus conflitos conscientes que a direcionam
para outras coisas.
Assim, a gestação pode ser uma fase delicada para a saúde mental, retomando a história pregressa da mulher e
reativando conteúdos arcaicos, como o seu próprio nascimento (Miyazaki et al., 2019).
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Assim, quando uma mulher se descobre grávida, atualiza, na relação com o bebê, as questões edipianas que a
marcaram quando ela mesma era bebê, que a constituíram como sujeito (Ferrari et al., 2013). Nessa atualização,
tais questões entram em cena as marcas da sua história na relação com a criança.
De acordo com Ferrari et al. (2013), o reencontro com a completude perdida da menina dar-se-á no momento em
que ela possa repetir (no futuro) a situação vivenciada na primeira infância, quando fazia uma unidade com sua
mãe, em uma mudança de posição (ela no lugar da mãe e o bebê no seu lugar).
Desta forma, estar grávida desperta afetos paradoxais de regozijo e tristeza, de sentimento de plenitude e de
vazio existencial, de certeza e de dúvida, desencadeando angústias que tocam momentos primitivos da
constituição psíquica da mulher (Teixeira; Moraes, 2008).
O bebê também age sobre a mãe, não se colocando sempre de forma passiva nessa relação, se portando como um
sujeito individual, com características próprias (Tavares, 2016). Essa ação do bebê real sobre a mãe e a família
pode salvá-lo de se prender apenas ao que desejaram para ele, visto que se não conseguisse sair desse papel de
bebê imaginário, não se constituiria como sujeito. Aqui percebe-se um ciclo, pois para o bebê conquistar esse
espaço, é necessário que a mãe lhe dê a possibilidade mínima, a partir de sua lida com seu próprio narcisismo,
que será ferido nesse confronto.
Conforme Lopes & Pinheiro (2013), as mulheres durante a gestação, estado considerado especial na preparação
para o exercício da maternidade, iniciam um processo de investimento narcísico em seu bebê, a partir da
identificação delas com o filho(a), mas que também advém da identificação com sua própria mãe e até mesmo
com outras mulheres gestantes ou mães.
Enquanto no início de período gestacional a mãe inflada narcisicamente vive um tempo de plenitude em que mãe
e filho são apenas um, o progressivo contato com um bebê que mesmo no útero vai se fazendo presente resulta,
após o nascimento do bebê real, num crescente e correspondente desinvestimento na mãe e investimento no bebê
(Rosenzvaig, 2010).
“Ninguém completou ninguém” (Moura, 2013) é o que a castração vem anunciar à dualidade mãe-bebê, e é isso
que permite que essa mãe redirecione sua libido para outros objetos além do filho, e o bebê se torne sujeito,
também em busca de completar sua falta. Esse redirecionamento é a capacidade da mãe sair do estado de
Preocupação Materna Primária, como se discorre a seguir.
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Pode-se pensar no processo de luto quando isso acontece, caracterizado por sintomas depressivos, que já que a
mãe precisa estabelecer rearranjos, nos quais o bebê imaginário se ancorará ao bebê real, para quem a mãe deve
remanejar suas expectativas. Em geral, esse quadro depressivo se dissipa em alguns dias, porém há situações em
que ele se agrava, tornando-se patológico e digno de maior atenção e acompanhamento específico (Tavares,
2016).
O apego amoroso e a conexão consciente são a base para a formação de uma vida psíquica satisfatória (Carletto,
2019). Portanto, a vinculação mãe-bebê acontece mais facilmente com a presença, a partir dos sentidos corporais,
que é o que forma o relacionamento. Ou seja, quando o bebê nasce. Quando ainda assim, essa vinculação não se
desenvolve, desconfia-se da saúde da mãe, que pode apresentar transtornos mentais ou não conseguir, por
influência de diversos fatores, desenvolver a prática materna eficazmente, e por isso a importância do olhar
clínico sobre essa mãe, que por vezes é esquecida após a chegada do bebê.
Há ainda a relação patológica, quando a mãe tem dificuldade de se separar do filho ao chegar o momento,
gerando problemas de fusão, o que pode ocorrer se a mãe, ou a pessoa que desempenha o papel materno, foi uma
criança carente em sua história inicial, pois ainda precisará ser cuidada, para poder ter condições para cuidar do
bebê (Carletto, 2019). Isso trata exatamente do que foi falado anteriormente, quando a história do bebê que ainda
irá nascer está permeada da história de origem dos pais.
A ansiedade materna é um fator de risco na formação de vínculo mãe-bebê, o que pode gerar no bebê
dificuldades de sucção, irritabilidade, alterações no sono, choro em excesso, visto que a mãe ansiosa tende a ter
dificuldades para se vincular ao bebê, por estar focada em muitos problemas (Carletto, 2019).
De acordo com Carletto (2019), Em crianças maiores foram encontradas dificuldades escolares, atrasos na fala e
na deambulação, baixo desenvolvimento emocional com dificuldades em resolver situações-problema,
dificuldade na transferência com o analista e também no vínculo amoroso e de confiança com seus familiares,
professores e amigos. O autor considera tais dificuldades como patologias do desamparo, das quais Winnicott
(1999) trata.
Moreira (2017) diz que a chegada de uma criança faria com que os pais ficassem distantes da angústia do
desamparo, uma vez que se sentem onipotentes, pelo poder exercido na criação do filho, que depende de seus
cuidados. Sobre o desamparo, Winnicott (1999) diria ainda que existe um confronto entre o desamparo da mãe e
o do bebê. Então, pode-se compreender que se o bebê desenvolve tais “patologias do desamparo”, isso tem
relação com o desamparo da própria mãe.
Ao se comunicar com escassez de recursos simbólicos, a gestante se resguarda de entrar em contato com esses
conteúdos primitivos, os quais podem estar associados a questões vivenciadas no início da vida, com as figuras
parentais, bem como a sua vivência edipiana ou, ainda, à elaboração da relação da mulher com sua própria mãe,
remetendo-a aos seus conflitos primitivos de separação (Miyazaki et al., 2019).
Assim, a nocividade materna pode se manifestar a partir de dois polos – a possessividade e o abandono. A
excessiva ocupação com o filho seria equivalente à incapacidade da mãe sair do estado de “Preocupação Materna
Primária”, e a ausência de ocupação da mãe seria equivalente à mãe que nem conseguiu entrar nesse estado, e se
manteve em silêncio subjetivo (Moura, 2013).
Tanto doenças desenvolvidas pela mãe, quanto condições do feto podem afetar a relação entre eles e a
capacidade da mãe ser suficientemente boa. A prematuridade do bebê, como crise vivida por algumas mães, pode
acarretar dificuldades, como a sensação de ser perigosa para o seu bebê, incapacidade de cuidar, lutar contra a
decepção e a inevitável culpa por ter parido prematuramente seu filho. O narcisismo da mãe é ferido para além
do “esperado”, pois deu à luz um bebê incompleto ou doente, acentuando-se as fantasias de castração. Portanto,
para que o bebê sobreviva, se faz necessário que a mãe entre em ressonância com o desejo de viver de seu filho
(Marson, 2008), o que se torna mais difícil e exige acompanhamento profissional e apoio de sua rede de
cuidados.
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bebê, e não se pode aprender em livros ou seguindo orientações científicas dos profissionais, mas pode ser
desenvolvida nessa preparação que envolve desejos, afetos e fantasias.
O conceito de mito familiar explica como os personagens familiares e a história daquela família podem
determinar a constituição daquele bebê que está sendo gestado (Tavares, 2016). Ou seja, mesmo que
inconsciente, já existe um discurso anterior ao próprio bebê.
Tavares (2016) aponta que a representação do bebê não seja paralela à gestação biológica, e menciona a
importância, para além do biológico hormonal da gestação, dos aspectos psicológicos, afetivos, históricos,
sociais, entre outros da mulher que se tornará mãe.
Assim, para que uma mãe possa exercer a função materna, precisará se identificar a partir de traços que possam
estabelecer uma ligação de afeto dela para com ele, ainda que esse percurso comporte sentimentos ambivalentes
(Lopes; Pinheiro, 2013).
A gestação é um período de preparação para novos atributos sociais tanto para a mãe quanto para o pai, e quando
há o envolvimento do pai e da família na preparação para a chegada do bebê, o bem-estar dos outros envolvidos
(mãe-bebê) é facilitada (Simas et al., 2013).
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exames, repercutindo emocionalmente para a gestante. Esse papel pode ser tecnicista ou facilitador do processo
de tornar-se pai/mãe –uma vez que confrontam o bebê real com o bebê imaginário –, o que depende do setting
que o profissional pode estabelecer com a gestante e quem a acompanha durante a realização dos exames
(Tavares, 2016).
O profissional que atua em caráter preventivo, possibilitando o espaço de fala da gestante, intervém no processo
de elaboração de conteúdos inconscientes que podem transbordar no momento da gravidez, o que é fundamental
para a construção do lugar materno, bem como para a preparação da mãe para o parto e para a interação com o
bebê (Boas et al., 2013).
5. Conclusões
O presente estudo tende a confirmar as hipóteses iniciais de que a constituição do bebê depende da relação que é
construída a partir da mãe.
No entanto, assim como Granato & Aiello-Vaisberg (2009) enfatizam, deve-se ter cuidado para não se cair no
“mito psicanalítico” de que os problemas emocionais da mãe selam o destino do filho, a despeito das tendências
inatas do bebê em direção ao próprio desenvolvimento emocional e do suporte social que a dupla mãe-bebê
venha a receber.
Como foi trazido neste trabalho, o suporte terapêutico tem uma grande importância no desenvolvimento dessa
relação, tanto nos cuidados maternos, quanto no desenvolvimento e constituição do próprio bebê. Assim, a rede
de apoio se faz fundamental no desenvolvimento dessa mulher como mãe, que também precisa ser vista como
uma mãe real, para que ela também possa atravessar sem tantas dificuldades pela descoberta do bebê real em seu
contraste com o bebê imaginário.
Uma das limitações da pesquisa foi a baixa quantidade de artigos atuais encontrados sobre o assunto da
constituição do sujeito desde a vida intrauterina e sua relação com a saúde da mãe.
Além disso, a maioria dos artigos encontrados foi, principalmente, a respeito de problemas já instalados na saúde
física ou psíquica do bebê, quando os pais vivem o luto pelo bebê imaginário, ou mesmo pelo bebê real. O que
indica a sugestão de trabalhos que atuem na prevenção de problemas, a fim de construir relações saudáveis entre
mãe-bebê-família-sociedade, não adiando a atuação apenas para após a instalação de um problema, mas para sua
prevenção e intervenção.
6. Agradecimentos
As autoras expressam seus agradecimentos às suas famílias e professores, pelo apoio às suas pesquisas.
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