Aula 4 - Princípios recursais

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PRINCÍPIOS RECURSAIS

Função e importância dos princípios.

Os princípios, genericamente falando, são regras não escritas que


decorrem de outras regras escritas, de um conjunto de regras ou do
sistema jurídico como um todo. Eles orientam não apenas a aplicação
do direito positivo, mas, também, a própria elaboração de outras
regras, que a eles devem guardar obediência e hierarquia. Os
princípios gerais dos recursos são princípios fundamentais aplicáveis
ao sistema recursal como um todo, pois foram adotados pelo sistema
jurídico por opção política e ideológica.
Princípio do duplo grau de jurisdição

O princípio do duplo grau de jurisdição consiste no


direito concedido à parte de exigir a revisão do
julgamento que lhe fora contrário por uma instância
jurisdicional superior. O princípio visa o controle da
atividade do juiz, por conseguinte, a segurança
jurídica, a fim de evitar que decisões contrárias à lei
ou à prova dos autos sejam impostas à parte, sem
que seja conferida ao jurisdicionado a possibilidade
de sua revisão.
Esse princípio decorre de regra contida no art. 5º,
LV, da Constituição da República.

Cassio Scarpinella Bueno considera o duplo grau de


jurisdição como um princípio implícito na CF/88.
Para Cassio Scarpinella, o Duplo Grau de Jurisdição
decorre do sistema recursal previsto no texto
constitucional e da cláusula geral do devido
processo legal. O devido processo legal é uma
cláusula geral ou enunciado normativo aberto, isto
é, seu conteúdo é definido pelo juiz de acordo com
as circunstâncias histórico-culturais do momento
judicial.
Pontos negativos desse princípio:
1) dificuldade de acesso à justiça;
2) desprestígio da primeira instância;
3) quebra de unidade do poder jurisdicional;
4) dificuldade na descoberta da verdade mais
próxima possível da real e
5) inutilidade do procedimento oral.
Não obstante, ainda que relevantes, as críticas não
desqualificam o duplo grau de jurisdição como
princípio constitucional, ainda que implícito.
Todavia, a sua aplicação deve ser ponderada em
situações concretas, obedecendo ao princípio da
proporcionalidade, podendo, assim, ser
excepcionado para que a legislação
infraconstitucional restrinja ou até elimine recursos
em casos específicos.
Princípio da Legalidade/taxatividade
(tipificação).
Também chamado de princípio da legalidade, o
princípio da taxatividade consiste na exigência
constitucional (art. 22, I, da CF/88) de que a
enumeração dos recursos seja taxativamente
prevista em lei federal. Não é deixada ao arbítrio
das partes, nem para a competência dos Estados ou
Municípios, tampouco para os regimentos internos
dos tribunais, a tarefa de criar recursos, modificá-los
ou extinguí-los.
Importante observar que a taxatividade recursal não
entra em colisão com o artigo 24, XI da CF/88, uma
vez que a referida norma constitucional apenas
confere competência concorrente à União, Estados e
Municípios para legislar sobre procedimentos em
matéria processual, uma vez que recurso é matéria
processual e não procedimental.
Princípio da Unicidade/Singularidade:

De acordo com o princípio, também conhecido


como princípio da unirrecorribilidade, não é
possível a utilização simultânea de dois recursos
contra a mesma decisão. Por conseguinte, há no
sistema processual apenas um recurso adequado
para cada decisão em determinado momento
processual.
Importante observar que o princípio em
análise comporta exceções, já que, por
exemplo, o art. 1.031 do Código de Processo
Civil prevê a possibilidade de utilização do
recurso extraordinário e especial contra o
mesmo decisum.
Princípio da efetividade/fungibilidade.

O princípio da fungibilidade dos recursos


consiste na possibilidade de que, existindo
dúvida objetiva a respeito de qual o recurso
cabível, o juiz competente receba, processe e
conheça o recurso equivocadamente interposto
pela parte, tal como se o recurso correto
tivesse sido interposto.
Trata-se do recebimento de um recurso como outro, adaptando-se o
nomen juris e o procedimento. Nesse sentido, registre-se que muito
embora, o princípio da fungibilidade não decorra de qualquer regra
expressa, ele encontra-se em consonância com o princípio da
instrumentalidade das formas, previsto no art. 277 do Código de
Processo Civil. Todavia, a dúvida da parte com relação ao recurso
cabível a justificar a interposição do recurso indevido deve ser
razoavelmente aceita, ou seja, a partir de elementos objetivos, como a
equivocidade de texto da lei ou divergências doutrinárias. Se o erro da
parte se afigurar grosseiro, o princípio da fungibilidade não é
aplicável.
A existência de dúvida fundada ou objetiva sobre o
recurso cabível conduz a uma necessidade de
flexibilização do sistema recursal para que sejam
admitidos todos os recursos abrangidos pela dúvida.
Não obstante, conforme jurisprudência sedimentada
no Superior Tribunal de Justiça, deve o indivíduo
interpor o recurso no menor prazo, entre aqueles
prazos conferidos aos recursos abrangidos pela
dúvida.
Princípio da Voluntariedade (renúncia/desistência).

Por força da aplicação desse princípio, que deriva do


princípio dispositivo, não apenas se exige a iniciativa
da parte interessada para a interposição do recurso, como,
também, confere-se a esta a liberdade de delimitar o âmbito
do recurso, podendo impugnar total ou parcialmente a
decisão que lhe fora desfavorável. É também manifestação
desse princípio a regra contida no art. 998 do CPC, segundo
a qual o recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a
anuência do recorrido ou dos litisconsortes, desistir do
recurso por ele interposto.
Princípio dispositivo
O princípio dispositivo é seguido estritamente em alguns países,
vedando ao juiz a possibilidade de determinar a produção de provas
ex officio, tendo as partes o poder exclusivo de alegação e de levar ao
processo as provas que acharem pertinentes.

No Brasil, não é permitido ao juiz proferir sentença com base em


situação fática estranha à lide, mas se permite, pelo artigo 370
do CPC, que o juiz ordene de ofício provas necessárias à instrução do
processo, além das provas apresentadas pelas partes, respeitando
sempre o tratamento igualitário destas.
Em suma, o princípio quer dizer que as partes
devem ter a iniciativa para levar as alegações ao
processo ou indicar onde encontrá-las, bem como
levar material probatório que poderá ser utilizado
pelo julgador para a formação do seu
convencimento e fundamentação da decisão.
Princípio da proibição da reformatio in pejus.
A reformatio in pejus consiste na reforma da decisão judicial
por força de um recurso interposto, capaz de resultar para o
recorrente uma situação de agravamento, de piora, em relação
aquela que lhe fora imposta pela decisão recorrida. Ou seja,
traduz-se num resultado exatamente contrário aquele pretendido
pelo recorrente. Assim, o princípio da proibição da reformatio in
pejus tem como objetivo impedir que essa situação de piora
ocorra por força do julgamento do recurso da parte.
Evidentemente, sendo a sucumbência recíproca e havendo
recurso de ambas as partes, a situação de qualquer delas poderá
ser agravada como resultado do recurso interposto pela parte
contrária, mas não do seu próprio recurso.
Princípio da colegialidade
Decorre da aplicação dinâmica dos princípios do
contraditório e do juízo natural, que, apesar da possibilidade
de delegação de poderes monocráticos para o relator,
viabiliza a interposição de agravo interno para o colegiado
como instrumento de aplicação de um contraditório
dinâmico sucessivo. Ressalta-se que a aplicação desse
princípio está condicionada ao esgotamento das instâncias
ordinárias para o alcance das esferas extraordinárias de
recorribilidade uma vez que a decisão monocrática não
seria de “última instância” (Art. 102, II e III, e Art. 105, II e
III, CRFB/88)
Jurisprudência 1:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. PROTOCOLIZAÇÃO, NA SEQUÊNCIA, DE
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO E DE RECURSO ESPECIAL EM FACE
DO MESMO ACÓRDÃO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA
UNIRRECORRIBILIDADE. SEGUNDO RECURSO. NÃO
CONHECIMENTO. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. 1. “Em virtude do
princípio da unirrecorribilidade, não é possível a interposição de recurso
especial quando ainda pendente de julgamento outro recurso no Tribunal de
origem” (AgRg no REsp 1.201.550/RJ, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima,
Primeira Turma, DJe 13/10/2010). No mesmo sentido: REsp 1.013.364/TO,
Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 11/09/2008. 2. Agravo
regimental não provido. (AgRg no AREsp 396.576/PI, Rel. Ministro
BENEDITO GONCALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/11/2014,
DJe 02/12/2014).
Jurisprudência 2:
AGRAVO DE INSTRUMENTO – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL –
DECISÃO IMPUGNÁVEL POR APELAÇÃO – INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA
– ERRO GROSSEIRO – RECURSO NÃO CONHECIDO. (...) Cuida-se de Agravo de
Instrumento exprobando a R. Decisão de fls., que em feito de Indenização por Danos
Morais e Materiais, deu pela parcial procedência da ação, para o fim de condenar as
Requeridas a restituírem, de forma solidária, os valores pagos pelos Requerentes a título
de danos materiais, no importe de R$ 6.877,40, bem como o valor de R$ 677,78,
referente às taxas condominiais que os Requerentes foram obrigados a pagar no período
de atraso da entrega do imóvel. (...) O recurso não pode ser conhecido. A sentença
julgou parcialmente procedente a ação, devendo ser desafiada por meio do recurso de
apelação. Logo, havendo expressa previsão legal sobre o recurso cabível, não há como
sustentar eventual dúvida objetiva sobre o recurso a ser manejado, tratando-se de erro
grosseiro, o que impede a aplicação do Princípio da Fungibilidade e dá causa ao não
conhecimento do recurso. Assim, por ausência de pressuposto objetivo, NÃO SE
CONHECE do recurso. (TJSP - Agravo de Instrumento nº 2155110-02.2016.8.26.0000,
- Rel. Des. Giffoni Ferreir – j. 31.08.2016).
Conclusão da aula:
O sistema jurídico não se limita à lei, mas é igualmente
formado pelo sistema principiológico. A tarefa do juiz
consiste na aplicação da lei abstrata ao caso concreto.
Tal processo de aplicação é denominado de subsunção.

Para que seja realizada a subsunção, o juiz deve passar


por um processo de interpretação da lei abstrata. Desta
forma, os princípios servem como diretrizes
fundamentais para que o julgador aplique corretamente
a norma ao caso concreto.
Ademais, os princípios jurídicos são fundamentais
para as hipóteses em que a lei se revele lacunosa ou
de interpretação dúbia, além de ser de extrema
relevância para promover a adaptação da lei às
mudanças que constantemente se verificam na
realidade social. Assim, é tamanha a relevância dos
princípios que a sua aplicação pode resultar na
alteração do sentido literal da norma.
Quanto aos princípios recursais,

a) o princípio da taxatividade recursal tem sido mitigado, admitindo-se a criação de


recursos não previstos expressamente em lei, desde que as partes criem tais recursos de
comum acordo, como negócio jurídico-processual.
b) pelo princípio da singularidade ou unirrecorribilidade afirma-se que só se admite uma
espécie recursal como meio de impugnação de cada decisão judicial, mostrando-se
defeso interpor sucessiva ou concomitantemente duas espécies recursais contra a mesma
decisão.
c) o princípio da dialeticidade diz respeito ao elemento volitivo, ou seja, à vontade da
parte em recorrer, expressa na interposição do recurso correspondente à situação jurídica
dos autos.
d) o princípio da fungibilidade não foi previsto normativamente no atual ordenamento
jurídico processual, não mais se podendo receber um recurso por outro em situações de
pretensa dúvida.
e) o princípio da reformatio in pejus, ou seja, reforma para piorar a situação de quem
recorre, não foi admitido em nenhuma hipótese no atual processo civil brasileiro.
GABARITO: B
A respeito do princípio da fungibilidade recursal, é
INCORRETO afirmar que:
a) A aplicação do princípio da fungibilidade recursal é possível nas hipóteses em
que exista dúvida objetiva, fundada em divergência doutrinária ou mesmo
jurisprudencial acerca do recurso a ser manejado em face da decisão judicial a qual
se pretende impugnar.
b) O conceito de dúvida objetiva, para a aplicação do princípio da fungibilidade
recursal, pode ser relativizado, excepcionalmente, quando o equívoco na
interposição do recurso cabível decorrer da prática de ato do próprio órgão julgador.
c) Contra a decisão que nega seguimento a recurso especial interposto contra
acórdão em conformidade com tese firmada em sede de recurso repetitivo cabe
agravo interno, mas a interposição de agravo em recurso especial no seu lugar
constitui hipótese de aplicação do princípio da fungibilidade recursal.
d) A interposição de agravo interno contra decisão colegiada constitui erro
grosseiro, sendo inviável a aplicação do princípio da fungibilidade recursal para o
recebimento do recurso como embargos de declaração.
GABARITO: C
O CPC/2015 trouxe previsão legal expressa de que não cabe agravo para o STJ contra decisão que
inadmite recurso especial quando o acórdão recorrido decidiu em conformidade com recurso
repetitivo (art. 1.042).

Tal disposição legal aplica-se aos agravos apresentados contra decisão publicada após a entrada em
vigor do Novo CPC, em conformidade com o princípio tempus regit actum.

Caso o Tribunal de origem decida em conformidade com entendimento firmado pelo STJ em recurso
repetitivo, a parte deverá interpor agravo interno. Se, em vez disso, a parte interpuser o agravo em
recurso especial para o STJ (art. 1.042), cometerá erro grosseiro.

Chegando ao STJ este agravo, ele não será conhecido e ele não retornará para que seja julgado pelo
Tribunal de origem como agravo interno.
Assim, após a entrada em vigor do CPC/2015, não é mais devida a remessa pelo STJ, ao Tribunal de
origem, do agravo interposto contra decisão que inadmite recurso especial com base na aplicação de
entendimento firmado em recursos repetitivos, para que seja conhecido como agravo interno. STJ. 3ª
Turma. AREsp 959.9
Pedro ingressou com uma ação contra Antônio. A ação foi julgada
totalmente procedente, sendo que a decisão está no prazo de
recurso. Diante desse quadro, assinale a alternativa correta

a) Apenas Pedro poderá recorrer pelo princípio da sucumbência,


sendo que o recurso correto é o de Apelação.
b) Se a ação tratar sobre demarcação de terras, Pedro poderá interpor
Apelação que não terá efeito suspensivo.
c) Caso a sentença confirme a antecipação de tutela, Pedro poderá
interpor Agravo Retido contra a decisão.
d) Apenas Antônio poderá recorrer pelo princípio da sucumbência,
sendo que o recurso correto é o de Apelação.
e) Em se tratando de decisão que estabeleça convenção de arbitragem,
Antônio e Pedro terão interesse em recorrer por meio de Recurso
Especial, que não receberá efeito suspensivo.
GABARITO: D

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