Parte 2 Garota GG 6 Manuh Costa

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Copyright © 2023, Manuh Costa

Capa: Lexica, By Canva edição de fontes livre de direitos.


Idealização de capa: Lexica editorial Canva livre de direitos.
Segunda Edição
___________________________________
Dados internacionais de catalogação (CIP) Costa, Manuh
Garota GG VI – Parte II
1ª edição Minas Gerais, 2023
1.Literatura Brasileira. 1. Título.
Ilustrações: Lexica
___________________________________
É proibida a reprodução total e parcial desta obra, de qualquer forma ou
por qualquer meio eletrônico, mecânico, inclusive por meio de processos
xerográficos, incluindo ainda o uso da internet, sem permissão de seu
editor (Lei 9.610 de 19/02/1998).
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos
descritos são produtos da imaginação do autor qualquer semelhança com
acontecimentos reais é mera coincidência.
Todos os direitos desta edição reservados pela autora.
Sumário
Marido e Mulher
Ok
Perdão
Novidades
De Volta
Vozes Assustadoras
Presentes
O Mais Velho
Amor Profundo
Despertar
Só Você
Novos Sentimentos
Uma Chance
Não Há Vergonha
Providências
Família
Chegada
Algo Precioso
O Baile
Encanto
Em Alerta
Algo Isolado
Outro dia
Em Família
Pequenos Atos
Inconveniência
Infortúnio
Em um outro momento
Concreto
Em Família
Mais Que Intenso
Em Casa Mais Uma Vez
Patroa
Inconveniente
Um Vazio
A Inimiga
Consideração
Finais Tristes?
Arrependimentos
Bônus * Safira
Querida leitora.

Como vai?

Eu sei que demorei, sei que você sofre de ansiedade e sei que não
gosta de esperar, então aqui depositei anos de muito amor, do meu amor.
Espero que saiba que não considero que entenda que tive que dividir este
livro em duas partes, então haverá uma parte três, mas sei que posso contar
com sua compreensão e paciência.

Espero que mais uma vez Ana e Mosés te encante como me


encantaram nesse novo livro.

Que tenha percebido o quanto você é importante para mim e para si


mesma, você é linda demais, cara! Para véi! Que linda!

Amo-te em qualquer lugar que esteja.


Trilha Sonora

SYML - "Wildfire" - Alternate Version [Official Lyric Video]

Novo Amor - Repeat Until Death

Sparks - Coldplay

Hollow Coves - Patience (Live Acoustic Session)

SYML - "DIM"

Flora cash - You're Somebody Else

Euphoria playlist / most popular songs - luvsgyux

G-Eazy, Tyler Grey - Mary Jane (feat. Halsey) [Official Lyric


Video] Prod. by DJ Cause

I. (Full Album) - Cigarettes After Sex

Lo-Fang - You're The One That I Want

CLANN - I Hold You

Kehlani - Gangsta (from Suicide Squad: The Album)

Did You Ever Hurt for Me?

Bazzi - Paradise [Official Music Video]

Disclosure - Latch feat. Sam Smith (Official Video)

SAYGRACE - You Don't Own Me ft. G-Eazy (Official Video)

AWOLNATION - Sail (Official Music Video)


Jeremih - Fuck You All The Time (Shlohmo Remix)

skeler - night mix (2021)

The Wisp Sings - Winter Aid

Sarah Cothran - As the world caves in (Oh girl it's you)

Silent Child - F**k You

Alessia Cara - Here

G-Eazy & Bebe Rexha - Me, Myself & I

Flight Facilities - Crave You (Adventure Club Dubstep Remix)


(feat. Giselle)

Jetta - Take It Easy (Matstubs Remix)

Sam Smith - Fire On Fire (From "Watership Down")

Halsey - Now Or Never (Audio)

Daughter - Medicine

Kodaline - All I Want

Aerosmith - Cryin' (Official Music Video)

Daughter - Medicine

Jaymes young - happiest year

Harry Styles - Sign of the Times

Patrick Watson - Je Te Laisserai Des Mots


3 Doors Down - Here Without You

Bryan Adams - Please Forgive Me

Bryan Adams - Have You Ever Really Loved A Woman?

SYML - "The War"

The Neighbourhood - Sweater Weather

Billie Eilish - Happier Than Ever

Christina Perri - A Thousand Years

Home - Edith Whiskies

Novo Amor & Lowswimmer - Terraform

Sleeping at last - turning page

That's Us - Anson Seabra


Se você está aqui, é porque para ti, importa.

Manuh Costa.
MARIDO E MULHER

— Está cansada?

— Bastante.

A viagem foi boa e esclarecedora, mas acabou e com ela veio nosso
retorno para casa, já é madrugada e de fato eu estou bem cansada, nosso
último dia em Cabo de San Lucas foi bem tranquilo, almoçamos no hotel e
passeamos a beira mar ao final da tarde, embarcamos por volta das 19:00 e
já passa da 00:30, não consegui relaxar nem dormir, mesmo que tenha sido
um dia relativamente agradável, Mosés também estava meio agitado,
estávamos ansiosos para voltar para casa.

Avisamos ao tio Jack que chegamos e ao Antônio que os traga


amanhã pela manhã, vamos ter que conversar com as crianças e com o Cory
separado, tenho me esforçado para não ficar só pensando sobre isso e todas
as hipóteses que o retorno de Viviane pode trazer para a vida de nosso filho,
para nossas vidas, mas parece impossível.

Por mais que eu note que estou relativamente mais calma que o
Mosés, sei que não é tão fácil para mim ter de lidar com isso depois de
tantos anos, evitamos falar durante nosso dia e depois que embarcamos, só
alinhamos algumas coisas sobre como contaremos as crianças da nossa
reconciliação e da anulação do divórcio.

Pensei bem sobre isso e estou convencida de que será o melhor para
mim e para nós dois acima de tudo.

Eu o amo, tenho tantos sentimentos por ele, ainda depois do


desgaste nossa reaproximação me fez ver muito além da mágoa e da dor, se
separar não é algo que envolve só lembrar da história e sim pensar sobre o
que temos no presente e o meu presente com o meu marido estava uma
merda, por muitos fatores que iam além das brigas, ele está disposto a
mudar isso e eu estou disposta a mudar também minha forma de encarar
tudo.

Vamos tentar novamente.

— Você não dormiu durante o voo.

Nem sei se conseguiria.

Tiro a saia que vesti em conjunto com a blusa de cor beje, os sapatos
altos depois vou para a cama tirando os meus brincos, Mosés se joga na
cama só de cueca, ele sabe como se despir na velocidade da luz, sorrio em
perceber a sensação boa de saber que ele está aqui, há meses não o vejo
aqui ou em lugar algum.

Ele não ocupa só a função de marido na minha vida, é meu


companheiro, meu confidente e amigo, senti que perdia tudo isso quando
nos separamos e fui machucada pelos pensamentos de traição, perder seu
tudo do nada é algo que talvez seja irreversível em sua vida.

— Quer que eu coloque um pijama? — indaga me olhando de cima


abaixo.

— Não precisa — abro a gaveta da mesinha de cabeceira e coloco


os brincos lá, me sento na cama e recolho minha aliança de casamento, eu a
deixei aqui depois de algum tempo quando pensei que era o fim.

— Quer que eu coloque em você? — pergunta e estende a mão


tocando a minha barriga.

— Sim — respondo e entrego a aliança para ele, estendo a mão.

Mosés ergue a aliança e depois devagar a coloca no meu anelar


esquerdo, mordo os lábios querendo sorrir com a sensação estranha de
felicidade que me toma, não achei que ele fosse colocar a aliança no meu
dedo tão cedo.

— Está faltando o anel de noivado, amor.

— Está no cofre, depois eu pego.

— Quero renovar nossos votos.

— Eu aceito.

Ele sorri depois passa o braço envolta de mim e me puxa para o


meio da cama, caio deitada e sorrio vendo-o subir em cima do meu corpo,
seus olhos fixados em mim e sua boca com um sorriso tão bonito que
causaria inveja em qualquer um. Ainda me pergunto como consigo me
sentir tão boba quando algumas vezes ele sorri assim para mim, o frio na
barriga e boas sensações se espalhando pelo meu corpo todo.

Mosés fica me olhando por alguns momentos enquanto se inclina na


minha direção, apoiando seu corpo no meu e suas mãos segurando as
minhas, me inclino e o beijo, os lábios retribuem ao meu beijo devagar,
entrelaço os dedos nos dele e nosso beijo se torna mais profundo.

Lento, quente e molhado.

Acho que nem paciência para beijar estávamos tendo e que por isso
é sempre uma boa surpresa quando fazemos coisas que havíamos esquecido
de como era, ele solta as minhas mãos e seus dedos se enfiam em meus
cabelos, minhas mãos pousam em suas costas e eu a toco acariciando a pele
quente, a boca explora a minha com mais firmeza, a língua degustando
minha boca como uma carícia íntima.

Como se beijasse a minha boceta.

Minha mão direita desce até a bunda dele e enfio a mão dentro da
cueca apalpando-o, abrindo as pernas para que se esfregue bem em mim e
gosto que seus quadris se movam devagar fazendo o pau dele pressionar
minha carne, mesmo por cima da calcinha consigo sentir a potência, a
dureza.

Enfio a mão em sua nuca e isso o agrada, ele deixa os meus lábios e
cola a testa na minha, me sinto envolvida por seu olhar, pela forma como
sorri para mim, ele move os quadris com mais firmeza então puxa meus
cabelos com força, afundando meus quadris no colchão com a rigor, sorrio e
mordisco seu queixo sem pressa deixando um toque quente dos meus lábios
no lugar.

Aperto a nádega com vontade e ele pressiona os quadris e arfo


sentindo uma onda de prazer me tocar o corpo devagar, a imaginação é
fértil, apenas o esfregar me faz pensar tantas coisas, me faz querer que ele
me coma aqui mesmo desse jeito, há meses nem conseguia pensar nisso, há
meses que não fazemos sexo, nem que fosse algo medíocre, nem que por
necessidade, apenas nos separamos e rompi todos os contatos com ele.

Forço meu corpo de encontro ao dele e o empurro, rolamos na cama


e fico por cima, me ergo segurando a abertura frontal do sutiã, tiro a peça
do meu corpo e meus seios saltam rijos pelo tecido com muita naturalidade,
seus olhos são tomados por uma malícia maldosa e depois me inclino
estendido meu corpo em sua direção, subindo para que meus seios fiquem
na altura de sua cabeça, então sem cerimônia o vejo segurar minhas mamas
e começa a abocanhar uma por vez, primeiro a esquerda e depois a direita.

Fecho os olhos arfando um pouquinho, mordo o lábio inferior


adorando a chupada, a pequena mamada que ele dá no meu seio direito e a
lambida que faz minha pele se encher de arrepios, sua mão direita se enfia
dentro da minha calcinha e seus dedos vão rapidamente encontrando meu
ponto delicado e quente.

Ele me acaricia devagar, os dedos massageando meu clítoris com


toda sua experiência enquanto sua boca chupa meu seio direito e a mão
esquerda puxa o biquinho do meu outro seio, sorrio agradada com a atitude.
Ele deixa esse seio e vai para o outro chupando com mais força, os dedos
me acariciando mais rápido, circulando meu clítoris e massageando minha
carne.

Começo a ser tomada por uma agonia familiar e gostosa, me ergo


apoiando os pés no colchão e abro as pernas vendo-o puxa a calcinha para o
lado, me acomodo sentada em seu abdome, ele afasta a calcinha para o lado
e me vê aberta para ele enquanto me masturba, estendo a mão para trás do
meu corpo e enfio dentro de sua cueca começando a tocá-lo.

— Me deixa encher seu cu de porra, bêzinha.

Aperto o pau e ele salta entre meus dedos, tão palpável e duro que
me faz salivar, ao mesmo tempo ergo meus quadris e empino a bunda para
trás me posicionando, ele tira os dedos de mim e começa a espalhar o meu
líquido viscoso no cacete melando-o, saio de cima dele e vou para o lado,
tiro minha calcinha e depois vou até o banheiro, sei que preciso me preparar
antes.

Abro a porta do armário e me inclino para pegar o frasco de


sabonete íntimo, porém ao mesmo tempo, sinto a tranco da penetração anal
forte dentro de mim bato com a cabeça na porta do armário ao lado e solto
um gemido alto.

Mosés me puxa pelos ombros e observo o semblante preocupado


diante do espelho do banheiro, tento me ajeitar enquanto me equilibro na
ponta dos pés, aguentando o pau enfiado até o talo no meu rabo.

— Desculpe — diz e olha a minha testa que tem uma pequena


marca avermelhada. — Me desculpe, estou ansioso, amor.

— Eu também. — confesso incerta.

Me seguro na pedra do lavatório e ele me beija o local, me acomodo


com um pouco de desconforto, ele beija o meu ombro e depois meu
pescoço, fecho os olhos e ele volta a tocar meu pontinho sensível, é
gostoso, posso dizer que me acostumei a fazer sexo anal com o passar dos
anos, por mais que algumas vezes quando fico muito tempo sem fazer sinto
pequenas fagulhas de incomodo como agora.

Ele mordisca minha orelha e procura meus lábios enquanto se


abaixa e me penetra bem devagar, ergo o pé e apoio na prateleira do armário
depois ele segura meu pescoço e me vejo toda nua arreganhada de frente
para o espelho enquanto ele está atrás de mim metendo no meu rabo. Sorrio
e mordo o lábio inferior vendo-o sorrir, gosto de ver isso, gosto muito, meus
seios subindo e descendo enquanto sua mão me toca devagar a carne
feminina, os dedos pressionam meu pescoço e seu polegar se enfia na
minha boca, chupo o dedo.

— Aí amor. — geme fazendo biquinho.

Me contraio e ele gosta disso, dá um tapa bem servido na minha


boceta e faz com que eu dê um pulinho toda excitada. Meu corpo se arrepia
de novo nesse momento e as ondas incríveis de prazer vão tomando a mim
dos pés até o último pelo do corpo.

— Está pronta? — indaga baixinho.

— Sim.

— Então se segure, Bê.

Me seguro com as duas mãos na pedra do lavatório e inclino meus


quadris para trás abrindo bem as pernas, Mosés me segura pelos quadris e
começa a meter bem fundo em estocadas fortes.

— Aaaahhhhh! — grito.

Não é de dor, não absolutamente.

Mas ele não para, é macho alfa insaciável que só vai parar quando
souber que não vou aguentar e agora, aguento muito bem. Sou tomada por
um latejar intenso enquanto sou penetrada assim, sua violência me agrada e
sinto meus seios pulando enquanto ouço o estalar do saco batendo nas
minhas nádegas.

Ganho um tapa forte na bunda enquanto ele vem mais fundo, bem
mais fundo, arregalo os olhos e olho nosso reflexo no espelho, Mosés sorri
cheio de malícia, quase maldade.

— Aiiiii, porra, Moshe, me fode com força.

Tapo minha boca depois que falo e ele tira a mão da minha boca
depois estende uma das mãos e enfia nos meus cabelos, então os puxa me
fazendo me erguer, sopro arfante, meu coração tão acelerado que parece que
vai sair pela boca.

— Fala de novo, implora para que eu te coma. — ordena. —


Ordinária!

Isso me excita tanto que mal sei explicar.

Sorrio me inclinando para frente e ele mete de novo fazendo com


que eu pule, meus seios saltando, como um bicho que ferroa algo, depois
ele me segura passando o braço envolta de mim e vai andando, me
conduzindo para o rumo da nossa hidro, depois ele se senta no batente e me
acomodo sentando nele devagar, Mosés abre as minhas pernas fazendo com
que eu fique sentada nele e segura meus quadris, fico suspensa e depois ele
me move sobe a rigidez impiedosa, aperto as laterais de suas coxas.

— Ah, meu senhor, da misericórdia! — berro e mesmo que adore


tapo a boca com a mão.

Mosés me suspende e me faz descer com força em cima dele, a


sentada faz um estalo forte e suporto adorando isso, a facilidade na qual me
ergue me espanta, mas gosto tanto que só consigo ficar cada momento mais
encantada. Ele ri e depois se ergue me segurando, então giramos e ele
indica o batente da hidro.
— Suba no batente, deixe que te seguro.

— Tem certeza disso? — engulo a seco tão arfante que quase não
consigo falar. — Bebê isso é extremo, sou pesada demais, Mosés minha
artrose!

— Foda-se sua artrose.

Arregalo os olhos e com as pernas bambas coloco primeiro o pé


esquerdo, ele me mantém nele feito cachorro no cio quando gruda na
cadela, o pensamento me faz rir e levando o outro pé, apoio no batente e ele
me segura com firmeza não tenho apoio, mas nem preciso, o homem vem
na força do ódio metendo na minha bunda.

— Que raba deliciosa! — escuto ele gritar enquanto meu corpo sobe
e desce com as metidas dele.

Estendo as mãos e me seguro nas pernas, Mosés abre mais as


minhas pernas e me sinto feito uma rã toda arreganhada, ele apoia o pé no
batente e segura meus cabelos para cima, então beija minha nuca suada,
depois meu ombro, a posição faz com que minhas pernas comecem a
queimar devido ao esforço, porém é tão gostoso fazer assim que supera
qualquer incomodo.

Sou empurrada e acabo escorregando para dentro da hidro, gargalho


e abro as pernas soltando um gemido agudo e alto enquanto ele me devora
assim, depois sinto umas mordidas intensas nas costas, até que sou puxada
de volta e ele me beija apoiando meu pé no batente novamente, ele manda,
ele controla.

Ele quem é dono de mim nesse momento.

Sorrio entre o beijo e a outra mão dele me masturba ligeiro, franzo a


testa.

— Goza comigo, Bê, me alivia. — pede com voz manhosa.


— Me enche de porra Moshe — imploro fazendo biquinho.

Mordisco seu lábio inferior e depois seu queixo, assim sinto minhas
pernas tremendo e um peso intenso tomando minha região pélvica, sorrio
enquanto o orgasmo anal se aproxima, ele aperta minhas nádegas apertando
a carne envolta da rigidez, isso me enche de tesão mais uma vez, só que
mais denso.

Algo ofensivo e bruto toma seu olhar e algo inexplicável me invade.

Aperto os olhos incapaz de assimilar as sensações, minha


sensibilidade mais acentuada, porém de forma tão sublime que me faz soltar
um grito grosso e árduo.

— Fode essa porra! — imploro.

— Toma porra vagabunda! — diz entredentes.

Gozo, me espremendo ao mesmo tempo, me libertando, um orgasmo


tão impetuoso que me faz sentir como se uma lava quente tomasse minha
bunda, minha região vaginal se enche e esguicho entre os dedos dele,
gozando com força, as solas dos meus pés ardem me inclino me segurando
no batente ele mete mais uma vez gozando dentro de mim.

Cumprindo com o que prometeu, enchendo a minha bunda de porra.

— Não como direito, não é?

Sorrio, acho que precisarei retirar o que eu disse, mas só por esse
instante não quero discutir isso.

Agora só quero desfrutar.


OK

— Tudo bem?

Se está tudo bem? Está tudo maravilhoso!

— Sim.

Não sei se teria energia para nada nesse momento, tomamos um


banho que durou quase meia hora, estávamos nos beijando e nos tocando
tanto que acabamos enrolando no banho, depois nos enrolamos em toalhas e
viemos para a cama, aqui estamos juntos compartilhando um cobertor e
nossos travesseiros, ele está me abraçando por trás, fazendo carinho nos
meus seios devagar, me sinto tão relaxa e bem. Mosés me segura pelo
ombro e me puxa fazendo com que me vire para ele, toca a minha face, o
semblante sereno e calmo.

— Nem acredito que fizemos aquilo. — Confesso com um pouco de


vergonha.

A vergonha vem depois de algum tempo, mas nada se compara a


satisfação de ter sentido tanto prazer.

— Você me fez esperar muito, queria que fosse diferente, ser


paciente e carinhoso, mas estava me segurando muito. — Mosés faz carinho
na minha bochecha. — E você bem que pediu, me chupou muito bem na
nossa viagem.

Sorrio, pouso a mão sob a sua e a seguro depois beijo a palma com
cuidado.

— Me senti à vontade e bem, não tive vergonha nem travei, eu


adorei. — falo.
— Tem que ser mais assim, não precisa ter medo ou vergonha do
seu corpo, Bê.

Toco seu peito firme e me inclino me encostando nele, enfio a mão


dentro do cobertor e toco os pelinhos pubianos dele, Mosés beija a minha
cabeça.

— Não posso negar, Ana, eu não esperava que gostasse de ser


tratada assim, mas aprecio também esse lado nosso que começa a
desabrochar.

— Eu também.

— Gosto da sua ousadia.

Beijo seu peito.

— Eu não pensei que seria tão intenso. — revelo. — Eu nunca gozei


como hoje.

— Já chegou perto algumas vezes, mas não tão forte.

É um nível de intimidade que sei que nunca irei compartilhar com


ninguém além dele.

— Te senti gozando entre os dedos, foi uma sensação maravilhosa,


te ter em minhas mãos, sentir que te preenchia toda e você gostava...

— Em que momento nós deixamos de ser assim?

Mosés toca meus cabelos sem pressa, me faz esse carinho, eu o olho
e ele fica me analisando em silêncio por alguns momentos.

— Nunca deixamos de ser assim, nós só não priorizamos isso em


nosso casamento com o passar dos anos, quinze anos não são quinze dias,
amor.
— Sei disso, mas é que...

— Imagino que você esperasse que fosse mais como no começo.

— Não é assim que deveria ser?

— Não acho que não tem que ser, mas aquela fase já passou, meu
amor, hoje temos que viver nossa fase, não somos tão jovens, Bê.

— Sei que não, amanhã eu talvez precise de bastante pomada e


analgésicos, a dor nas juntas vem.

Ele ri, sabe que brinco em alguns sentidos.

— Quero dizer que nunca pensei que nossa vida sexual estagnasse
tão rápido, achei que pararíamos com uns setenta e oito por aí. — admito.

— Tivemos problemas como qualquer casal, amor, é normal.

Fico em silêncio e o abraço vendo nossa cama bagunçada e os


cobertores espalhados por nossos corpos, não sei se pediria para ser
diferente porque vivemos muitas coisas nesses anos de casados, mas
propriamente dizendo nunca senti que haviam muitos fetiches além dos que
já estávamos pondo em prática, a casualidade do sexo foi cômoda e depois
dos trinta e cinco estava me entregando a monotonia que era fazer um papai
e mamãe bem rápido para não perder os horários das crianças logo pela
manhã.

— Sei que quer que seja diferente, que espera que seja mais picante,
é isso?

— Você não quer que seja assim? — toco seu abdome e depois seu
peito. — Quer dizer, eu acho que aos poucos fui me sentindo abandonada
nesse sentido do nosso casamento, por você, mas principalmente por mim,
fez parecer que o seu desejo por mim foi diminuindo.
— Não foi, algumas vezes é tão cansativo toda a rotina da empresa
que eu me ocupo muito com isso. — Mosés revela. — Quis começar a
malhar para poder me sentir mais disciplinado e disposto, quando mais
novo praticava box e luta, hoje me pego cochilando no escritório ou
bebendo para afundar as mágoas, a vida do adulto não é uma missão tão
incrível quanto parece.

— Me sinto inútil algumas vezes por não conseguir ser mais


disposta também, têm sido dias muito difíceis, eu achei um dia que se fosse
dona de alguma coisa teria algum conforto e trabalharia menos, ao invés
disso trabalho feito uma camela.

— Bem-vinda a minha vida desde que eu tinha vinte anos.

Eu o olho e Mosés está sorrindo, confesso que nem por um segundo


havia pensado tanto nisso, pensar em mim é uma atividade constante,
porém não como se isso acontecesse tanto com ele já que não reclama,
trabalho bastante na empresa, mas em casa também e ele fica mais por
conta da empresa.

— Nunca me disse isso, que vive cansado, não parecia cansado.

— Não deve se preocupar com isso.

— Claro que devo, amor, você nunca me falou sobre isso.

— Não quis te perturbar com nada do tipo, sei que também estava
cansada da rotina, sempre me senti em desvantagem em relação a você
justamente por isso e sei que estava exausta de dividir as tarefas da casa e
da empresa.

— Bem, quero que você não me omita mais essas coisas, sei que
vinha viajando muito e isso talvez não tenha te feito bem.

— O meu médico disse que eu estou com staff mental, tentei me


ocupar durante o processo de separação, na verdade desde que saiu de casa,
tenho passado muito por isso, algumas noites tenho trabalhado demais, viro
a madrugada.

Não esperava saber disso assim, contudo, de todas as formas


possíveis eu sempre soube que Mosés tinha seu sofrimento, ainda mais por
conta da separação, mesmo que imaginasse que ele estava com outra sabia
que isso iria impactar a vida dele de alguma forma.

— Não quero lembrar disso, Bê — diz ele. — O agora é o que


realmente importa.

— Eu sei que estava bem sobrecarregado, mas nunca me disse isso


antes.

— Ana, tem coisas que sei que se eu te falar, vai acabar ficando
ainda mais preocupada, sobrecarregar você não é algo do qual eu queira.

— É incrível como conseguíamos falar tanto a respeito de nossos


dias e nos dias atuais tenhamos nos desgastado tanto com as pequenas
coisas que não consigamos mais falar sobre nada do tipo sem que surja
algum tipo de acusação ou discussão sobre as necessidades individuais de
cada um.

— Não cuidamos do nosso casamento, Ana, mas ficar se


martirizando por isso não vai mudar nada.

É verdade.

— Sim, mas penso que se soubermos o que temos que fizemos de


errado poderemos mudar nossa forma de agir, eu tentarei ser muito
compreensiva com você, sei que agi errado também, não me isento da
culpa.

Beijo seu peito e me encosto nele.

— Te amo.
É algo que sai de forma natural, como sempre foi antes, algo que
não deveria ter mudado tanto com o passar dos anos, Mosés me aperta com
força e sei que minhas palavras têm relevo e significado para ele, é claro
que eu o amo muito, ele é o homem com quem me casei e decidi dividir
minha vida, mas acima de tudo alguém que amo muito.

Algumas vezes até mais do que a mim mesma.

— Não consigo imaginar como seria se não houvesse vindo comigo


a viagem, se houvesse assinado aqueles papéis. — Mosés revela e percebo
sua angústia. — Eu não sei como poderia viver mais tempo longe de você.

Eu o fito, seus olhos cobertos por algumas lágrimas, isso me revira


toda por dentro e é algo do qual me desacostumei de ver, ele pressiona a
mão contra os olhos e seca as lágrimas como se isso o machucasse um
pouco mais, sei que tenho importância na vida dele, acredito em suas
intenções e conheço a verdade, sei que sofreu muito assim como eu mesma
sofri, porém contudo a raiva me impediu de pensar profundamente sobre
sua dor, me sinto um pouco egoísta mesmo que não me culpe por isso.

— Me desculpe. — falo e toco sua face.

— Quero que você saiba que eu te amo muito também, que eu


nunca te traí nem em pensamento e que você é a única pessoa capaz de me
fazer sentir o verdadeiro prazer, que sou incapaz de me sentir à vontade
com outra pessoa além de você, é minha mulher Ana, mãe dos meus filhos
e dona da minha casa, não conseguia entender como acima de tudo
acreditou naquilo quando te pedi, te disse tanto que era mentira. — ele fala
com uma ponta de mágoa e dor na voz, trêmulo me solta e se ergue se
sentando na cama. — Fiquei com medo de ter feito algo de errado, não
lembrava de nada e tinha receio de que fosse verdade e que suas motivações
fossem concretas.

— Eu não posso dizer que estava totalmente certa, amor, mas...


— Não confiou em mim, depois de tudo o que passamos, não
acreditou que eu estava falando. — interrompe.

— Sim.

Me incomoda ter que admitir, suas lágrimas caem enquanto ele me


olha meio chateado, estendo a mão e seguro a dele.

— Me perdoe.

— Não quero que se repita, ok?

— Não irá se repetir.

— Ana eu... se isso voltar a acontecer, acho que teremos que nos
divorciar.

Ouvir isso me assombra de um jeito rápido e estranho.

— Quero que confie em mim, sei que tem seus problemas com a
imagem e me desculpe, não quero minimizá-los, mas isso não pode mais
ficar acima do nosso casamento, é algo que eu quero que você saiba.

Ele funga e ergue a minha mão, depois a beija com devoção.

— Foi tão difícil para nós dois quando nos casamos, lembra? Você
sofria tanto com isso, por que isso agora?

— Me sentir traída mexeu comigo, também sou vítima da situação.

— É vítima de si mesma, Ana, você é sua prisioneira e torturadora,


do medo que sente do seu corpo, você é sua algoz, você se coloca nessas
posições de complexidade sem necessidade, é incapaz de acreditar em si
mesma e se vê de forma deturpada e isso não pode estar acima do nosso
casamento em nenhum sentido.
Fico calada em ouvir todas essas palavras e confesso que a vontade
que tenho é de soltar a mão dele e sair daqui ele nunca se direcionou a mim
dessa forma, nem usou de palavras do tipo para me falar algo, mesmo que
eu saiba que está totalmente com razão, ainda é muito duro ouvir isso vindo
dele.

Talvez porque Mosés tenha me amado tanto que nunca me colocou


nessa situação de se referir a minha aparência de um jeito diferente, ele só
me amou quando nem eu conseguia me amar, ele me aceitou, então ouvir
isso é algo que de algumas formas me machuca.

Verdades machucam bastante algumas vezes na vida.

— Sei que está apavorada em ouvir isso, mas preciso que saiba que
eu vou te apoiar sempre, em tudo, terapia, médico, o que precisar, mas não
quero mais ter que conviver com esse medo que você tem de ser gorda ou
de que é insuficiente para si mesma. — ele limpa as faces com a outra mão.
— E sinto muito que se machuque com tudo isso, mas temos que falar sobre
isso de uma forma transparente, eu amo você, amo muito, mas não podemos
ficar juntos se nossa vida tiver que orbitar em volta disso.

— Obrigada por ser sincero. — falo olhando para nossas mãos


juntas. — Obrigada por não desistir de mim.

Razões, motivos ele tem de sobra, eu não posso rebater isso porque
seria injusto com ele, me propus a ouvi-lo e a tentar compreender o que
poderemos fazer para nos proporcionar um casamento melhor, que
tenhamos paz e união em nosso matrimônio e não tem que ser apenas no
sentido da empresa, principalmente na forma como lidamos um com o
outro.

— É verdade que eu sei que isso te machuca tanto que se sente


incapaz de lidar com algumas situações, mas não quero que se limite ao
ponto de querer me largar devido as suas inseguranças.

— Não foram só as inseguranças, tive mais motivos.


— Sei que teve.

— Não vou ficar tentando me justificar sobre isso, Mosés, tive


minha parcela de culpa, fui precipitada e imprudente, tenho minhas
emoções e medos também e mesmo que seja em parte porque fui afetada no
ego, nada poderia ter conspirado para ser diferente, te ver com uma menina
vinte anos mais jovem numa revista nu numa cama de hotel não é a melhor
coisa de se ver numa segunda feira.

— Eu só...

— Eu entendo, você quer que isso não seja o centro das atenções do
nosso casamento e está coberto de razão, é triste ouvir isso de você, mas é a
verdade e eu sei que meus problemas com a minha imagem têm me
perseguido desde muito jovem, era algo que acreditava ter superado,
contudo que hoje vejo que não melhorei tanto ao ponto de não me comparar
mais, nem de sofrer ou de não ficar olhando para todos os pequenos
“defeitos” do meu corpo.

— Você os vê como defeitos, apenas você.

Faço que sim com a cabeça.

— Eu fiquei enciumada de pensar que estava com uma menina mais


nova, pensei que era por isso que nós quase não fazíamos sexo e que você
tinha tido crise da meia idade, imaginei até uma vez que ela estava grávida
e que se casariam, tanta coisa se passou pela minha cabeça, foi um duro
golpe te imaginar com ela numa cama fazendo tudo o que faz comigo, então
quando vi algumas fotos no Instagram dela eu comecei a me comparar a
ela, tenho quarenta e dois anos amor, como deveria me sentir? Vi matérias
me comparando com ela, eu estava tão magoada que até liguei para um
médico e questionei sobre fazer uma bariátrica.

Mosés me encara franzindo a testa, com aquele olhar todo severo


dele e sei que se zanga.
— Eu questionei sobre a cirurgia e ele me disse que eu poderia fazer
redução de pele depois que emagrecesse o suficiente, redução de mama e
que eu poderia por silicone se desejasse, tudo ficaria noventa mil, até
abdominoplastia ele me prometeu...

— Ana!

— Eu ainda pensei que se depois que assumisse ela quando me visse


toda enxuta e magra iria me querer de volta, que me pediria para te aceitar,
o médico disse que eu poderia por Botox e fazer lifting facial, porém eu
acabei desistindo porque conversei com a Sêmora e ela me chamou de
louca, eu cheguei até a pegar as guias para os exames, ela me chamou de
desequilibrada e disse que iria te falar, então eu mandei ela ir pro inferno e
disse que era meu corpo e que ela não deveria se meter na minha decisão,
que era fácil para ela falar aquilo já que ela é magra e fez cirurgia, ela
chorou e ficamos sem nos falar por vários dias.

— É sério isso? — Mosés está boquiaberto.

— Sim — começo a ficar constrangida. — Depois eu a convidei


para tomarmos um chá aqui em casa e quando nos sentamos para conversar
me desculpei, nos abraçamos e ela me disse dos riscos de fazer uma cirurgia
dessas, disse que respeitaria minha decisão, mas que eu não deveria fazer
por desespero e sim por saúde, que eu não tinha que ser magra para agradar
ninguém porque com ela foi assim, passou a vida toda buscando aceitação e
por boa parte da vida foi infeliz.

— Ah, meu amor, que ideia! — resmunga irritado. — Vocês duas


brigaram por conta disso?

— Eu estava tendo dias horríveis, chorava por tudo, estava


desesperada, foram nessas noites que eu queria me jogar da sacada, nada
parecia fazer sentido ou dar certo, eu só queria não me sentir daquela forma.
— revelo. — Mosés não quero que esse problema pareça maior que o seu,
que o nosso casamento, mas isso me machucou tanto, eu não queria me
sentir assim, claro que já estava balançada com nosso casamento devido ao
desgaste dos anos, mas a traição foi o estopim para que eu ficasse ainda
mais triste e depressiva, estava insatisfeita comigo mesma, me perguntando
onde havia errado, colocando defeitos no meu corpo, me comparando, me
culpando por ter sido ausente e algumas vezes até por não ter te dado tanta
atenção.

— Também me culpei, Bê, estava obcecado pelo trabalho e sei que


me ausentei muito, sabia que havia culpa da minha parte nesse sentido. —
ele fala. — Ana, poderia ter me ligado e conversado, lido minhas
mensagens.

— Como faria isso se achava que estava com ela? Sei que
conversaríamos, mas estávamos brigando tanto antes de eu voltar para cá
que parecia impossível tentar uma conciliação, eu estava ferida e só queria
que tudo acabasse logo, estava envergonhada, me sentia suja de pensar que
dormia com você numa cama e quando viajava dormia com ela.

— Eu nunca te submeteria a isso.

— Mosés eu sei que não, mas você viu a sua bunda estampada nos
jornais do país?

Ele vai ficando vermelho até as orelhas, havia fotos em que ele
estava abraçando aquela garota quase nu.

— Não gostei de ser exposto também, as pessoas ficam me olhando


na empresa como se eu fosse um michê sem valor, algumas mulheres
chegam a me assustar com o jeito que me olham e homens também. —
pragueja e faz um gesto impaciente com a mão. — Ah, que se danem todos,
para comer aquela ali eu só poderia mesmo estar a base de um remédio bem
forte.

— Mosés! — exclamo horrorizada.

Não sei se fico muito feliz de ouvir isso, mas conhecendo-o tão bem
sei que é sincero da parte dele.
— Sei o que vai dizer, vai me chamar de machista e tudo mais, só
que eu preciso que você saiba que ela não é o meu biotipo, eu gosto de
mulher grande, é a minha preferência, gosto de pegar, de apalpar e de sentir,
eu tenho direito de gostar de mulher gorda? Ou vai me chamar de
magrofóbico?

O jeito como ele fala me faz sorrir, ele está com raiva, porém ainda
assim me contenho.

— Olha, que você saiba por mim, se fosse para eu te trair eu trairia
com uma mulher do seu biotipo, eu te disse que não me sinto bem com
qualquer mulher na cama, tenho meus traumas e dificuldades, eu não sei me
soltar por nada com ninguém além de você, temos nossa intimidade, nosso
jeito de fazer amor e outra coisa, ela não seria você, então já quero deixar
bem claro que eu não quero ser mais questionado sobre isso, nem que eu
apareça no Xvídeos deitado numa cama com a Rainha Elizabeth, entendeu?

— Sim senhor.

— E que fique claro que não tolero mais seu comportamento


depreciativo quanto a sua imagem, você viu até que ponto chegou, Ana?
Claro que eu te apoiaria, mas não por esses motivos e outra, não acha que
isso seria prejudicial a você a longo prazo? Sabe as restrições que teria que
passar? Teria que tomar vitaminas pelo resto da sua vida, não poderíamos
beber juntos, você seria condicionada a uma vida de restrições.

— Também não é assim.

— É ASSIM SIM! Muitas pessoas fazem essas cirurgias e acabam


engordando de novo, sabe porquê? Porque está tudo na forma de se ver, na
cabeça, se não mudar a forma de pensar, nada vai melhorar, tem coisas que
são para o resto da vida, eu já vi um programa desses de pessoas que fazem
tratamento para emagrecer através de cirurgia, essas coisas são indicadas
para pessoas que tem obesidade mórbida.

— Mosés...
— Você não é obesa mórbida, ou é?

— Bem, não, mas...

— Mas nada, se for fazer terá que procurar a Beth e pedir indicação
de um bom psicólogo, tem que se cuidar primeiro para depois pensar sobre
isso com calma, ver se isso está te afetando fisicamente, seus exames são
sempre excelentes.

— Eu já te expliquei os motivos, estava emotiva e deprimida, só


quis pensar nas possibilidades.

— Por motivos errados, eu nunca seria feliz de voltar para casa e te


ver magra só por minha causa, por uma suposta traição minha, que fique
claro, não apoiaria se fosse por isso.

— Está bem.

Depois que falo eu o abraço com força, eu amo meu marido, amo
tanto que me sinto uma imbecil depois de tudo, sei o que deveria ter feito,
mas não fiz devido as circunstâncias, não foi algo bom, mas me serviu de
lição para que não permita que isso aconteça novamente.

— Você é o que tenho de mais precioso, Bê, você e as nossas


crianças, por favor, não se machuque mais. — pede e beija a minha cabeça.

— Me esforçarei para que isso não aconteça de novo.

Farei até o impossível para que não volte a acontecer.


PERDÃO

— Está acordada?

— Eu não quero dormir.

Abraço Mosés na cama, seus cabelos estão espalhados pelo


travesseiro enquanto pouso um beijo quentinho em sua nuca, meus dedos da
mão direita tocam os pelinhos em volta de seu umbigo enquanto a mão
esquerda está acariciando seu peito, minha perna enfiada entre a dele e meu
corpo está colado ao dele.

Acho que fazia tanto tempo que não experimentava como era essa
sensação que não consigo pensar em dormir nesse momento, um momento
de carinho e gentileza, de trégua e paz, apenas do nosso silêncio, algo que
poucas vezes vínhamos dividindo nos últimos anos em nosso casamento.

Há algum tempo atrás me perguntei como seria se um dia eu e o


Mosés conseguíssemos ficar tanto tempo juntos que viveríamos todas as
fases de nossas vidas lado a lado, fui tendo algumas respostas com o passar
desses anos de casamento, gerei nossos filhos no ventre e o vi sorrir a cada
parto, o vi chorar também, fiquei estressada ao lado dele depois do
nascimento das gêmeas e tivemos também que tomar a decisão de adotar o
Cory, depois vieram os meninos e o vi mais uma vez chorar feito criança
pequena ao segurá-los no colo.

Me indaguei sobre como seria quando ele me visse conquistar as


coisas e me recordo de quando assumi meu cargo na empresa, ele estava de
pé me aplaudindo com um sorriso cheio de orgulho nos lábios, quando
chegamos em casa as crianças e ele havia planejado um jantar de
comemoração com nossos pais, com minhas irmãs e com a irmã dele, toda
família se reuniu para comemorarmos e quando por fim ele e eu ficamos a
sós tivemos uma noite incrível de amor.
Eu também me recordo de todos os nossos Natais em que ano após
ano nos demos presentes, das vezes em que viajamos juntos ou com as
crianças, de como imaginei como seria nossa velhice juntos e em como
compartilharíamos o nascimento de algum neto, a verdade é que nesses
quinze anos juntos eu imaginei como seria muita coisa e foi, ao menos, boa
parte delas, a outra parte não foi.

E sei que talvez não tenha sido tão ruim assim.

Mesmo com todo esse sofrimento eu vejo através da centelha de


problemas, uma esperança de que nós dois possamos reconstruir e continuar
a termos nossos sonhos e família, me observar por essa esfera é no mínimo
curioso já que para mim é de fato meio complicado reconhecer que preciso
mudar algumas vezes, melhorar é algo que venho tentando constantemente,
porém, vejo que tenho falhado miseravelmente na minha missão de ser forte
e prosseguir.

— Não? — a voz dele está pesada e baixa.

— Hum-Hum! — beijo sua nuca e seu ombro.

— Por quê?

Reflito sobre isso.

— Lembra de quando nos casamos e fomos para o quarto do hotel?


— indago e ele faz que sim com a cabeça sem pressa. — Eu não queria
perder um segundo de cada minuto de tudo o que estava acontecendo, eu
estava tão feliz que sentia como se não devesse deixar passar um detalhe, é
assim que me sinto agora, em meses eu consegui ter esse momento de
felicidade ao seu lado, é algo que por mais que me negasse a ver, queria.

— Estava nervoso — Mosés fala e sei que sorri. — Pensando bem


algumas coisas que aconteceram naquele dia... Pareceu um show de
horrores, você batendo na Safira, a Viviane tentando me beijar, eu não sei o
que foi pior.
— Nós enfrentamos tantas coisas para ficarmos juntos, não é
verdade?

— Eu enfrentei você, quer dizer, não é?

Entendo o que Mosés quer dizer, ele quer dizer que ele enfrentou o
meu medo de viver o nosso amor de frente comigo, acho que ele venceu em
todas as vezes e tem razão, muita razão.

— Sim.

— Ana Beatrice você está admitindo que está errada?

Sorrio, Mosés se vira na cama e me olha abrindo bem os olhos, toco


seu braço e minha mão sobe até seu ombro e depois escorrega até seu
pescoço, toco o local onde a barba começa a crescer e espeta a pontinha dos
meus dedos. Meu marido segura a minha coxa e a puxa para cima de seu
quadril, se acomoda enfiando a coxa entre minhas pernas, ele respira fundo
me olhando nos olhos e isso me faz sorrir mais uma vez.

— Precisa de tudo isso? — indago achando graça.

— É lógico que precisa — ele toca as minhas costas devagar. —


Talvez essa seja a coisa em você que eu nunca consiga entender, é forte,
mas tão frágil que algumas vezes me assusta.

— Há muita fragilidade em qualquer ser humano, apenas custa


muito a algumas pessoas admitirem suas fraquezas e medos — meus dedos
escorregam para sua nuca e toco os cabelos devagar.

— Não quero mais ter que lutar com seus complexos, Ana, eles me
assustam — ele me olha nos olhos e suas irises se movem depressa. — Não
gosto desse lado em você, não gosto da forma como se coloca nessa
posição, não gosto também do jeito como você se vê, me deixa triste.
— Como acha que eu devo me ver? — questiono mesmo não
gostando das coisas que ele está me falando e que sei que vai continuar a
me falar.

— Como você quiser se ver, desde que isso não te machuque,


sempre quis que você conseguisse se ver como eu te vejo, mas hoje mesmo
depois de tanto tempo confesso que não pensei que você ainda se sentisse
limitada devido ao seu peso ou ao seu tamanho.

— Achei que não fosse mais querer falar sobre isso — comento e
toco sua face devagar.

— É claro que teremos que falar sobre isso — ele toca meus cabelos
e os puxa para trás da minha orelha. — Eu sei que você precisa que eu
entenda seu lado mais uma vez.

Oprimo a vontade de sorrir e me sinto quentinha por dentro.

— Nunca falamos sobre as suas inseguranças profundamente


mesmo que você tenha demonstrado com muito esforço que não tinha
tantos receios em relação ao corpo — Mosés estende a mão e toca minha
coxa me puxando para junto de si. — Eu não me importo de te ouvir desde
que me ouça também.

— Eu nem consigo imaginar que você tenha alguma insegurança


física, Mosés, quer dizer, você sempre foi tanto para mim — o vejo ficar
bastante sério. — O que foi?

— Não sou muito para você, só quero ser o suficiente, Ana, por que
está dizendo isso? — indaga. — Você não é assim e sabe disso, por que está
se colocando de novo nessa posição?

— Eu não sei, foi apenas forma de falar, você não gostou?

— Não, não gostei.


— Me desculpe, só estava te elogiando.

Só queria dizer que acho que o Mosés é muito mais do que eu


poderia esperar em toda a minha existência e ele agir assim só reforça isso,
só indica que ele é realmente especial e maravilhoso, o homem que eu sei
que me fará muito feliz por todos os dias da minha vida.

— Explique então.

— Só quis dizer que você é especial e que sei que devido a isso me
fará muito feliz, que você sempre foi comigo mais do que eu esperava que
fosse, é claro que eu não pensei que nós dois daríamos certo no começo,
mas hoje eu vejo o grande homem que você é, depois de tudo você ainda
quer estar ao meu lado e me trata com amor e quer me ajudar, sou grata por
você não ter desistido de mim.

— Eu também sou grato por sua vida, me casei com o amor da


minha vida e tenho vivido muitos sonhos com ela desde então, mesmo que
as vezes ela seja um pouquinho cabeça dura e insegura.

Eu o beijo e vou para cima dele sentindo seu aperto bem quente, os
braços que me apertam amplamente dando a volta em minha cintura, as
mãos grandes que deslizam por minhas costas e me apalpam, nossas bocas
se envolvem com intensidade enquanto escuto os sons dos beijos.

— Eu tinha me esquecido do quanto você pode ser doce, romântico


e incrível quando quer — digo e dou mais um selinho nele. — E meu.

— Seu eu sempre fui — ele ri e segura as pontas dos meus cabelos


puxando-os para trás mais uma vez. — As outras coisas eu não sei se sou
tanto assim.

— É sim, é muito — depois que falo o fito. — Meu Mozão.

Sei que oprime o sorriso, sei que ele ama esse apelido e que adora
que eu seja carinhosa com ele, senti tanta falta disso, tanta que sinto
vontade de chorar só de lembrar de todas as vezes que estava na cama
lembrando de momentos como esse e ele não estava lá comigo, saber que
foi minha decisão deixá-lo me deixa triste, ainda que não tenha sido algo
que foi por minha culpa.

— Eu prometo que nunca mais vou deixar que nada nem ninguém
fazer isso conosco novamente, nem eu farei — falo e meus olhos começam
a se encher de lágrimas.

— Não chore senão eu irei chorar também.

Sorrio e vou para o lado limpando as minhas faces, Mosés vem para
cima de mim e puxa os cobertores, rio entre lágrimas, sei o que passei, ele
sabe o que passou, porém também me sinto bem mal pela forma como sei
que tenho tomado essas decisões, principalmente por saber que apesar dos
pesares nossa relação teve esse rompimento e isso nos abalou muito, mas
porque eu escolhi não confiar nele e seguir os meus medos e inseguranças.

Isso é literalmente uma merda.

Quer dizer, não estava errada, mas também indiretamente sei que
poderia ter feito as coisas diferentes.

— Ana...

— Eu sinto muito, me perdoe.

— Eu sei que sente, amor, por favor não transforme isso num drama
ainda maior, já passou.

Ele toca as minhas faces e as limpa com os polegares, acho que a


última vez que chorei assim na presença do Mosés foi no início do nosso
relacionamento quando tive que me observar nua diante de um espelho e
dele.
Aquilo foi algo que me fez mal, mas que depois me fez sentir tão
bem.

— Eu te amo e nunca faria nada disso intencionalmente, eu juro que


não vai mais acontecer, ok? — indago chorosa.

— Sei que não vai — Mosés cola a testa na minha e me dá um


sorriso repentino. — Eu aceito que me pague com sexo também se quiser.

Rio alto e abraço esse bobo, ele beija a curva o meu pescoço e
depois puxa os cobertores nos cobrindo até o pescoço, segura a minha mão
e entrelaça os dedos nos meus apertando-os com gentileza.

— Minha Ana, minha gordinha para sempre.

— Para sempre, meu Mozão.

Sei que ele revira os olhos, mas beijo sua cabeça mesmo assim,
respiro fundo e relaxo aos poucos, deixando que meu corpo afunde na nossa
cama, olhando para o teto de nossa casa e um pouco mais feliz, bem mais
feliz na verdade.

Amanhã será um novo e feliz dia.


NOVIDADES

— Bom dia, minha linda.

— Hummmm...

Soa como um gemido, mas ainda assim começo a sorrir, as boas


sensações se espalhando por meu corpo, me estico enquanto os braços do
meu marido me apertam no meu clássico abraço de bom dia. Me viro na
cama e o aperto ao mesmo tempo escuto o som da porta do nosso quarto
sendo aberta e vejo as crianças correndo para nossa cama, faço uma careta
enquanto Cory pula em cima do nosso colchão, Sophie vai para cima do
pai, Laisa vai para o outro lado e Sahara vem para cima de mim, Bea pula
entre nós dois, Gustav se senta na ponta da cama e seu gêmeo Akim se
senta na outra ponta, ambos com lágrimas nos olhos assim como as gêmeas,
Cory já me parece estar chorando abertamente há bastante tempo.

— Achei que nunca mais veria essa cena — Sophie abraça o pai
com força e funga.

Sei o quanto tudo isso foi difícil para as crianças, o quanto sofreram
e o quanto foram machucadas pela minha decisão de pedir o divórcio,
também por pensarem tantas coisas ruins sobre o pai, não gosto de ver os
meus filhos sofrendo como vem sendo.

— O papai nunca mais vai permitir que a mamãe faça algo assim —
Mosés determina emocionado e beija a cabeça dela e depois a de Laisa. —
Nós nunca mais vamos nos separar.

— Nunca — reforço cobrindo o rosto de Bea e Sahara de beijos,


abraçando-as com os dois braços.

Os meninos sobem na cama e vêm para cima de nós dois, Cory fica
sentado entre nós dois com as pernas dobradas limpando os cantos dos
olhos, estendo a mão chamando-o e ele vem nos abraçar também.

Sei que muitas pessoas não entenderiam a ligação que temos com
nossas crianças, para a maioria das pessoas lá fora somos superprotetores e
acham que nós as mimamos muito porque tratamos elas como deve ser, mas
não dou a mínima, muito menos o Mosés.

Ambos adoramos ser carinhosos com nossos filhos e amamos a


personalidade de cada um deles, principalmente de sermos tão bem
retribuídos afetivamente por eles, são nossos, parte de nós, prova disso é
poder vivenciar momentos como esse, nesse exato momento.

— Estamos preparando o café — Sophie garante se erguendo. —


Chegamos há uns vinte minutos, o tio Tom nos trouxe com a tia Safi.

— Bem cedo — Mosés fala e limpa as faces. — Achei que viriam


por volta do horário do almoço, querida.

— Estávamos ansiosos — Akim fala. — E como foi a viagem?

— Foi muito boa, fizemos muito sexo — Mosés enfatiza num tom
exagerado.

— Aí pai, credo! — ele faz uma careta e se ergue saindo da cama.


— Já perdi até o apetite.

— Eu fico com os ovos — Gustav protesta. — E você me deve vinte


e cinco pratas.

— Sem apostas — aponto mais séria.

Eles se entreolham e depois começam a sair do quarto, Laisa me dá


um beijo forte na bochecha e Bea me dá outro na outra bochecha, Saarah
beija a face do pai e sai também logo em seguida, Sophie o aperta e se
levanta toda sorridente, tenho crianças lindas, as meninas são muito
parecidas com o pai já os meninos não chegam nem perto de parecer
comigo, todos são parecidos com Mosés de uma forma ou de outra ou com
a minha sogra.

As meninas têm cabelos loiros enquanto os meninos têm cabelos


castanhos claros, todos tem os olhos do Mosés, talvez o formato do meu
nariz e meus lábios, porém são mais parecidos com ele fisicamente.

Cory fica parado diante de nós dois nos olhando como se não
acreditasse que estamos aqui, Mosés sai da cama, já está usando uma cueca,
provavelmente foi até o closet pela madrugada e pegou para si.

— Você quer conversar agora? — indago.

— Talvez — Cory responde um tanto acanhado.

Respiro fundo, vejo meu marido ir até o closet em silêncio, não


pensei que teria essa conversa com meu filho tão cedo, que haveria
necessidade de explicar nada nem de ter que falar a respeito da mãe dele,
mas por fim, ela está de volta e imagino que não esteja disposta a ficar
longe dele, mesmo que não saiba as intenções dela já faço uma ideia de
quais motivações.

— Eu não quero que vocês se sintam mal — Cory me lança um


olhar um tanto nervoso. — Ela me ligou e temos conversado desde então,
não quis marcar nenhum encontro porque não sei se estou preparado ainda e
vocês estavam viajando e se resolvendo.

— Eu entendo que queira ver a sua mãe — falo pouco confortável.

— Sei que isso afeta muito vocês dois, não quero que fiquem
magoados ou decepcionados comigo com a reaproximação da Viviane — os
olhos dele se enchem de um tipo de mágoa. — Eu sei que ela fez tudo
errado com vocês e comigo, mas talvez ela tenha mudado, não é?

Eu duvido muito.
— Tem que ter cautela, sua mãe é uma pessoa na qual não devemos
confiar de forma alguma — Mosés retorna e se aproxima da cama, já está
usando uma calça de pijama. — Ela disse alguma coisa?

— Disse que quer me ver e que sente muito a minha falta — Cory
confessa sem jeito. — Pai, sei que teve seus problemas com ela no passado,
mas seria legal que me apoiasse nisso, talvez ela queira realmente se
redimir.

Eu também não acredito muito nisso.

Sabemos o quanto ela pode ser manipuladora e dissimulada.

— Eu combinei que conversaria com vocês dois sobre isso e que


marcaria uma data para nos vermos, ela está hospedada em um hotel no
centro, como saiu do centro psiquiátrico recentemente ela está sem
dinheiro, eu tomei a liberdade de ajudá-la com um pouco da minha mesada.

Mosés não gosta e reconheço esse olhar cheio de receio e raiva


velada, eu entendo essa mágoa, a dor que ele carrega porque hoje vê a irmã
mais nova numa cadeira de rodas. É lógico que ele sabe que Safira assumiu
todos os riscos quando entrou naquele carro, mas que concordamos que
apesar de todos os riscos, a intensidade na qual foi colocada diante da
situação justamente por Viviane é algo do qual julgamos desnecessário.

Quem não julgaria? Ela foi responsável por tudo o que aconteceu
em boa parte dos problemas que tivemos indiretamente quando nos
conhecemos, todas as coisas referentes a Safi e como consequência o
enfarto do Phill e, além disso. Das motivações por parte da raiva que a Safi
sentia por mim, dela ter ido à igreja e tentar impedir o Mosés de se casar
comigo e depois de quando chegou ao limite quando aponto aquela arma
para mim.

Cory não sabe de boa parte dessas coisas e talvez nunca precise
saber, dizer isso para ele nos dias atuais não mudaria nada além do fato de
que sua mãe no passado foi uma pessoa muito má.
Eu acredito em segundas chances, acredito na oportunidade da
mudança, mas não sei se acredito tanto que isso possa se encaixar a
qualquer pessoa nesse mundo.

— Não farei nada que vocês dois não permitam — garante Cory
com um tom a mais de seriedade no olhar e olha para o pai como se
esperasse aprovação da parte dele. — Papai?

— Eu não tenho que tomar essa decisão por você...

— Ah, pai, qual é? Tudo bem que ela e a mamãe se odiavam no


passado por conta do lance de vocês dois, mas hoje é diferente, nem a
mamãe guarda mágoa.

As coisas não são bem assim, querido.

Mosés me olha brevemente e sei o que esse olhar quer dizer, mas ele
respira fundo e isso também significa que está ponderando. Quando o Cory
começou a crescer nós dois chegamos a um acordo de silêncio total em
relação ao que aconteceu com a mãe dele quando ele era criança. Sempre
dissemos quem era Viviane, onde ela estava, mas tudo isso se resumiu a um
“ataque de esquizofrenia e paranoia” e nada além disso. Dissemos que ela é
uma ex de Mosés e que ela decidiu nos dar a guarda dele quando ele era
pequeno devido a isso, mas nada além do que ele já sabe.

Sabemos o impacto que isso poderia ter na vida dele e não queremos
que o Cory sofra com as escolhas da mãe, nem que saiba que ela o
negligenciou tanto durante seus primeiros anos de vida, é uma conversa que
só vamos ter se ele de fato nos perguntar e como ele até então nunca
questionou, não nos coube tomar nenhuma decisão sobre falar algo do tipo.

— Entendemos a sua necessidade de se reaproximar da sua mãe, só


queremos que tenha cautela — Mosés fala e sei que escolhe todas as
palavras.
— Queremos que fique seguro — completo e estendo a mão
tocando a mão dele.

— Ela me garantiu que está tomando todos os remédios, que tem


vários médicos que a acompanham desde que ganhou alta do hospital
psiquiátrico — Cory responde um tanto desapontado.

Sei o que está se passando pela cabecinha dele e isso é


completamente justificável.

— Sei como se sente em relação a isso, meu amor, mas tudo tem seu
tempo, podem continuar conversando e quando se sentir pronto podemos
marcar uma data...

— Só não quero que vocês dois se intrometam e assustem ela —


Cory me interrompe e se ergue fazendo cara de quem comeu e não gostou.
— Ela é a minha mãe, talvez ela também tenha o direito de querer se
reaproximar sem segundas intenções em relação ao papai ou coisa do tipo,
não acha?

Não, não acho.

Mas me zango do jeito como ele se refere a ela como “minha mãe”,
ela nunca quis ser mãe dele de verdade e se tentou foi algo do qual não fez
direito.

— Não é nosso papel te dizer o que fazer, Cory, você é um homem


adulto e sabe muito bem o que é melhor para si mesmo — respondo num
tom mais firme e ele se endireita todo carrancudo. — Não vamos nos
intrometer na sua relação com a SUA mãe, não se preocupe.

As bochechas dele vão ficando vermelhas e o rubor sobe até suas


orelhas, ele não fala mais nada e sai do quarto depressa, sei que não gostaria
de ter usado esse tom com ele, mas realmente se ele acha que eu vou
normalizar isso é algo do qual não permitirei.
Fico por alguns instantes olhando para o rumo da porta enquanto ela
se fecha, dizendo para mim mesma que devo aprender a compreender as
necessidades dele, a ter empatia, mas sei que no fundo, no fundo, é
complicado demais pensar sobre isso agora com calma.

— Devemos dizer a ele...

— Não vamos dizer nada a ele, você sabe que no exato momento
em que nós dois dissermos o que ela fez, ele vai pensar que estamos
tentando afastar ele dela, que eu estou tentando afastar ele dela por sua
causa — respondo e começo a sair da cama. — Acho que agora é a hora de
falar com o tio Olaf sobre alguém para cuidar dele à distância durante esses
dias e saber quais as verdadeiras intenções dela.

— Farei isso — Mosés se levanta também e por alguns instantes


fica me olhando de cima abaixo.

— O que foi? Vai ficar aí olhando para a minha “raba” e não vai vir
se trocar?

A pergunta parece tirá-lo de órbita e então ele vem na direção do


nosso closet, antes que eu entre levo um tapa bem servido na bunda, dou
um pulo e arregalo os olhos, queima bastante, mas também me faz rir.

— Está pronta para mais um dia de aventura, ordinária?

Estou definitivamente adorando esse apelido.

— Sempre.
DE VOLTA

— E então, agora que vocês dois oficialmente voltaram e estão


juntos, tipo, real oficial, já podemos voltar a mexer nas nossas redes
sociais?

Analiso a pergunta de Sophie, ela ainda é a garota que ama


computadores e maquiagens, que monta Lego como nenhuma outra criança
que eu conheço poderia montar, só que ela também é uma adolescente que
ama redes sociais e postar foto dos lugares para onde vai e as coisas que faz
no dia a dia.

E eu sei o quanto é ruim para as crianças terem se afastado das redes


sociais, mas também imagino que todo esse processo teria sido ainda mais
doloroso se caso eles houvessem continuado a permanecer nas redes sociais
todos os dias.

Eu não gostei do jeito como fui colocada diante da situação, mas a


exposição para eles veio ainda milhares de vezes pior, por serem nossos
filhos, mas porque também são netos do meu pai, porque estudam em
escolas com centenas de crianças que também são filhos de pessoas
importantes e que não têm metade da consciência que eles têm sobre um
bocado de coisas.

— Podem voltar a usar as redes sociais, mas tomem cuidado com as


coisas que possam encontrar em páginas de fofoca ou algo do tipo —
respondo sincera. — Não quero que aceitem nenhum tipo de mensagem de
pessoas que não conhecem, fechem as redes apenas para pessoas com quem
têm contato.

— E nada de fotos nossas por enquanto ­— Mosés diz com certa


firmeza. — Nem de vocês.
Pedi ao Cory que me ajudasse com as crianças em relação a isso,
como medida eu os fiz desinstalar todas as redes sociais de seus
smartphones, ele foi a pessoa que providenciou para que isso se cumprisse
mesmo à distância.

Pego a garrafa de café e sirvo mais uma xícara para o Mosés depois
outra para mim, olho para a mesa farta e para cada uma das minhas crianças
sentadas em seus lugares, acho que começaram a marcar cadeira quando as
gêmeas já estavam com uns cinco anos, Cory sempre se sentou ao lado
esquerdo do pai e eu ao direito.

Sophie, Laisa e Sahara ao lado dele, Gustav, Akin e Bea sentados do


outro lado da mesa, do meu lado, sorrio ao sentir a mão do meu esposo
pousando sob a minha embaixo da mesa, os dedos entrelaçando nos meus e
me vem uma boa lembrança, de quando todos eles ainda eram pequenos
demais e comiam em cadeirinhas, de quando Cory ainda era um menino
pequeno e precisava de um acento para que alcançasse a mesa.

As crianças tinham pratos coloridos, copos coloridos e colheres que


faziam pares com os pratos, em cada prato tem o nome de cada um deles,
bem como nas colheres e nos copos, algumas vezes quando me lembro do
quão era estressante sinto vontade de chorar.

Porque não é fácil cuidar de sete filhos ao mesmo tempo, nada fácil
na verdade.

Mas olhando hoje para todos eles me sinto orgulhosa e satisfeita, sei
que fiz um bom trabalho como mãe, que sou presente na vida das minhas
crianças e que eu sempre fiz tudo o que estava ao meu alcance para que
todos eles estivessem limpos e bem alimentados.

Tenho dado o melhor de mim para minha família há anos e graças a


Deus meus filhos são crianças maravilhosas.

— Mamãe, tudo bem? — Gustav indaga me encarando meio sem


graça.
— Tudo mais que bem — respondo num tom sincero e coloco um
beijo carinhoso na cabeleira cumprida dele.

— Estou feliz que o papai voltou para casa — Akin diz com um
sorriso imenso nos lábios.

Os meninos estão naquela fase da adolescência que querem a todo


custo mostrar que já são rapazinhos, dando uma de durões e engraçados
quando querem, contudo, eles costumam ser bastante carinhosos conosco
em casa.

— Vocês vão para a empresa hoje? — Bea pergunta e enfia uma


fatia de melão na boca.

— Temos que resolver algumas coisas, mas voltamos para o almoço,


vocês podem aproveitar e preparar algo juntos para almoçarmos — Mosés
explica enquanto morde um pedaço grande de pão com ovos.

— Lasanha! — Saarah berra de repente toda alegre.

Olho para o rumo da minha menina e ela acaba por rir, as crianças
disparam a rir também e fico espantada achando graça com isso. Ao mesmo
tempo que me dou conta do quanto senti falta disso, me vejo também tão
conectada com cada um deles que isso me faz sentir alguém boba demais.

— Eu fico com os molhos — Cory avisa e enfia algumas nozes na


boca. — Pai, o tio Tom tem uma moto velha na garagem, eu tipo meio que
já tenho a habilitação então será que eu poderia pegar ela para consertar?

— Tipo Jacob Black? — Bea suspira de um jeito lúdico.

— Acorda para a realidade Bela da Shoppe — Sophie joga um


guardanapo no rosto da irmã.

— Team Eduard! — berra Laisa de volta.


Rio mais uma vez, eu parei para pensar uma vez sobre como seria
isso, foi uma das coisas que mais me machucou e de todas as hipóteses a
que mais me destruiu em todos os mínimos pedaços incontáveis.

Como seria se não voltássemos?

Bem, não seria.

Eu tentei todas as vezes banir essas sensações, mas é algo que


voltava dia após dia, sabia que não veria o Mosés limpando os cantos da
boca com um guardanapo de tecido como o homem mais educado que eu já
conheci na face da terra, eu não veria as minhas meninas interagindo em
sua forma una de se comunicar e nem os gêmeos ficarem trocando olhares
como se tivessem um satélite natural para identificar o que ambos estão
pensando a respeito de coisas da escola ou que aconteceram no dia a dia.

Me doeu muito todo processo de separação, por muitas coisas, mas


por isso.

Construí uma família com Mosés Handerson, um lar e tudo o que eu


sei que nunca tive antes na vida e a chance de perder tudo isso me afetou
demais, a suposta traição dele me machucou muito porque aquilo também
me fez acreditar que era o fim de tudo o que mais lutei para construir.

Meu lar.

Agora olhando em volta me vejo sorrindo mais uma vez.

Feliz feito pinto no lixo como não venho me sentindo há tanto


tempo que mal conseguiria descrever a sensação de felicidade.

Agora tudo está voltando para o seu devido lugar.


Mosés veio na frente porque eu fiquei com a louça, no final das
contas cada um deu uma desculpa e Cory teve que ir ao mercado com eles
para reabastecer a dispensa. Hoje faremos um churrasco misto de carne
vegetal, carne animal e alguns legumes.

Ainda estou meio que aprendendo a lidar com essas particularidades


da geração deles, quer dizer, minhas filhas participam ativamente de
movimentos sobre aquecimento global e relação de consumo e tudo mais e
são causas das quais eu tenho participado, contudo, meio que de uma forma
mais indireta.

Então Cory foi buscar mais carne e todos os ingredientes para


fazerem o churrasco e uma lasanha de beringela, imagino que nosso almoço
ficará mesmo para um jantar ou coisa do tipo, porém, estou tão feliz de
saber que meu retorno a empresa será marcado também pelo meu retorno
com o meu esposo que não consigo parar de sorrir.

Também imagino que Mosés tendo vindo um pouco antes terá a


oportunidade de reunir o pessoal para que possamos ter essas reuniões com
os diretores, o pessoal do RH e podermos fazer algumas promoções.

Sei que trabalhar a distância não tem sido fácil para mim, evitei vir a
Handerson com todas as forças porque sabia que ele estaria aqui, ainda fico
imaginando como até algumas semanas atrás eu estava trabalhando em casa
via internet, dividindo meu tempo entre copos de chá, café e alguns lenços.

Não sinto que negligenciei meu cargo, fiz tudo como pude e da
melhor forma, sei que Mosés tem administrado boa parte das coisas sem
muita dificuldade mesmo que tenhamos sido uma ótima equipe durante
todos esses anos.
Ser sua sócia para mim veio sendo bem mais importante do que ser
sua esposa de fato e vice e versa, então agora queremos fazer diferente,
queremos que nosso casamento volte a ocupar o primeiro lugar em nossas
vidas.

Por isso faremos essas mudanças na Handerson, esperamos que tudo


se encaminhe e fique bem.

Estaciono o carro na minha vaga e pego minha bolsa no banco do


passageiro, escolhi um conjunto social de cor azul escuro composto por
uma calça cintura alta e uma blusa de mangas folgadas com lacinho no
pescoço, calcei um dos meus sapatos prediletos e me maquiei com cuidado.

Acho que com o passar dos anos eu fui me esquecendo de como era
esse processo, me arrumar mais, calçar meus sapatos Dolce prediletos,
colocar brincos, me sentir de novo a mulher que demorei a aprender a ser.

Se amar todos os dias sendo gorda não tem sido a missão mais fácil
do mundo, mesmo com muito esforço, sei que nos últimos anos eu estava
me mantendo arrumada muito mais por obrigação do que em si porque
queria, porque gostava e não deve ser assim.

Sei que é um exercício diário cativar em si mesma o autocuidado


principalmente depois de tudo o que aconteceu. A situação já estava ruim,
então só piorou tudo.

Puxo meu cabelo para trás e pego meu casaco no banco de trás do
carro, quando tranco meu carro coloco a alça da bolsa sobre o ombro e vou
caminhando até o elevador do estacionamento.

Tenho pensado em algumas coisas, talvez fazer uma surpresa para o


Mosés mais a noite, quem sabe?

Sorrio ao me lembrar da loucura que fizemos ontem no banheiro,


toco minha cabeça lembrando da pancada que levei e isso faz com que
minhas bochechas fiquem vermelhas, eu nunca pensei que depois de tanto
tempo ainda houvesse em nós essa vontade louca de transar.

Ainda mais com a menopausa batendo a minha porta.

Só que ontem por todos os momentos em que eu estive com ele me


senti bem distante da Ana gorda e velha que eu tenho me sentido
ultimamente, segura, capaz, como se por aquele momento eu fosse
novamente a mulher de vinte e poucos anos que tinha uma libido quase
imaculada em vista da que tenho hoje.

Fico diante do nosso elevador, digito a senha no painel e as portas se


abrem, meu tio colocou um programa que reserva esse elevador apenas para
mim e Mosés utilizar, ninguém mais tem acesso, mais por uma questão de
agilidade e poupar tempo.

Entro no elevador, é reservado apenas para nós dois e algumas vezes


para a Sêmora também, ele dá direto para a nossa sala, e aperto o botão do
meu andar, as portas se fecham e observo meu reflexo no espelho por
alguns momentos, não me sinto mal ou incomodada, mesmo que não goste
muito de ver essas pequenas linhas de expressão nos cantos da boca.

— Sem paranoia! — digo para mim mesma enquanto o elevador


sobe.

Me viro para frente e arrumo o meu casaco dobrado em cima do


meu braço, enfio o chaveiro do carro dentro da minha bolsa e arrumo o cós
da minha calça me sentindo um pouco ansiosa, mesmo que não esteja
preocupada. Olho para o meu sapato e arrumo o pé dentro dele, não é muito
alto, mas nunca se sabe quando eu posso levar um tropeço daqueles.

As portas do elevador se abrem na nossa sala e quando ergo o olhar


vejo o par de sapatos reluzentes de cor preta, a calça de brim da mesma cor
e mais acima o terno que faz par com a calça. As duas mãos dele seguram
um buquê de flores azuis grande e os olhos azuis se tornam mais intensos
quando ele me vê, seu sorriso é pequeno e genuíno.
Mosés Hallan Carsson Handerson.

Isso tudo bem diante de mim usando uma gravata azul escura que eu
cansei de arrumar em seu pescoço nos dias de correria, na mão esquerda em
seu anelar a aliança dourada reluzente.

— Boa tarde, Ana Beatrice.

A voz dele mantém aquele tom grave que eu conheço, cheio de


provocação e um tom velado também de sutileza.

— Já quer aloprar uma hora dessas, Mozão?

Ele me dá um sorriso com o canto da boca e saio do elevador me


aproximando dele, estendo a mão e Mosés passa o braço em volta de mim
abaixando o buquê, sorrio olhando para cima, deixando que ele coloque um
beijinho suave nos meus lábios.

Eu o amo tanto, tanto!

— Bem-vinda de volta meu amor — diz ele baixinho entre o beijo.

— Obrigada, meu amor.

Dou mais um beijinho nele e outro, Mosés me solta e me entrega o


buquê, sorrio olhando para o meu presentinho lindo, não é algo do qual
pensei que ele me daria hoje, mas fico feliz que ele tenha me dado.

— Seu presente eu dou mais tarde — falo contente.

— Acho que não precisaremos esperar até mais tarde — ele


responde e me olha de cima abaixo. — Por que não veio de saia?

Minhas bochechas ficam vermelhas e o calor sobe até as orelhas, me


endireito sem entender muito bem por qual motivo estou constrangida, é o
meu marido! É só o meu marido querendo saber por que não vim de saia
para que ele me coma em qualquer lugar que quiser dessa sala sem que
tenhamos trabalho de nos livrar das roupas.

— Esse é o outro presente que eu vou dar mais pela noite, o


primeiro presente será entregue lá em casa na hora do churrasco —
respondo e sorrio. — Você acha mesmo que eu sou tão antiprofissional
assim?

— Eu gosto quando somo antiprofissionais nessa sala — ele enfia as


mãos nos bolsos da calça e vai se afastando até sua mesa. — Na mesa, no
sofá, perto da janela, ah, eu adoro ser antiprofissional principalmente no
terraço, ar puro, sabe? O elevador também é um ótimo lugar para ser
antiprofissional.

Eu riria se não estivesse de fato constrangida.

Acho que já profanamos os quatro cantos da empresa durante todos


esses anos, acho que o extremo aconteceu quando transamos no
estacionamento dentro do carro, algumas vezes eu só me sinto grata pelo
privilégio de ser dona daqui e poder ter acesso as câmeras de segurança.

Só para me certificar que não vai vasar nenhuma imagem minha


feito uma puta desorientada transando com o meu marido em qualquer lugar
daqui.

— Já reuniu o pessoal? — indago indo até a minha mesa.

Olho em volta, tudo no mesmo lugar, minha mesa ao lado da dele,


nossos troféus nas prateleiras num canto ao lado de todos os certificados
que a empresa tem, as fotos de algumas viagens que fizemos em nossas
mesas, das crianças quando ainda eram bebês e delas em diversas fases da
infância.

Temos um aquário na nossa sala, quadros que as crianças pintaram


ainda na primeira infância, decoramos de uma forma que torna o ambiente
um local que nos faz sentir bem e confortáveis, fizemos essa reforma há
cerca de dez anos. Se alguém me dissesse que eu seria CEO de uma
empresa desse porte e tamanho tendo começado como contadora de setor,
eu nunca acreditaria.

Agora sou dona.

— Eu amo esse lugar — digo, mas está mais para uma sensação de
alívio.

Poder sentir que pertenço sim a Handerson, ocupando meu lugar de


sempre ao lado do meu sócio e esposo.

Coloco minhas flores sob um cantinho da mesa e puxo minha


cadeira colocando meu casaco sob o encosto, Mosés pega a minha bolsa e
coloca sob a mesa dele então me puxa me pegando pela cintura e me abraça
com carinho.

— Senti tanto sua falta aqui, Bêzinha.

— Eu também senti, meu amor.

Aperto ele entre os braços e beijo seu pescoço, Mosés me aperta


com força e mais uma vez sinto toda a onda de amor que vem dele, carinho,
atenção, todas as sensações que ele sempre me transmite quando estamos
juntos.

— Já reuni o pessoal e fiz os ajustes necessários, já abrimos vagas


para os cargos que vão ficar em aberto e fiz outras promoções — Mosés
explica e me solta do abraço. — Já pedi que colocassem tudo na intranet, se
os cargos não forem preenchidos com nosso pessoal, vamos abrir para
contratação externa.

— Não acho má ideia — concordo.

Sei que temos excelentes profissionais, mas a concorrência também


tem alguns bons profissionais no mercado, em alguns casos se ocorrer de
precisarmos contratar pessoas de fora também não acharei ruim.

Aprendi a entender o negócio durante esses anos, desenvolvi muitas


habilidades em questões que até então antes eu não pensei sobre como seria.
Mosés tem um jeito mais restrito de trabalhar, ele é mais firme e duro com
situações e pessoas, costumo ser mais flexível e empática.

É por isso que as decisões que exigem mais deixo para ele, é bom e
racional em muitos sentidos que eu não sou.

— Quer me acompanhar nas reuniões com o pessoal de


desenvolvimento? — ele pergunta e checa o relógio de pulso.

— Preciso dar uma olhada nos meus e-mails, Sêmora?

— Está na sala de reuniões organizando tudo para a próxima


reunião, acredito que até as 14:00 estejamos a caminho de casa.

— Por mim está ótimo.

Ele guarda o celular no bolso e me lança um olhar um pouco


maldoso.

— Pensei em jantarmos fora hoje, o que acha?

— Você quer sair para me comer fora?

Olho para o monitor do notebook escutando uma risadinha maldosa


vinda dele, ele se inclina e deixa os lábios bem próximos da minha orelha.

— Por mim, te comeria agora mesmo nessa mesa.

O calor na voz dele me causa arrepios intensos por todo o corpo,


minhas bochechas se esquentam e sei que estou mais vermelha que um
pimentão.
— Mas os negócios chamam — ele fala e me dá um beijinho suave
no pescoço depois se ergue e arruma os botões do terno com cuidado. —
Nos vemos em algumas horas, amor.

— Sim, boa reunião, querido.

— Obrigado.

Mosés gira os calcanhares e se afasta com essa postura incrível e


charmosa que ele possui, antes de sair da sala, ele olha sob o ombro e me dá
um sorriso diferente, como se houvesse chegado a uma constatação muito
interessante.

Então sai da nossa sala me deixando sozinha com um sorriso


enorme nos lábios, estou suspirando, me sentindo estranhamente
empolgada, mas acima de tudo tão feliz que mal consigo descrever.

— É bom estar de volta.

E agora para sempre.


VOZES ASSUSTADORAS

— Ana Beatrice, como posso ajudar?

— Oi, Ana.

Franzo a testa reconhecendo essa voz de imediato, mas ao mesmo


tempo sentindo como se todos os pelos do meu corpo começassem a se
arrepiar um a um, desde os pés até a minha cabeça, não de um jeito bom,
mas da pior forma possível, um jeito que eu não sinto há tanto tempo que
havia me esquecido.

Da última vez que ouvi essa voz, havia uma arma apontada para
mim no meu quarto em casa, quando me lembro do olhar dela algo em mim
enrijece, me sinto endurecida, olho para o teclado do telefone em cima da
minha mesa, pego meu celular e noto que a minha mão treme um pouco.

— Ana? Ainda está aí?

Estou nervosa, mas consigo selecionar o aplicativo de gravação de


voz ao mesmo tempo que apoio o telefone no ombro e aperto o botão de
viva voz do teclado.

— Estou aqui sim — respondo tentando aparentar calma.

Quando na verdade meu primeiro impulso é querer desligar a


ligação, sei que isso seria facilmente resolvido se não houvesse tanto em
jogo, meu filho.

É difícil pensar em engolir a Viviane, é quase impossível tolerar o


fato de que ela está me ligando para falar comigo, não ouvia sua voz há
tantos anos que havia me esquecido de como era a sensação.
— Eu preciso conversar com você, sei que o Mosés não atenderá
minhas ligações — a voz de Viviane é calma e pacífica como nunca havia
ouvido antes. — Eu quero falar sobre eu poder ver o Cory.

— Ele comentou mesmo conosco — respondo olhando para a tela


do meu celular, está tudo sendo gravado. — Deixamos a critério dele caso
quiser te ver.

— Não quero fazer as coisas erradas com o Cory — ela continua. —


Eu já paguei pelas coisas erradas que eu fiz no passado, quero um recomeço
com o meu filho.

Agora de repente ele é o seu filho? Agora você quer um recomeço,


não é? Tão fácil! Depois de tudo o que fez com o Cory, todos os processos
dolorosos nos quais submeteu ele, vem com essa?

— Entendemos, o Cory já é adulto e sabe o que é melhor para ele —


falo sincera. — Ele é um rapaz independente e tem toda a liberdade de
escolher o que é melhor para ele.

— Só liguei mesmo para dizer que não obrigarei ele a nada, só


quero conhecê-lo um pouco melhor e poder ter contato com ele — Viviane
diz. — Eu quero ter posição na vida do meu filho.

Sei, vou fingir que acredito.

— Você tem cuidado dele muito bem e sou grata por isso, mas eu
sou a verdadeira mãe dele e ele também merece que eu faça parte da vida
dele.

Odeio com todas as forças que ela fale por esses termos porque eu
não só cuidei do Cory, eu sou a mãe verdadeira dele também, para mim
nunca seria diferente disso, ele é meu filho tanto quanto as minhas outras
crianças.
— Ele está com receio de magoar você e o seu marido, então quero
deixar claro que eu não vou me aproximar de vocês, só quero ver o meu
filho e poder ter esse tempo com ele.

Como se eu acreditasse nas intenções dela.

É tão irritante que ela apareça depois de todo esse tempo repetindo
que o Cory seja filho dela, que ela é a mãe dele quando na verdade teve
muitas oportunidades no passado e não fez a mínima questão de que ele
fosse de fato tudo isso para ela.

— Que seja, faça o que for necessário.

Depois que digo, desligo a ligação, olho para a tela do gravador do


celular e salvo o áudio, minhas mãos ainda tremem, minha respiração está
descompassada, levo alguns minutos até conseguir me mover de novo.

Meu corpo todo está tenso só de pensar que de alguma forma ela
estará tão perto do Cory nos próximos dias, contudo, sei que não há muito a
ser feito em relação a isso porque é o que o Cory quer, nesse momento tudo
o que me resta é ter que lidar com os fatos.

E os fatos por mais que sejam dolorosos e difíceis de se engolir, são


inegáveis.

Só que eu não acredito que ela mudou assim do nada, nem que
esteja disposta só a se aproximar de Cory para conhecê-lo porque se assim
fosse, ela já haveria entrado em contato conosco quando ele era mais novo.

É oportuno demais que ela se aproxime logo agora que eu e Mosés


estamos “supostamente” separados.

Ela ter me ligado só reforça o que eu sei que vai acontecer, ela vai
ter que ver o Cory, mas também é um aviso de que por mais que nós
tenhamos enterrado ela no nosso passado, ela está bem mais que viva no
nosso presente.
Todo cuidado com essa cobra é pouco.

— Rainha B, você está um arraso!

Meu sorriso é automático e quando ergo o olhar vejo a minha


melhor amiga entrando na sala, consigo me sentir melhor de imediato,
Sêmora ainda consegue me fazer sentir como se estivesse diante de alguém
que é muito além de uma melhor amiga até mesmo dentro do ambiente de
trabalho.

— Eu gostaria de dizer que como a pessoa maravilhosa que eu sou e


uma grande gostosa é claro — ela suspira para sua frase triunfal e balança
os cabelos. — Minha irmã, que loucura!

Solto uma gargalhada alta e fico de pé, Sêmora dá a volta na mesa e


me abraça com força, pouco me importava com formalidade aqui na
Handerson e agora é que eu não me importo mesmo, é bom depois de tanto
tempo longe daqui poder chegar e ser recebida tão bem.

Primeiro pelo meu marido e agora por minha irmã.

— Me conta tudo! — exige toda contente.

— Aconteceu tanta coisa que eu nem sei por onde começar.

— Vou buscar os nossos cafés, eu deixei a linha liberada porque


como estávamos em reunião pareceu impossível pensar em deixar alguém
esperando.

— O telefone quase não tocou.

— O Chefe não para de sorrir, eu nem consigo imaginar porquê.

Eu consigo.
Por alguns momentos enquanto Sêmora vai até a cafeteira da nossa
sala, fico processando a ligação na qual acabei de desligar, o quanto ainda é
irritante pensar que Viviane está muito perto de nós mesmo depois de tudo.

Naturalmente a eu de anos atrás não ignorou isso porque sabia que


ela sempre seria a genitora do meu filho, porém não achei que viveria para
ter que lidar com ela solta por aí pronta para querer uma reaproximação.

E sei que o meu marido — sim, sim marido! — tem toda a razão de
nutrir raiva dela, mas nesse momento ainda precisaremos ter bastante
cuidado para lidar com Viviane porque agora não é como antes.

Bem, é e isso é um sinal de alarme.

Porque não quero que ela faça com o Cory o que fez com a Safira e
sei que com a capacidade dela de manipular pessoas isso seria algo
facilmente possível em se tratando dela, só de pensar sinto calafrios ruins
pelo corpo todo.

Me abraço ao lembrar daquele dia horrível quando recebemos a


notícia de que a Safira havia sofrido um acidente, da sequência catastrófica
de coisas que aconteceram como reflexo da tentativa dela de manter o
Mosés perto dela.

Viviane é um assunto que não existia mais em nossas vidas há anos,


agora ela aparece como um daqueles fantasmas ruins que estão dispostos a
ficar grudada em nossas vidas como um encosto, um lembrete diário de que
talvez não nos deixe em paz.

— Amiga, você está com frio? Quer que eu mude a temperatura do


ar?

Sêmora se aproxima com duas xícaras de café em mãos, quando me


estende uma aceito, suspiro e indico o pequeno sofá num canto da sala para
que nos sentemos lá, aconteceu tanta coisa nesses dias, não sei nem por
onde poderia começar a falar.
A viagem, as brigas, a mentirosa que desmascaramos, a Viviane de
volta, tanta coisa!

Nos sentamos uma de frente para a outra a Sêmora sopra seu café
habitual, ela fica de lado toda elegante e isso faz com que eu sinta um
pouco mais de orgulho dela, é minha melhor amiga há mais de vinte anos,
minha confidente e minha principal rede de apoio.

Como uma irmã que as minhas próprias irmãs nunca serão.

— Por onde começar?

— Vocês transaram?

— Sim!

Sêmora bate com os saltos dos sapatos no chão comemorando, ainda


fico vermelha quando falo sobre sexo com ela algumas vezes, mas dadas as
poucas vezes que venho falando sobre isso com ela nos últimos meses, é
algo que realmente não me deixa assim tão constrangida.

— Foi tipo bruto ou romântico?

— Bruto — respondo e bebo um gole de café. — Bem bruto!

Ela faz aquela cara de safada e isso me faz rir, eu e a Sêmora fomos
desenvolvendo muita intimidade com o passar dos anos para falar sobre
nossos casamentos, filhos, sobre como nos sentimos nos dias ruins e nos
dias bons, mas a Sêmora tem essa capacidade incrível de falar sobre
sacanagem como se fosse a coisa mais normal do mundo.

— Por que você está com essa cara de triste?

— A Viviane saiu do hospital psiquiátrico onde ela estava internada


e agora quer se reaproximar do Cory.
Sêmora fica boquiaberta, preciso de mais um gole de café.

— Ela entrou em contato com ele enquanto estávamos fora, agora


apareceu com essa desculpa de que quer se aproximar dele e decidiu que é
hora dela exercer o papel que deseja na vida dele.

— Como assim?

Sêmora está chocada, claro, quem iria esperar que depois de todo
esse tempo aquela mulher voltasse fazendo exigências? Ninguém poderia
contar com isso, contudo, vindo de uma completa desequilibrada o que
deveríamos esperar?

Viviane e consciência são duas palavras que não combinam juntas.

— Bem, acho que essa é a única coisa ruim e mais desafiadora por
agora, eu e o Mosés nos reconciliamos e conseguimos colocar um ponto
final naquela situação com a Gisele.

— E aí?

— Ela inventou tudo, disse que sabia que pagariam bem para ela se
conseguisse montar alguma situação com uma pessoa importante, que teve
essa ideia para dar um golpe publicitário porque na época a irmã dela estava
fazendo tratamento de cancer e ela não tinha dinheiro para arcar com tudo.

Eu realmente nunca poderia romantizar essa situação em relação a


Gisele porque isso quase me custou meu casamento ou ao menos o que
restava dele, porém agora isso só parece algo ruim de lembrar, ruim por
mim e ruim pela irmã dela também.

— Amiga! — exclama Sêmora horrorizada. — Eu te disse, não


disse?

Sêmora não duvidava muito do Mosés mesmo que houvesse tomado


as minhas dores, que tivesse com raiva de tudo o que viu nas páginas de
fofoca ela me dizia muito no começo que não acreditava que ele havia me
traído, que achava que isso nunca poderia acontecer.

Na minha cabeça há alguns meses eu só queria acreditar no que vi,


era conveniente, era ver para crer e eu vi, não quis dar ouvidos a qualquer
outro tipo de coisa.

Para todo mundo Mosés era incapaz de me trair porque todos


conhecem muito bem a índole dele, só que haviam fotos, imagens
incontestáveis, uma pessoa próxima a ele dizendo o contrário, até mesmo
um vídeo com um clima romântico em que ela estava no quarto de hotel
aparentemente com ele, montando agora todos esses cenários na minha
cabeça me vem essa sensação de que sou idiota porque ela fez tudo de caso
pensado e caímos direitinho na armadilha dela.

— Eu não te julgo porque se fosse eu faria o mesmo — Sêmora diz,


mas parece preocupada. — E quanto a cobra?

— Eu e Mosés decidimos que vamos permitir que o Cory decida.

— Amiga, mas e quanto a tudo o que ela fez?

— Não acho que seja certo expor ele a nada disso.

— Não parece justo com a Safira.

— Eu sei que não é, mas não é justo com o Cory também, realmente
sei que é complicado ainda estamos pensando com zelo sobre isso, só que
nesse momento sei que se proibirmos ele de qualquer coisa, talvez isso o
coloque contra nós dois.

— Isso é tão injusto, vocês deveriam dizer a ele o que aconteceu, o


Cory ama a Safi, você vê que ele a adora e que é a tia preferida dele, como
acha que ele se sentiria se soubesse que aquela vagabunda fez isso com ela?
O Tom já sabe?
— Ninguém sabe! — suspiro profundamente. — E não acho
pertinente que nesse momento o Phill ou a Safira saibam muito menos o
Tom.

Eu sei que ele não reagiria muito bem, na verdade se o Mosés já está
exaltado com tudo o que está acontecendo não quero nem imaginar a forma
como o Tom reagiria se a Viviane ousasse se aproximar de quem quer que
seja da nossa família.

Acho que chegou naquele nível que nem se trata mais de perdão.

— Eu nunca poderia imaginar que isso aconteceria nesse momento,


achei que vocês dois se reconciliariam e depois tudo voltaria ao normal. —
ela bebe um pouco de seu café. — Você realmente acha que ela tem boas
intenções com o Cory?

— Acredito pouco nisso, mas não poderia proibi-lo de se aproximar


dela.

— Amiga, sangue não quer dizer nada.

Sei o que ela quer dizer com isso, cria os meninos realmente como
se fossem dela, a verdade é que eu e Sêmora dividimos um bocado dessa
coisa de ser mãe de crianças que não trouxemos ao mundo.

A Sammy sumiu e nunca quis saber dos meninos, hoje eles são
garotos que respeitam a minha melhor amiga como sua verdadeira mãe, já
estão na faculdade também, contudo, ao menos a Sêmora restou o conforto
do Jammie ter dito a verdade desde que eles ainda eram muito pequenos.

Eu não tive essa sorte, não quero nem imaginar como o Cory
reagiria de saber todas as maldades que aquela bruxa sujeitou a ele e a
nossa família, que ela quase o matou de fome e dando remédios ao meu
filho, dói de lembrar o estado que ele chegou a nossa casa.

— E como o chefe está reagindo a tudo isso?


— Ele a odeia então acho que já deve imaginar a forma como ele se
sente em relação a tudo o que está acontecendo, nós dois nem nos
entendemos direito e já temos mais problemas. — suspiro mais uma vez. —
Não que eu esperasse uma segunda lua de mel ao voltar, mas ao menos um
pouco mais de paz.

Sêmora ainda tem olhos chamativos e tem pensado em assumir os


fios grisalhos, ela tem usado corte Chanel há alguns anos e acho que foi
muito bem favorecida depois que se submeteu a abdominoplastia depois do
segundo parto, algumas vezes é difícil acreditar até que ela está com um
pezinho nos cinquenta assim como eu.

— Você se sente mais segura Rainha B?

Sorrio, automaticamente minhas bochechas começam a ficar


vermelhas porque isso me traz aquelas lembranças obscenas de como eu e o
meu marido acabamos transando feito dois animais na nossa cama.

— Ana! — exclama horrorizada. — Eu estou falando sério.

— Claro que me sinto mais segura — respondo envergonhada. —


Nós transamos e tudo está bem nesse sentido, é só que, agora é diferente.
Sinto que eu e o Mosés estamos novamente sintonizados, mas nada é como
antes, não sei bem explicar.

— Eu e o Jammie estamos planejando uma viagem para o Caribe


nas próximas férias — Sêmora está sorrindo toda empolgada. — Os
meninos virão para ficar com Janice e Aester, vai ser o máximo!

— Você e o Jammie são fogo!

— Ulá lá! — exclama exageradamente e se abana.

Começo a rir, rio tanto que minha barriga dói porque se há alguém
que me faz rir assim nessa vida além dela não conheço, termino meu café e
me ergo porque sei que preciso fazer alguns acertos já que vou embora mais
cedo.

— Vou te ligar para nós marcarmos um jantar em família — aviso.


— Eu e o Mosés vamos renovar os nossos votos.

— Eu quero ser madrinha! — exclama toda alegre. — Vou fofocar


com o meu marido sobre os últimos acontecimentos, ele está super ansioso
para saber o desfecho da Gisele.

— Te explico tudo por mensagem, sairemos mais cedo e quero fazer


uma surpresa para o Mosés — sorrio.

Sêmora estende os braços e nos abraçamos logo em seguida, me


sinto de fato confortada pelo fato de ter uma amiga verdadeira. Acho que
não importa quanto tempo passe, nem o quanto acabemos discutindo por
coisas pequenas e tolas, eu e a Sêmora seremos boas amigas para sempre e
isso nunca mudará.

Nunca!
PRESENTES

— Mãe, tem um segundo?

— Claro, só estou terminando de organizar essa baderna que o seu


pai fez aqui na roupa suja.

Cheguei há alguns momentos e tive que trazer minha encomenda


escondida para cá, usei a desculpa de que havia roupa suja para lavar e
escondi minha caixa aqui, já me troquei e deixei o Mosés no terraço com as
crianças, eu não quero estragar minha surpresa.

— Então, do que precisa? — pego algumas roupas no cesto de roupa


suja e vou jogando na máquina.

Cory ainda tem aquele olhar temoroso de quando faz algo errado e
deseja pedir alguma coisa, conheço bem as minhas crianças, o suficiente em
diversos sentidos. Os olhos claros e os cabelos loiro escuros lisinhos, não
conto quantas vezes o abracei, dei colo, carinho e afeto, mas que também
ensinei, que protegi e dei bronca.

Agora tem esse rapaz alto com barba feita diante dos meus olhos me
analisando como se quisesse me dizer algo do qual sei que não vou gostar,
só pela forma como ele me olha sei que se refere a ela.

— Quero me desculpar pelo que eu falei mais cedo, acho que você
não merecia que eu falasse daquele jeito com você, é só que... — ele hesita
um tanto nervoso. — Só quero conhecer a minha mãe biológica, sem
dramas ou brigas!

Sei que isso não será possível.

— Nem eu e nem o seu pai nos opomos a isso — respondo e pego o


recipiente com as bolinhas de sabão líquido. — Não se preocupe.
— Mãe, sei que você está zangada, mas a Viviane não quer mais
nada com o meu pai — ele diz e enfia as mãos nos bolsos. — Ela só quer
me conhecer e uma reaproximação, custa que você aceite?

— Acha que estou agindo assim porque tenho ciúmes do seu pai? —
começo a me irritar com a ideia.

— Bem, você o largou recentemente, estavam separados, sei que


está fragilizada com tudo o que houve e não quero que você se sinta mal
com isso — Cory fica me fitando bastante sério. — Eu conversei com ela e
disse que não quero que ela se aproxime de vocês dois, ela me garantiu que
não chegará perto do papai ou de você.

Entendo a linha de raciocínio dele porque é a única coisa que ele


sabe sobre isso tudo, então respiro fundo e decido que não posso discutir
com ele sobre nada disso, ainda mais depois que aquela cobra me ligou na
empresa hoje cedo.

— Ok.

— Só ok? — os ombros dele sobem e descem. — Não vai dar


nenhum sermão ou brigar comigo?

— Cory eu não sei onde quer chegar! — respondo magoada com o


que ele acabou de dizer.

Porque eu não fico dando só sermão e brigando com ele, só que


quando o fito sei que o Cory talvez já esteja sendo de alguma forma
induzido ou contaminado pelas palavras da Viviane, isso é realmente
preocupante.

— Há quanto tempo você tem falado com ela?

Ele revira os olhos como se fosse algo banal, cruzo os braços e


chuto a porta da máquina de lavar com certa força, quando ela bate faz um
barulho alto, Cory dá um pulo um tanto assustado, pois bem, se ele quer que
eu seja esse tipo de coisa para ele, eu serei.

— Dois meses — responde ligeiro. —, mas foram só conversas


superficiais, vocês estavam passando por tanta coisa que eu não quis piorar
a situação!

— Dois meses? — indago e engulo minha indignação. — Sério?


Quando pretendia nos contar?

— Mãe para de ser exagerada, ok? Só foram conversas simples, ela


me procurou e temos conversado sobre nos ver pessoalmente — Cory
responde amedrontado.

— Sabe que independente de qualquer coisa eu e o seu pai sempre


apoiaríamos você nas suas decisões, não temos segredos nessa família, você
sabe muito bem que nós nunca te julgaríamos por estar conversando com
ela. — digo tentando me controlar ao máximo. — Você mentiu para mim e
para o seu pai durante dois meses sobre isso e veio nos falar há apenas
alguns dias atrás...

— Não, eu não menti, eu só omiti, são duas coisas bem diferentes!


— ele me interrompe agitado. — Mãe! Para de me olhar assim, você está
monopolizando essa situação! Nem o pai está tão nervoso com isso!

Me sobe uma raiva imensa, um ódio de pensar que o Cory nunca


escondeu nada de nós e agora parece estar de segredinho com aquela cobra
surucucu!

— Foi isso o que a sua “mãe” te disse? Que eu estou com ciúmes do
Mosés com ela? Aposto que deve ter sido muito legal bater vários papos
com a sua verdadeira “mãe” durante esses meses pelas minhas costas! —
respondo e me sinto mal com isso.

Sinto vontade de chorar, não por ele ter omitido, mas por notar que o
Cory está erguendo uma barreira forte entre eu e ele assim por conta da
Viviane.

— Você ficou louca? Mãe!

— Você me chamou de que? — o berro simplesmente sai.

A conversa tomou esse tom sério porque meu filho de repente está
me chamando de louca, apenas pelo fato de que eu estou reagindo como
qualquer ser humano normal a enxurrada de coisas que acabo de saber.

Ao mesmo tempo minha mente me transporta para aquele momento


péssimo das nossas vidas em que a Viviane envenenou a Safi contra mim,
de como manipulou ela, de como a enganou e de todas as coisas ruins que
vieram como consequências disso.

Isso é algo que me desestabiliza num nível do qual nunca achei que
me desestabilizaria porque eu sei o que a Safi sofreu depois do acidente, o
que o meu sogro sofreu internado e de toda a dor que o Mosés e eu
enfrentamos durante os meses que se seguiram por conta do inferno que ela
fez em nossas vidas.

Relembrar é algo que tenho feito pouco, por isso é algo que está me
perturbando de repente.

— Eu só estou querendo dizer que não precisa ficar paranoica em


relação a nada, mãe! — ele explica ainda num tom de apatia.

— Eu não estou paranoica em relação a nada, Cory, você quem está


problematizando toda a situação — protesto irritada. — Você quem veio me
procurar e falar esses desaforos, me chamando de louca e de ciumenta.

— Achei que você me acolheria e me apoiaria, mas pelo que estou


vendo, só está mais preocupada com essa mágoa imensa que tem pela
Viviane, talvez ela tenha razão! — retruca secamente.
Me dói ouvir isso, mas me dói mais ainda constatar que ela está
manipulando-o de todas as piores formas contra mim.

— Ela deve ter mesmo razão, porque afinal de contas, ela é a sua
mãe! — ressalto a última palavra cheia de desprezo e saio da lavanderia
passando por ele.

Bufando de raiva, engolindo toda a vontade que tenho de repente de


falar tudo o que sei e quero, só que isso não é uma competição para mostrar
que estou mais certa que a Viviane, há muito envolvido.

Eu e Mosés temos muito que falar e agora que sei que ela e o Cory
estão mantendo contato há mais tempo será algo que teremos que fazer o
mais rápido possível.

— Eu não sei porque você está agindo assim, eu vim me desculpar,


não quero brigar, mamãe! — Cory vem atrás de mim enquanto entro na
cozinha. — Mamãe, eu estou falando com você, eu só quero que as coisas
se resolvam.

— Eu já entendi, Cory — falo e vou até a geladeira tentando ocupar


as mãos.

— Vai continuar brava comigo? — Cory cruza os braços todo


carrancudo.

— Não estou brava com você — digo de forma robótica e pego a


jarra de suco na geladeira.

Estou brava com ela.

Cory está do outro lado da mesa de refeições da cozinha, braços


cruzados, cara fechada, mas noto que em seu olhar ainda tem aquele temor
que sempre assume quando temos que falar sobre algo sério.

— Eu não quis ser desrespeitoso — esclarece ele.


— Tudo bem.

Não é muito justo, mas enfim.

— Amor eu acabei de entender como funciona a churrasqueira... —


Mosés entra pela porta que dá para a área da varanda dos fundos e quando
nos vê seu sorriso se desfaz. — O que está acontecendo aqui? — ele fica
repentinamente todo sério. — Amor?

— Você sabia que o Cory está conversando com a mãe dele há


meses pelas nossas costas? — questiono furiosa.

Mosés olha para ele realmente surpreso, logo em seguida seu olhar
assume aquele tom de raiva e chateação.

— Mãe! — exclama Cory e enfia a cara nas mãos. — Para com


isso! Eu só vim me desculpar, tentar conversar com você, mas você está
agindo igual...

— Uma louca, não é? — pergunto e minha garganta se fecha.

— Cory, sai daqui, vai ajudar os seus irmãos, deixa que eu converso
com a sua mãe! — Mosés ordena todo sério.

— Pai eu só quis...

— Depois eu e você vamos conversar sobre isso, agora vai lá ajudar


os seus irmãos — Mosés corta um pouco mais severo. — Agora!

Cory me lança um olhar cheio de mágoa e depois sai da lavanderia


pisando forte, me apoio na pedra da pia e passo a outra mão na testa
notando que estou tremendo, me sinto desestabilizada.

Respiro fundo algumas vezes antes de receber um abraço do meu


marido, meus braços ficam de repente moles, meu coração apertado assim
como minha garganta, como se de repente se formasse um bolo pesado e
ruim quando engulo a saliva.

Quando Mosés passa os braços em volta de mim uma onda de alívio


me toma dos pés à cabeça, mesmo que a angustia ainda me percorra o
íntimo, sei que estou segura aqui, que minha morada está fortalecida de
alguma forma.

Ao menos nesse sentido.

— Quer saber? Eu não vou! Vamos logo conversar sobre isso, eu


não sou um moleque para vocês dois me tratarem assim! — Cory volta
depressa e todo nervoso. — Eu só queria poder conversar com a mamãe
sobre tudo, não me sinto confortável de omitir mais de vocês a situação só
porque tiveram um problema no passado.

Mosés me solta e nos viramos para o rumo dele, fico olhando para o
meu filho e isso realmente me machuca porque sei que ela está se
aproveitando de sua vulnerabilidade, que está usando o fato de ser genitora
dele para querer justificar o que quer que tenha inventado em sua cabeça.

— Você se acha tão adulto para machucar sua mãe com palavras só
porque a sua genitora reapareceu na sua vida depois de todos esses anos? —
Mosés indaga com uma voz firme feito rocha e o encara com tanta
seriedade que sinto um pouco de medo. — Sua mãe é esta que está aqui, ou
a sua genitora limpou sua bunda? Te deu banho? Te confortou depois de
uma queda? Quem sempre esteve aqui por você foi a sua mãe, não a
Viviane...

— Mas pai...

— Eu ainda não acabei de falar! — Mosés esbraveja num tom de


voz mais alto e Cory abaixa a cabeça rangendo os dentes. — E olhe para
mim, olho no olho, você não é homem agora? Resolva seus problemas
como homem!
Cory ergue a cabeça e me olha depois encara o pai de cabeça
erguida.

— Nós entendemos os laços de sangue, Cory, por isso nós nunca te


proibiríamos de ter contato com a sua genitora, não tem justificativa você
ter omitido isso de nós, por que omitiu isso de nós?

— Achei que ficariam zangados — Cory responde todo preocupado.


— Na verdade fazem quatro meses que nós estamos conversando, ela me
enviou um e-mail me contando que era minha mãe e deixou um telefone
para contato, no começo eu tive minhas dúvidas, mas acabei ficando
curioso e telefonei para ela, temos conversado por ligações e mensagens
todos os dias.

Mais uma vez eu a subestimei.

Mais uma vez ela entrou em nossas vidas.

— Eu não quis preocupar vocês, sei que estavam passando por


muita coisa com a separação — Cory me fita. — E eu não quis te chamar de
louca, mamãe, me desculpe, é que você parece ter tanto nojo dela, dá para
ver que seu olhar muda, seu tom de voz, nunca te vi se referindo a ninguém
com tanto nojo, mas ela ainda é a minha mãe biológica.

— Eu lamento por isso — as palavras saem a força. — Não quis


ferir os sentimentos em nenhum sentido.

— Eu só quero poder reencontrar a Viviane e ajudar ela a


reconstruir a vida dela, ela está precisando de apoio agora, sou o único
parente dela vivo — Cory explica incerto. — Eu não quero que vocês dois
fiquem magoados ou zangados comigo por isso.

— Pode ajudar a sua mãe, Cory, mas há muitas coisas que estão
além da sua compreensão que nos fazem estar em dois extremos — explico
num tom ainda mais sincero fitando-o fixamente. —, mas não me peça que
tolere algo além disso, porque isso não vai acontecer.
— Por que você a odeia tanto? Você não se casou com o papai?

Fico calada, Mosés aperta os meus dedos com firmeza e ficamos nos
encarando por momentos desconfortáveis de silêncio. Sei que não poderia
explicar ou dar a resposta que devo para ele, não é algo do qual eu poderia
dizer ao meu filho, isso o destruiria.

— Você não tem porque odiá-la tanto, afinal de contas, você já


ganhou! — Cory quebra o silêncio.

Eu nunca poderia imaginar que o Cory diria algo assim para mim,
palavras cortantes, coisas que me machucam extremamente.

— Acha que é pelo seu pai? — indago e meus olhos começam a se


encher de lágrimas. — Acha mesmo que é porque ela “não venceu” no
final? Que tipo de pessoa você acha que eu sou? Acha que eu roubei o seu
pai dela? Foi isso o que ela disse?

— Amor...

— Não! — determino de cabeça erguida, ainda que meus olhos


estejam cobertos por lágrimas. — Meu filho, você acha do fundo do seu
coração que eu roubei o seu pai da sua mãe biológica?

— Ela disse que eles estavam namorando quando você apareceu...

Ah, não! Não! Deus, ela o envenenou! Ela conseguiu contaminar o


meu menino!

— Acontece, Cory que eu não sou um troféu — Mosés determina


num tom rígido e meio magoado. — Eu não tinha um relacionamento com a
sua mãe quando conheci a Ana e se estive perto dela durante um tempo foi
por sua causa, porque eu queria que você estivesse seguro e protegido e isso
nunca, nunca teve a ver com o que eu vivi com ela, sempre se tratou mais
de você.
— Ela disse...

— Pode acreditar nela, Cory, não há nada que possamos dizer ou


fazer para que não acredite, porque afinal de contas ela é a sua mãe! — digo
chorosa, mas ergo a cabeça enquanto o fito. — Eu já sei até o que ela deve
ter dito porque ela é ótima em tudo o que ela faz, menos em falar verdades.

Cory fica calado, os olhos começam a se encher de lágrimas e o


semblante dele se enche de tristeza, me dói ver, a última vez que o vi
chorando foi quando ele passou no vestibular, mas nada que lembrasse essa
dor estranha em seus olhos.

— Sua mãe é uma mentirosa compulsiva, ela tem problemas


mentais sérios e nós insistimos que não tivessem contato durante todo esse
tempo por conta disso, sua avó materna nos passou sua guarda integral
antes de falecer. — Mosés revela bastante sério. — Temos documentos,
laudos, tudo o que precisar para saber sobre ela.

— Eu e o seu pai nunca duvidamos da nossa decisão de ficar com


você e eu nunca viraria as costas para você só porque você decidiu que quer
conhecer a Viviane. Só que infelizmente a sua mãe é uma pessoal
mentalmente instável, ela inventa mentiras para se aproximar das pessoas e
acaba machucando todos que estão por perto para que ela consiga o que
quer. Não vou tentar te convencer de nada, acho que só o tempo dirá e
espero muito que você não tenha que passar por um terço das coisas que eu
e o seu pai passamos nas mãos da sua mãe para ter certeza de que ela é uma
pessoa perigosa.

— Me desculpe mamãe, eu só queria conhecer ela — Cory fala com


a voz coberta pelo choro.

— Então conheça, meu filho — Mosés reforça. —, mas não deixa


isso te afastar de nós, somos sua família, você é o nosso garoto e isso nunca
irá mudar, ok?
Ele faz que sim com a cabeça e depois se aproxima de nós dois
depressa, tão choroso, ele me abraça e isso me traz a recordação de quando
o segurei pela primeira vez no colo, de como quando ainda era tão pequeno
e frágil quase quebrável e aquela mulher ruim o colocou diante de um dos
momentos mais pavorosos de nossas vidas.

Agora Cory não é mais aquele pequenino desnutrido que chegou a


minha casa adormecido, ele é um homem feito mais alto que eu, com braços
cumpridos, barba e tão alto que quase ultrapassou o pai.

O aperto de volta e meu coração se conforta com isso, em minha


mente vem o consolo de que apesar de tudo ele é o meu menino, meu
potinho de amor, meu mais velho e que nada no mundo poderá mudar isso.

É outra coisa na vida que não pretendo deixar que Viviane me


roube.

Mesmo que ela tenha dito essas coisas para ele, ainda que ela o
tenha infectado com mentiras e invenções, não vou permitir que ela
machuque o meu menino do mesmo jeito que machucou minha cunhada
anos atrás.

Se ela estiver achando que isso vai acontecer, ela está absolutamente
enganada.
O MAIS VELHO

— Ela o contaminou.

Lanço um olhar rápido para o meu esposo e depois volto a fatiar as


tomates, daqui através do janelão da cozinha posso ver o Cory mexendo nas
carnes que já estão na churrasqueira enquanto as meninas colocam a mesa e
tiram fotos, Akim e Gustav estão de olho nas panelas em cima do fogão do
terraço.

— Já enviei mensagem para o tio Jack, ele me garantiu que já


colocou alguém para acompanhar os passos da Viviane — Mosés revela
para minha surpresa. — O tio Olaf arrumou alguém de confiança para
cuidar disso.

— Localizaram ela assim tão rápido? — estou espantada.

Mesmo se tratando do meu tio, ele é um obcecado por segurança,


ok, mas assim tão rápido?

— Eu enviei mensagem há dois dias, amor, não foi difícil para


acharem ela, está hospedada em um hotel do centro — meu esposo começa
a lavar algumas folhas de alface ao meu lado. — O tio Olaf disse que vai
nos atualizar, pedi sigilo em relação ao Tom.

Suspiro um tanto infeliz, queria tanto que isso não estivesse


acontecendo agora. Logo agora que eu e o Mosés estamos nos acertando,
que o nosso casamento vai começar a entrar nos eixos?

A verdade é que também me vem essa sensação de constatar que o


Cory nos omitiu isso justamente porque estava com medo de como a notícia
poderia nos impactar e ele tem razão, estamos na cidade há um dia apenas e
já tivemos uma briga com ele com direito a choro e berros.

Acho que ele teve medo de que o fato de estarmos separados fosse
ainda mais nos prejudicar em uma futura reconciliação, compreendo suas
motivações pensando por esse lado, mesmo que não justifique tanto as
omissões.

— Ela está sendo acompanhada por uma assistente social e fazendo


tratamento médico uma vez por semana num hospital comunitário da cidade
— Mosés vai colocando as folhas de alface dentro do escorredor do outro
lado da pia. — Ela sabe que não pode cometer nenhum deslize, qualquer
falha e terá que voltar para o hospital psiquiátrico.

— Você sabe porque soltaram ela?

— Ela cumpriu a pena dela por contravenção e ela pagou uma multa
generosa para o Estado, o advogado dela conseguiu convencer o juiz de que
ela não representa risco para ninguém então tiveram que liberar ela.

— Na cabeça dele isso funcionou, mas na cabeça de um juiz?

— Está zangada com o Cory?

— Ele me chamou de louca.

— A palavra proibida!

— Você está fazendo piadinha porque não foi com você.

— Amor, precisa deixar ele tomar todas as decisões dele sozinho...

— Até parece que você não paga um segurança para seguir ele no
campus, não é? Pegou todas as manias controladoras do papai e dos meus
tios.
Ele revira os olhos, mas merda! Estou tão magoada pela briga que
tive com meu filho por conta daquela naja, mesmo que eu saiba que
necessariamente ele não tem culpa, que ele deve ter sido induzido por ela a
acreditar em tudo o que ela disse.

Mosés pega o pano de pratos e desliga a torneira e seca as mãos


depois me abraça por trás colocando o queixo na curva do meu pescoço, ele
se encosta em mim e continuo a fatiar os tomates em pequenos
quadradinhos para o nosso almoço.

Ele apoia as mãos dos lados da minha cintura e me aperta beijando a


lateral do meu pescoço com carinho, com gentileza, fecho os olhos por um
segundo e absorvo as sensações de paz que percorrem o meu corpo.

Minha auto jornada sendo sabotada pelas minhas reações mais


naturais ao toque dele, aos seus beijos e a essa segurança que nunca deveria
ser mais suficiente do que a que eu sei que devo sentir sozinha.

Mas bem, não deve ser pecado reconhecer que tem uma fragilidade
como essa, de poder se reconfortar entre os braços do marido e admitir que
essa sensação te faz um bem danado, senti falta disso.

Porque faz com que eu me sinta forte e posturada diante dos meus
problemas, das coisas que eu vivencio e desafios diários que encaro por ser
um pouco de cada coisa, até mesmo quando sou um pouco mais mãe do que
devo ser.

— Eu não pensei que seria tão difícil também, mas você me disse
que deveríamos deixar que ele viva isso com ela — Mosés diz baixinho e
coloca outro beijinho atrás da minha orelha.

— Eu não achei que ele havia omitido isso de nós dois — confesso
e olho através da janela. — Ela deve ter dito tantas mentiras para o meu
menino, mas dessa vez não vou permitir que ela machuque ninguém da
nossa família.
— Ela não irá — ele garante num tom mais ameaçador. — Não
podemos deixar que o fato da Viviane estar solta nos afete nessa proporção,
mesmo que seja difícil.

— Sei disso — concordo. — É difícil pensar em não interferir


mesmo que isso seja necessário, eu sei que dar explicações será mil vezes
mais doloroso para ele.

— Sabe que em algum momento ele terá que saber a verdade, não
sabe?

— Eu sei, mas não tem que ser agora.

Muito menos agora.

— Me sinto responsável por tudo isso, afinal de contas eu a trouxe


para nossas vidas.

Me inclino para o lado e ergo a cabeça procurando seu olhar, meu


marido me fita com uma cara de tristeza de dar pena.

— Não é sua culpa, você não poderia saber que ela era problemática
— afirmo. — E se você não houvesse se envolvido com ela, nosso menino
não estaria aqui hoje conosco.

— Eu já disse que te amo hoje?

E sorri, meu coração fica quentinho e fico na pontinha dos pés para
alcançar seus lábios, dou-lhe um selinho leve e Mosés me aperta com mais
firmeza se esfregando na minha bunda, a arma dele está firme e parece bem
pronta.

— Toda essa tensão me deu uma vontade de trepar — diz ele com os
lábios colados nos meus. — Trepar até me cansar! Me prometeu uma
surpresa, cadê?
Isso me faz lembrar de algo importante.

— Você tempera o vinagrete e me espera lá fora com as crianças —


me desvencilho dos braços dele. — Leva o alface, tá?

— Para onde você vai? — ele me olha confuso enquanto vou me


afastando.

— Eu esqueci de estender as roupas, vai logo! Acho que já tem


carne pronta!

Me apresso e vou até a lavanderia, assim que entro fecho a porta e


tiro meu avental, vou até o canto atrás do armário e abro a caixa de papelão,
sorrio e pego meu presente entre os dedos, meu coração se enche tanto que
mal sei explicar.

Pego a caixa de presente dobrável que veio dentro dessa caixa e


abro com cuidado, coloco meu presente dentro da caixa e a fecho com
cuidado, sorrio e tomo cuidado ao colocar no balcão e colocar a faixa cor de
rosa grudada em cima.

Logo em seguida deixo o furinho na lateral da caixa aberto e então


destranco a porta da lavanderia mantendo a caixa debaixo do braço
desocupado, logo que abro vejo o meu marido encostado na parede do
corredor com os braços cruzados fazendo cara de quem comeu e não
gostou.

Faço cara de tédio, ele olha para a caixa de presente e depois para
mim todo curioso.

— Vamos lá para fora, quero dar esse presente para as crianças —


minto porque ele estragou minha surpresa.

— Comprou algo para eles? O que é? — Mosés faz cara de quem


comeu e não gostou. — Achei que era para mim, você disse que iria me dar
um presente hoje à tarde e um a noite.
— Nossa, como você é estraga prazer! — praguejo e me aproximo
então estendo a caixa pra ele. — Eu espero que te traga dias felizes.

Ele desfaz a carranca e olha para a caixa todo sério, logo em seguida
estende as mãos e a pega para si, ergue o peso e nega com a cabeça.

— Amor... não! — determina apreensivo. — Amor, sério?

— Abre! — sorrio enquanto vou caminhando para a cozinha.

— Sério? — ele vem atrás de mim e quando olho para trás, Mosés
está encostando a cabeça na lateral da caixinha. — Porra! Ana, para de
brincar com os meus sentimentos!

— Gente vocês estão demorando demais — Sophie está na cozinha


segurando um espetinho de linguiça vegetal. — O papai ganhou um
presente?

Mosés leva a caixa até a mesa da cozinha e logo em seguida respira


fundo, vejo nossos filhos entrando pela porta do terraço bem apressados, ele
respira fundo e me lança um olhar todo tenso.

— Abre! — ordeno com um sorriso.

— Aposto que é um carro novo — Cory insinua se encostando na


pedra de refeições com um sorriso no rosto. — Ou camisinhas!

— Aí, vira essa boca para lá! — Gustav faz uma careta.

— Será que eu estou pronto? — Mosés tira o laço e logo em seguida


puxa a tampa de cima da caixa.

Ele enfia a mão dentro da caixa e seu semblante muda quando toca o
que tem dentro, Laisa se aproxima toda curiosa enquanto Saara e Bea estão
bastante empolgadas, Akim se esgueira para frente para ver.
Então meu esposo a retira de dentro da caixa, seus olhos por alguns
instantes se fixam nela tão espantados e automaticamente cheios de amor
que me fazem querer chorar mais uma vez.

— Um cachorrinho! — exclama Sophie fazendo bico.

— Outro cachorro de mulher — meu esposo olha para ela e depois


para mim com os olhinhos brilhando.

— Na verdade é uma cadelinha, o nome dela é Nina, eu pedi a


Sêmora que buscasse ela do abrigo municipal — esclareço.

— Continua sendo de mulher — Mosés esclarece e seus olhos se


enchem de lágrimas. — O Meu Mike talvez ficasse com ciúmes dessa
cachorra de mulher.

Ah, meu amor!

— O Mike sabe que você não suporta viver sem apoio emocional
papai — Cory avisa enternecido.

Preenchi a papelada através do site hoje cedo, Sêmora pegou ela


para mim e a deixou comigo alguns minutos depois que eu cheguei, pedi
descrição, ela só veio me entregou na porta e foi embora, queria fazer essa
surpresa para o meu esposo, sei que ele amava profundamente o Mike, que
nenhum outro animal no mundo poderá substituí-lo, mas que para o nosso
recomeço queria dar um presente com grande significado para ele.

— Obrigado, Bê! — ele se aproxima segurando sua nova pet junto


ao peito e estende o braço me puxando para si. — Eu te amo minha linda,
eu te amo tanto! Obrigado pelo presente, ela é perfeita mesmo sendo um
cachorro de mulher.

Não gostaria que o Mosés chorasse, mas é algo que eu já esperava


porque tudo o que se trata do Mike o machuca muito.
— Eu também te amo, amor! — digo abraçando-o de volta. — A
Nina precisava de alguém que desse todo amor e carinho para ela, sei que
você tem de sobra.

— Gente, é só um cachorro! — Akim avisa com a voz trêmula.

— Cala essa boca — Beatrice ordena e se aproxima. — Vem cá


papai, me deixa te dar um abraço.

Sophie, Laisa, Cory, Gustav, Saara vem para se juntar ao nosso


abraço, Akim é o último porque está envergonhado, mas também porque
sabe que não importa se está se sentindo mais adulto ou independente, seu
pai precisa desse abraço.

É um momento de transição importante para o Mosés.

Nada mais justo que todos nós fiquemos ao seu lado assim como
estamos, abraçadinhos.

Como a família que sempre fomos e que sempre seremos.


AMOR PROFUNDO

Entro no nosso quarto.

Daqui posso ver o homem pelo qual me apaixonei desde o primeiro


momento parado perto da porta da sacada, ele está envolvido numa toalha
até a cintura e com outra toalha de rosto pendurada no ombro.

Tão diferente daquele jovem homem no qual esbarrei durante uma


corrida na rua, mas apenas ele.

Fecho a porta e passo a tranca, suspiro tentando esquecer por alguns


momentos do problema, da discussão que tive com o Cory, mas
sinceramente depois da discussão confesso que fiquei triste por mais que
com o decorrer do nosso churrasco nossos filhos tenham nos arrancado
algumas risadas e Nina tenha distraído um pouco a todos nós.

Sorrio, ainda assim eu fico feliz de poder ter retornado e que nosso
primeiro dia aqui tenha sido de alguma forma com nossos filhos, com a
certeza também de que na empresa as coisas vão se ajustar e que estamos
fazendo tudo do jeito que deve ser feito.

Me vi por momentos analisando o Cory, notei que ele parecia


arrependido por ter me magoado, acho que essa foi a primeira vez que
realmente tivemos uma discussão feia e séria, ele ficou perto de mim a todo
momento e me ajudando com tudo o que eu precisava, claro, é algo que ele
tem feito porque é grudado em mim desde muito pequeno.

Só que era como sempre é com ele e seus irmãos quando faz algo
errado, ele estava tentando uma reparação, algo que me fizesse sentir
melhor, alguma compensação por ter me chamado de louca, por ter mentido
para mim.
Isso se tornou tão pessoal de repente, porque doeu muito quando o
Mosés por diversas vezes durante discussões e brigas me chamava de louca,
por mais que em momentos eu soubesse que era só o jeito dele se expressar,
isso me atingiu em camadas diferentes e em sentidos diversos dentro de
mim.

Agora a pouco passei nos quartos deles, entendendo mais uma vez
suas individualidades, notando os seus rituais noturnos antes de dormir,
dizendo a mim mesma que agora sou mãe de seis adolescentes e um homem
adulto, tentando afastar dos pensamentos a sensação de que o Cory não é
meu de verdade por mais que ele tenha me feito sentir assim.

Ao passar em seu quarto o vi segurando um de seus livros de bolso,


ele estava descalço e usando um pijama de cor azul, os cabelos úmidos e
um olhar vívido que apesar de ter traços daquela mulher, nunca me fez vê-
lo de forma diferente se não como uma das pequenas partes de mim.

Desejei boa noite e dei um beijo na testa dele, ganhei um abraço


forte assim como ganho todas as noites desde que ele ainda era pequeno o
suficiente para não entender tantas coisas.

Então aqui estou eu pensando sobre como preparei uma surpresa


para o meu esposo e em dado momento sei que devo aproveitar, mas não
consigo parar de pensar no meu filho mais velho e esse novo velho
problema, Viviane.

As mãos grandes de Mosés tocam meus ombros e logo em seguida


começam a deslizar para meus braços devagar, fazem com que me sinta
mais uma vez atenta e especial, atenta porque os arrepios se perpetuam por
meu corpo, especial porque ele sempre faz quando me toca.

— Gostou do presente?

— Ela já mijou duas vezes no chão da sala, não gostei, amei!


Sorrio e me viro para ele erguendo os braços, passando-os em volta
de seu pescoço, ele me abraça enquanto suas mãos vão deslizando até as
minhas nádegas, seu corpo vem encostando no meu e vou sentindo o calor
meio úmido que emana dele.

Mosés tem essa coisa que eu nunca, nunca saberei explicar.

Ao menos sempre que estávamos em fases boas de nosso casamento


não importava o quanto meus dias fossem difíceis ou péssimos, sempre que
entrávamos nesse quarto ou em qualquer lugar que estivéssemos só nós
dois, automaticamente me sentia um pouco melhor, mais relaxada, mais
próxima de algo que eu nunca saberei explicar.

Acho que me esqueci de todos esses momentos, eles foram sendo


apagados da nossa convivência pela rotina. Não deverá ser mais assim, não
será.

— Achei que me esperaria para o banho — aviso e meus dedos


tocam seus ombros devagar.

Vou comtemplando esses novos músculos, algo que lembra como


ele era mais jovem, mas que também faz com que seja ao mesmo tempo
diferente, quando nos conhecemos ele tinha um corpo malhado, porém era
mais magro, agora está mais gordo e forte.

— Eu tive que levar a Nina para a caixa dela, fiquei lembrando do


Mike e depois não consegui resistir, precisei de um banho para espantar a
tristeza. — ele responde me fitando um pouco mais sério. — Tudo bem
entre você e o Cory?

— Acho que sim, ainda meio balançada com tudo — respondo. —


Eu acho que agora não quero falar sobre isso, preciso te dar a minha
segunda surpresa.

Um sorriso maroto e pequeno brota no canto de seus lábios, as mãos


dele apertam as minhas nádegas com força e isso faz com que meu corpo
suba para cima me esfregando nele toda, ainda que por cima desse bocado
de roupas que estou usando posso sentir tudo.

— Vai para a cama! — ordeno num tom um pouco baixo.

Me sinto até meio incapaz de aumentar meu tom de voz, ele me


apertando assim, se esfregando assim no meu corpo...

Mosés olha para a minha boca e depois me solta então começa a


andar para trás indo para o rumo da nossa cama em silêncio, bem tranquilo,
mesmo que eu saiba que esse olhar não tem nada de quieto ou algo do tipo.

Sei que ele está se controlando ao máximo, é bom nisso.

— Agora deita na cama! — continuo a ordenar e me movo.

Meus passos são lentos enquanto ele vai se esticando para trás e se
deitando na cama, tão gostoso envolvido nessa toalha de banho, tão lindo e
todo molhado só para mim. Mantenho contato visual, bem, isso é algo do
qual tentei planejar sozinha e com cuidado, mas com o passar do tempo eu
me acostumei muito com o fato de ter acessibilidade a um bocado de coisa.

Ele se estica na cama e se encosta nos travesseiros ocupa boa parte


da cama, vou até o closet escondendo meu sorriso de satisfação em vê-lo
me obedecer assim, Mosés se acostumou a ser meio que Alfa nesse sentido
no nosso relacionamento, ainda que algumas vezes me deixe no comando
ele é muito bom em ser meio controlador.

Pego a caixa que deixei escondida aqui há alguns momentos e volto


para o nosso quarto tomando cuidado com tudo, levo a caixa até a nossa
cama e coloco perto dos pés dele, começo a abrir a caixa mantendo contato
visual.

— Vamos ver o que temos aqui... — começo e pego a alcinha do


balde, então o retiro da caixa exibindo-o como troféu. — Opa, cachaça!
Mosés sorri do nada e nega com a cabeça, coloco o balde com gelo,
duas taças e um champanhe em cima da cama e depois pego a bomboniere
exibindo-a com morangos bem fresquinhos.

— Ora quem diria? Morangos! — falo com surpresa exagerada.

— Você não está fazendo isso, é sério! — exclama e seus olhos


aderem a um brilho intenso e cheio de significativo.

— Espere que ainda não acabei!

Enfio a mão na caixa e pego a sacola preta de cetim, então coloco a


caixa no chão e os morangos em cima da cama ao lado do balde, enfio a
mão no saco e depois que pego um punhado de pétalas de flores começo a
jogar nos cantos da cama, Mosés dá uma risada alta e cheia de felicidade,
isso é algo que faz tão bem para mim.

Jogo mais um punhado de pétalas de flores em cima dele e despejo


todo o resto perto de seus pés, toda a cama fica coberta de pétalas de cor
vermelha, ele também, por todas as partes de seu corpo.

— Agora você tira essa toalha — digo e minha boca começa a se


encher enquanto ele começa a abrir a toalha. — Quero você com morangos
e pétalas de flores.

Vejo meu esposo se erguer e tirar a toalha do corpo, então sacode o


tecido e joga para longe, apanho a garrafa de champanhe e estendo para ele.
O vejo se sentar na cama e pegar a garrafa então começar a abrir o lacre,
enquanto ele faz isso vou até o banheiro.

Ele sabe que preciso de um momento rápido para higiene.

Tiro a roupa com um pouquinho de pressa porque acreditava mesmo


que ele fosse me esperar para tomarmos banho juntos, quando Mosés subiu
eu estava lavando os pratos, ele veio com as meninas para ajudá-las com
algumas questões referentes a algo que elas precisavam, acho que das aulas
de línguas ou coisa assim.

Daqui a dois anos elas irão para a universidade também, então


parecem bem engajadas em causas para que possam ter bom ingresso em
universidades boas.

Entro no box e inicio meu ritual de banho ligeiro, me lavo bem com
sabonete líquido e passo meu óleo de banho predileto, depois lavo bem as
partes e o rosto, então saio do box pegando a minha toalha de banho.

Enquanto me seco abro o armário do banheiro e pego a lingerie que


reservei para hoje, eu pretendia fazer isso com calma, mas depois que
passamos toda a tarde no terraço com as crianças o tempo passou
relativamente rápido então não tive tempo.

Passo um hidratante rápido no corpo e coloco o conjunto de lingerie,


solto meus cabelos e depois que me olho no espelho sorrio para mim
mesma. Saio do banheiro engolindo um pouco da minha empolgação em
usar uma lingerie preta depois de tanto tempo.

Escolhi essa porque a calcinha é fio dental, o sutiã é transparente e


composto por alguns detalhes de bordados em formato de flores, tem meias
pretas também o que eu acho um charme, mas porque pela primeira vez em
meses me senti bem em abrir minha gaveta de lingeries, escolher uma na
qual eu me sentisse bem e usar para mim, para ele também é claro.

Entro no nosso quarto enquanto abotoo as ligas nas meias na parte


frontal, caminho com naturalidade até a porta da sacada ouvindo o som da
rolha estourando pelo quarto, sendo jogada para longe.

Me dá vontade de rir porque por mais que eu não esteja olhando


para ele, tenho absoluta certeza das reações dele em relação a me ver
usando uma lingerie assim, sinto o calor do olhar dele me queimando
mesmo que esteja de costas fechando a porta da sacada.
Esse lado nosso adormeceu por tanto tempo, mas agora eu não
consigo sentir tanta vergonha, nem medo, sei o que decidi e não quero e
nem voltarei atrás no que escolhi para minha vida e meu casamento.

De toda forma merecemos isso.

— Acho que temos que rever algumas coisas sobre o nosso


casamento, sem sombra de dúvidas uma delas é que temos que estabelecer
limites — começo escolhendo bem as palavras enquanto fecho as cortinas.
— Não acha?

— Concordo plenamente! — Mosés responde.

Me viro e observo-o em pé ao meu lado me estendendo a taça de


champanhe, o corpo cheio de pétalas vermelhas grudadas ao mesmo tempo
tento não olhar para o pênis dele, isso faz com que a minha boca se encha
de água.

— Obrigada — digo e aceito a taça, então a ergo na direção dele. —


A você!

— A mim mesmo, eu mereço! — diz ele batendo com a taça na


minha em um brinde rápido.

Sorrio, sei que não é modéstia.

Provo do champanhe, é docinho e refrescante, Mosés também prova


e logo em seguida estende a mão na minha direção, recuo um passo
evitando o toque e indico a cama com a cabeça.

— Deita lá — ordeno mais uma vez. — Eu quem estou dando a


surpresa.

— Devo dizer, “sim senhora”?

— É um bom termo.
Depois ele se afasta e sobe na cama então se senta onde estava
antes, depois que fecho a cortina me aproximo da cama segurando a taça,
ele fica me olhando de cima abaixo em silêncio, bebendo mais dois goles de
champanhe.

Pego a bomboniere com os morangos e estendo para ele, Mosés


escolhe um e leva até a boca, olho para o abdome definido e logo em
seguida despejo os morangos sob ele, enquanto os morangos caem em cima
de seu corpo nu, Mosés suspira surpreso.

Jogo alguns em seu peito e outros sob seu pau firme e outros até
perto de suas pernas, quando termino me sinto satisfeita, a cena é um pouco
excitante não sei porque. Me sento no canto da cama e observo com
cuidado de cima abaixo.

— Minha proposta se resume em transarmos o máximo de tempo


possível — digo toda ereta. — Quero que você seja o meu escravo sexual
hoje à noite.

— Bem mais que justo, mas que tal se você também for minha
escrava sexual quando eu quiser?

— Eu gosto disso.

Pego um morando perto o joelho dele e levo até meus lábios então
mordo e enquanto mastigo bebo mais um gole do champanhe, a mistura
completa e deliciosa. Observá-lo absolutamente nu, ver cada pequeno
detalhe de seu corpo só para mim é tão bom.

Me sobe um calor pelo corpo até minhas bochechas.

Subo na cama e fico de joelhos perto dos pés dele, depois engatinho
sob os joelhos até ele pouco me importando se amasso ou não os morangos
jogados na cama, me inclino e abocanho um morango em sua virilha,
quando apanho com a língua chupo o local como se chupasse uma fruta e
então me ergo mastigando o morango, vendo seu pênis saltar de repente.
Mosés mastiga o morango e pega a garrafa de champanhe em cima
da mesinha de cabeceira então enche sua taça mais uma vez, ele estende a
garrafa para mim enquanto mastigo meu morango e deixo que encha minha
taça também.

Bebo mais um gole modesto do champanhe e escolho outro


morango pousado em seu corpo, esse está sob seu abdome um pouco acima
de seu umbigo, Mosés não se move, mas sua respiração parece um pouco
alterada.

Me inclino mais uma vez e abocanho esse canto sugando a pele, ele
suspira mais uma vez profundamente enquanto me ergo e mastigo o
morango, isso começa a se tornar um jogo excitante.

Ele pega um morango e inesperadamente estende e enfia dentro da


parte frontal da minha calcinha, me mantenho de joelhos prendendo a
vontade de rir com o jeito cínico no qual seu olhar me é direcionado.

— O que foi? Eu também quero brincar!

— Quer é? — indago irônica.

— Quero! — responde determinado.

Sorrio e bebo toda a minha taça de champanhe, Mosés sorri e bebe


toda a taça dele também, colocamos as taças sob a mesinha de cabeceira e
me inclino abocanhando um morango que repousa em seu peito, chupo e
mastigo o morango, apoio as mãos no colchão e abro as pernas subindo em
cima dele.

Mosés toca minhas coxas e isso me atiça, depois subo mais um


pouco e me sento em seu abdome exibindo o morango preso dentro da
minha calcinha, ele estende a mão e puxa a calcinha para o lado fazendo
com que o morango caia em seu peito depois observa minha vagina
parecendo todo hipnotizado.
Ele se inclina e faz menção de me beijar lá, então me inclino para
trás e fico sentada sob sua firmeza. Ele faz cara feia e logo em seguida sinto
o estalo alto da mão dele na minha nádega, vou com o corpo para frente
com a dor da palmada, mas enquanto a minha pele queima com isso, me
sinto um pouco mais excitada.

Sorrio enquanto meus quadris se movem com naturalidade no vai e


vem gostoso, sentindo que a minha carne vai se esfregando na ele de um
jeito sensual e causando ainda mais tensão entre nós dois.

Me estico e recolho o celular dele em cima da mesa de cabeceira,


ele se ergue e me segura pelas nádegas me puxando firme contra seu corpo,
a pegada faz meu corpo pular em contato com o dele, ele se inclina e
começa a espalhar beijinhos quentes no meu pescoço.

Conecto o celular na caixinha integrada que temos na bancada da tv


e logo em seguida seleciono uma música de sua lista de reprodução, a
música tem um volume meio alto e é daquelas bem sensuais.

Acho que um dos benefícios que temos é de ter o conforto de termos


quartos a prova de som, mesmo que eu saiba que as crianças sabem muito
bem quando não devem vir até aqui, somos discretos nesse sentido desde
sempre, mas quando eles eram pequenos era meio complicado pensar em
transar em alguns dias porque eles simplesmente entravam dentro do nosso
quarto quando tinha medo de algo ou estavam doentes.

Jogo o celular dele num canto e toco seus ombros, então o empurro
com força contra a cama e vejo as pétalas irem para todos os lados, Mosés
ergue a mão e saca um tapa forte na minha cara, aguento a ardência e agarro
o polegar dele com a boca sugando o dedo com vontade.

Me esfrego nele mais uma vez e me ergo, pego um morango, então


coloco sob seu peito e aperto a fruta fazendo com que se despedace toda,
logo em seguida começo a lamber o local capturando os pedaços com a
língua.
— Amor, isso é tortura! — ele geme num tom baixinho e suas mãos
apertam meus quadris.

— Humm... — solto e termino de lamber todo o morango, então me


ergo ainda me esfregando, estou ficando úmida a cada segundo por debaixo
do tecido da calcinha.

Mosés estende a mão e enfia na parte da frente da minha calcinha


então a puxa para o lado me tocando com dois dedos devagar, arfo
adorando o toque, me ergo mastigando o resto do morango e me apoio nos
joelhos levantando os quadris.

Ele espalha toda a minha umidade e segura o pau com a outra mão,
então se toca enquanto os dedos fazem gestos lentos e circulares em minha
vagina, com cuidado se introduz até mim e enquanto desço com os quadris
me penetra vagarosamente.

O vejo virar a cabeça para o lado e abocanhar um morango jogado


na cama e depois ficar com ele preso entre os dentes, me inclino mexendo
os quadris para ele e fazendo com que entre completamente em mim.

Mordo o morango entre seus lábios e ele me beija, dividimos um


morango, com línguas ávidas e molhadas, algo doce e excitante, me ergo
recuando e vindo de novo para ele com força, ele vem comigo metendo tão
fundo que faz meus seios pularem, estou toda ouriçada.

Os olhos azuis estão nos meus enquanto nos movemos feito dois
bichos selvagens num ritmo intenso, roubo-lhe outro beijo forte, explorando
toda sua boca, sua língua a minha, ele toca meus tornozelos e os puxa, ergo
as pernas apoiando os pés na cama e afasto as pernas ficando arreganhada
para ele, me movendo num cavalgue rápido com ele, sentindo o toque de
seus polegares pressionando minhas virilhas com força.

Me ergo e me seguro nos joelhos aguentando as metidas intensas,


ouvindo o som de uma música lenta que me faz ficar ainda mais molhada
para ele, ergo a cabeça ouvindo os estalos do nosso sexo e isso me faz
sorrir, me aproximo de um pequeno orgasmo, ele para e me deixa me mover
fazendo com que eu libere o orgasmo rapidinho, enquanto me esfrego toda
nele até o talo, levo outro tapa bem servido na cara, isso me faz estremecer
toda.

Dos pés à cabeça, me faz arrepiar e tremer, me excita tanto que


preciso de alguns segundos para me recuperar.

— Tudo bem? — Mosés pergunta se erguendo.

Ergo o pé e apoio em seu peito ainda um pouco trêmula, empurro-o


e ele cai deitado no colchão mais uma vez, volto a me mover então ele vem
comigo tocando a parte interna das minhas coxas, me arreganhando mais
para que me veja completamente.

Não consigo ter insegurança nesse momento, nem medo ou


vergonha, como se de alguma forma as barreiras fossem se rompendo e
tudo me mostrando que essa é a forma que eu quero que ele me veja.

Sou desejada por ele, sou desejada demais!

Apoio o pé na cama e me ajeito começando a girar em cima dele,


ouço o som de um gemido alto abafado por um de nossos travesseiros e isso
me faz rir, me apoio nos joelhos me ajeitando de costas para ele e me
seguro em suas coxas me movendo nele.

Olho para trás enquanto mantenho meu cavalgue acelerado, ele está
suado, olhando para minha bunda, as veias saltando de seu pescoço
enquanto as mãos seguram as ligas da lingerie e as puxa.

Me viro para frente e sento várias vezes metendo em longas


estocadas, rebolando para ele, ouvindo o som dos gemidos dele, mas
também o som da minha voz cheia de calor cantarolando a música enquanto
meto com ele assim.
Meu coração está acelerado, as veias do meu corpo bombeiam um
sangue tão quente que me faz suar ainda mais, nego com a cabeça adorando
recebê-lo dentro de mim, adorando o prazer insuportável que isso causa em
mim, no meu íntimo.

Me apoio nos joelhos e movo apenas os quadris no vai e vem ligeiro


enquanto as mãos dele seguram os lados das minhas nádegas e as afasta me
observando, me arrepio toda mais uma vez e sinto uma pontada intensa na
minha virilha vindo pela minha pélvis feito um raio e alcançando minha
vagina em cheio.

Suporto o orgasmo mais intenso que o primeiro, minha carne


engolindo-o com quentura, fazendo com que eu vibre toda e meu clítoris
sensível pule também, sinto meu latejar forte e solto um gemido mais alto.

Olho para trás e noto o olhar fixo em mim, na minha bunda,


cobiçando-a a cada segundo e desejo que continue olhando um pouco mais,
quero que veja muito mais, me sinto uma louca enquanto observo também
meu movimento rápido sob ele, enquanto estou deslizando rapidamente.

Mosés estende a mão e pega a garrafa de champanhe em cima da


mesinha de cabeceira, logo, leva até os lábios e toma um modesto gole da
bebida, isso é tão excitante, é algo do qual nunca o vi fazendo assim tão
explicitamente para mim.

Ele me dá outro tapa forte na bunda e toca minha coxa me puxando,


me ergo arfante, minha virilha queima um bocado com a excitação da
penetração enquanto me viro na cama ele me observa me virando para ele
com prazer, enfia a mão debaixo do travesseiro e retira de lá um colar de
brilhantes bastante chamativo.

Me sento em suas coxas realmente impressionada com o tamanho da


pedraria, com todo o glamour da joia brilhante, ainda estou um pouco
trêmula, ele me entrega a garrafa de champanhe e depois segura o colar
pelas pontas exibindo-o com cuidado, sorrio bastante surpresa.
Ele estende uma das mãos e toca meu pescoço já sentado, depois
puxa meus cabelos para o lado e emoldura o colar no meu pescoço, eu o
beijo nesse momento toda excitada, mas também lisonjeada com o presente.

Enquanto nos beijamos ele coloca o colar no meu pescoço, sinto o


peso frio das pedrinhas descendo até a altura do meu colo, são pequenos
brilhantes arredondados com base e logo nas pontas em formatos de gotas.

Compartilhamos o gosto do champanhe vagarosamente enquanto as


mãos dele tocam meus ombros como se me comtemplasse, de uma forma
que ele não fazia há tanto tempo que havia me esquecido.

Ele toca meus braços logo em seguida e depois minhas costas até
alcançar minhas nádegas, ele me ergue e eu o capturo com a mão livre,
conduzo seu pênis mais uma vez para mim e enquanto ele entra novamente
solto um gemido entre nossos beijos.

Mosés deixa meus lábios e começa a traçar beijos por todo meu
pescoço, meus quadris se movem e ergo a cabeça lhe dando acesso ao meu
colo, aos meus seios, ele os mordisca por cima do tecido transparente
deixando os mamilos ouriçados. Sorrio e ergo a garrafa levando-a até meus
lábios, bebo dois goles modestos do champanhe serpenteando sobre ele, sua
boca dando leves mordiscas abaixo dos meus seios enquanto ele os aperta
com força espremendo-os sob o tecido transparente do sutiã.

Abro as pernas de forma primitiva enquanto ele vem me invadindo


com mais força, me seguro em seu ombro cravando as unhas em sua pele,
Mosés me segura pelos quadris e gira na cama colocando as pernas para
fora da cama, ele segura um punhado dos meus cabelos e vem se movendo
comigo de forma bruta.

Olho nos olhos e toda nossa conexão faz muito mais sentido, isso
desperta em nós dois um lado oculto de nosso casamento ou que em algum
momento do passado nós não soubemos como desenvolver.

Como um predador insano que adora uma boa caçada.


Como um animal prestes a cair em uma armadilha e se deleitar com
o prazer de acabar com a agonia do outro.

Ele me dá um tapa forte na face e não recuo, continuo a me mover


com ele bem rápido, minhas pernas se fechando em volta dele com força,
meus quadris subindo e descendo com o impacto das metidas dele, meus
seios trepidando e desejando um pouco mais.

Somos ótimos juntos, merda! Por que cheguei a pensar por uma
fração de segundos que poderia ser diferente?

Ele abre a boca e ergo a garrafa despejando champanhe na boca


dele, pego um morango na cama e coloco na boca então o beijo misturando
nossos gostos, sabores, ele solta um gemido e depois se afasta vindo com
mais força, franzo a testa enquanto engulo o morango e solto um grito alto.

— Me fode, por favor, me fode, Moshe!

Seu semblante continua impiedoso, apoio os pés na cama ainda que


estejam ardendo, minha sensibilidade ao extremo, subindo e descendo sob o
membro duro, ele tão suado quanto eu, arfante, os olhos contidos ansiando
pelo alívio do gozo.

Mas ao mesmo tempo querendo que se perpetue.

Os olhos azuis se fecham e ele me segura com força, me sinto


invadida por essa sensação extrema enquanto meu clítoris salta de forma
estranha, irritada, meu corpo todo se joga contra o dele enquanto encontra
um frenesi chocante. Fazendo arrepios de dor e prazer se espalhar por
minha intimidade, me fazendo tremer e soltar um grito agudo alto.

— Isso, isso! — ele geme alto enquanto vai liberando o gozo forte
comigo. — Muito bem, querida!

Recebo mais um tapa forte na cara e adoro isso, sorrio esguichando


nele, liberando um orgasmo poderoso, me tremendo tanto que sinto que
posso cair a qualquer momento no chão.

Minhas coxas tremendo enquanto meus pés queimam, meus seios


latejando dentro da lingerie, minha vagina trêmula e encharcada desse
poder quente que sai de mim, sinto que devo expulsá-lo e quando o faço
novamente vejo todo o céu repleto de estrelas diante de meus olhos.

Ah, é isso!

Nosso recomeço não poderia ser mais delicioso.

Mosés com champanhe, morangos e prazer, muito prazer.


DESPERTAR

Desperto.

As mãos grandes estão me tocando as costas, elas estão me


chamando mais uma vez, me convidando na verdade.

Levo alguns segundos até me recuperar do pequeno intervalo de


sono ao mesmo tempo sinto um estalinho quente vindo de um beijo suave
que ele me dá no ombro.

Mosés Handerson sabe muito bem o que faz.

Meus lábios se abrem e procuro os dele, um corpo quente se


esfregando no meu, um pênis firme tomando forma se esfregando na minha
bunda enquanto suas pernas se enfiam nas minhas de um jeito tão tentador
que me faz soltar um suspiro baixo.

Nosso beijo se torna mais profundo conforme me viro para seu


corpo e o abraço abrindo as pernas e sentindo a firmeza escorregar para o
meio das minhas coxas devagar, a mão dele toca meu pescoço e ele o aperta
suavemente enquanto sua língua percorre toda a minha boca devagar.

Adoro isso, que saudade disso!

Estendo a mão e toco a bunda dele, aperto a firmeza musculosa e sei


que preciso de um pouco mais de exploração de seu corpo, de todos esses
músculos, de cada pequeno detalhe dele.

Deixo seus lábios e começo a beijar seu pescoço, depois seu peito
ele ergue os braços e se deita de costas deixando que eu o comtemple
enquanto minha boca alcança seu abdome, com a língua desço até seu
monte de púbis, ele geme baixinho e sei que adora isso.

Eu o seguro e começo a masturbá-lo enquanto espalho beijos por


sua virilha, olhos afiados num tom azul mais escuro me analisam bastante
concentrados, abro a boca o conduzo para mim então começo a chupá-lo
devagar.

Faço um bom trabalho com a boca, protejo os dentes enquanto sinto


a textura lisinha e dura feito rocha me excito um bocado com o jeito no qual
ele parece viril, sensual, como se nenhum tabu pudesse nos limitar nesse
momento ou em qualquer outro de nossa intimidade.

Com ele sempre fui capaz de tudo, mesmo que em algum momento
isso tenha se perdido em algum sentido.

Ele se apetece de ser chupado, gosta bastante, relaxado, só curtindo


o boquete que tanto dá prazer para ele.

Enfio tudo na boca e engulo forçando um pouco mais, ele se encolhe


afundando os quadris na cama e prende o ar enquanto pratico um pouco
mais dos meus limites, testando-os, sentindo que isso incomoda um bocado,
mas adorando cada segundo mais uma vez.

Sua mão se enfia nos meus cabelos e ele os puxa para cima fazendo
com que me erga, deixo-o todo babado e ao mesmo tempo me inclino para
lamber e sou impedida pela mão impiedosa, o puxão nos meus cabelos diz
claramente que ele não quer isso.

— Tem algo que quero que use para mim — ele diz baixinho e se
ergue puxando meus cabelos com mais força. — Vai usar!

— Sim.

Ele me puxa para cima e sei que devo subir e me sentar sob suas
coxas, Mosés estica o braço e abre a segunda gaveta da cabeceira então
retira uma caixa de lá, não muito grande, um pouco menor que uma caixa
de sapato.

— Tire o sutiã e a calcinha.

— Tão sério meu Momozinho! — faço bico enquanto abro o fecho


do sutiã.

Noto um ar de humor em seu olhar, mesmo que tente me ignorar.

Puxo as alças do sutiã e libero meus seios, junto as pernas e as ergo


para cima puxando a calcinha e retirando-a de meu corpo logo em seguida.
Mosés abre a caixa e retira dela uma peça de brilhantes com pedraria muito
bonita.

Quando ele a ergue mostrando do que se trata fico boquiaberta,


porém ele se senta e sei que devo ficar em pé na cama, fico um pouco
nervosa porque não entendo bem a didática, nunca usei uma dessas peças de
body de brilhante.

Na verdade, eu já vi em alguns desfiles de moda e filmes, mas nada


de tão perto.

Enfio as pernas e ele me ajuda a colocar os braços, depois me


ajoelho de costas para ele, Mosés abotoa com cuidado o colete nas minhas
costas, arrumo as correntes de brilhantes nas partes dos seios e logo em
seguida na parte das virilhas, não consigo parar de sorrir ao ver toda a
beleza disso tudo.

O body tem um toda uma pedraria em formato de colares na parte


dos seios e busto, descendo até a barriga, mas na parte de baixo é
basicamente sem nada, como um maiô sem tapão na frente ou atrás, só que
tão lindo.

É a primeira vez na minha existência que estou coberta de brilhantes


por todo o corpo.
O mais interessante é que quando ele termina de abotoar, me segura
pelos quadris e faz com que eu me vire para ele, então logo em seguida,
arruma o colar no meu pescoço puxando algumas pontas e prendendo na
parte frontal do body, incorporando o colar nele também.

— Perfeita!

E me contempla de cima abaixo vagarosamente.

Ele toca meus seios por cima da pedraria e me faz sentir um arrepio
intenso por todo o meu corpo.

Me inclino subindo nele novamente e Mosés me beija intensamente,


meu corpo todo vibra novamente com o beijo, as mãos tocam minhas coxas
livremente, me sinto mais uma vez como se estivesse com esse homem que
escondeu um lado bastante interessante de mim.

Um estranho que deseja escalar todos os degraus de prazer comigo


sem hesitar.

Ergo os quadris e me apoio nos joelhos dando as costas para ele


novamente, me inclino para frente e me apoio nos cotovelos mostrando a
minha bunda completamente aberta para ele, ele dá dois tapas fortes nas
minhas nádegas e faz com que eu me encolha toda com a dor que provoca
no local.

Excitada solto um gemido, observo os fios de brilhantes que se


estendem nas laterais das minhas nádegas pressionando a pele, como o
recorte de uma calcinha apertada, logo em seguida ele puxa a minha bunda
para baixo e se introduz para ela devagar.

Sinto um despertar diferente para nós dois agora, algo tão poderoso
que ainda não sei como explicar.

Relaxo os joelhos enquanto minhas pernas se abrem para que ele me


penetre assim, suas mãos apertam minhas ancas por cima da pedraria de
brilhantes e enquanto o observo concentrado abaixo os quadris relaxando
um pouco mais.

Ele vai entrando com o pau na minha bunda vagarosamente, aperto


os lábios com força e fico por alguns momentos me acostumando com a
penetração, movendo a bunda para ele, permitindo que a vergonha esteja
bem longe de nós nesse momento.

— A senhora só melhora com o tempo.

— O senhor também!

Ele se inclina e coloca um beijo no meio das minhas costas, então dá


outro tapa bem servido na minha nádega direita, recuo soltando um gritinho
baixo, logo começo a me mover me erguendo, me apoiando nas mãos
enquanto exploro a intimidade sem muita pressa.

Sou puxada pelo tronco e aguento o tranco da metida forte,


estremeço relaxando por completo no pau firme, o pênis enfiado
completamente em mim, latejo um pouco enquanto me inclino pra trás me
deitando sob seu corpo, abrindo as pernas e apoiando os pés na cama.

Recebo um beijo no cantinho atrás da orelha enquanto ele invade


mais uma vez esse canto secreto do meu corpo sem pudor, subo e desço
com ele acompanhando seu ritmo, adorando cada segundo dessa aventura
excitante.

Um fogo ínfimo ressurge dentro de mim, roçando conforme nossos


corpos se encontram, um pecado óbvio e prazeroso, uma luxuria que esteve
fora do nosso casamento por anos e que retorna ainda mais forte.

Começo a suar um pouco mais, ele também.

A mão grande espalma minha boceta e começa a me masturbar, a


outra toca meu seio por baixo da pedraria de brilhantes, olho para o teto do
nosso quarto e sou tomada por ondas mais palpáveis de prazer anal.
— Você mete tão bem! — sussurro fascinada com essas novas
pontas de prazer. — Por favor, me penetre na boceta, enfie seus dedos em
mim do jeito que quiser!

Ele esfrega os dedos em toda a minha boceta com força e depois


enfia dois dedos dentro de mim me invadindo sem pudor, me comendo a
bunda com firmeza sólida, meu corpo vibra com a sensação e encontro um
rápido orgasmo vaginal.

Estremeço entre seus dedos, no entanto, ele não para.

Me ergo porque quero ver isso, meu clítoris vibrando enquanto


minha carne salta entre seus dedos molhados, por mim, por minha quentura
e umidade, mas ele vem com mais intensidade me penetrando na bunda
também e isso faz com que eu experimente um orgasmo anal incrível.

— Aí amor! — grito involuntariamente. — Isso, por favor, por


favor, quero tudo!

Fico parada ouvindo o som do nosso sexo, os estalos altos dele


metendo bem fundo na minha bunda, de seu polegar acariciando meu
clítoris depressa e seus dedos entrando e saindo de dentro de mim.

Nunca foi assim, não tão excitante.

Fico perdida por alguns momentos ouvindo os sons altos dos nossos
gritos em meio a melodia baixa de uma música romântica, ouvindo as
metidas intensas transmitindo prazer para todo o meu ser de forma diferente
e una.

Sou puxada para trás e ele me agarra com um braço enquanto força
um pouco mais na minha bunda, tento me libertar suportando o orgasmo
brutal, então começo a chorar porque mal consigo controlar esses impulsos,
ele não para! Ele não hesita!

Ele quer tudo e um pouco mais.


— Por favor, por favor! — suplico em um choro baixo de prazer e
soluço.

Não o vejo cessar ou parar, me encolho mais uma vez e meu corpo
trepida com a intensidade de outro orgasmo, o vejo sorrir de um jeito
leviano e meter mais fundo impiedosamente, o recebo agoniada pelo prazer,
mais sensível e molhada que nunca.

Seus dedos fazem um trabalho maravilhoso, mas não há tempo para


que eu pense, todas as faíscas que me incendeiam explodem um mar de
estrelas diante dos meus olhos, como ondas cintilantes e brilhantes de cores
que me vazem soltar outro grito. Assim, ele me acompanha mais uma vez,
me fazendo gozar entre seus dedos, enfiada até o talo nele.

— Porra, meu amor! — geme ele e goza com força dentro de mim.

E goza mais uma vez com mais vigor, suado, deslizo sob ele
suportando mais uma metida severa, sentindo a rajada forte que me faz
soltar mais um grito banhada de prazer, meu corpo totalmente sensível e
entregue.

Entregue a Mosés e as estrelas.


SÓ VOCÊ

— Gostou do presente?

— É perfeito.

Coloco um beijo no peito dele e o fito, Mosés estende a mão e toca a


pontinha do meu nariz com o indicador, acho que estou incomodando-o
com toda essa pedraria em cima de seu corpo.

Me ergo me apoiando nos joelhos e depois me sento em seu abdome


observando as marquinhas vermelhas que meu novo traje causou na pele
dele, fico um pouco horrorizada, ele toca as minhas coxas como se fosse
algo irrelevante.

— Você ficou tão linda com esse pequeno mimo, meu amor. — ele
diz baixinho me observando de cima abaixo com um sorriso.

— Acho que te machuquei isso sim — toco seu peito e seu abdome.
— Olha.

— Não está doendo — Mosés se ergue e fica sentado enquanto toca


as minhas nádegas devagar. — Amei as surpresas.

— E quem disse que acabou? — ergo as sobrancelhas e toco seus


ombros.

— Você acha que eu aguento outra dessas? — ele olha pra os meus
seios. — Se bem que uma espanhola cairia muito bem para finalizar a noite.

Acho graça, ele segura um punhado de cabelos meus e os cheia de


um jeito tão intenso que faz com que eu fique ligeiramente constrangida.
Por alguns instantes é como se eu visse meu marido voltando a ser
quem ele sempre foi comigo, deixando esse outro lado dele guardado para
outros momentos mais picantes, gosto muito disso.

Só que estou curiosa.

— Onde conseguiu essa peça?

— Eu encomendei na grife da Safi.

Estou realmente chocada com a resposta, ele me lança um olhar


mansinho e meio constrangido também.

— Ela mesma quem desenhou para você, eu encomendei antes de


viajarmos, tinha esperanças de que pudesse levar na viagem, porém não deu
tempo dela terminar, Cory trouxe para mim há dois dias.

Safira tem uma grife com marca inclusiva de roupas de alta-costura,


ela faz designs sob encomenda para pessoas portadoras de deficiência e
influentes no mundo da moda, inclusive já usei muitos vestidos durante as
celebrações da família que ela mesma fez, mas segundo ela ainda é um
hobbie já que com o passar dos anos as crianças e o Tom viraram também
sua prioridade.

Queria ter hobbies que me rendessem cinquenta mil dependendo da


peça.

— Ela disse que teve que pagar a dez pessoas para montarem, mas
que ela mesma também levou horas a fio para terminar. — ele explica
tranquilo.

— Amei as pedrinhas, são lindas.

— São diamantes.
Engulo a seco, ele me dá um beijinho como se fosse a coisa mais
normal do mundo e depois me abraça tranquilamente, fico por alguns
instantes absorvendo toda essa informação, é claro que é uma peça meio
pesada, mas eu nunca poderia imaginar que isso tudo aqui são pedras de
diamante.

Não um body de diamantes!

— Te amo tanto — ele fala baixinho e toca minha nuca fazendo


carinho. — Te amo, meu amor, nossa eu amei a surpresa!

Acabo por me ver sorrindo, me sentindo um bocado idiota em


outros bons sentidos porque para Mosés isso provavelmente não teve valor
financeiro nenhum, não importa o quanto Safira cobrasse sei que pagaria,
muito mais pelo valor sentimental do que pelo valor em dinheiro.

Fico fazendo um paralelo sobre a reação dele ao ganhar a Nina e


minha reação ao descobrir que estou usando uma peça de milhões de
dólares, mesmo que saiba que não surte tanto efeito para mim, ele ficou tão
feliz em ganhar a Nina que isso parece mil vezes mais importante para ele
do que ganhar qualquer coisa em dinheiro que eu poderia dar.

Porque afinal de contas esse é o meu marido.

Ele nunca mede nada por preço e sim por valor.

Ele não mede valor por interesse ou moeda, talvez num passado
distante tivesse muito isso de querer pagar por tudo o que fizessem para ele,
mas atualmente sei que ele fica muito feliz com pequenas coisas, as
valoriza, então esse mimo assim como ele diz talvez tenha um significado
muito mais sentimental do que financeiro.

Ele não se importa com o preço e sim o valor das coisas assim como
eu.
— Eu amei meu presente — digo sincera. — Te amo, muito
obrigada, meu amor.

— Gostou mesmo? Espero que não me dê uma bronca dizendo que


gastar vinte milhões de dólares numa roupa para você é algo banal.

Uma barganha. Penso com certa ironia, mas hoje não!

— Hoje não! Eu amei! Principalmente a parte que não cobre as


partes baixas!

Ouço o som de sua risada se espalhar pelo quarto, não carrego tanto
remorso de desfrutar de uma vida razoavelmente luxuosa, temos trabalhado
incansavelmente para que seja assim, mas algumas vezes nos damos a esses
pequenos prazeres da vida.

Mesmo que no dia a dia ainda ande com roupas simples e levemos
uma vida no mínimo confortável, sei que com o casamento e o
reconhecimento de paternidade do meu pai, muito dinheiro veio junto.

Eu também trabalho muito para ter meu dinheiro, justamente por


trabalhar tanto e me dedicar a empresa meu casamento foi meio que para o
brejo em diversos sentidos.

— Sabia que ficaria linda usando essa peça, brincadeiras à parte a


Safi queria muito poder trabalhar com essas pedrarias, eu comprei os
diamantes e ela montou, não foi algo assim tão difícil.

— Para você, não é? A coitada deve ter esfolado os dedinhos dela,


tadinha da minha cunhadinha!

— Que nada, ela pagou muito bem para que essas ajudantes dela
fizessem tudo, sem falar que sempre que eu ia na loja ela me expulsava
dizendo que queria que fosse surpresa.
Conversei com a Safi algumas vezes durante esses meses, a vi
também com frequência, vi o Tom e as crianças também, ela se mostrou
muito triste com minha decisão de separação, mas me apoiou assim como o
Tom, sei que ela também apoiou o irmão de alguma forma, são muito
unidos.

— Senti falta disso, sabia?

Eu o fito, sua mão toca minha cintura por baixo das camadas da
pequenas joias reluzentes.

— Senti falta de nós dois numa cama só trepando, de você me


pedindo mais, de te ouvir chorando e implorando por mim, isso mexe muito
comigo, Bê.

Também mexe comigo e é tão incrível que eu também me sinta da


mesma forma agora.

— Senti falta da minha esposa comigo, mas agora é diferente, você


está mais confiante e solta, uma verdadeira ordinária na cama.

Sorrio e fico por momentos pensando sobre os reflexos disso para


cada um de nós, o casamento, as brigas, a separação, até mesmo as
desconfianças e ofensas. Sei que eu recebi isso de uma forma e ele de outra
totalmente diferente, enquanto eu fiquei ofendida com a hipótese de ser
traída, Mosés estava desesperado para que eu não acreditasse nisso e até
mais que ofendido com a situação.

— Eu amo você e nunca mais permitirei que ninguém te afaste de


mim — determino e seguro suas faces. — Você é só meu e de mais
ninguém, entendeu?

— Entendi — ele responde com um sorriso que se arregala a cada


instante enquanto me olha.

— E me ama mais que tudo mesmo eu sendo uma imbecil!


— Eu te amo mais que tudo e você não é uma imbecil, bem, talvez
um pouquinho precipitada, mas nunca imbecil.

Fico tão feliz com sua gentileza, porque mesmo diante de tudo sei
que o Mosés não quis desistir de mim e o amo ainda mais por isso a cada
instante.

Nos beijamos e ele me puxa para junto de si fazendo com que eu


caia em cima dele na cama, ouço o som dos nossos risos se espalhando pelo
lugar mais uma vez, espantando toda aquela dor que vivenciamos nesse
local meses atrás.

Dizendo para mim mesma que agora e para sempre mais uma vez
ele é só meu.
NOVOS SENTIMENTOS

Entro no nosso quarto carregando uma bandeja de café da manhã.

Não esperava que ele fosse acordar tão cedo, porém, também não
pensei que ele dormiria até as 11:35.

Já desci e iniciei meu dia.

Enviei mensagem para a Sêmora avisando sobre nosso dia ser


remoto, o dia de hoje será relativamente tranquilo na empresa então não
haverá tanta necessidade de que eu ou Mosés estarmos lá.

Acabei dando o café para as crianças, entre burburinhos e olhares


envergonhados do Cory fiquei tentando ignorar a sensação de que ainda sou
mãe de um bando de adolescentes e passei a noite toda transando com o pai
deles.

É claro que as crianças sabem disso, elas sabem que temos nossa
intimidade, mas fingem muito bem que não sabem porque morrem de
vergonha disso assim como nós dois, por mais que sempre falamos sobre
essas coisas com eles de uma forma natural.

Meus lábios se abrem num sorriso largo enquanto empurro a porta


com o pé, por mais que ainda o veja nu assim espalhado em nossa cama
abraçando um dos nossos travesseiros fico por momentos querendo me
convencer de que é real.

Pés grandes, pernas longas, coxas grossas, uma bunda mais


musculosa, braços cumpridos dobrados enquanto ele dorme tranquilamente
entre pétalas de rosas por todos os lados, acho que não sobrou nenhum
morango, os que haviam sido perdidos nas brincadeirinhas, recolhemos
depois do sexo.
O vejo se mover e estender o braço, tatear o meu lado da cama e
logo em seguida puxar o cobertor se cobrindo todo sonolento, meu sorriso
fica ainda maior quando o vejo cheirar meu travesseiro em seu silêncio
matinal.

Sou tão idiota por ter chegado a cogitar que ele poderia me traído!

Sei que terei que compensá-lo por tudo, ainda que não tenha sido
tudo assim no sentido literal, que tenha sido um conjunto de coisas que
aconteceram.

Me aproximo de nossa cama em silêncio, então fico parada diante


dele com a bandeja de café da manhã, ele sorri devagar e logo em seguida
se ergue se sentando na cama, tem algumas pétalas de rosas grudadas em
seu peito, ombros, pescoço e até orelha, sorrio de volta e coloco a bandeja
diante dele arrumando os pés da bandeja com cuidado.

Fiz ovos com gemas moles, torradinhas, trouxe fruta e café


quentinho, também coloquei algumas castanhas e cacau num pote com
iogurte para ele, peguei uma rosa que deixei guardada na geladeira e
coloquei em um copo com água.

— Bom dia, Moshe!

— Bom dia, Ordinária!

Sorrio de novo e me sento de frente para ele, Mosés se inclina e me


dá um beijinho suave, sua mão segura a minha e entrelaça os dedos nos
meus de um jeito íntimo e carinhoso.

— Obrigado pelo café e pela surpresa. — ele diz num tom de


carinho e malícia.

— Por nada — sei que estou ficando vermelha, mas ao mesmo


tempo gosto tanto disso. — Deveres conjugais, você sabe.
Olho para nossas mãos entrelaçadas e me sinto emotiva de repente,
para mim não foi só sexo, nunca seria, mas também foi uma das noites mais
prazerosas e excitantes que tivemos nos últimos cinco anos.

Picante, quente, intensa, enfim tudo!

— Estou feliz que nós tenhamos reatado esse lado do nosso


casamento — confesso e seguro a mão dele, a ergo e beijo seu pulso com
zelo. — Amo você e não quero pensar como seria voltar e não te ver
novamente aqui comigo.

— Isso não irá acontecer — ele responde e toca meu queixo com a
outra mão erguendo minha cabeça, seu olhar me acerta em cheio. — Nunca,
entendeu?

Faço que sim com a cabeça.

É estranho demais pensar que até alguns dias atrás estávamos


discutindo naquela viagem, que passamos por tudo isso de forma
involuntária, mesmo que agora não seja assim, mesmo que nesse momento
o ame muito mais do que já amei antes.

— Por onde devo começar? — Mosés olha para a bandeja e solto


sua mão. — Ei, vem para cá, quero você aqui juntinha de mim.

Acho que ele não quer que eu me sinta exatamente assim, um pouco
mais culpada de tudo.

— Tá.

Engatinho até ele e me sento ao seu lado, ele passa o braço em volta
do meu corpo e indica a torrada e os ovos.

— Quero que me alimente.

— Mas está um folgado mesmo!


Sei que estou rindo, depois me inclino e começo a colocar os ovos
sob a torrada, ele pega a xícara de café e prova um pouco.

— Já falou com a Sêmora?

— Sim, tudo sob controle com a diretoria e já começaram as


entrevistas, a Marcy está verificando a possibilidade de indicação de
alguém para substituir a Gisele permanentemente, ela ainda está dando uma
mão para a Sêmora e assim que conseguirmos alguém, a Sêmora poderá vir
para nos auxiliar com nossas agendas.

— Até que enfim uma boa notícia!

Coloco a torrada com ovos diante dele e Mosés dá sua primeira


mordida, passo a mão em seus cabelos afastando algumas pétalas de rosas
que ainda insistem em ficar aqui, o vejo sorrir enquanto olha em volta.

— Está pensando em coisas desse tipo uma hora dessas?

— Estou pensando que quero uma noite dessas pelo ou menos uma
vez por mês até os noventa e seis no mínimo.

— Será que você aguenta, Moshe?

— Ah, eu aguento!

Rio mais uma vez e ele morde a torrada de novo, beijo sua face e
vejo os cabelinhos brancos nos cantos de sua orelha, alguns fios espalhados
por seus cabelos, a coisa mais charmosa que eu poderia ver em anos depois
de uma noite de sexo intenso.

Ah, eu sou tão apaixonada por ele.

Longe de todas as minhas inseguranças e medos sempre existiu esse


meu lado, esse lado que o ama, que ama os pequenos detalhes dele, de sua
personalidade, de tudo.
Antes estava envenenada pelo meu medo e pela raiva, por todas as
coisas que me convenceram quando vi aquelas imagens, fui contaminada
pelas mentiras da mídia, por tudo o que inventaram sobre o que houve...

Escuto algumas batidas na porta do quarto e imagino que sejam as


crianças.

— Pai, mãe, o tio Tom acabou de chegar, ele quer conversar com
vocês! — a voz de Sophie soa do outro lado da porta. — Pelo amor de
Deus, né? Já chega também!

Troco um olhar com meu marido e ele começa a rir.

— Já estamos indo — aviso. — Pede para ele tomar um café e


esperar no escritório.

— Ele parece nervoso — ela responde. — Vou dizer.

Mosés vai parando de sorrir, naturalmente que vou chegando a essa


conclusão também, mas saio da cama primeiro.

— Tome o resto do café e um banho, vou preparar o território, não


precisa se preocupar, quero eu mesma cuidar disso, ok?

— Eu não vou enrolar — ele garante e leva a xícara aos lábios. —


Ele não vai querer acordo.

— Eu sei, é meu primo!

É que o Tom costuma ser super flexível em tudo, tudo, mas quando
se trata da Safi ele parece que trava em absolutamente tudo, mesmo que eu
entenda é inevitável que ele não aja como um Carsson ignorante e
troglodita quando precisa proteger sua esposa.

É algo que o Mosés faz muito bem, mas convivendo com meu pai e
meus tios ele faz muito melhor.
Saio do nosso quarto me sentindo até tranquila, quando acordei mais
cedo tomei um banho rápido e coloquei uma calça de moletom folgada e
uma camiseta leve, estou descalça como sempre fico quando estou em casa.

— Amor, sem discussões, ok? — ele pede quando abro a porta do


quarto. — Nada de discussões!

— Pode deixar.

— Por que eu não estou acreditando em você?

— Porque eu sou uma Carsson?

Ouço uma risada ao abrir a porta, tão logo saio do quarto aceno para
ele e puxo a maçaneta vendo-o sorrir e negar com a cabeça, assim todo
gostosinho, mas ao fechar a porta paro de sorrir e sei que devo levar a sério
seu pedido.

Porque de todo jeito eu sei o que isso pode significar.

Da última vez que teve uma reunião de família ouvi uma discussão
calorosa entre papai, tia Júlia e o tio Jack, tudo isso porque a tia Júlia estava
pensando sobre se mudar para outro estado, no final da discussão o tio
Jonas estava chorando enquanto o tio PH ficou berrando aos quatro ventos
o quanto todos da família erão loucos e tempestuosos.

Ela acabou desistindo, acho que chegou à conclusão de que as


coisas não são tão simples, não existem escolhas fáceis quando se decide
ser uma Carsson, sei disso, ao longo dos anos me vi passando por diversas
discussões do tipo com papai.

Ele é autoritário, mandão, algumas vezes insensível e controlador,


Ayla e eu algumas vezes ficamos dias sem falar com ele porque tem essa
mania feia de tomar decisões e só nos comunicar, é algo que melhorou com
os anos, contudo, que ele também faz como se fosse a coisa mais normal do
mundo.
Entro no escritório e vejo meu primo parado diante da janela com
uma caneca de café na mão, acho que tem sido muito mais que isso nos
anos de convivência, ele se tornou presente e muito prestativo com o
decorrer do tempo, mas acima de tudo um verdadeiro irmão, para mim, para
meu marido, um tiozão para meus filhos.

— Bom dia, querida!

— Bom dia, querido!

Sorrio, ele me analisa como se esperasse que eu dissesse alguma


coisa, fico sem graça, mas ele já sabe que nós voltamos, que reatamos nosso
casamento.

Tom tem essa coisa de ser um homem natural e espontâneo, longe


de toda a masculinidade tóxica que rodeia os homens de hoje em dia, ele é
alto, tem cabelos escuros e cumpridos, sobrancelhas da mesma cor e olhos
claros em tons esverdeados lindos.

Hoje está usando uma calça de brim, chinelas e uma camiseta


folgada, os cabelos presos por um coque no alto da cabeça, a barba robusta
e cheia, toda sua etnia explícita nos traços fortes que ele tem, mas tão igual
a qualquer um de nós que eu nunca poderia explicar.

Ele é o mais velho depois do Nando e é o que não tem nada a ver
com nada que lembre hospitais — que é o negócio da família há anos — ou
as empresas do pai, mesmo que tenha ações e se esforce para estar lá em
reuniões importantes, ele preferiu tirar boa parte do tempo para se dedicar a
família.

Acho que no fundo todos nós o invejamos um pouco por isso,


porque ele não liga, mas principalmente porque ele foi corajoso o suficiente
para não ser nada do que esperavam dele.

É marido e pai em tempo integral e faz isso muito melhor do que


muitos homens na face da terra, faz melhor até mesmo que eu própria.
— Acho que cheguei numa má hora.

— Nada, o Mosés está no banho, aconteceu alguma coisa?

— Você sabe que sim.

Me aproximo dele e abro os braços, Tom deixa sua caneca de café


sob a mesa e abre os braços também vindo me abraçar, sei que por mais que
não deva me sentir assim sempre me vem essa onda de gratidão por tê-lo
em nossas vidas, ele fez com que a Safi acreditasse mais em si mesma, com
que ela se sentisse capaz de amar e ser amada, com que ela acreditasse que
poderia ter um futuro em todos os sentidos.

— Que bom que vocês voltaram, querida.

Tom me chama de querida desde que nos conhecemos por assim


dizer, ao menos desde que começamos a nos reconhecer como primos,
família, mas esse “querida” é apelido carinhoso que até causa inveja nas
outras primas e até mesmo na Lottie e nas meninas de vez enquanto.

— Sim, foi a nossa escolha.

Aperto ele de volta e fico reconfortada por um momento.

Ninguém me julgou quando decidi me divorciar, fui muito apoiada


por todos integralmente, ele foi uma das pessoas que mais tentou me dar
suporte principalmente em relação as crianças.

Ele e a Safi quem me ajudaram com os horários das meninas e nos


finais de semana que se ofereceram para levá-las para casa deles, sei que ele
conversou com os meninos e que deu todo suporte que poderia para o Cory
em todos os sentidos.

— Ela já fez contato?

Ah, mais uma vez terei que lidar com essa inconveniência.
Suspiro me afastando um pouco, Tom pega a caneca e vai
caminhando até o sofá que mantemos perto da sacada do escritório, na
verdade aqui é a biblioteca que funciona como escritório algumas vezes, é o
lugar preferido das crianças para ler nos dias de inverno e costumava ser o
lugar que eu e o meu marido profanávamos anos atrás na ausência deles.

É, bons tempos!

— Sim, com o Cory e comigo, não tivemos tempo de resolver isso


ainda, chegamos há dois dias, ontem tivemos que ir a empresa para resolver
um bocado de coisa.

— E...

— Bem, Tom, o que você quer que eu fale? Ela quer se reaproximar
do filho dela!

— Ele não é filho dela, Ana, ele é SEU FILHO!

Me sinto realmente bem em ouvir isso, mesmo que dito com certo
rancor.

Mas ele sabe todo o processo da Safi, ele estava lá quando ela teve
que fazer tantas terapias, as dores que ela sentia no começo, os choros, ele a
carregou no colo depois de um dia difícil na Universidade e a consolou.

Todos os passos que a Safi deu foram acompanhados de esforço


triplo, toda a dor que isso causou nela tanto emocional quanto física foi
presenciada por nós, mas muito além foi por ele, porque ele se casou com
ela, ele decidiu construir uma família com ela e acreditou em sua
recuperação.

Ele veio depois do acidente, mas para ele foi como viver todo o
inferno que nós que presenciamos o que houve de perto também.

— E quanto ao querida? — me sento ao lado dele tentando sorrir.


Tom me encara um tanto sério e fico sem nem saber o que dizer.

— Não quero ela perto do meu sobrinho, nem da Safira ou dos meus
filhos, enfim, de nenhum de vocês, ela é perigosa.

— Eu sei que ela é, mas ao que tudo indica ela andou mexendo os
pauzinhos em relação ao Cory já tem um tempo, ontem nós brigamos.

Meu primo parece realmente surpreso, assim como eu fiquei é claro


quando Cory me contou.

— Não contamos para ele, Tom, não queremos...

— Tem que contar! — ele me interrompe e seu semblante se torna


ainda mais sério. — Ele tem que saber o que ela fez.

— Sei que você acredita...

— Não, Ana! — ele me interrompe novamente e seu tom de voz é


um pouco mais rude. — Não acha que ele merece a verdade?

Agora me vem na mente as palavras do Mosés sobre não discutir


porque realmente, odeio ser interrompida.

— Sei que quer resolver isso da melhor forma e acredito que não é a
melhor forma colocar a Safira e o Cory nessa posição novamente. —
explico mantendo o máximo de calma e o semblante dele se torna um pouco
mais preocupado. — Acredito que você não entenda as proporções que isso
poderá tomar caso nós decidamos falar para o Cory ou para a Safira,
primeiro porque eu e o Mosés nunca contamos para ele o que houve e
segundo, quer mesmo que a Safi passe por todo o trauma mais uma vez?

Ele não responde, mantém a caneca de café pousada sob as mãos,


ainda com esse olhar sério.
— O que adiantaria se o Cory soubesse? Isso só machucaria ele,
sem falar que ainda não sabemos a que nível ela poderia usar isso tudo para
tentar nos afetar.

— E o que sabe até agora?

— Aparentemente ela contou ao Cory que eu roubei o Mosés dela,


mas do jeito dela, da forma que ela quer que ele acredite, segundo ela não
quer nos envolver, só quer uma chance para ser a mãe dele.

— Não acha que tudo se resolveria se contasse para ele o que ela
realmente fez?

— Do mesmo jeito que eu não quero que a Safi sofra ou o Phill


fique preocupado, não vou machucar o meu filho, isso só causaria revolta
nele.

— Então vai deixá-la se aproximar do Cory como se nada houvesse


acontecido?

Essa é uma constatação que ainda me machuca muito.

— Não tenho escolha.

— Tem, basta que conte para ele que a mãe dele é uma mau-caráter
e que ela causou tudo aquilo nele e na Safira, no Phill.

— Eu odeio tudo isso tanto quanto você, mas você não está
pensando nos sentimentos do Cory ou da Safira, só está com medo de que
ela sofra no processo e eu te entendo...

— Não, Ana, você não entende!

Ele me interrompe mais uma vez, abro a boca para falar, porém
desisto, decido que não vou continuar a conversa, me levanto.
— O que foi?

— É que você não está me ouvindo, não adianta o que eu diga você
ainda se sentirá no direito de falar o que acha e encarar isso como uma
verdade absoluta.

— Sou bom nisso, não sou? Agora quer que eu deixe uma assassina
a solta e ignore o fato de que ela quase matou a minha esposa há quinze
anos como se isso fosse algo irrelevante? Você não tem sangue nas veias,
Ana, porque não é possível.

— Entendo a sua dor...

— Não, você não entende! — pragueja.

De novo.

Me afasto indo para o rumo da mesa, cruzando os braços, me


segurando bastante.

— Sei que pareço injusto com o Cory...

— Olha, a felicidade eterna da sua mulher não é mais importante


que a felicidade do meu filho! — berro sem conseguir segurar.

Antônio se levanta todo duro e me encara de cabeça erguida.

Isso é algo que eu realmente nunca vi e não gostaria que


acontecesse, queria que nossa conversa fosse uma conversa não uma sessão
de discussões repletas de insinuações e essas questões que podem nos
machucar.

— Seu filho não pode sentir dor, Ana? Em vista de toda a dor que a
minha mulher sentiu?
— Ah eu devo te lembrar que antes de você se casar com ela, eu
estive com ela por bastante tempo, eu cuidei dela tanto quanto você e
preciso dizer que a Viviane não presta, ela é uma pessoa horrível, mas a
Safira fez todas as escolhas dela e isso não é culpa da Viviane.

Ele dá uma risada nervosa, mas de pura raiva.

— Está dizendo que a Safira tem culpa de ter sido envenenada por
ela? Ela era só uma garota, Ana! — fala exasperado. — Não é possível que
esteja dizendo isso!

— Você não sabe todo o inferno que foi a minha vida antes de você
conhecer a Safira, por todas as coisas que eu e o Mosés passamos por causa
da Viviane, você não está nem tentando entender o que eu quero dizer, só
está zangado porque sei que a ama, sei que carregou as dores dela, mas não
é justo comigo também!

Tom fica calado, os olhos expressivos para mim, cheio de raiva


contida.

— Eu não tenho intenção alguma de permitir que ela se aproxime da


Safira ou dos seus filhos, mas não posso proibir do Cory de conviver com
ela porque ela nunca vai deixar de ser a genitora dele. Se eu tentar afastá-lo
dela só o colocarei a mais dez passos para longe de mim, acredite! Eu sei
como se sente, eu estava lá quando ela acordou do coma no hospital,
quando ela ganhou alta, quando o Phill teve o enfarto, eu mais do que
ninguém sei o que é isso, mas não posso machucar o meu filho só porque
você considera o melhor para si mesmo, para sua esposa.

— Não preciso que diga que sofreu, Ana, sei que sofreu, mas...

— Eu sei que ela sofreu, Tom, eu estava lá, lembra?

Ele assente com a cabeça e depois respira fundo, os olhos aderindo a


um pouco mais de calma, respiro fundo também tentando acalmar meus
ânimos.
— Não quero que ela se aproxime da Safi e nem das crianças, se
puder garantir que isso não acontecerá, para mim será o suficiente.

— Não vai acontecer, o tio Jack garantiu ao Mosés que vai vigiar ela
de perto.

— Papai já sabe?

Ele está bem surpreso.

— Mosés pediu que ele não dissesse justamente temendo sua


reação, o tio Olaf quem está cuidando da parte da segurança, não precisa se
preocupar.

— Melhor.

Ouço o som da maçaneta e logo em seguida meu marido entra no


escritório, usando calção de malha e uma camiseta leve, de chinelas, os
cabelos úmidos e penteados para trás, aposto que esse banho foi um
daqueles que ele toma feito gato.

— Perdi alguma coisa?

— Só dois berros e uma discussão — Tom responde e pigarreia. —


A noite foi boa, cunhado?

— Vai tomar no meio desse seu...

— Então vamos deixar acordado que em relação a Safi e ao Cory


ainda é cedo para tomar qualquer decisão drástica — interrompo Mosés
num tom de voz alto, Tom começa a rir enquanto toma o restante de seu
café.

— Tem um chupão no seu pescoço, prima!


— Tem? — arregalo os olhos e toco os lados dos pescoço toda
nervosa.

— Para de ser enxerido! — Mosés reclama impaciente. — Amor ele


está te amolando.

Nossa, meu coração até acelerou, que mico!

— Em relação a minha irmã, não acredito que a Viviane consiga se


aproximar dela em nenhum sentido. Já estamos cuidando disso da melhor
forma.

— Como ficou sabendo? — indago.

— O Cory comentou comigo via mensagem hoje cedo, disse todo


empolgado que havia reencontrado a mãe e que queria que eu o
acompanhasse durante o encontro deles.

Nem eu ou Mosés conseguimos absorver isso tão bem.

— Eu disse para ele que iria pensar, ele disse que é muito
importante para ele e que sabe que vocês dois não iriam, que não pediria
isso para vocês.

Claro, o Tom conheceu o Cory quando ele ainda pequena um


menino pequeno, ele cresceu com essa imagem na cabeça de que o meu
primo é seu tio preferido, confia nele plenamente.

— Eu não sei como dizer não — Tom confessa meio dividido. —,


mas não quero fazer isso.

— Pode dizer que tem um compromisso — digo meio chateada. —


Ele está escondendo tudo de nós dois.

Tom fica em silêncio por alguns momentos, entretanto, sei que isso
seria pedir demais até para ele, afinal como a Viviane reagiria quando
soubesse que ele é casado com a Safira?

Aposto que aquela dissimulada fingiria que não conhece a Safira e


agiria como se nada houvesse acontecido.

— Vou pedir que a Lottie vá com ele, mas não vou dizer que não
vou, pedirei que ele fale o horário e ela passará aqui para pegar ele, ela é
boa em lidar com pessoas como a Viviane.

Ah, se é! Aquela ali é uma onça assim como todos da família falam.

— E não faz essa cara, você sabe que ela ama um barraco, mas
resolve tudo sem ficar pedindo nada aos nossos pais, diferente do Nando e
eu.

— Será que ela vai conseguir cutucar a onça e sair ilesa? — Mosés
pergunta com um olhar coberto de deboche.

— Eu pagaria para ver. — respondo um tanto irônica.

E duvido muito disso também.


UMA CHANCE

— Ei, tudo bem?

— Só pensado mesmo em tudo isso.

— Não se desgaste, lembra do que nós conversamos?

Acho que não poderia só ignorar tudo.

O Tom acabou de sair daqui depois de uma conversa bem calorosa


sobre a Viviane e de fato não esperava que apesar de tudo quando isso
acontecesse ele fosse entender toda a situação, no final das contas sei que
ele ainda ficou chateado porque sabe que dessa vez assim como da outra
não será tão simples deixar a Viviane para trás.

Fico por alguns instantes imaginando como poderia deixar isso de


lado sabendo que o meu filho está de fato interessado em uma
reaproximação da cobra, só se eu fosse muito sem coração para não
reconhecer que esse é um problema delicado.

Mosés se aproxima bastante calmo.

Me despedi do Tom com um forte abraço apesar de tudo, estava


aliviada de saber que ele enviará a Lottie no lugar dele com o Cory, sei que
em algum momento meu filho irá nos contar sobre isso, contudo, estou
calma de ter sabido antes pelo primo. Subi para nosso quarto e vim trocar as
roupas de cama, recolher a roupa suja e dar uma organizada no quarto.
Fiquei sorrindo ao me ver varrendo tanta pétala de rosas e alguns morangos
pisados embaixo da cama.
— Você não quis me esperar para a melhor parte? — ele questiona
olhando para nossa cama feita e para o quarto limpo.

— Na próxima você fica com a bagunça — respondo exibindo o


cesto de roupa sujas e a vassoura e a pá num canto do nosso quarto. —
Acho que ainda preciso passar um pano úmido.

— Faço isso, por que não desce e fica com as crianças?

— Preciso de um tempinho para pensar em tudo.

— Está preocupada demais.

— Você não?

Vejo meu esposo ficar diante de mim, os cabelos ainda úmidos, o


calção folgado e esses músculos escondidos por debaixo de uma camiseta
de malha fina, sua mão se ergue e toca a minha face e só por esse pequeno
instante consigo me sentir um pouquinho melhor.

— Estou, mas não há nada que possamos fazer além do que já


estamos fazendo, o Tom já está ciente e todos da família também.

— Estou decepcionada pelo Cory não ter nos dito.

— Ele tem que aprender a tomar as melhores decisões para si


mesmo sozinho, amor, isso é algo que não podemos fazer por ele.

— Eu sei, mas é que...

— É que você é a mãe dele e isso te magoa, eu entendo, também me


senti assim.

— Me senti traída.

— Eu também.
Esfrego a bochecha na mão dele feito filhote triste e ele se inclina
me puxando para perto de si, passando o outro braço em volta da minha
cintura, me abraçando tão forte que faz com que eu fique bem.

Tão bem.

— Quando ele conhecê-la de verdade, vai perceber os erros que


cometeu.

— Não quero que ele se machuque no processo, meu único medo é


esse.

— Acho que você está pedindo demais, o Cory não é mais uma
criança, amor, ele já é um homem adulto e precisa saber lidar com suas
próprias decisões.

— Essa é a sua ideia sobre lidarmos com tudo isso? Deixando-o


perto daquela cobra, sem proteção?

— Foi sua ideia não contar a verdade para ele.

— Eu sei, eu sei!

Encosto o rosto no peito largo, ele enfia a mão na minha nuca


acariciando os pelinhos finos e depois meus cabelos, a outra mão toca o
meio das minhas costas devagar me dando conforto.

Fazia tanto tempo que não me sentia assim com o meu marido que
estou me sentindo como bichinho carente, aliás, por falar em bichinho...

— Já viu a Nina?

— E você acha que as suas filhas me deixaram chegar perto dela?

Sorrio, recebo um beijinho na testa. Sei que as meninas se


apaixonaram por Nina assim como ele, não tivemos mais animais durante
esses anos porque não queríamos que o Mosés sentisse que estávamos
substituindo do Mike, acho que agora foi o momento certo para trazer seu
novo pet para casa.

— Ana, posso falar uma coisa?

— Claro!

— Adorei nossa noite de ontem, adorei que se sentiu segura e que


me seduziu, que foi selvagem e que se permitiu mais comigo na cama.

— Sinto que estou quebrando novamente as barreiras.

Estou enrubescida, como não?

Aperto-o com carinho e me vem uma boa sensação no peito, um


friozinho na barriga que nunca mais tinha me perturbado nessa proporção.

— Recebi um convite para um jantar beneficente daqui a dois dias,


eles enviaram por e-mail, confirmei, portanto, vão enviar os convites de
papel hoje.

— Acha que estamos prontos para aparecer juntos em público


depois de tudo?

— Devemos algo a alguém?

— Absolutamente não.

Noto que nossos corpos se movem devagar para os lados,


balançando de um jeito tão leve, gentil, ah, será que estou fantasiando
demais desde que chegamos?

— Pedi para nossos pais ficarem com as crianças, o Cory vai com
eles também, papai disse que quer levá-los para pescar, então teremos três
dias só nossos.
— Eu posso levar a Sêmora de tiracolo?

— Talvez não precise, o Jammie foi convidado, então eles vão, é o


Baile Anual de Arrecadação da Associação do seu tio Jonas, esqueceu?

— Nossa, já chegou?

— É, o tempo passar rápido e os seus tios querem dinheiro.

— Falso, você fica jogando poker com eles e tentando imitar um


mafioso todo ano.

Ele ri, beijo seu peito, aspiro o cheiro gostoso dele, senti falta disso
mais que tudo.

— Advinha o tema desse ano? Sua tia Patrícia quem escolheu.

— Moda Vintage?

— Século 17.

— Acha que teremos tempo para conseguir roupas?

— Ela disse que pode ir adaptado, pensei em amarrar umas cortinas


em você e me colocar dentro de um saco de batatas.

Ergo a cabeça rindo muito da ideia.

— Uma coisa temos que admitir, você tem uma imaginação muito
fértil senhor HC.

— Ah, eu tenho!

Toco suas costas devagar também, enfiando as mãos por dentro da


camisa, sentindo a pele quente em contato com as pontas dos meus dedos.
— Falei com a Safi, ela vai tentar pensar em algo.

— Você é um explorador, isso sim!

— Capacitista!

— Explorador de irmã.

— Gostosa.

— Isso não vale, sabia?

Ele ri e me rouba um selinho, logo em seguida escutamos o som de


batidas na porta, não há tempo para responder, Akin coloca a cabeça para
dentro do quarto depois de abrir a porta e faz uma careta.

— Vamos almoçar fora, vocês vêm ou vão ficar aí fazendo essas


coisas abomináveis?

— Vou chupar a língua da sua mãe, espera aí!

Mosés se inclina colocando a língua para fora na minha direção


então, eu abro a boca indo de encontro a ele e coloco a minha língua para
fora também, Akim faz cara de nojo e fecha a porta sumindo para fora,
começamos a rir os dois de tudo isso.

— Não demorem! — ele berra de fora do quarto. — Estou


começando a me arrepender de ter deixado vocês voltarem, parecem dois
coelhos.

Troco olhares com o meu esposo e me agarro ao seu pescoço


puxando-o para baixo e colocando um beijão na boca dele, quando ele me
corresponde, tenho mais que certeza de que nós dois nunca, jamais nos
arrependeremos de ter voltado.
NÃO HÁ VERGONHA

Assim como tem sido desde que o Cory tirou habilitação, nos
dividimos em dois carros, em um ele veio no carro dele com os gêmeos,
Sophie e Saara e no outro viemos eu, Mosés, Bea e Laisa, Mosés ficou meio
chateado porque não pode trazer a Nina. Fiquei observando-o por
momentos conversando com sua nova filhote enquanto a colocava em sua
caixinha de papelão toda forrada deixando claro que voltaria com uma
caminha mais confortável, fiquei sorrindo feito boba, grata por ter dado a
cadelinha para ele.

Cory disse que viramos almoçar no Mersea que é um dos restaurante


prediletos dele, então acabamos por só seguir seu carro mantendo a
distância e trocando mensagens com as meninas no grupo da família.

Escolhi uma roupa leve, jeans folgado e uma blusa de mangas


simples que não usava há muito tempo, chinelas, Mosés permaneceu com as
roupas que está e as crianças também estão usando roupas leves, essa época
do ano faz muito calor aqui.

Diferente de Nova York que tem um clima bastante frio no qual me


acostumei por anos, temos vivido aqui desde que papai pediu que nos
mudássemos, tem uns treze anos que moramos aqui em São Francisco, foi
uma mudança necessária e relativamente fácil.

Então nos acostumamos muito, nem consigo imaginar as crianças


usando roupas tão leves numa manhã dessas em Nova York, lá é mais
úmido e meio frio nessa época do ano.

Aqui é ensolarado, sem falar que nossa casa fica afastada da cidade
grande, temos essa oportunidade incrível de morar num lugar em que
estamos mais perto da natureza e da família do que dos dias estressantes na
cidade grande cercados de prédios e buzinas.
Claro que ainda amamos nossa casa nos Hamptons, vamos passar as
férias ou feriados lá com a família, ela ainda é meu primeiro amor, contudo,
não me vejo morando assim tão longe do meu pai.

É amargo, mandão e carrancudo, mas é o meu pai.

Cory fez reservas e já nos acomodamos em nossos lugares há alguns


minutos, fico observando meus filhos e filhas mexendo em seus celulares
enquanto Mosés passa o braço em volta do meu corpo e se encosta e mim
com cara de sono.

— Cansado? — indago baixinho perto dos lábios dele.

— Estou com sono.

Acho que fomos dormir por volta das 05:00 da manhã, eu não dormi
muito, me levantei às 09:00. Ele ainda conseguiu dormir até as 11:30. Só
que acho que me acostumei com a rotina de me acordar cedo e que nos
últimos meses por sofrer com insônia e ansiedade também não posso dizer
que dormir tão bem tem sido meu foco.

Para falar a verdade aqueles dias durante a viagem foram os dias


que eu mais dormi bem nos últimos seis meses.

— Poderá dormir quando chegarmos em casa — aviso. — Estamos


com o dia livre hoje.

— Você vai dormir agarradinha comigo, Bê?

Manhoso!

— O que tanto cochicham aí? — Laisa indaga deixando o celular de


lado. — Tomem bastante cuidado, viu? Dizem que a mulher tem quase 90%
de engravidar na menopausa.
— E quem disse que eu ligo? — indago num tom cheio de
provocação. — Afinal de contas, se vierem mais quatro, é um para cada.

Ela começa a rir assim como suas irmãs e irmãos, é verdade que não
estava nos meus planos engravidar de múltiplos em nenhuma das vezes, foi
tão difícil, não gosto de lembrar das nossas discussões, mas também foi
uma das melhores coisas que poderia me acontecer.

Foram presentes inesperados assim como a chegada do Cory.

— A mamãe é jovem, acho que ainda quero mais alguns irmãos ­—


Cory diz e me estende o celular. — Pedi pizza, mamãe.

Ah, ele vai ficar me adulando, mas não deixa de ser fofo quando ele
me chama de mamãe.

— Só a entrada, é claro. — ele indica a tela do aparelho.

Se sentou perto de mim, me deu um beijo no rosto quando


descemos, ficou todo sorridente durante todo o café mais cedo, ele está
fazendo a tarefa de casa.

— Sua preferida — complementa ele. — Pedi cervejas sem álcool e


refrescos para as crianças.

— Que crianças? — Gustav questiona.

— Aquelas crianças — Cory aponta para ele e para Akim.

As meninas riem e o pai deles me abraça colocando o beijinho


quente no meu pescoço.

— Isso já está ficando constrangedor! — Sophie comenta toda


entediada.

— Se vocês quiserem podemos nos separar...


— Também não é para tanto — Bea argumenta me interrompendo.

Mosés se ergue me soltando e se endireita todo carrancudo para eles,


quando ele não dorme direito fica meio rabugento, só que logo que ergo o
olhar entendo um pouco dos seus motivos.

Bem na mesa da frente tem um olhar certeiro e bastante conhecido e


influente na cidade, uma dessas fofoqueiras de plantão, alguém que faz
publicações numa página de fofocas sobre celebridades locais, eu não
consigo me lembrar o nome dela, mas me recordo bem desse rosto porque
essa moça apresenta um programa local de entretenimento e celebridades.

Acho que só por um segundo eu me esqueci completamente disso,


não sei se porque tive a falsa sensação de que voltando tudo ao normal em
nosso casamento as coisas se resolveriam, também nem tivemos tempo de
pensar nisso.

Noto que ela está com o celular apontado para nossa mesa, não está
sozinha, está acompanhada de mais duas jovens moças, não faço ideia de
quem sejam.

— Ela está nos filmando? — Laisa indaga ao olhar para trás e vai se
encolhendo na cadeira. — Que vergonha!

— Vou resolver isso — Mosés faz menção de se levantar.

Seguro o pulso dele e ele me encara bastante surpreso, começo a me


erguer mantendo contato visual com a jovem loira de olhos castanhos e
cílios cumpridos.

— Eita! — Gustav exclama se encolhendo na cadeira. — Agora o


bicho vai pegar de verdade.

— Ela ta fazendo aquela cara que fez quando eu quebrei o braço


verão passado. — Gustav fala baixinho.
Como se eu não fosse ouvir, não é verdade?

Não é algo que eu faça ou tenha feito nos últimos anos ou desde
nunca, odeio ser exposta a quaisquer tipos de coisa, mas se tem uma coisa
que eu realmente odeio é o fato de que ela está expondo as minhas crianças.

Não é como quando estou viajando com eles e com a família e


alguém tira uma foto de longe, ela está nos filmando aqui, talvez
transmitindo isso para alguém nesse exato instante, além de não ser nada
seguro também é algo do qual sei que ela não pode fazer.

Me afasto da nossa mesa e vou até a mesa dela, vejo ela puxar o
Iphone para baixo, longe do meu campo de visão, tão logo fico diante da
mesa dela tento dar meu melhor sorriso para a moça.

— Perdão, boa tarde, gostaria de saber por qual motivo você estava
filmando as minhas crianças.

— Desculpe? — ela faz uma careta estranha e depois sorri. — Eu


não entendi?

— Você estava filmando minha família, meu esposo, gostaria que


apagasse o vídeo — peço juntando toda a minha paciência.

— Acho que você está cometendo um equívoco senhora Carsson —


ela responde ainda mantendo as mãos debaixo da toalha de mesa. — É esse
seu nome, não é? Você não é aquela gorda que foi traída em rede nacional?

As duas moças riem entre si, sorrio para ela mesmo sabendo que ela
falou isso num tom de voz tão alto que basicamente todas as pessoas das
mesas em volta ouviram e estão olhando.

— Desculpe, eu não entendi! — respondo ainda sorrindo.

— O que não entendeu? — ela pergunta cheia de desdém. — Não


pode violar os direitos de livre expressão desse país, ninguém está te
filmando.

— Muito bem, já que você não está entendendo, eu vou explicar


para você e suas amigas — falo ainda sorrindo bastante e pigarreio. — Pare
de filmar as minhas crianças! — grito para ela o mais alto que consigo e as
vejo dar pulos em suas cadeiras, escuto os sons de horror vindos das mesas
de todo o restaurante. — Você está filmando menores de idade sem o
consentimento dos pais, isso viola as leis de proteção as crianças, estou
sendo clara?

Ela se endireita na cadeira e se mantém ereta me encarando como se


fosse pular no meu pescoço a qualquer momento, confesso que por dentro
estou explodindo, torcendo para que ela faça isso, faz tempo que eu não dou
uma surra em alguém.

— Você está me intimidando, mantenha distância, obesa!

— Não vai apagar o vídeo? — indago ainda num tom alto.

— Não, e aí? O que vai fazer?

— Ela não fará nada, mas eu farei! — a voz do Mosés soa alto atrás
de mim. — Espero que tenha bons advogados, como é mesmo o seu nome?

— Eu não me sinto confortável em ter uma mulher adulta filmando


o meu corpo, papai — Sophie abraça o pai escondendo o rosto com as
mãos, fazendo uma voz triste.

As pessoas no restaurante começam a olhar para ela de uma forma


estranha, as amigas dela param de rir e ficam cabisbaixas tentando esconder
o rosto.

— Algum problema por aqui? — uma das funcionárias do lugar se


aproxima.
— Sim, essa moça está filmando partes do corpo das minhas filhas
menores de idade — aviso ainda meio alterada. — Preciso que acione a
polícia.

— Estou com medo papai! — Saara faz cara de choro e abraça o pai
também.

— Não, não, foi apenas um equívoco...

— Senhora, vou pedir que espere e não faça mais isso no nosso
estabelecimento, a polícia será acionada — a funcionária informa.

— Eu sou jornalista! — justifica ela.

— Eu quero ir embora — Laisa informa toda nervosa.

— Cory, leva os seus irmãos para o carro e liga para o tio Ali, peça
que ele venha buscar vocês por favor, eu e o seu pai resolveremos isso o
mais rápido possível.

— Nós não temos que ir embora, não fizemos nada de errado! —


Bea determina toda séria. — Eu não fiquei uma hora e meia num carro para
chegar aqui e ir embora assim.

— A garota tem razão! — um senhor responde de uma mesa


afastada. — Ela quem tem que sair! Ela agiu errado!

— Poderá ir embora se deletar o vídeo ou qualquer conteúdo


relacionado a mim e as minhas crianças, você escolhe — aviso ainda me
controlando ao máximo.

— Ou pode ficar e encarar as consequências, não costumo ser tão


piedoso quanto a minha esposa.

Ela ergue o celular e o desbloqueia então me entrega o aparelho,


sabe que não tem saída, seleciono o vídeo em questão e apago do aparelho,
logo em seguida removo da nuvem de forma definitiva, entrego o celular
para ela e olho para o rumo da porta.

Quando ela começa a se erguer, algumas pessoas começam a vaiar


ela, as amigas dela se levantam cobrindo os rostos com as bolsas, mas
admito que ainda que pareça ser uma dessas pessoas nada confiáveis ou
honestas, ela tem sim muita coragem, começa a andar para fora do
restaurante de cabeça erguida.

Troco um olhar com o meu marido e vejo a funcionária indicar


nossa mesa enquanto outro acompanha as três moças, as ondas de vaias
perduram até que a última das três saia do restaurante.

Vamos voltando para a nossa mesa com as meninas trêmulas, Sophie


com lágrimas nos olhos assim como Laisa e Saara, Bea permanece séria
enquanto se senta em seu lugar, Cory também está todo duro.

— É por conta da casa — avisa a moça um tanto nervosa. —


Lamentamos muito por isso.

Eu ainda mais.
PROVIDÊNCIAS

Tenho pensado sem cessar no acontecimento de mais cedo.

Foi lamentável o que aconteceu naquele restaurante hoje.

Por mais que as crianças estivessem comendo e mudando o rumo do


assunto, lambendo suas feridas, lidando com a dor do constrangimento, meu
esposo zangado, e eu só calada dizendo para mim mesma que deveria ser
forte e que não iria me permitir ficar triste porque alguém mais uma vez
havia me chamado de gorda como se fosse a coisa mais normal do mundo.

Mesmo que isso seja do qual eu já sabia que poderia acontecer


quando retornássemos, acho que por alguns momentos desde que tudo
aconteceu e voltamos de viagem eu quis deixar esse assédio da imprensa de
lado.

Afinal de contas, eu sei que em algum momento vai passar, o


negócio talvez seja todo esse processo de passar por todas essas questões,
sem pronunciamentos, sem que nada seja dito a mídia, isso é algo que nem
eu ou o Mosés ou ninguém de nossa família faça.

Quando papai assumiu minha paternidade deixou claro que isso


implicaria numa centena de porção de coisas, então episódios de assédio da
imprensa e da mídia foram coisas que presenciei ao me tornar uma
Handerson e logo em seguida com mais força, uma Carsson.

Se eu achava que ser esposa do Mosés na época era algo difícil, ser
a filha de um dos herdeiros mais ricos do mundo se mostrou um desafio
diário. Isso só se intensificou mais com o passar dos anos porque por mais
que em diversas circunstâncias nós tentemos, algumas coisas vazam.
Eu sei que antes de eu ser reconhecida a família já vinha passando
por muitos escândalos, alguns de deixar de cabelo em pé, como por
exemplo o casamento de fachada da minha tia avó Lílian ou que meu avô
biológico de verdade era seu esposo, não cheguei a conhecer a minha avó,
papai não fala muito nela, desconheço os motivos, mas acredito que isso
implique em coisas que envolvem ele e o tio Richard.

Uma vez por ano no Dia de Finados temos ido ao túmulo dos
familiares, costuma ser um dia meio triste para o vovô Carsson, para a vó,
mas também porque sei o que significa a perda de todos os membros
Carsson para todos nós e o quanto isso representa na história do nosso
nome.

Sei que as pessoas talvez não entendam, afinal de contas elas não
fazem parte da nossa família, entretanto, os anos de convivência têm me
mostrado que carrego não só um nome coberto de escândalos, mas um
legado muito importante.

É algo que ensino com muito zelo para os meus filhos.

— A senhora ainda está chateada por conta da nossa briga de


ontem?

A pergunta do Cory é algo que me traz reflexões reais sobre a


maternidade, em outros momentos da minha vida em sua infância eu achava
que ser mãe era apenas algo relacionado ao desgaste natural de ter que
acordar por noites numa madrugada e checar se estavam bem, em outros
momentos quando ele adoeceu e precisou ir ao médico devido a gripe ou
quando seus irmãos ainda pequenos se machucavam.

Hoje, ainda é incrível como não consigo definir o fato de ser mãe
apenas por isso.

Porque eles estão aqui, crescendo, tomando decisões, fazendo


escolhas e não deixei de ser sua mãe, isso nunca se resumiria apenas
broncas e brigas, choros, noites em claro, é óbvio que não, é algo tão maior
que tudo isso.

Termino de fatiar as cenouras, ele lava as mãos na pia da cozinha e


logo em seguida fica parado ao meu lado pegando as cebolas sob a pedra de
mármore, depois pega uma faca no faqueiro num canto e começa a
descascar as cebolas como sempre faz quando fica em casa.

É verdade que eu quis chorar quando saímos daquele restaurante,


mas não o fiz e não o farei assim como também não quero ter que chorar
porque o Cory decidiu que vai conhecer a mãe dele.

— Eu não estou tão chateada, mas ainda estou pensativa sobre isso.

Analiso os olhos claros me espiando, cabelos lisos e meio ondulados


nas pontas penteados para trás, ele ainda mantém os cabelos penteados para
trás assim como sempre fiz desde que ele chegou nas nossas vidas, mesmo
que dentro de mim veja essas semelhanças claras dele com a Viviane
sempre que o olho ainda sinto como se ele fosse minha maior benção e
presente em anos.

— Eu não queria te magoar — ele garante um pouco medroso. —


Me sinto grato por tudo o que vocês fazem por mim, não quis parecer
ingrato ou coisa do tipo.

— Não precisa se sentir grato porque nós fizemos algo tão simples
como te amar, Cory, o amor não é algo que escolhemos sentir por ninguém.
— falo escolhendo cada palavra com muito zelo. — Agora se estiver se
referindo as coisas materiais, muito menos isso, sempre lutaremos para dar
tudo o que pudermos a você.

Cory fica calado enquanto começa a descascar outra cebola.

— Eu nunca pensei que você chegaria na minha vida e traria tanta


felicidade, porque é filho da sua mãe, mas porque eu nunca me imaginei
amando tanto uma criança não biológica. Só que eu deveria saber que isso
não é requisito para amar ninguém.

— Eu sei que você não gosta da Viviane.

— Não gosto mesmo, precisa ouvir da minha boca? Isso não vai
torná-la menos sua mãe ou mudar a importância que ela poderá ter na sua
vida. — falo sincera e atenta a batata que estou fatiando.

— E você não precisa da minha aprovação para nada em relação a


ela, mesmo que isso não justifique o fato de ter mentido para mim.

— Eu fiquei com medo, mamãe! — explica ele todo atento a cebola.

— Fazemos coisas estúpidas quando estamos com medo. —


concluo. — Às vezes tomamos decisões ruins para nós mesmos e tudo bem,
desde que isso não seja usado para transgredir ou magoar ninguém.

— Eu não irei mais omitir nada de vocês, a Viviane e eu iremos nos


conhecer pessoalmente e pedi ao tio Tom para me acompanhar, vocês se
importam?

— Claro que não, eu acho que você deve fazer o que acha que é
melhor para conhecer a sua mãe.

Dizer cada palavra ainda é complicado, contudo, sei que é


necessário, talvez até mais que isso.

— Obrigado por entender, mamãe, eu amo você e não quero que


fique magoada com isso — ele diz. — E eu entendo que ficou brava.

— Tem mesmo que entender, sou uma excelente mãe!

O vejo sorrir e encostar o rosto no meu ombro, se tornou um homem


alto e tão bonito, o tempo passar muito rápido mesmo.
— E mamãe, não liga para o que aquela mulher falou não, viu? Você
é linda!

— Eu sei que eu sou linda.

— Por falar nisso, acho que conheci alguém.

Franzo a testa toda surpresa, Cory se endireita e fico esperando que


ele fale algo, ok, teve duas garotas que eu conheci, diga-se de passagem,
bem rápido, nada muito sério há cerca de uns cinco ou seis nos atrás, algo
do colégio, agora isso sim é outra grande surpresa.

— Se bem que acho que não tenho muitas chances, ela é do curso de
direito, super engajada em causas e popular, acho que meio que estou
intimidado.

— Uma crush?

— Está mais para nada correspondido, fui a uma reunião com


colegas do curso e ela estava lá, fui esnobado.

— E como ela é? Inteligente? Gosta de animais como você?

— Achei ela educada, mas meio fria.

— Mas tentou se aproximar?

— Mãe, não sou bom nisso!

— Meu filho, você é o rapaz mais lindo de toda aquela


universidade, como assim?

Ele dá uma gargalhada tão alta que me faz sentir um bocado de


vergonha, é uma gargalhada desdenhosa e cheia de menosprezo e ao mesmo
tempo me lembro de uma pessoinha que dava essas gargalhadas cheias de
desespero e desdém há muitos anos.
Ah, Cory, você também?

— Fria tipo convencida? — franzo a testa um tanto curiosa.

— Fria tipo filha de um congressista?

— De direita?

— Eu já posso cantar o hino nacional com a mão no peito?

Meus ombros caem e fico realmente decepcionada.

— Mãe! Relaxa! É só uma paquerinha e, ela me ignora, calma aí!

— Ninguém trata o meu bebê assim, quero nomes.

Ele continua a rir do meu tom de brincadeira.

— Do que estão falando? — Mosés entra na cozinha com a cara


toda amassada e sua nova filhote na mão.

Ele não solta mesmo essa cadela desde o exato momento em que
chegamos. Pediu que alguém trouxesse uma caminha de cachorro e os potes
para ração, a coitada da cachorra já tem um laço bem na testa que uma das
meninas colocou e cara de que é cachorra de mulher.

— Você acordou a cadela de novo?

— Ela quem foi me acordar!

Ele colocou a caminha da Nina perto da nossa cama, acho que ainda
está se acostumando com o fato de que agora tem uma nova filhotinha para
cuidar, para dar amor e sinceramente gosto muito de ver ele segurando-a.

— Você não deixa a Nina em paz, papai, essa é a verdade, já chegou


desesperado para ir colocar ela na caminha!
— Se fosse você iria querer dormir numa caixa de papelão?

— Com tantos cobertores quentinhos? Travesseiro?

Ele revira os olhos, acho que teve seu tempo de dormir, desde que
chegamos ele pegou a caminha de Nina e subiu para nosso quarto, foi se
deitar, as meninas foram para seus quartos e os meninos estão na sala de
jogos jogando videogames. Estou organizando algumas coisas na cozinha e
preparando o jantar, legumes gratinados, quero fazer um risoto e servir com
carne de panela também.

— Cory tem uma Crush na escola! — volto para nosso assunto.

— Eu ainda não recebi nenhum pedido de intenção de namoro —


Mosés abre a porta da geladeira com a mão livre, todo risonho.

— Gente, apenas não! — Cory termina sua quarta cebola e depois


vai lavar as mãos. — De todas as formas, é só uma garota que eu achei
legal.

— Tá legal, garoto super independente — digo fazendo cara de


nojo. — Vai lá sofrer pela filha do congressista.

— A filha do congressista — Mosés repete.

Ele entrega a garrafa para o Cory e depois apoia Nina em seu peito
acariciando a cabecinha dela, a pequenina está com olhinhos fechados toda
mimosa. Sei que fiz uma boa escolha, ela é uma mistura de Yorkshire com
algum outro animal pequeno, não acho que será de grande porte.

Cory abre a garrafa de água e entrega para ele.

— Será o nome perfeito para um novo livro?

Entendo as referências e começo a rir bastante.


— Por que eu nunca entendo o que vocês dois estão falando? —
Cory indaga erguendo as mãos feito um bobo.

— É a linguagem do amor — Mosés responde vindo até mim


segurando Nina com a mão livre. — Quer ajuda?

— Sim, o Cory vai colocar a mesa e mandar as crianças tomarem


banho — respondo. — Pode levar a Nina para as meninas e vir fatiar a
carne, está descongelando na vasilha de tampa amarela.

— Posso abrir um vinho? — Cory questiona.

— Não! — eu e Mosés respondemos ao mesmo tempo.

— Suco de uva então — Cory fala indo até os armários ainda


sorrindo. — Estou feliz que voltaram.

— Eu também — meu esposo responde se inclinando na minha


direção, me dando um selinho suave.

— Ah, ok, não precisam me convencer de nada! — meu mais velho


vai se afastando até a mesa de jantar com os pratos.

Troco olhares com Mosés e fico vermelha, dou mais um beijo suave
nele e volto a fatiar alguns talos de vagem.

Acho que apesar dos pesares, foi um excelente segundo dia de


retorno.
FAMÍLIA

— Ei, eu vou entrando, viu?

Mamãe entra no meu quarto toda sorridente, eu já sei que ela veio
para buscar as crianças, Cory irá dividir o tempo dele com ela e o Phill
durante os dias que estivermos fora. Sorrio logo que ela abre os braços.

Confesso que a minha relação com o meu pai tem sido muito melhor
do que a relação com a minha mãe a longo prazo, contudo, ela também tem
esse espaço no meu coração porque conquistou quando decidiu me respeitar
mais, me ouvir mais e principalmente a entender que acima de qualquer
coisa sou sua filha.

Estou terminando de organizar algumas coisas para nossa viagem,


confesso que não esperava que o Mosés fosse aceitar o convite para ir ao
baile anual do tio Jonas, contudo, é um baile do qual vamos há tantos anos
que francamente, não sei nem se poderíamos dar quaisquer desculpas para
ir.

Só que o tempo passo relativamente rápido nesse sentido e sequer


me dei conta de que havia chegado o dia, em parte entendo porque ele quer
ir, porque validar para nossa família formalmente que estamos juntos é
importante, porém, não queremos levar as crianças e falamos sobre isso
mais cedo, foi uma decisão que ele tomou para não expor elas a coisas
como a que aconteceu ontem.

Como o baile será em Los Angeles, iremos hoje para passarmos a


noite lá e amanhã não termos problemas com questões de horário,
realocamos nossas agendas para apenas assuntos urgentes em relação as
reuniões, são exceções que nós não estávamos fazendo, no entanto, que
agora serão parte do nosso dia a dia.

— Oi, mamãe!
Nos abraçamos fortemente, acho que ela aprendeu boas lições nos
anos de convivência desde que se casou com o Phill e veio morar perto da
gente, também por causa dos nossos filhos, dos meus sobrinhos. Isso meio
que amoleceu o coração da mamãe em muitos sentidos, coisa que ela não
conseguia ser quando eu era criança, mas bem, isso é passado agora.

— O Phill veio?

— Sim e as suas irmãs também vão lá para casa com os meninos,


fique despreocupada, os rapazes irão ocupar cada segundo do dia deles.

— Obrigada, só ficaremos ausentes mais quatro dias, vocês sabem


não tem como dizer não ao tio Jonas.

— Sei bem!

Ela arregala os olhos e isso me faz sorrir mais uma vez, mamãe usa
uma calça jeans e uma blusa moletom cinza, tênis, ela e o Phill embarcaram
nessas de fazer caminhadas pela manhã e optaram por ter uma vida mais
saudável de uns tempos para cá. Claro que ele já é adepto de hábitos assim
devido aos problemas cardíacos, mas ela deslanchou mesmo há uns cinco
anos atrás.

Mamãe assumiu os brancos de vez e adora participar do clube de


leitura que as minhas tias promovem todas as quintas, ela meio que virou
uma Carsson em alguns sentidos também, participa de tudo e não aceita ser
excluída de nada, também acho que ninguém conseguiria afastá-la de nada.

Como é mesmo que eu já ouvi o Mosés chamando-a...

— Ah, chegou a nossa querida Coruja! — escuto meu marido


falando ao entrar no nosso quarto todo empolgado.

Ele carrega as peças encapadas em dois cabides, saiu mais cedo para
ir buscar na loja da Safi, essas serão nossas fantasias para o baile, me senti
super grata quando telefonei ontem à noite e ela falou que tinha nossos
números.

A verdade mesmo é que eu sei que ele já deveria ter encomendado


até mesmo antes de voltarmos, mas fingi que não sabia porque eu também
sei que ele fez isso porque sempre soube que no fundo, no fundo, não havia
feito nada de errado.

— Você ouviu do que ele me chamou de novo? — Mamãe questiona


colocando as mãos na cintura. — Não vai me defender, Bê?

Acho que com o tempo mamãe se acostumou com o apelido, Mosés


gosta de tirar sarro dela nesse sentido, mas é uma relação saudável acima de
tudo.

— Já tem um excelente advogado — Mosés indica os cabides


enquanto os leva para nossa cama. — O Papai disse que vão levar as
crianças para a Disney, quando iria nos contar? E quanto a Nina? Eu não
posso deixá-la com qualquer um, ela é uma filhote ainda! É pequena demais
para viagens assim!

— Ah, por favor, são só quatro dias, para onde mais eu poderia levar
tantos netos? Sempre que vamos sair temos que andar de mãos dadas! —
Phill vem logo atrás se apoiando na bengala, usando como sempre terno
azul escuro e sapatos reluzentes. — E a Nina ficará com a Dulce, já
conversei com ela sobre tudo, fique tranquilo.

Vou até ele de braços abertos, Phil me abraça todo gentil, amoroso,
como sempre tem feito desde que nos conhecemos, temos uma relação
excelente.

— Estamos muito felizes que voltaram, filha! — Phill diz com um


sorriso enorme nos lábios. — Não sabe o quanto oramos a Deus para que
isso acontecesse.
— Obrigada pelo carinho, Phill — respondo e coloco um beijinho
na bochecha dele. — O seu filho, sabe, ele sempre dá um jeitinho em tudo,
até arrumou essa festa de última hora.

— Já enviamos nossa doação a Jonas, explicamos que este ano não


poderemos ir porque temos doze netos para cuidar — os olhos do Phill
brilham quando olham para mim e depois para o Mosés. — Me prometam
que nunca mais irão fazer isso com meu velho coração!

— Não faremos, papai! — Mosés garante num tom sério e


resiliente. — Te dou minha palavra de homem que nunca mais irá
acontecer.

— Nunca, nunquinha! — Garanto com um sorriso arregalado. —


Agora, só a morte!

— Vira essa boca para lá! — Mosés pragueja carrancudo.

— Eu não quero saber de desanimo e nem brigas! — mamãe


determina toda entusiasmada.

— Está me chamando de briguento, Coruja? — Mosés instiga


prendendo o riso.

— Não vai estragar o meu momento feliz — os olhos dela


continuam tranquilos.

Isso é insignificante perto do que poderia ser se hoje houvéssemos


retornado e nos divorciados, nossos pais nos apoiaram de todas as melhores
formas e sei disso. Phill apoiou o Mosés também, mesmo que eu saiba que
ele também discutiu com ele assim como papai quando nós brigamos e saí
de casa.

Por causa do escândalo, da exposição e das suposições.


— Aproveitem bastante para descansar, já pensaram em tirar
algumas férias os dois? — mamãe questiona indo até o Phill.

— Vamos pensar com carinho em tirar um tempo assim que


resolvermos as pendências da empresa — Mosés segura a minha mão e me
puxa para ele. — Eu e a Ana vamos reestruturar nossas funções e tirar mais
tempo para as crianças e nossa família, não é amor?

Ele não quer que a mamãe pense mal dele, tadinho, mesmo depois
de tudo noto que ainda busca aprovação dela em diversos sentidos.

O abraço passando os braços em volta do corpo dele, encostando o


rosto em seu peito, acima de todas as coisas

— Sim, estamos mudando algumas coisas, ah, e Phill, se conhecer


alguma secretária de confiança eu agradeço.

— Vou verificar com as outras filiais, trabalhei com algumas boas


no decorrer dos anos.

— É maravilhoso ver vocês dois juntos novamente! — mamãe diz


nos olhando com orgulho.

— É mesmo — Phill reforça.

Minhas bochechas esquentam, pois bem, esses são nossos pais, são
nossos principais apoiadores, pessoas que se importam muito conosco, que
nos querem felizes e juntos acima de todas as coisas.

— Eu achei que a reunião seria lá embaixo!

É a voz firme e grave do meu pai.

Fico por alguns momentos processando a cena do homem alto e


loiro parado na soleira da porta nos olhando como se esperando que eu fale
alguma coisa.
É que ainda é meio surreal ver que meu pai é um homem bastante
jovem, ainda consigo me perguntar como ele tem uma genética tão boa
nesse sentido, só que também atribuo isso ao fato de que o papai é um atleta
nato.

É um rato de academia assim como os meus tios.

— Vamos ao escritório, temos algo importante a tratar.

Daamon Carsson não está pedindo, porque ele é assim, demorei um


tempo para me acostumar com esse tom autoritário e sério.

Meu esposo dá um passo na direção dele e ele nega com a cabeça e


depois me lança um olhar bastante sério.

— Você não, ela!

— Eu já volto.

Eu acho que já sei o que ele vai falar, porém, me preparo


mentalmente para a conversa.

— Sem discussões — Mosés determina apontando para nós dois. —


Nem berros!

— Não discutimos — eu e papai falamos ao mesmo tempo enquanto


vou ao encontro dele na soleira.

— Vocês não discutem? — mamãe indaga achando graça.

É, com o Tom dá para ponderar, com papai... Lá vou eu!


Papai está perto da porta da sacada do nosso escritório.

Aquele olhar analítico, o jeito sistemático de ser, os lábios cerrados


e olhos fixados no jardim da nossa casa, sei que não deve ter levado mais
que meia hora para chegar aqui em seu carro.

Mora aqui perto assim como mamãe e Phill, assim como todo o
restante da família Carsson, cercados por um território amplo de proteção
extensa de floresta e um muro alto nos limites da propriedade.

Alguns seguranças circulam a noite por todo o lugar para garantir


nossa proteção e tem sido assim desde que me mudei para cá, isso se
mostrou necessário depois de alguns atentados externos contra membros da
família em alguns sentidos.

Graças a Deus, sem ninguém ferido demais.

— Espero que tenha encontrado as resposta que estava procurando,


filha!

Acho tão fofinho quando meu pai me chama de filha, é claro que
não é como meu outro pai chamava, mas faz com que esse instinto paternal
dele soe mais alto perto de mim. Perdemos um bom tempo afastados, eu,
ele e a Ayla, temos nos empenhado para que seja diferente desde que ele
nos achou.

— Encontrei, pai.
— Estamos muito felizes que vocês tenham voltado, mas o que o
Jack me falou não deixa de ser preocupante.

— Sobre o Cory?

— Também, nos preocupamos muito com sua segurança.

— Não posso proibir ele de ter contato com a mãe.

— Ela não é mãe dele!

Você também vai começar?

— Está querendo me culpar por isso?

— Estou querendo te alertar para os riscos de omitir isso do Cory.

— Não se preocupe, o Tom fez isso muito bem ontem.

Papai cruza os braços, está usando uma calça de brim beje e uma
camiseta social de mangas de cor azul escura, nada que lembre algo
relacionado ao hospital, acho que talvez hoje seja uma de suas folgas dos
plantões.

Cabelos loiros bem aparados e os olhos azuis que são num tom
parecido com os meus, mas fora isso e talvez as nossas personalidades
fisicamente sejamos extremos opostos, diria até que as meninas têm mais
semelhança com ele do que eu.

— Filha, não seria...

— Não, papai, não seria!

Ele coça a barba e me lança aquele olhar reprovador, só que o


conheço o suficiente para saber que mais uma vez ele quer controlar a
situação o suficiente para que eu me sinta protegida, como ele fez há meses
quando processou alguns jornais por veicular matérias sensacionalistas
sobre meu casamento.

Papai tem um poder de persuasão infalível, ele sabe como conduzir


situações, é frio na maioria das vezes em momentos de conflito, mas
também quando abre a boca é para acabar com qualquer um.

— Ana, estou pedindo que me deixe cuidar disso! — papai fala num
tom ainda ameno.

— Não vou permitir que magoem o Cory, eu já expliquei isso para o


Tom, logo iria conversar com o senhor...

— E eu não vou permitir que magoem você, isso não tem a ver com
o Cory e sabe disso, o que impede que essa louca coloque a segurança dele
em risco também?

Nada e sei disso.

— Como se não bastasse, ontem me enviaram um vídeo de você


brigando com uma blogueira no meio de um restaurante.

Fico nervosa, porém sei que ele tem olhos em todos os cantos, ele
sabe que eu detesto que fique vigiando minha vida nesse sentido, que odeio
que fique monitorando cada passo meu para saber o que estou fazendo.

— Antes que diga qualquer coisa, foi alguém que entrou em contato
com a equipe de imprensa ameaçando divulgar o vídeo, não acha que
deveria ter mudado sua postura nesse sentido?

— Ela estava filmando as crianças, o que você queria que eu


fizesse? As meninas começaram a chorar!

— Poderia ter me acionado.


— Ah, Pai, sério? — fico chateada. — Olha, sou adulta e sei
proteger meus filhos.

— Só estou dizendo isso porque não quero te ver exposta


novamente, me preocupo com você, depois de todo esses escândalos, como
acha que toda a família se encontra, Ana?

Sei que isso afetou papai, minha mãe, o Phill, meus tios e até meus
avós, divórcio é uma coisa que não ocorre na família frequentemente ou
melhor, nunca. Ao menos não desde que entrei para a família.

Só que não é só pelo divórcio e sim pelo que nós representamos uns
para os outros, Mosés é parte de nossa família em todos os sentidos, há uma
preocupação enorme sobre as crianças também, o bem-estar emocional
delas principalmente.

Isso foi algo com o qual tentei lidar quando tudo explodiu, de todas
as melhores formas tentei organizar isso, mesmo que não tenha funcionado
porque eu me senti destruída com o processo, só que agora não é o caso.

— Eu entendo que tenha se sentido responsável, papai, mas eu


mesma quero resolver isso da melhor forma.

— Cory deve saber.

— Você diria a mim ou a Ayla?

— Filha, é o correto.

— Diria ou não?

Ele fecha a cara e não responde.

— Ah, que bom que chegamos a um consenso!

— Você é uma teimosa mesmo, deve ter puxado aquela sua mãe!
— É que não é tão simples quanto aparecer depois de vinte e sete
anos dizendo que é pai de alguém, eu ainda tenho responsabilidade afetiva
com os meus filhos, pai, e o fato do Cory ter a Viviane como mãe não pode
interferir no jeito como ele possa conhecê-la.

— Não gosto de ter que falar isso, filha, mas se ela se aproximar
demais de você, não serei tão piedoso com ela como você ou Mosés foram e
reze muito para que o Cory não fique no meio disso. — papai declara
secamente e sinto um arrepio estranho na espinha. — Eu não permitirei que
ela aponte uma arma para você novamente, você não será desamparada
como antes e eu cuidarei para que dessa vez, ela fique tão longe, mas tão
longe que nunca mais possamos ouvir o nome dela novamente, entendeu?

— Sim, eu entendo.

Ele me lança um olhar severo, como faz quando não gosta de algo
que eu disse ou fiz.

— Vou para casa, trouxe um bolo e biscoitos que suas irmãs e sua
mãe fizeram.

Começo a sorrir, é que ela é casada com ele e aprendi com o tempo
que tenho mais uma mãe que é uma xará e um amorzinho de pessoa.

— Pai, não fica zangado comigo, tá?

— Eu não estou zangado! — determina ele se aproximando. — Só


que acho que sabe que não poderá esconder isso por muito tempo dele.

— Ele saberá no momento certo, mas agora ele tem que passar por
tudo isso para entender, e se ele se afastar de mim, papai?

— Ana, o Cory não é uma criança, ele não é tão ingênuo, sei que ele
entenderia muito bem que você só fez isso para protegê-lo.
Ergo os braços e papai passa os braços em volta de mim me
puxando para um abraço forte, ok, hoje é dia oficial do abraço dos meus
pais.

— Acho que cheguei no melhor momento! — escuto a voz do


Mosés soando no escritório.

— Se eu tiver que ver essa sua bunda feia mais uma vez na tela do
meu celular, eu mesmo cuidarei de afastar a minha filha para sempre de
você, entendeu, moleque?

— Sim senhor!

Sorrio e papai coloca um beijo na minha cabeça de forma protetora,


Mosés se aproxima com os braços abertos para ele e uma cara de cachorro
medroso.

— Achou que se livraria de mim, sogro? Aposto que você e aquela


Coruja ficaram tricotando pelas minhas costas!

— Para de ser dramático! — papai me solta e abraça ele com força.

Mosés sorri enquanto devolve o abraço firme, então se afastam,


papai nos olha juntos por um instante e depois sorri como se tirasse uma
conclusão engraçada sobre isso.

— Sei que vocês dois estão tentando fazer tudo o que podem para
dar certo, estou feliz que voltaram, todos estamos, sabia que era questão de
tempo até resolverem isso.

Depois ele começa a se afastar até a porta do escritório.

— Nos vemos amanhã em Los Angeles? — indaga ele.

— Com certeza! — aviso com um sorriso enorme. — Amo você,


Bê, se cuide!
— Também te amo, papai.

Ele sai do escritório mantendo o sorriso nos lábios, sei que vai ficar
com as crianças porque ele adora estar com as meninas e os meninos, com o
Cory, mesmo com tudo acontecendo.

— Sobrevivi! — Mosés diz soltando o ar todo tenso.

Bem, acho que também sobrevivi a essa.


CHEGADA

— Gostou do quarto?

— Tem vista para o mar!

Quem diria, uma vista para a Venice Beach!

Acho que nunca poderia ter escolhido algo tão lindo e me sinto
muito grata de saber que ele teve toda essa preocupação e cuidado de
escolher num quarto de hotel com vista para o mar.

— Cansada?

Ele me abraça por trás e coloca um beijo no meu pescoço, puxando


meus cabelos para o lado, enfiando as mãos dentro da minha blusa e
tocando minha barriga, sorrio e me encosto nele como não faço há algum
tempo, relaxada e completamente feliz.

Sem pensamentos intrusivos, sem pensamentos ruins.

Apenas em paz comigo mesma e com pensamentos um pouco mais


otimistas sobre o futuro.

Lá mais adiante posso ver as luzes de Los Angeles brilhando na


lateral do horizonte, de resto as ondas do mar mais agitado a minha frente.
Um vento gostoso sopra em meu corpo fazendo com que me sinta mais
leve, como dias atrás quando estávamos longe daqui.

— Um pouco.
A verdade é que saber que as crianças estão com nossos pais e que
vão para essa pequena viagem com eles já me deixa bastante aliviada,
porque de todas as formas o Cory estará longe da Viviane e porque eu sei
que ele será monitorado de perto por todos.

Também apesar de todos os pesares de saber que o meu pai vai


providenciar para que tanto ele quanto as crianças fiquem seguras, isso já
me ajuda a relaxar de novo.

— Falei com a Dulce, ela disse que a Nina está se comportando


feito uma daminha. — Mosés fala todo feliz. — Acho que quando ela
crescer mais poderemos trazê-la nas nossas viagens assim como eu levava
meu ordinário.

— Sem sombra de dúvidas.

Eu sei que o Mosés levará um tempo para se acostumar com a Nina,


mas também sei que ele já está criando um vínculo com ela, não duvido que
esteja pedindo para a coitada a Dulce uma porção de fotos da cachorra, lá
em casa durante esses dias depois que ela chegou, ele não saia de perto
dela.

— A Dulce já deu a ração dela.

— E aposto que você pediu muitas fotos.

— Mas é claro, tenho um álbum só dela.

— Agora só falta chamar a cadela de ordinária também.

Ele ri.

— Ah, esse posto é só seu amor, de mais ninguém.

— Sei, sei, me engana que eu gosto.


— Mudando de pau para cacete, que tal comermos algo e depois eu
te comer? — ele sugere e traça beijinhos por meu pescoço lentamente.

— Achei que iriamos comer e dormir.

— Vampiros não dormem!

Gargalho com essa cantada fiada dele, Mosés ri baixinho e mordisca


o lóbulo da minha orelha devagar, faz com que pare de rir e suspirar um
pouco.

— Pensei em algo bem romântico para hoje à noite, quer ouvir


minha proposta?

— Claro, senhor vampiro!

— Primeiro nós beberíamos um bom vinho, depois você iria me


deixar te comer nessa sacada, então iriamos para a hidro e eu te comeria lá
também.

— Haveria algum lugar desse quarto em que você não me comeria?

— Ainda não consigo voar, então apenas o teto!

Volto a rir porque é inevitável, só que eu sei que para o Mosés ficar
cinco meses e meio sem sexo direito talvez tenha sido como viver uma
eternidade sem fazer uma necessidade básica.

Antes disso tínhamos relações casuais, algumas um pouco quentes, é


claro, mas na maioria das vezes algo por vontade mesmo.

— Há algo mais que precisemos fazer por hoje?

— Transar, foder, trepar, fazer amor, como quiser chamar, meu


amor.
— Eu estou falando sobre os relatórios que a Sêmora nos enviou...

— Ah, tem isso também!

A voz dele assume um tédio imenso, me viro e ergo os braços


passando em volta de seu pescoço, Mosés estende as mãos deslizando-as
até minhas nádegas vagarosamente, sorrio para ele ainda encantada com
suas ideias.

— Estou profundamente decepcionado com você, achei que teria


quatro dias de sexo intenso!

— Você tem que me dar um sossego, senhor HC.

— E quem disse isso?

— Minha boceta disse.

— Você me excita tanto quando fala palavrão!

Ele se inclina e me dá um beijo suave nos lábios, continuo a rir, colo


a testa na sua fitando-o.

— Amanhã depois do baile, te faço outra surpresa, nesse momento


nossas responsabilidades nos chamam!

— Então tem que me prometer ao menos que será algo bem


especial.

— Eu prometo.

Sei que pensarei em algo, a safada que habita em mim fará isso
muito bem.

— Eu vou cobrar — ele vai andando para trás enquanto me conduz


para dentro do quarto de hotel. — Com juros.
— Pode cobrar — vou dando passos para frente indo com ele.

Sorrimos um para o outro, Mosés me solta assim que ficamos diante


da cama de casal.

— Quer que eu desfaça as malas enquanto você analisa os


relatórios? — questiona.

— Sim senhor — suspiro e pego minha pasta em cima da cama. —


Olhou os e-mails?

— Sim, parece tudo ok com as receitas do mês passado, agora temos


que tomar algumas decisões sobre a mudança de diretoria.

Faço uma careta e me sento na cama puxando o notebook para fora


da pasta, Mosés está colocando as malas sob a escrivaninha vazia e abrindo-
as cuidadosamente.

— Eu não sei o que essa gente quer.

— Dinheiro, amor, dinheiro!

É tão óbvio, claro, algo que os diretores vêm buscando


constantemente, mas agora que promoveremos alguns mais para
administrarem os novos cargos, os antigos decidiram que querem fazer
mudanças.

— O que faremos em relação a isso? — questiono e pego meu Ipad


na pasta também.

— Nem olhe para mim, eu só sou o cara que quer te dar sexo.

Ele abre as portas do guarda-roupa embutido e começa a guardar


peça por peça com todo cuidado do mundo, é zeloso. Começo a rir com o
sentido da resposta, me vem aquela lembrança idiota da última vez que
realmente transamos na empresa, foi na minha mesa, algo rápido e intenso,
mas faz tanto tempo isso.

— Pense nisso como eu — sugere e pega uma muda de lingerie


minha depois cheira e coloca numa das gavetas do guarda-roupas. — Eu
não vou deixar de fazer sexo para ter que trabalhar mais.

— O que significa...

— É só dar o que eles querem!

— Eu não vou fazer todas as vontades da diretoria só porque eles se


sentem ameaçados pelos novos eleitos, não estou pedindo nenhum favor
para nenhum deles, pagamos muito bem e eles tem um excelente plano de
aposentadoria e de carreira.

— Acho que teremos problemas!

— Eu sei que teremos, mas não vou me desgastar com pessoas que
acham que eu tenho que estar à disposição deles.

— Agora sim você está parecendo o seu pai e os seus tios falando!

— Você entendeu.

Me sento na cama e abro meu notebook, desbloqueio meu celular e


meu Ipad, vou abrindo nos e-mails e nas conversas do chat corporativo da
Handerson, sinceramente sei que o Mosés tem razão em partes, mas não
quero que o fato de que eles saibam que precisamos deles dê a eles
quaisquer chances de acharem que podem nos cobrir de exigências
impossíveis.

— Estava pensando sobre o que a Sophie disse sobre você ter outros
bebês — Mosés coloca mais uma roupa dobrada dentro da segunda gaveta
escondendo um sorriso. — Já pensou se isso acontece?
Eu evito bebês por muitos motivos e um deles é que meu trabalho
tem sido minha prioridade assim como minha família também tem sido.
Depois da gravidez dos gêmeos chegou esse momento em que decidi
mutuamente com o meu esposo que não queríamos mais ter filhos, desde
então eu tomei contraceptivo durante um tempo e nos últimos anos uso
DIU.

— Eu ficaria muito feliz — ele fala todo tímido.

— Eu chorava!

Mosés me analisa rapidamente e dá uma risada alta, não foi


voluntário, mas é que sentia tantas dores no final da gestação das meninas e
depois dos meninos, o pós-parto, nossas discussões, as crises e briguinhas
por conta do puerpério, não é um mar de flores assim não.

Eu sei o que é cuidar de seis bebês ao mesmo tempo, eu sei o que é


preparar mamadeiras múltiplas todos os dias, trocar fraldas e fraldas todos
os dias, eu também sei o que é ter que acordar de madrugada para ninar seis
bebês com cólica enquanto seu pequeno de oito está chorando com uma
infecção intestinal.

Mosés também sabe como é isso, ele estava lá comigo em todos os


momentos, mas sempre, sempre, todo mundo quer a mãe. Só o colo da mãe
sara, consola, conforta, o colo da mãe é o lugar acolhedor e quentinho.

Ele é aquele pai que algumas vezes abraçava na esperança de fazê-


los se sentir confortados, que tentava dar amor e carinho, mas eu quem
tinha os seios, seios que doíam durante a amamentação.

Durante a amamentação de Akim e Gustav eu sei o que eu passei


com dores, meus seios sangrando, doendo, tanta coisa...

— Nem consigo imaginar como seria recomeçar, mas confesso que


sinto falta de segurar um bebê no colo.
— Pode pedir a sua irmã que te dê mais um sobrinho.

— Eu não quero outro sobrinho, sua azeda!

Começo a sorrir e coloco o Macbook em cima do travesseiro então


começo a responde o chat rapidamente com alguns relatórios que já havia
analisado em nosso voo há caminho daqui.

— Só estou dizendo que ainda somos jovens e que se acontecer eu


também ficarei muito feliz.

Penso com cuidado sobre isso porque o Mosés está expressando o


jeito como ele se sente e não quero ser insensível ou grosseira, sei que ele
sempre quis mais filhos, mas a bem da razão sempre soube que nós não
conseguiríamos administrar nada com mais crianças na época.

— E como acha que seria para mim ser mãe aos quarenta e tantos
anos?

— Normal?

— Acha que as pessoas achariam normal? Me chamariam de velha!

— E mais uma vez você está querendo dar ouvidos a quem não faz
parte das nossas vidas.

— Eu só estou querendo dizer que para você é muito fácil, quando


um homem decide ter um filho não importa a idade ele nunca vai deixar de
ser homem, já uma mulher basicamente é chamada de “avó” da criança ou
está velha demais para ter filhos. — justifico até calma. — Quer dizer, será
que as pessoas acham que uma mulher casada não faz sexo?

— Você? Fazendo sexo? Que horror! — noto o deboche bem-


humorado na voz dele e acho graça. — Só estou querendo dizer que agora
que as crianças estão maiores, se acontecesse eu não acharia ruim.
— É claro, porque eles sempre adoram você, não é mesmo?

— Eu não tenho culpa de ser um excelente pai.

Rimos das nossas alfinetadas, mas é a mais pura verdade,


brincadeiras à parte.

— Entendo suas fragilidades e eu respeito sua forma de ver as


coisas, sei que tem dado muito duro para cuidar das crianças e da casa, só é
algo que pensei mesmo.

— Acha que conseguiríamos a essas alturas da vida cuidar de um


bebê?

— Sinceramente, não vejo porque não.

— Só não quero focar nisso agora porque também quero aproveitar


nosso casamento da melhor forma.

— Eu sei, meu amor, eu também quero aproveitar da melhor forma.


— Mosés se aproxima da cama e se senta diante de mim. — Fico triste que
se sinta tão refém do que as outras pessoas pensam de você, mas eu
entendo, tenho lidado com isso com praticidade sem pensar que talvez não
seja tão simples.

Não achei que ouviria isso vindo dele com tanta simplicidade e
carinho.

— Mas é que para mim você sempre foi completa, sabe? Então é
complicado imaginar isso na prática, é difícil até de imaginar que alguém
não te veria como eu te vejo.

Se você soubesse o quanto é importante para mim ouvir isso, tão


valioso!
— Só quero que você entenda que a vida não pode ser desse jeito,
que você não é isso e nunca representará nada do que as pessoas falam de
você.

— Eu sei disso, é só que eu sinto que em muitos momentos sempre


tive que buscar validação em diversos sentidos, minha aparência foi um
destes sentidos, agora quero que seja diferente nesse sentido.

— Sei que é cansativo demais para você ter que passar por esses
processos desgastantes, antes de ontem no restaurante eu me senti bastante
desconfortável em ouvir aquela mulher falando aquilo sobre você.

— Eu me senti mal, só que dessa vez eu não estava assim tão


abalada.

— Eu gostei muito da sua atitude, apesar de saber que o seu pai não
aprovaria.

Carsson + Imprensa = NÃO!

— Ele chamou minha atenção hoje cedo sobre tudo isso, também
falamos sobre o Cory, nem tivemos tempo de falar disso direito.

— E aí?

Mosés se ergue e pega a outra mala, coloca sob a escrivaninha e


abre o zíper, logo em seguida começa a desfazê-la.

— Ele disse que deveríamos contar ao Cory sobre a Viviane e se


mostrou bastante preocupado com nossa segurança, não gostei do tom dele.

— Você não gostou porque é autoritária assim como ele.

— Ah, eu sou?
Pego novamente meu Macbook e volto a analisar os relatórios que
foram enviados ontem e hoje pela governança, outros pela ouvidoria, são
coisas que costumo analisar, mas que basicamente acumulei quando decidi
viajar com o Mosés. Sei que para ele não tem sido assim tão difícil olhar
tudo isso ou participar das reuniões da empresa, ele é mais rápido nesse
sentido, já eu costumo ser um pouco mais analítica e detalhista.

— Não posso discordar dele, há muito envolvido, mas nem ele e


nem ninguém da família poderiam determinar a forma como devo cuidar
dos meus filhos. Se dependesse do papai, as crianças não poderiam nem
respirar longe dele.

— Acho que devido ao histórico de tentativas de homicídio contra a


sua família, o seu pai tem pegado até leve.

É, de fato!

— Você só o defende porque é tão ou mais possessivo e controlador


que ele.

Mosés se vira para mim segurando o cabide encapado, ele me lança


um olhar reprovador e o ignoro completamente, acredito que a maior
vantagem do agora é que nós podemos ter essas conversas sem gritaria e
ofensas. Em outros momentos isso provavelmente já teria tomado
proporções catastróficas, ele me chamando de louca, gritando comigo e eu
dando uma crise de raiva berrando de volta.

— A concebida sem defeitos já acabou de falar? — questiona ele e


pendura o cabide dentro do suporte do guarda-roupas, então pega o outro.

— Você não se vê quando está com ciúmes, mesmo que isso seja
fofo e doentio algumas vezes — respondo e analiso um outro e-mail que a
Marcy me enviou mais cedo. — A Marcy enviou e-mails sobre o novo
programa ambiental, já deu uma olhada?
— Já sim, enquanto a madame dormia no voo — ele responde e
coloca as nossas nécessaires individuais sob a escrivaninha.

Ele ficou magoado.

— Amor, não quis te magoar.

— E não magoou, é só que eu acho que também não é assim, não


sou tão possessivo.

Melhorou com o tempo, mas ainda é.

Ele se aproxima tirando a camisa que vestiu para vir para cá, já está
descalço desde que chegamos, a minha boca se enche quando ele ergue os
braços e observo os músculos do abdome dele se contraírem e se
expandirem, o peitoral firme e essas entradinhas, mas desvio o olhar para a
tela porque ainda é — e acho que sempre será. — constrangedor olhar para
o meu marido como uma cadela no cio disposta a transar com ele só porque
ele se tornou esse incrível gostoso depois dos quarenta.

Ele se senta ao meu lado, mas de frente para mim, mexendo no


celular todo atento, gosto tanto do que vejo que me sinto feito uma
adolescente desesperada por atenção.

— Vinho ou café?

Você!

— Hum..., bem, acho que um café, podemos trabalhar até tarde hoje
e descansar um pouco amanhã até a hora do baile.

— Ok.

— Está bravo pelo que eu falei, me desculpe.


— Não tem que se desculpar por dizer a forma como me vê, amor,
mas acho que já está comigo tempo o suficiente para saber que eu não irei
mudar.

Os olhos azuis me analisam rapidamente e depois ele se volta para a


tela do celular com um pequeno sorriso nos lábios, isso me parece
misterioso demais.

— O que é? Algo sobre as crianças?

— Nada.

Não me convenço, mas também nunca fui dessas que fica


bisbilhotando nada o que se refere as particularidades do Mosés.

— Vão trazer o café e sanduíches, vou nadar um pouco na


cobertura, você não quer vir comigo?

Vai ficar pelado?

Meu Deus!

Mosés fica me olhando esperando que eu responda, olho por alguns


momentos para ele e mentalmente estou presa de alguma forma a pergunta,
ao rumo que os meus pensamentos tomam. Ao mesmo tempo os olhos dele
tem esse poder esquisito e diferente de me encarar, como se dissessem
claramente que não me quer vendo relatórios nessa cama.

Ele quer me comer nessa cama.

Jogo o Macbook para o lado e avanço para cima dele colocando um


beijo intenso em seus lábios, Mosés não está surpreso e recebe o meu beijo
com intensidade, a língua dele se enfia na minha boca de um jeito agressivo
e intenso, do jeito que eu adoro.
Minhas mãos tocam os ombros dele e aperto a firmeza quente dos
músculos explorando a boca dele sem receio ou obstáculos, sou puxada
pelos quadris e ele abre o fecho do meu jeans rapidamente puxando-o para
baixo com uma mão enquanto a outra se enfia dentro da minha calcinha.

O toque é quente e urgente, rápido, os dedos suaves se enfiando


dentro da minha carne com naturalidade necessária, arfo e me ergo
apoiando-me nos joelhos, meu corpo subindo e descendo enquanto os dedos
esfregam minha intimidade.

Eu me sinto uma absoluta tarada irresponsável, essa vagabunda


interior que esteve adormecida por toda a minha vida me subjugando e se
escondendo dele sendo expulsa para fora sem um pingo de vergonha.

E ele é apenas...

— Moshe! — sussurro e volto a beijá-lo.

Nesse momento ele enfia um dedo dentro de mim, então o move


para dentro e para fora, seguro as pontas da minha blusa e a puxo para cima
retirando-a do meu corpo, as roupas parecem um obstáculo cansativo de se
tirar.

Mosés me masturba com uma mão enquanto a outra se livra de seu


jeans também, jogo a blusa para longe e tiro o sutiã bem rápido, ele tira a
mão de dentro da minha calça muito consciente de que me excitou o
bastante para me deixar molhada então puxa o cós da minha calça para
baixo levando a calcinha com tudo.

Pulo para o lado da cama empurrando o jeans com as pernas


enquanto ele fica em pé e tira o dele também todo apressado, me livro da
calcinha e da calça o mais rápido que posso então sinto um puxão firme no
braço fazendo com que eu fique de pé.

Ele me olha como se eu fosse uma puta sem um pingo de valor e


sinceramente é exatamente assim que gosto que me olhe desde que
reatamos.

Então ele me empurra contra a parede mais próxima e se inclina


separando minhas coxas com as pernas, assim ele sobe e me penetra com
força, me seguro nele soltando um grito alto, um misto bem frenético de
prazer e tesão.

Mosés precisa se abaixar um pouco para me beijar, então me dá


outra metida bem servida, minha bunda bate com tanta força na parede que
faz um barulho alto, um estalo forte, enfio as mãos em seus cabelos e
observo-o meter dentro de mim sem um pingo de dó.

Empurro ele um pouco e observo o pau firme me invadindo sem


pudor, fazendo meu corpo subir e descer rapidamente com o impacto da
penetração, os lábios dele se abrem e ele geme enquanto coloca beijos
quentes no meu pescoço. Suas mãos apertam meus seios com força bruta,
seus gestos são extremamente agressivos, mas merda, estou amando!

Mosés segura meu pescoço com força e pressiona minha carne com
uma penetração mais ligeira, franzo a testa e arfo sentindo o impacto
profundo dentro de mim fazendo com que meu corpo se estremeça por
completo de tanto tesão.

Ser sufocada é tão... tão... ah, eu estou adorando!

Inclino o corpo para frente e ele vem mais forte me dando um tapa
bem servido na cara, apertando meu pescoço com mais força, puxo o ar
sentindo-o vibrar comigo, minha intimidade tão sensível que ele desliza
para dentro e para fora.

Sou liberta quando estou prestes a gozar, então ele para e fica me
observando espremida entre ele e a parede, toda trêmula, nas pontas dos pés
para alcançá-lo, toda arfante e molhada.

Estremeço sentindo vontade de destruir algo enquanto meu corpo


todo aguenta a força do orgasmo, ele me pressiona se mantendo dentro de
mim, sentindo meu vibrar e soltando um gemido baixo entre os lábios.

Observo os ombros largos e os braços firmes enquanto os músculos


dele se contraem para mim num esforço nítido de se conter, o suor que
escorre rapidamente por sua testa até suas têmporas, a imagem da virilidade
do homem com quem tenho divido todos os dias há anos, mas diferente do
jeito que sempre o vejo.

Sexy, viril, tão, tão gostoso e intenso!

O vejo recuar e se afastar e sair de dentro de mim, sua mão toca


minha face e depois se enfia na minha nuca pegando um punhado do meu
cabelo e puxando-o sem hesitar, vou com ele sendo puxada até a sacada,
arregalo os olhos quando Mosés me empurra para fora e me seguro no muro
de concreto me arrepiando dos pés à cabeça com o vento frio que sopra.

Ele separa minhas pernas com o joelho e as afasta puxando meus


quadris para trás num solavanco enquanto sua outra mão puxa meus cabelos
com força, me apoio na mureta sem conseguir pensar muito.

Depois sinto a metida bem vigorosa dele em mim novamente, olho


para todos os prédios no horizonte e me seguro na mureta engolindo a
vontade de gritar, ainda quente e escorregadia, ainda excitada ao extremo
com ele.

Mosés me empurra e meus seios tocam o batente da mureta fria, isso


estranhamente me causa prazer, enquanto pressiona meu corpo para frente
vindo mais fundo, não consigo pensar sobre vergonha, pudor ou o que quer
que seja, ele não está preocupado com isso e acho que já joguei tudo para a
casa do caralho quando comecei a beijar ele na cama.

Eu não me importo mais.

Ergo a cabeça e sua mão solta meu cabelo e toca meu pescoço, ele
vem me penetrando longamente como se me experimentasse, com a mão
livre aperta o meu seio e o contato quente de sua mão quente e suada me faz
gemer.

Olho para baixo e vejo a rua movimentada, isso faz minhas pernas
sentirem um frio esquisito, algo que me dá medo, mas só consigo me sentir
ainda mais úmida, como se o risco aumentasse o desejo de prazer que ele
alimenta nesse exato instante.

Meus quadris começam a se mover com os dele de um jeito


envolvente e natural, porque sei como ele gosta, o jeito que nos dá mais
prazer. Ele se afasta e começa a meter mais forte novamente, me seguro e
sei que estou sendo imprudente de transar assim feito uma atriz pornô numa
sacada.

Mas o que posso fazer? É mais forte do que eu!

— Não para! — ordeno enlouquecida pelo tesão que me toma a


intimidade.

Talvez seja o frio que causa arrepios dos pés à cabeça, a sensação de
altura, a adrenalina e toda essa sensação que nunca experimentei antes, a
falta de pudor e de vergonha, eu não sei, mas vai me subindo um calor
estranho das solas dos pés até os tornozelos, logo em seguida por minhas
canelas até atingir minhas coxas.

— Não para! — grito aguentando a metida medonha. — Caralho!

— Você gosta, não é? Adora me ouvir metendo fundo dentro de


você, não é Ordinária? — indaga ele vindo mais forte, a voz grave e baixa.

— Eu adoro, amor, me fode gostoso, me come com força, mete na


minha boceta, por favor! — imploro desconhecendo o som da minha voz.

É arrastada e arfante, aguda, meu coração pula tanto no peito que


sinto como se fosse saltar para fora. Esse calor absurdo se torna uma
latência constante que sobe pela minha pélvis até minha entrada.
Franzo a testa e começo a reconhecer uma estranha sensação de
querer fazer xixi, me seguro com mais força na pedra de mármore e tento
segurar ao máximo, me contraio aguentando um pouco mais porque sei que
ele também está perto.

Os sinais são muito claros, do meu corpo, do corpo dele.

— Bê — ele chama e morde meu ombro com força.

— Ai! — gemo alto me seguro sentindo uma fraqueza forte nas


pernas.

Ele me segura e para todo arfante, segura a minha face e quando o


olho, parece que ele correu ao menos uma corrida de cinco quilômetros sem
parar. Também estou respirando pela boca, afoita, suportando o prazer que
ameaça explodir em mim.

— O que foi? Está doendo?

— Preciso fazer xixi!

— Xixi? — ele leva alguns segundos para absorver minha resposta.


— Agora?

— Deu vontade! — justifico sem graça.

Mosés passa o braço em volta do meu corpo e me ergue, arregalo os


olhos enquanto ele começa a caminhar comigo para um canto do lado
esquerdo da sacada. Quando ele me solta estamos num canto mais escuro e
secreto da sacada, mas só consigo sentir que deslizo um pouco mais para
ele.

— Aí tem um ralo.

Arregalo os olhos e olho para trás me segurando na parede da


mureta, ele move os quadris para baixo e depois sobe me preenchendo mais
uma vez, sinto o impacto da metida e meus seios pulam com a trepidação.

— Pode segurar o quanto puder — avisa baixinho e sua mão acerta


um tapa bem servido no meu monte de vênus, pulo. — Ah, acho que nossa
primeira vez assim será fantástico.

— Não está sugerindo...

— Eu estou.

Franzo a testa e ele volta a se mover me dando um tapa forte na


nádega, recuo e fico por alguns instantes olhando para o ralinho
arredondado no chão tentando absorver a informação.

Sua mão segura meu seio e ele o aperta se enfiando debaixo do meu
braço pela lateral do meu corpo, abocanhando-o e sugando-o com força,
sopro me movendo com ele novamente, dizendo para mim mesma um
enorme “por que não?” mentalmente.

O que haveria de errado?

Ele rebola rapidinho como se estivesse me experimentando mais


uma vez, sua mão escorrega e ele toca meu clítoris devagar me estimulando
um pouco mais. Acho que não vou conseguir segurar tanto tempo.

Quer dizer, é surreal demais segurar isso enquanto ele me penetra e


me masturba, chupa meu seio.

Estou tão sensível!

Um peso estranho me toma e tento segurar mais uma vez, me


contraio com força o máximo que posso, só que isso só faz com que eu
sinta ainda mais prazer, só me faz sentir ainda mais tesão.

— Tá apertadinha, amor! — ele geme e morde meu mamilo com


força.
— Aí, porra! — grito sem me conter.

Eu não conseguirei segurar, não conseguirei!

Me sobe um tesão estranho e poderoso pelo corpo, um arrepio mais


que extremo.

Todas essas transas estão sendo uma sequência de primeiras vezes


inéditas para mim.

Vai se tornando uma tortura palpável, eu tentando prender e isso só


vai se multiplicando dentro de mim, como a sensação de querer fazer xixi e
ter que segurar por não ter para onde ir, mas com o reconfortante alívio de
saber que estou exatamente fazendo xixi.

Como é mesmo que eles chamavam? Pompoarismo?

Agarro sua nuca com as unhas e pego um punhado de cabelo, apoio


o pé na parede sem conseguir segurar mais, meu corpo sobe com mais uma
penetração e libero o que me tortura. A mão dele continua a me soltar e
tento me soltar dele, meu corpo libera espasmos fortes enquanto gozo
livremente.

Enquanto esguicho a urina com força.

Mosés não me liberta e goza comigo, enquanto ouço o som baixo de


um gemido longo e contínuo se espalhando por toda a sacada, algo que
ainda consegue me deixar ainda mais excitada.

Minhas pernas tremem violentamente, meu clítoris pula entre seus


dedos enquanto esguicho mais uma rajada forte do meu corpo, ouço o som
do meu soluço e de um choro baixinho ecoando pelo lugar.

As estrelas vibram de forma excessiva, puxando os cabelos da nuca


dele, meu corpo todo explodindo com o dele num orgasmo vaginal
extraordinário.
Um sorriso enorme nos meus lábios e meu corpo tão trêmulo que
parece que vai explodir.

É ele tinha razão, nossa primeira vez com isso foi simplesmente
maravilhosa.
ALGO PRECIOSO

— Eu não disse que seria fantástico?

Sorrio toda esparramada em seu peito, coloco um beijo suave bem


aqui e um cheiro, depois de um sexo tão intenso e um banho quente tudo
parece um pouco mais leve. Acabei cochilando depois que viemos para a
cama, acho que o Mosés também, despertei há alguns instantes com um
toque suave nas costas.

Ele está com a mão enfiada nos meus cabelos acariciando meu
couro cabeludo sem pressa, as pernas abertas, todo relaxado enquanto estou
deitada sob seu corpo de bruços, tocando sua coxa.

Ainda é como me sentir uma adolescente com os hormônios a flor


da pele, ainda é maravilhoso sentir essa exaustão e a sensação de satisfação
que se espalhou pelo meu corpo depois que ele me deu tanto prazer, só que
é tão diferente porque temos isso.

Uma conexão, um ao outro.

— Ainda não acredito que fizemos aquilo na sacada — sorrio mais


uma vez. — E se alguém tiver nos visto?

— Estamos no último andar, acho um pouco difícil, mas e daí? Não


será a primeira vez que vão ver a minha bunda em rede nacional.

Rio e ele também, me ergo e vou colocando alguns beijinhos por seu
peito e subindo pela trilha até seu pescoço, apoio a cabeça no travesseiro de
lado e ele me olha afastando meus cabelos para trás.

— Me sinto um pouco envergonhado.


Eu sei o que ele quer dizer, é sobre o que fiz na sacada, mas
principalmente porque foi nossa primeira vez fazendo sexo assim, nos
arriscando dessa forma, confesso que nunca pensei que há essas alturas da
vida eu transaria numa sacada e tão pouco que acabaria urinando durante
uma relação.

— Diga algo — ele pede e toca minha bochecha com o indicador.


— Se não quiser não faremos de novo.

— Eu gostei bastante, achei que houvesse notado — sei que a minha


bochecha está esquentando.

— Gostou mesmo? — ele me dá um selinho e toca a minha nádega


com suavidade enquanto essa mão acaricia um cantinho atrás da minha
orelha.

— Sim. — me custa admitir. — Mesmo que tenha sido tão extremo.

— Não quero ponderar com você, amor, somos casados, essas coisas
são normais entre casais.

— Eu sei, estamos redescobrindo nosso casamento — toco seus


lábios com a pontinha do indicador. — Eu adorei cada segundo.

— Acho que adoro isso em você, acima de todos os problemas você


sempre foi minha parceira, cumplice de todas as minhas loucuras, não é
mesmo?

— Como quando durante o batizado dos meninos você deixou o


Akim cair dentro da fonte da igreja?

— Eu não o deixei cair, ele se jogou!

Caio na risada, Mosés também, sempre que me lembro das


peripécias das crianças durante a primeira infância me acabo de rir, foram
tantas quedas, nos momentos dos dentes de leite, das desculpas esfarrapadas
do Mosés quando o pegava jogando alguma criança para cima como se
fosse uma bola de basquete.

Nunca o recriminei de forma tão severa é claro, sei que essa foi uma
forma que ele encontrou de viver sua infância também. Como quando ele
comprou as bicicletas das meninas e comprou uma novinha para ele da
mesma cor e modelo para adultos só para poder andar de bicicleta com elas
ou quando ele deu aos meninos uma bola e ficaram por horas chutando bola
no jardim de casa.

Ele sempre tentou aproveitar ao máximo a infância das crianças


nesse sentido.

— O garoto levou a sério essa coisa de batizado! — exclama ele


ainda achando graça.

— Se não fosse por mim ele teria se molhado muito mais.

Consegui resgatar Akim depois que ele basicamente mergulhou


cabeça e os braços, eu me lembro da cara de chocado que o Mosés fez e de
como todos inclusive o padre começou a rir muito da situação.

Akim saiu da água todo afoito e risonho, nem parecia que tinha
caído de cara na fonte, claro que não era de rir, mas eu acabei rindo muito
de nervoso, sequei a cabeça dele e os braços juntamente com os ombros,
levamos alguns minutos até retornar ao ritual, acho que foi a primeira vez
que vi o meu pai rir tanto na vida, ele e os meus tios pareciam eufóricos
com a cena.

Para nossa alegria temos os vídeos, para o azar do Akim até hoje os
tios dele e os avós acabam dando muita rizada desse momento com humor,
mas ele sabe que tem um lugar especial no coração de todos assim como
seus irmãos que também capricharam em outros momentos em eventos da
família ou em casa.
— Acho que fiz um bom trabalho, ele se tornou um excelente
nadador — Mosés comenta fazendo uma cara de modéstia que só ele.

— Não esqueço a cara dele quando consegui pegar ele da fonte, ele
saiu com os olhos arregalados olhando para os lados todo assustado, mas
rindo.

— Lembra quando a Sophie caiu de bicicleta pela primeira vez?

— Nossa, quanto drama!

— Acho que foi a segunda vez que chorei muito na vida.

— E as outras mil vezes? E quando o Cory caiu do skate? Você não


parava de chorar dizendo que era sua culpa porque estava comprando
sorvete!

— Mas eu estava comprando sorvete!

Cory chegou com joelhos ralados, braços ralados e olhos


avermelhados, ao Mosés restou ao menos uma sessão inteira de choro no
nosso quarto enquanto se culpava por ter virado as costas para ele cinco
minutos para comprar um sorvete.

No dia seguinte, Cory havia lambido as feridas, Mosés estava


adulando-o e passando antisséptico nos arranhões, tratando ele feito um
bebê.

— Você acha que eu não me lembro que você uma vez deixou as
meninas sozinhas na banheira e quando eu subi no quarto elas haviam
inundado o banheiro?

— Isso não foi minha culpa, ainda não sei como tiveram força para
abrir aquelas torneiras.

— Elas são nossas, têm forças para fazer qualquer coisa.


— É verdade!

Vivemos tantas coisas boas nesses anos, mas não deixa de ser
assustador que não pensei sobre isso com tanto cuidado e zelo como agora.
Acho que é assim que a maioria das mulheres que são casadas há muitos
anos se sentem quando precisam tomar alguma decisão definitiva sobre a
relação.

Porque no fundo no fundo, não é só sobre o casamento, é sobre tudo


o que construiu durante todo o ele, as relações, lembranças, vínculos, os
filhos, os bons momentos e todas as coisas que te fez feliz durante aquele
tempo.

— Ainda quer trabalhar?

— Você é tão cínico!

Ele ri e me dá outro beijo, mas um lento, gentil, carinhoso, um beijo


de língua bem molhado, enfio a mão em seus cabelos e o correspondo da
mesma forma, gosto tanto disso, é tão bom namorar com o meu marido.

Tinha esquecido disso, dessa sensaçãozinha gostosa de poder beijar


ele com calma depois do sexo, das nossas conversas sobre qualquer coisa,
de como ríamos muito de situações engraçadas, mas principalmente de
como éramos um para o outro.

— Te amo tanto! — ele sussurra entre o beijo. — Você não tem


ideia do quanto eu estou feliz por ter voltado para casa, amor, do quanto
senti falta de você durante esses meses.

Me sinto bem em ouvir isso, mas também me sinto mal.

— Te amo — repete e me aperta com força.

— Eu amo você.
É tão forte vivenciar isso depois de tudo o que passamos juntos.

Devolvo o abraço, guardo mais um momento na memória, algo tão


precioso que sei que nunca esquecerei.

— Pensa com carinho sobre o que falamos mais cedo, tá?

— Eu sabia!

Acabo por rir e ele também, mas confesso, talvez eu pense mesmo
com carinho nisso num futuro próximo, agora me parece muito mais
interessante só praticar.
O BAILE

Quando acordei estava sozinha na cama.

Havia um outro bilhete do Mosés escrito à mão — coisa que


realmente me surpreendeu porque é algo que ele só tem feito desde que
viajamos para o México. — falando sobre seu motivo de ter saído mais
cedo.

“Bom dia, meu amor, espero que tenha acordado bem, sei que
acordou, seu tio me ligou e pediu que eu fosse me reunir com ele, não quis
te acordar, você está dormindo tão bem. O seu pai me enviou mensagem e
avisou sobre nos reunirmos, acho que agora definitivamente entrei para o
clã. Aproveite o resto do seu dia para ir ao Spa do hotel e descansar, estou
levando minha roupa, nos vemos a noite.

Com amor, seu Mozão.”

Fiquei sorrindo de ponta a ponta enquanto me via pulando para o


lado e abraçando o travesseiro dele. Mais uma vez as boas sensações me
invadiram e explodiam dentro de mim.

Peguei meu celular e selecionei o cardápio do hotel, escolhi meu


café e fui para o banho, por alguns instantes fiquei sorrindo e me abraçando.

Ah, como não? Depois de uma noite tão fantástica?

Logo depois do banho decidi que apesar de ser muito tentador


descer para o Spa ainda havia bastante coisa a fazer em relação ao trabalho,
portanto, me sequei bem, me vesti e decidi que precisava trabalhar um
pouco durante o dia.
De todas as formas como o evento seria mais a noite solicitei o
auxílio de uma maquiadora e de uma cabelereira para os horários de depois
do almoço, o baile começaria por volta das 19:00 e sei que como nós
Carsson’s somos anfitriões não podemos nos atrasar.

O tio Jonas odeia atrasos.

Logo que abri meu aplicativo de mensagens me deparei com o


grupo das crianças, muitas fotos deles aproveitando seu primeiro dia na
Disney, todos com roupas leves e tênis, também das minhas irmãs e meus
cunhados e sobrinhos.

Uma foto do Cory com uma travessa com orelhas da Minie na


cabeça me fez sorrir, as meninas fazendo pose diante de um brinquedo no
parque também, havia tantas mensagens que depois que o serviço de quarto
chegou, tive que ler todas e ouvir os áudios enquanto tomava meu café.
Pedi um café expresso acompanhado de queijo de ricota e croissants, nada
que fosse tão pesado porque ao me dar conta percebi que já era tarde da
manhã.

Mosés enviou fotos da Nina mais cedo, fiquei rindo ao ver a pobre
da cachorra toda mimada dormindo na caminha que ele comprou para ela,
depois outras fotos foram surgindo e exibindo o meu pai segurando um taco
de golfe e reconheci o local logo de imediato, logo em seguida ele mandou
selfies dele ao lado do Dominic, do Tom, e do Nando, isso me fez sorrir,
porque sei que sinceramente é importante para ele voltar a rotina de
inclusão familiar.

Não que ele tenha sido tão excluído assim, sei que papai se
empenhou em mantê-lo por perto, mas dadas as circunstâncias eu sei que
ele não se sentia nada a vontade para estar assim tão próximo da família do
meu pai.

Eu também sei que o meu pai tentou muito fazer com que eu e
Mosés tivéssemos conversas ou uma reconciliação durante os meses de
separação, ainda que ele assim como eu acreditasse no que vimos nos
jornais e nas redes sociais, só que foi algo que eu optei por não fazer.
Assim que eu e o Mosés nos separamos eu pedi ao meu pai que não
se metesse nisso, que era meu casamento e minha vida e que nem ele e nem
ninguém da família tinham o direito de interferir em nenhum sentido.

É claro que eu sei que ele conversou com o Mosés, ele é o meu pai,
o conheço o suficiente para saber que devem ter tido um diálogo cheio de
hostilidade, papai não é um homem de medir palavras e o meu marido sabe
ser um cavalo quando quer.

Enviei uma selfie da minha cama com meu Macbook aberto e o Ipad
ligado, logo em seguida atendi a uma ligação de vídeo da Sêmora e soube
que deveria trabalhar um pouco.

O fato de eu me ausentar fisicamente da empresa não me impediu de


estar exercendo minhas funções como CEO da Handerson, contudo, sei que
sobrou para o Mosés porque ele ainda teve que viajar e participar de muitas
reuniões presenciais que eu não pude.

Sei que para ele tem sido uma maratona cansativa porque ele está lá
para participar ativamente de tudo enquanto eu fiquei com a parte menos
burocrática e mais analítica. Ele estava trabalhando muito mais do que eu,
eu sei, porque haviam dias que para mim era insuportável acordar e lidar
com tudo.

Então agora, nada mais justo que eu trabalhe um pouco mais


também.

Sei que isso será a curto prazo porque em algum momento algumas
funções serão mais só de tomada de decisão já que vamos meio que
terceirizar algumas funções para novos diretores.

Depois do primeiro bom dia, a Sêmora indicou o local onde estava e


acabei rindo, porque ela também está em Los Angeles para o baile e porque
ela também está hospedada em um hotel assim como basicamente todos da
família.
Ouvi o som da tv ligada e soube que apesar dela estar em uma
escrivaninha diante de um notebook, o Jammie estava no quarto, então
nossa conversa sobre nossas vidas pessoais não foi algo que rolou.

Sabia que a noite eu e ela poderíamos conversar sobre isso.

Então começamos nosso dia com uma reunião online com alguns
diretores, tive que juntar um pouco de paciência quando ouvi as exigências
dos meus renomados colegas da empresa e fiquei por momentos relendo
essas novas condições que eles gostariam de inserir na promoção que eles
desejaram inserir devido aos termos que eu e Mosés colocamos há alguns
dias durante as reuniões.

Fiz algumas observações no meu bloco de notas durante a leitura


conjunta da pauta da reunião e de todas as exigências, no final da reunião
que durou quase uma hora e meia deixei claro que iria pensar com cuidado
a respeito ao lado do Mosés e que daria a resposta no máximo em uma
semana.

Houve um momento de silêncio meio incomodo depois que respondi


então finalizei a chamada consciente que ao menos dez homens com quem
lido constantemente estavam me odiando muito, só que também sei que isso
se dá ao fato de que eles estão acostumados com o Mosés.

Sei que alguns diretores não gostam de mim pelo exclusivo fato de
que sou mulher, não preciso de tanto esforço para ver que em algumas
reuniões eles trocam sorrisos e elogios com o meu marido, mesmo o Mosés
sendo mil vezes mais rigoroso e direto que eu.

Só que é um meio onde aprendi a saber como lidar para ter uma boa
produtividade e resultados.

Eu também não gosto do fato de não termos diretoras mulheres, por


isso nessas novas vagas abri sete vagas para mulheres, acredito que
preencheremos todas, antes por tudo já estar organizado já há algum tempo,
Mosés decidiu manter seu corpo de diretores do jeito que estava devido ao
fato de funcionar, até porque já tivemos umas cinco diretoras mulheres, mas
todas fizeram planos de carreira e acabaram optando por transferência para
outra filial ou por um cargo que desse a elas mais flexibilidade.

É muito fácil para cada um deles viajar toda semana, ficar até tarde
no trabalho, tirar apenas um dia de folga em épocas do ano, afinal de
contas, todos têm esposas que cuidam de suas vidas pessoais em casa, dos
filhos, de todo o resto.

Isso não é como sair de um dia de trabalho, chegar em casa e pegar


seus dois gêmeos trocando chutes, duas de suas quadruplas batendo boca
por causa de uma chapinha de cabelo, outra tentando separar os gêmeos
enquanto mais uma está tentando não colocar fogo em uma panela na
cozinha.

Não é como ter que administrar as rotinas de sete crianças pequenas


por anos, como colocar roupas para lavar, separá-las, não é como limpar
vômito e coco de criança, aí, nem gosto de lembrar daquela cena de terror
que o Gustav fez quando tinha dois anos, sujou até as paredes do quarto
deles de bosta.

Tinha bosta até no olho dele.

Eu sei que o meu esposo também já passou por muitos apuros em


relação as crianças, isso porque ele sim é um pai de verdade nesse sentido,
ele não tem medo de viver a paternidade real e quer participar de tudo em
relação as crianças.

Só que as crianças foram crescendo e se tornando independentes,


portanto, foi algo que ele foi deixando de lado. Devido a expansão da
empresa ele tem priorizado um pouco mais os negócios, mesmo que ainda
seja bastante presente.

Só que ele é assim, a maioria dos homens da empresa não são.


Depois dessa reunião fiz outros alinhamentos com a Sêmora sobre
alguns outros assuntos, então entramos em outra chamada de vídeo com um
cliente potencial, me vi sorrindo ao apresentar um plano de ação em
potencial para a gestão dos negócios dele, um milionário no ramo agrícola
que busca soluções mais práticas para investimentos.

Fiz um planejamento e no final da reunião tive quase que uma


certeza de que iremos fechar um negócio, sei que essa conta será muito
importante para a Handerson.

Após a reunião, tivemos que alinhar mais algumas coisas sobre


alguns outros relatórios, algumas horas depois finalizamos nossa vídeo
chamada porque fui avisada que as moças que iriam me auxiliar haviam
chegado.

Me despedi da minha melhor amiga com um até logo, em seguida,


enviei mensagem para a recepção do hotel avisando que elas poderiam
subir, também solicitei no chat uma salada para meu almoço.

Respirei fundo e guardei tudo dizendo para mim mesma que teria
uma longa tarde de beleza pela frente e isso me fez lembrar de alguém do
qual me comprometi a ajudar. Sorri e mandei mensagem para a Sêmora
pedindo que ela entrasse em contato.

Tinha certeza de que daria certo.


Eu nem quero acreditar que a Safira conseguiu algo tão bonito e
glamuroso para mim para esta noite, mas enfim, é a minha cunhada, se
tratando dela e de todos os designs que ela costuma fazer para nós não há
muito o que se questionar.

Sei que sendo ou não de última hora ela daria o seu melhor em
quaisquer hipótese.

Acredito que esse vestido valorizou demais minhas curvas, meus


seios e principalmente os meus seios, com direito a espartilho e tudo.

Analiso mais uma vez a saia volumosa com bordados em tons


dourados com desenhos pequenos e bem minimalistas de linhas em
formatos de flores. Todos os detalhes do ombro a ombro perfeito, das
camadas leves de anáguas que coloquei por baixo, da parte do decote que
espreme os meus seios enquanto respiro.

Pedi que a cabeleireira fizesse uma trança raiz nos meus cabelos e
ela colocou pequenas presilhas com pingentes em formato de flores
amarelas, achei que combinou muito comigo e me deixou até um pouco
mais jovem. Já a minha maquiagem escolhi algo mais leve, pouca base,
uma sombra em tons claros nos olhos, pouco delineador e ela até colocou
cílios postiços em mim, um batom cor de rosa suave e quem diria, fiquei tão
bem.

Tão linda! Eu amei demais!

Ainda ganhei uma massagem facial antes da maquiagem de cortesia


da maquiadora.

— Chegamos, senhora!

— Obrigada.

Pego minha bolsinha no banco do carro e arrumo os sapatos nos pés,


acho que afinal de contas depois de ter passado basicamente metade da
tarde toda me emperiquitando para essa noite, isso deu algum resultado.

O Baile será realizado nessa propriedade do meu tio, é uma de suas


casas em Beverly Hills, uma mansão ostentosa que ele comprou há muitos
anos, alguns membros da família utilizam também para vir passar férias ou
quando temos casamentos.

Algo que ocorre com frequência já que a família é enorme.

Eu aprendi com o passar dos anos que apesar de todos quererem


meio que viverem suas vidas de suas próprias formas, ninguém quebra o
pacto que fez ao nascer e crescer como um verdadeiro Carsson.

Se um homem dessa família se interessar por você ele não fará


rodeios, foi assim com o Tom e com o Nando e é assim com todos os meus
outros primos, porque são ensinados a serem assim.

Alguém abre a porta do carro e puxo a saia do meu vestido


colocando meu pé para fora, seguro a mão grande e sorrio ao reconhecer o
meu pai, assim todo engomadinho num traje apertado com um calça que
bate um pouco abaixo dos joelhos, meias brancas longas, uma camisa preta
bordada com colete e um terno que faz par com a calça a também preta.

Noto os flashs assim que saio do carro, puxo a saia enfiando a alça
da bolsa no pulso e puxo o restante da saia para fora do carro subindo na
calçada de tapete vermelho. Não achei que o meu esposo me receberia
porque sei que o fato de papai estar aqui fará com que a imprensa não se
sinta na liberdade de dizer nada ou questionar nada.

Vieram pelo baile, mas vieram pelos escândalos também.

Mesmo que ele saiba que eu não vou dizer nada sei que ele quer me
proteger a todo custo de perguntas constrangedoras, quer que eu não me
sinta desconfortável com nada que possam dizer e sabe muito bem que as
pessoas jamais fariam isso em sua presença.
Arrumo a saia no corpo e papai puxa a parte de trás do vestido para
o lado, ele ergue o braço e passo o meu por debaixo do dele, isso me faz
sorrir mais uma vez, porque sei que o que ele tem de educado e gentil
quando quer, quando não quer tem de jumento.

— Você está magnifica, minha filha.

— Obrigada, papai!

Eu fico feliz de saber que o meu pai sempre está disposto a me


proteger, mesmo que isso me estresse, mas fico feliz ainda mais de notar
que ele acima de tudo me ama, mesmo que só tenhamos esses anos de
convivência, ele me trata realmente como um pai trata sua filha.

— Senhor Carsson, uma foto para a GR Magazine!

Caminhamos até a metade do caminho da entrada e nos viramos


para o lado direito onde a massa de fotógrafos se concentra, me endireito e
sorrio assim como papai. Ainda me pergunto como tive que ter aulas disso
há anos com uma professora de comportamento.

É que depois que papai assumiu minha paternidade e isso veio a


público eu tive que aprender a me comportar perto das pessoas, a entender
que haveriam sempre fotógrafos tirando fotos nossas em lugares distintos,
mas principalmente que eu deveria aprender a lidar com isso da melhor
forma.

Era algo que eu não sabia, o assédio da imprensa quando me casei


com o Mosés foi algo do qual eu também não tinha ideia de como lidar, fui
aprendendo com o passar dos anos a lidar com isso.

Sei que para essas pessoas agora eu não passo de uma corna que
perdoou o marido por suas traições e que aparenta fingir que nada
aconteceu, mas bem, eu sei que não é assim, eu sei a verdade e não dou a
mínima para o que pensam ou dizem.
— Eu cheguei, sogro, posso assumir daqui.

Eu vejo esse homem alto usando um traje azul escuro com meias
cano alto e sapatos reluzentes e por alguns segundos eu perco um pouco da
atenção, como se precisasse mesmo constatar que ele é meu.

Só meu.

Passei meses tentando me convencer de que não era, mas isso não é
verdade, nunca será.

Papai se afasta e vai para perto da porta de entrada olhando para os


fotógrafos e repórteres como se fosse um segurança pronto para tomar
atitude se preciso, ergo o outro braço e seguro o braço do meu marido me
posicionando.

Sorrio para os fotógrafos e tento acompanhar os pedidos e chamados


de cada um deles, Mosés se inclina na direção do meu ouvido e fala:

— Você está linda, meu amor!

— Obrigada, você também está lindo.

Ele sorri e começa a me puxar porque outro carro acaba de


estacionar diante da calçada, aceno para os repórteres e isso não deixa de
ser uma grande hipocrisia, porque foram muitos deles que me assediaram
por meses depois de tudo o que aconteceu.

Agora estão aqui sorrindo para mim como se nada houvesse


acontecido e fingindo que sou “bonita” o suficiente para me publicarem em
revistas ou sites de comunicação e entretenimento.

— Senhora Carsson, vocês voltaram oficialmente? — uma moça


berra e estende o microfone para nós enquanto caminhamos.
— Não dá para voltar com algo que nunca acabou — Mosés
responde apenas educado.

— Isso quer dizer que não irão mais se divorciar?

— Obrigada por terem vindo — respondo ainda sorrindo e aceno


para ela.

Mosés aperta o passo e vamos subindo os degraus da escada sem


olhar para trás.

Não gosto da exposição, porém, já sabia que seria assim.

— Eu disse sem declarações — Papai diz assim que chegamos ao


topo da escadaria.

— Só falei o óbvio — responde Mosés polido.

— Vou receber mais um, nada de declarações, para ninguém! —


determina papai num tom seco. — Vão direto para a mesa de vocês e bico
fechado.

— Sim senhor!

Mosés e papai tem um excelente relacionamento, mas tem hora que


desgasta.

Puxo meu esposo para o rumo da porta de entrada e enquanto ele


vem me seguindo sei que está chateado pela ordem do meu pai.

Bem, tive que seguir regras ao meu envolver com ele em vários
sentidos, agora ele se incomoda porque sabe que o nome do meu pai é mais
importante que o dele e que papai tem uma reputação a zelar e ele tem que
fazer isso porque está comigo.
É interessante pensar o quanto o mundo dá voltas, era contadora
dele, virei sua secretária, depois sócia, meu nome era totalmente anônimo e
insignificante, hoje sou dona da maioria das ações da empresa e tenho nome
relevante socialmente.

E ainda teve algumas pessoas que me criticaram por eu ter me


tornado secretária dele.

Só Deus sabe o que teria acontecido se eu houvesse de fato recusado


porque só conheci a Ayla porque fiquei grávida do Mosés, do contrário
talvez papai nunca houvesse me reencontrado e conhecendo minha mãe
como conheço, ela nunca contaria.

Me casar com ele mudou a minha vida.

Me inclino e coloco um beijinho em sua face, ele esconde o sorriso


se mantendo sério.

— Nenhum sorriso para mim?

— Você terá todos sempre que desejar, meu amor.

Ah, eu amo que está sendo mais romântico comigo.

Ele se rende e sorri me olhando enquanto entramos na antessala da


casa.

— Demorei muito?

— Não muito.

— E como está aqui?

— O de sempre, seus tios esbanjando o espírito antissocial e apático


deles.
— Eu amo a apatia dos meus tios, me lembra muito alguém que
conheço há anos.

— Me sinto ligeiramente lisonjeado.

Não vi o meu marido o dia todo.

Ainda trocamos mensagens pelo aplicativo de conversas, as


mensagens foram curtas sobre horários e sobre como estava sendo nossos
dias, nada demais.

— Ah, sabe o que eu ouvi uma das convidadas falando?

— Expectativas foram criadas.

— Que fazemos parte de uma ceita.

— Não gostei, amei!

Eu e Mosés sempre fazemos deboche desses eventos sociais porque


sabemos que no fundo, bem lá no fundo, todas essas pessoas estão por perto
porque sabem que nem se juntassem suas riquezas conseguiriam acumular
metade do patrimônio que a família possuí.

Afinal de contas, quem é que dá uma ilha de presente para a esposa


como se fosse a coisa mais natural do mundo?

No último aniversário da minha madrasta, papai deu a ela uma ilha


no caribe e colocou o nome dela. Não posso reclamar também, no meu
último aniversário ganhei uma propriedade na França, no anterior um
imóvel no Brasil.

Todos os anos papai me dá coisas caríssimas, é algo do qual sinto


que tem muita utilidade para mim. Já fui em quatro das propriedades que
ganhei dele nesses últimos anos, são em lugares dos quais utilizamos para
viagens em família.
Saímos da antessala e passamos por portas largas que dão para a sala
de visitas da casa, aqui já posso ver diversas pessoas por todos os lados
usando roupas de época, vestidos suntuosos, homens elegantes e que sei que
são muito importantes.

Acredito que levou um tempo para os membros da família se


habituarem a festas frequentemente nesse sentido, mas nós somos
conhecidos por todas as causas que apoiamos ao redor do mundo, Mosés
inclusive, ele tem a instituição dele no Brasil.

Todos os anos temos ido com as crianças para o evento de sua


instituição, assim como eu também apoio minhas próprias causas e tenho as
que sou madrinha. Nossos filhos também são mais engajados porque sabem
a importância de tudo isso para nós e nossa família.

Me lembro a primeira vez que fui ao país durante as férias de


família, nos reunimos numa das ilhas que o meu tio deu para minha tia, foi
tão incrível estar naquele lugar, me senti realmente conectada com algo, as
crianças aproveitaram muito também.

Eu noto olhares e sorrisos, percebo que cochicham, porém é algo do


qual procuro ignorar, seguimos por entre as pessoas rumo ao salão de festas
e tão logo entramos mais olhares, me mantenho firme porque já sabia que
seria assim.

Mesmo que eu não tenha pensado tanto nisso.

Também não planejei, nossa viagem pro México foi discreta e


rápida, desde que chegamos temos ficado em casa com as crianças e a nossa
primeira e última tentativa de uma aparição em público meio que se
frustrou.

— Parece que vão eleger os melhores trajes da noite e os


comtemplados vão ganhar uma viagem para as Maldivas com tudo pago. —
Mosés cochicha discretamente na minha direção.
— Isso é muito a cara do meu tio — respondo cochichando de volta.

Para não dizer o mínimo é claro porque ano passado ele deu uma
viagem com tudo pago para a Turquia para os donatários mais generosos da
noite. O tio Jonas tem aquela coisa de querer que doemos o suficiente, mas
que promove essas festas para arrancar muito mais dos outros,
principalmente dos milionários muquiranas.

Ele os convida de propósito e eles vem porque sabem que se


recusarem aos olhos de todos os outros vão parecer justamente o que são,
um bando de ricos egoístas e miseráveis.

Entramos no salão e fico satisfeita de estar tão cheio que as pessoas


mal parecem se dar conta de que somos nós dois.

— Nossa mesa — ele me conduz para o rumo da esquerda.

Consigo enxergar alguns rostos conhecidos conforme vamos


passando pelas mesas, vejo a tia Patty cumprimentando alguns convidados
em uma outra ponta do salão enquanto o tio Richard está de mãos dadas
com a tia Mandy andando pelo lugar.

Sei que não precisamos muito de desculpas para nos reunirmos já


que moramos basicamente todos na mesma propriedade, mas é muito bom
poder rever a família sempre.

Em parte, porque no início eu ainda havia caído de paraquedas e não


conseguia me sentir tão reintegrada, mas todos se mostraram tão receptivos
e carinhosos que acabei me tornando parte importante de tudo isso.

Puxo a saia do vestido assim que o meu esposo indica a mesa


redonda para dois, ele puxa a cadeira para que eu me sente e me sinto
transportada para esse ambiente lindo que está iluminado com luzes de cor
amarela nos cantos e toda uma decoração bastante clássica.
Ano passado o tema foi anos noventa, foi um pouco mais frenético e
divertido, diferente de agora que sou envolvida pelo som de um violino e
um piano. Os músicos estão num canto do salão também vestidos a rigor.

Meu esposo se senta ao meu lado e logo em seguida coloca a mão


sob a minha entrelaçando os dedos nos meus, sorrio, me sinto
estranhamente romântica, meu coração dá um pulinho mais forte e isso faz
com que eu respire um pouco mais rápido.

Todos esses dias com o Mosés têm sido tão bons e


maravilhosamente excitantes.

— Como foi o seu dia? — indago e me sinto também estranhamente


tímida.

— O seu pai me levou para jogar golfe, me deu vários sermões,


depois os seus tios e primos me levaram para um bar e bebemos um pouco,
então viemos para cá e tomei banho e me troquei.

— Ele disse algo que te desagradou?

— É o seu pai, amor, como esperava que ele reagisse? Me deu


sermão, disse que eu deveria ser mais cuidadoso com pessoas e que não
permitiria que isso acontecesse novamente.

Reviro os olhos, Mosés fica me olhando um bocado sério.

— Dei minha palavra de homem que não aconteceria novamente,


confesso que fui ingênuo, no começo ele se ofereceu para resolver tudo,
mas eu tentando provar para você que conseguia fazer tudo sozinho, acabei
demorando todo esse tempo, fui orgulhoso.

— Você não teve culpa do que ela fez.

— Eu sei que não tive, mas fui responsável por não ter sabido lidar
com tudo isso como se devia.
Acho que ele se sente responsável porque o papai está incumbindo
essa culpa nele e mesmo que entenda o meu pai, não quero que ele fique
martirizando o Mosés pelo que houve.

— Não se chateie por isso — aviso sincera.

— Não estou chateado, ele foi sincero, mas não foi tão rude, depois
que falou tudo isso me deu um abraço e disse que está feliz demais por nós,
que sou como um filho para ele, em quinze anos ele nunca me disse algo do
tipo.

— Ah, amor!

Ele sorri enquanto me encho de suspiros.

— Titia!

O berro vem de um pulo no meu colo, mãos alvas e pequenas, olhos


em tons verdes meio redondos que aprendi a reconhecer com o passar dos
anos, cabelos escuros e lisinhos, dentes de leite redondos e juntinhos, nariz
empinado e pequeno e bochechas, quanta bochecha meu Deus!

— João Lucas! — exclamo maravilhada.

Ele só tem quatro aninhos, é um dos xodós da família, a coisa mais


doce e fofa que eu tive o prazer de segurar no colo desde que nasceu, mas é
também a coisa mais travessa desde que aprendeu a andar.

Ele dá a volta na cadeira e depois começa a escalar o meu marido,


Mosés solta a minha mão e o pega no colo todo sorridente, ele é a mini
cópia de um senhor de terras do século 17. Trajes sociais de cor preta,
sapatos reluzentes, meias brancas nas canelas, até mesmo uma rosa de
mentira enfiada no bolso de cima do terno.

— Benção, tio! — ele pede estendendo a mão para Mosés.


— Deus te abençoe, querido. — Mosés aceita a mão dele e aperta
com gentileza.

— Benção, tia! — e estende a mão para mim.

— Deus te abençoe, meu amor. — aceito sua mão e coloco um beijo


em sua cabeça.

É difícil não se apaixonar pelas crianças da Lottie, ela que o diga,


gosta tanto de filho que depois do João ainda teve a Ângela, fora nossos
outros sobrinhos mais velhos, a verdade é que temos aniversários frequentes
para ir, batizados, festas de debutantes e até mesmo bodas.

Eu e Mosés vamos em tudo com as crianças, são momentos em


família que buscamos participar, acredito que nos últimos cinco meses não
tenham celebrado nada devido aos acontecimentos.

Mesmo que eu tenha deixado claro ao papai que eles poderiam


continuar a viver suas vidas tranquilamente.

— Senti saudade — João diz para mim e abraça o meu esposo. —


Saudades!

— Também sentimos sua falta, meu amor ­— digo e puxo os cabelos


dele para o lado.

— Ah, João, aí está você! — Dominic aparece todo apressado.

Eu noto que ele está com aquela cara de “perdi o garoto, ufa, achei”
porque reconheço isso do meu marido, cansei de ver ele sair procurando
uma das crianças pelo jardim desesperado enquanto elas se escondiam dele
dentro dos armários da cozinha.

— Esconde, papai bravo! — João Lucas se encolhe enfiando a cara


debaixo do braço do meu marido.
Não é de rir, mas...

Dominic King coloca as mãos na cintura e respira todo arfante,


imagino que tenha corrido meio mundo atrás de seu herdeiro. Os olhos
azuis claros fixados em João Lucas, o rosto todo avermelhado, é um homem
loiro muito bonito e alto acho que um pouquinho mais jovem que o Mosés,
mas é tão charmoso.

— Pode deixá-lo aqui conosco, Dom — Mosés avisa tranquilo.

— Não quero causar transtornos — Dom diz todo constrangido.

— Pode ficar tranquilo, deixa ele uns minutinhos aqui — respondo


segura.

— Vou buscar uma água, ah, e parabéns por terem voltado, estamos
muito felizes por vocês, de verdade — ele fala discretamente e lança um
olhar para o filho. — E você não conta para sua mãe que eu te perdi.

— Shiuu! — João Lucas coloca o dedo indicador na boca fazendo


gesto de silêncio.

Eu e Mosés acabamos por rir enquanto seu pai se afasta dando uma
de durão.

— Ele sabe quem manda — João Lucas diz todo genioso. — É a


mamãe!

— Precisa entender, garoto, elas sempre mandam em tudo — Mosés


não para de sorrir.

João Lucas sorri todo sapeca e abraça meu esposo, ele é tão
carinhoso, acho que de todos os filhos da Lottie ele é o mais carinhoso de
todos. Confesso que também o fato da Ângela ter nascido com deficiência
visual fez com que toda a família se concentrasse muito em dar amor e
carinho incondicional para eles.
Passaram por maus bocados quando ela nasceu, a pequena é uma
verdadeira vencedora.

— Ah, você está aí, não é seu pestinha? — a voz de Clint é cheia de
humor e preocupação. — Oi tia, oi tio! Que bom que vieram!

Fico de pé e abro os braços, Clint vem e me abraça com força todo


gentil, é o mais velho dos filhos da prima Lottie, um rapaz gentil e muito
educado.

— Que bom que vocês voltaram, tia! — ele diz baixinho me


apertando.

— Obrigada, querido! — exclamo tão tocada com seus votos de


felicidade.

Sei que todas as intenções da nossa família são para que fiquemos
juntos, eles sabem que eu e o Mosés nos amamos.

— Onde estão seus outros irmãos?

— Indra e Hari estão por aí conversando com velhas ricas, Indyhe


está com a mamãe lá em cima, mamãe está amamentando a Ângela, papai
perdeu esse pestinha e me mandou procurar.

— Feio! — João Lucas mostra a língua para Clint.

— Ele o deixou conosco — Mosés explica. — Não precisa falar


assim com o seu irmão, João, por que não vai até ele e dá um abraço?

João Lucas leva alguns segundos para pensar, depois se solta dos
braços do meu marido e escorrega para o chão, ele dá a volta na cadeira e
depois vai correndo para Clint. Clint que já está quase terminando seu curso
de direito na faculdade pega seu irmão mais novo no colo e o abraça de um
jeito fraternal.
Eu sinceramente sei que a Lottie demorou bastante para ter filhos,
que o Clint é fruto do primeiro casamento do Dominic, mas ainda me
pergunto, como é que ela consegue administrar tantos filhos com idades
diferentes de uma só vez.

— Vou atrás do papai, ele deve estar atrás de algum lugar para
chorar, da última vez que esse capeta sumiu, ficou três horas escondido
dentro do armário da cozinha, ele quase infartou e a mamãe por pouco não
terminou o serviço.

João Lucas dá uma risada sapeca e esperneia no colo do irmão, Clint


não o solta e se afasta levando-o para longe de nossa mesa, tento não rir,
mas sinceramente, como eu não riria disso?

— Eu nem quero acreditar que alguém bateu o recorde do Gustav —


Mosés não consegue parar de rir também.

— Champanhe ou vinho tinto senhor? — indaga o garçom diante de


nossa mesa.

— Vinho, por favor — respondo.

— O mesmo para mim, obrigado.

O rapaz enche as taças de vinho tinto rapidamente e depois as


coloca sob nossa mesa, ele também coloca um copo com gelo e depois se
afasta. Pego minha taça de vinho e provo um pouco da minha bebida,
observo meu esposo fazer o mesmo com a taça dele.

Me vem na mente, todas aquelas lembranças de ontem e vai me


subindo um calor pelo corpo, não sei também se é porque bebo o vinho e
isso faz com que me sinta meio quente.

— Gostei do decote — ele diz baixinho olhando para os meus seios.

— Eu também adorei os meiões.


Depois que falo ele me dá um sorrisinho meio maldoso.

— Sei.

Suspiro e olho em volta, ainda tem muitas pessoas nos observando,


olhando para nossa mesa e cochichando, outras damas da sociedade com os
olhos fixados nele, e concluo algo importante.

Algumas coisas nunca mudam.

— E a noite só está começando.


ENCANTO

Mosés saiu para o toalete.

Aproveitei para enviar fotos da festa para o grupo das crianças, eles
não paravam de comentar como gostariam de ter vindo, mas também se
mostraram bastante felizes por estarem na Flórida.

Mandei algumas fotos minhas tentando me sentir uma dessas mães


super bonitas e recebi elogios de todos os lados, me vi sorrindo e bem mais
confiante, por mais que os meus filhos nunca tenham poupado elogios para
mim.

Já acenei para uns trinta parentes, para o tio Jack e para a tia Duda,
também para o tio Jonas que tentou por duas vezes chegar a minha mesa,
mas não conseguiu porque diversas vezes o pegavam pelo caminho.

Já aplaudi algumas canções e pessoas que estão no centro do salão


dançando valsas longas e elaboradíssimas, acho tão lindo que as
celebrações da família apesar de serem assim bastante luxuosas também
esconda um significado romântico e enriquecedor.

Escuto o som de aplausos para os últimos casais que decidiram se


arriscar na pista de dança e bebo os últimos goles do meu vinho me
perguntando porque afinal de contas o meu esposo está demorando tanto.

Quer dizer, será que deu dor de barriga nele?

O pensamento me faz rir, porque afinal de contas, já tivemos


diversos momentos inusitados em que o Mosés teve piriri, algo que aliás
não é nada romântico.

Deixo a taça de vinho vazia sob a mesa e aplaudo também, nesse


momento uma mão grande família se estende para mim, não consigo deixar
de sorrir enquanto meu olhar sobe e vai se deparando com os olhos azul
cintilantes dele.

— Me dá o prazer da dança, senhora?

Ergo a mão e seguro a dele me levantando, entrando no climinha


que ele está se dedicando em criar, eu sei também que o Mosés não quer dar
moral para que pessoas que não são da família fiquem nos olhando como
têm olhado até agora.

Por que viríamos se nós não quiséssemos de fato participar disso?

Não é só uma aparição em público para que todos saibam que


voltamos, é uma festa para que nós dois possamos nos divertir como sempre
fazemos quando estamos em eventos de família.

Sem medo de ser feliz.

Mosés me conduz por entre as mesas e vamos caminhando até o


centro do salão de festas ouvindo o som das conversas e risos dos
convidados, o som de taças e de homens que falam alto sobre dinheiro.

É claro que minhas pernas estão meio nervosas, apesar de que sei
que danço bem, não dançamos uma boa valsa há bastante tempo.

Mantenho a mão erguida junta da dele e me sinto tão chique, não sei
explicar.

Logo que chegamos no centro do salão de festas escuto o som do


piano estalar por todo lugar iniciando uma música frenética do Aerosmith.
Mosés me puxa para si com força e bem rápido, arregalo os olhos
espantada, me sobe um arrepio forte por todo o corpo e me vem a sensação
de frio na barriga.

Ao mesmo tempo ele me aperta contra seu corpo e meu coração dá


um salto absurdo.
Então a voz do cantor que também está tocando o piano inicia Cryin
num solo acompanhado do som de uma guitarra e de uma bateria, ele me
conduz para o primeiro passo com o primeiro refrão e me movo com ele
rapidamente bastante chocada.

Eu não estou acreditando, meu Deus!

A valsa se dá com outro passo largo enquanto a música prossegue,


me mantenho ereta acompanhando-o pelo espaço do salão, sorrio ao ver os
lábios dele se moverem conforme a música ecoa por todos os lados.

Rodopiamos enquanto em passos longos e largos vamos indo para as


laterais do centro do salão. Vejo meu pai vir logo atrás com a minha
madrasta seguindo nossos passos, logo depois deles meu tio Richard com a
tia América, então todos os meus tios vão vindo em sincronia com suas
esposas.

Rio realmente em choque, mas também encantada.

Maravilhada eu diria.

Me sinto presa dentro da cena de um filme que nunca vivi ou numa


página de qualquer romance histórico em que sou mocinha e meu esposo o
cavalheiro por quem estou completamente apaixonada.

Onde todas as coisas conspiram para dar certo, onde tudo é por uma
fração de segundo perfeito.

Vejo a saia do meu vestido subir para os lados enquanto valseamos


por todo o local rapidamente, meu corpo girando enquanto minha
respiração se torna arfante, enquanto meu sorriso se torna uma risada baixa,
logo em seguida uma risada mais alta e além.

Esse bobo me olha de um jeito tão apaixonado, ele canta a música


com perfeição me fitando, só para mim, como se não existisse mais
ninguém na face da terra além de mim.
Me sinto tão especial com esse olhar, com o gesto em cada palavra
enquanto ele canta.

Mosés me conduz para o lado entrando no centro do círculo que se


formou, o círculo onde meus tios e meus pais dançam rodopiando como nós
dois estávamos fazendo. Então ele segura a minha mão e me solta fazendo
com que me afaste e depois me puxa.

Rodo indo de encontro até ele, gargalho e olho em volta vendo que a
dança continua enquanto paro e ele me abraça por trás me embalando nessa
dança mais lenta, não consigo parar de rir.

Isso é tão contra tudo o que ele é, isso é muito mais do que ele
sempre conseguiu ser.

Inesperadamente vejo os casais de rostos tão queridos pararem


formando um círculo a nossa volta, ele me solta, então os homens dançam
para os lados estalando os dedos enquanto as mulheres ficam na frente deles
segurando as saias de seus vestidos longos e volumosos.

Escuto o som do coro masculino cantando a música bem alto com


ele enquanto Mosés se afasta e continua a cantar freneticamente o refrão da
melodia tão conhecida, tão exagerado que me faz gargalhar.

Ele começa a andar a minha volta fazendo gestos exagerados com as


mãos, vou girando conforme ele anda, eu percebo que todos os meus tios e
tias e principalmente meu pai se esforça muito para rir.

Escuto o som de risadas vindas de todos os lados, algumas pessoas


em mesas filmam e outras estão aplaudindo.

Ele dá uma volta inteira e fica diante de mim, logo vejo-o parado
diante de mim cantando enquanto vai se inclinando para baixo e se
ajoelhando, nesse momento vejo todos os meus tios se ajoelhando e
erguendo os braços para cima.
Meu tio Jack faz uma cara de tédio tão grande que só consigo rir,
realmente, socorro, fizeram o tio Jack — o mais mal-encarado dos irmãos
Carsson — se prestar a esse papel?

Me volto para meu esposo e ele segura a minha mão cantando o


refrão mais uma vez, uma última vez.

Meus coração se enche tanto de amor por ele que mal sei descrever
isso.

A música se encerra e vejo minhas tias irem até os meus tios e


pularem em cima de cada um deles, minha segunda mãe pulando em cima
do meu pai, escuto algumas exclamações de horror e humor, meu pai é o
primeiro a cair para trás.

Rio extasiada e pulo em cima do meu esposo também abraçando-o


com força.

As risadas se espalham por todo o salão, para todos os lados escuto


o barulho de gargalhadas e uma chuva de aplausos começa a invadir todo o
lugar.

Mosés se desequilibra também e cai para trás, vou junto ouvindo a


risada gostosa dele, ele toca a minha cintura e o fito bem de perto, o coração
saltando forte no peito, arrepios bons se espalhando por meu corpo.

— Mosés Handerson Carsson, você obrigou o meu tio a dançar em


público?

— Sua tia fez isso — ele justifica morrendo de rir.

— Eu te amo tanto!

Não espero por resposta, me inclino e dou um beijo nele, mas não
apenas um beijo, mas um beijo do meu mais puro e singelo amor, com todo
significado por minha gratidão a ele por isso.
— Já pode me chamar de encantado, viu? — ele pede entre o beijo.

— Meu encantado!
EM ALERTA

Depois de ter dado um beijão no meu marido, fui chamada atenção


pelo meu pai, mas nem liguei, mesmo que tivesse a sensação de que era
uma adolescente irresponsável depois de um beijo em público.

Era só o meu pai me dando sermão e sendo o meu pai.

Então saímos do chão do salão e voltamos para a nossa mesa,


ouvindo aplausos, risadas e elogios vindos de todos para o Mosés, para os
meus tios e tias, para o meu pai.

Fiquei tão encantada — literalmente — que não parava de rir e


agradecer a todos pelos sorrisos, pelos elogios, pela gentileza.

Meu tio Alejandro e meu tio Jonas acabaram convidando o Mosés


para uma conversa com o prefeito há alguns instantes, então nem tivemos
tempo de falar. Minhas tias já vieram aqui para falar comigo e me
cumprimentar. Algumas primas e primos também, não consigo acreditar
que o Mosés fez isso.

Eu nunca, jamais em hipótese alguma poderia sonhar que ele faria


isso.

Da última vez que ele fez uma surpresinha parecida foi durante
nossa dança de casamento.

Começo a pensar que talvez por isso ele veio passar o dia com
minha família, eles tiveram que ensaiar isso, eles devem ter tido um
trabalho enorme para dançar de forma sincronizada.

Ah, nem consigo acreditar!


Ele cantou para mim e dançou comigo daquele jeito, ele se ajoelhou,
ele, ah!

Fecho os olhos respirando fundo e tento engolir a euforia que ainda


toma cada pequeno pedaço do meu corpo, os nervos explodem com essas
constatações.

— Senhora Carson!

Abro os olhos com o meu sorriso intocável, logo em seguida um


garçom está diante da minha mesa segurando uma bandeja com duas taças e
um champanhe.

— O senhor Handerson Carsson pediu que me acompanhe até o


jardim.

— Sim! — berro ficando de pé e depois encolho os ombros toda


envergonhada. — Quer dizer, ok, vamos!

Arrumo a saia do vestido esfregando as palmas das mãos no tecido


bonito, o homem ruivo e alto de olhos castanhos dá a volta na mesa e
começa a se afastar para o rumo de uma das portas da lateral do salão de
festas.

Eu o sigo de perto dizendo a mim mesma que de todas as noites


mais emocionantes da minha vida, essa estará no top cinco, atrás do nosso
casamento, da chegada do Cory em nossas vidas e dos nascimentos dos
nossos bebês.

Cumprimento alguns convidados enquanto sigo o rapaz, ainda


frenética diante de todos os últimos acontecimentos.

Passo por uma das portas laterais do salão de festas seguindo-o,


seguro as saias do vestido tentando pisar na grama com todo o cuidado do
mundo, o rapaz vai caminhando até um dos bancos mais afastados das
portas do salão.
Essa propriedade é uma das maiores que o tio Jonas possuí e uma
das mais bonitas.

Conta com tantas suítes que eu não me recordo o número exato, tem
também salão de jogos, uma piscina na outra lateral com área com
churrasqueira e até mesmo um lago com fonte nos fundos.

Sigo o rapaz até o banco e olho em volta notando a distância


considerável até a casa, sorrio mesmo assim, sei que talvez o meu esposo
queira um pouco de descrição para conversar.

Sinto o cheiro de grama recém-molhada, a noite aqui fora está mais


fresca do que no salão lotado, aqui ainda é iluminado por postes de luz
amarela rustica, algo que torna o ambiente muito mais que lindo, romântico.

Me sento no banco e o rapaz ruivo fica me olhando parado há certa


distância, arrumo meu vestido e olho em volta esperando que ele deixe a
bandeja aqui e volte para o salão.

Só que ele continua a segurar a bandeja e a me olhar fixamente


como se esperasse por algo.

Será que devo dar uma gorjeta? Deixei minha bolsa sob a mesa.

— Eu posso te dar uma gorjeta quando voltarmos lá para o salão...

— Eu não quero gorjeta — ele fala e seu tom de voz parece mais
grave.

Ele me olha de cima abaixo e fico um tanto paralisada com a forma


como o rapaz me observa, não gosto, só que também não consigo me
mover. Olho para os lados mais uma vez e não vejo ninguém, nenhum sinal
do meu marido ou de alguém conhecido.

Estamos longe o suficiente para que ninguém que esteja tão perto da
porta possa ver.
O rapaz se inclina devagar e minha reação não poderia ser diferente,
pulo para o lado e seguro meu vestido, então me levanto e começo a correr,
não tenho muito tempo, não consigo dar nem alguns passos para longe e
sinto um puxão forte nos cabelos.

Solto um grito enquanto meu corpo vai para trás, chuto o sapato
com os pés para longe enquanto meu corpo tromba de encontro o dele e ele
coloca a mão na minha boca me impedindo de continuar gritando.

Ele passa um braço em volta da minha cintura e me puxa com força


contra si, tento puxar o ar enquanto sou erguida e arrastada para trás
novamente.

— O que é que foi, gordinha? Para que a pressa?

Agarro o braço dele e finco as unhas tentando escapar, olhando para


o rumo da porta e vendo que alguns casais saem para fora, só que o meu
campo de visão é coberto porque sou jogada para a lateral e aqui tem alguns
arbustos na frente do banco.

Minhas canelas doem em contato com a pedra do banco e sou


empurrada, arfo totalmente em pânico porque não consigo me equilibrar e
caio de frente. Me sinto meio zonza com a força na qual sou basicamente
jogada contra o banco.

— Eu não quero! Não! Para! Eu não quero — grito bem alto num
tom de súplica. — Me solta! Eu já disse que não quero! Eu sou casada! Por
favor, pare!

— Eu gosto assim — ele empurra minha cabeça contra a pedra fria e


isso machuca muito. — Mulher difícil deve ser domada!

Tento me levantar, puxar o ar pela boca, porém sinto a pressão do


joelho dele sob minhas costas, empurro meu corpo enquanto tento tatear
algo, mas minhas mãos não alcançam a pedra do banco, arfo nervosa, meu
coração salta tanto no peito que uma onda de adrenalina ruim me toma e
paraliso mais uma vez.

Escuto o som da fivela do sinto sendo aberta, meu coração bombeia


mais uma forte rajada de sangue e tento alcançar a parte lateral do pé do
banco, mas não consigo nem chegar perto, ele toca a saia do meu vestido e
ouço o som da minha respiração mais alta que nunca.

Tento puxar o ar, contudo, a pressão contra minhas costas é tão forte
que não consigo emitir som algum. A mão dele se enfia dentro das saias do
meu vestido e logo em seguida ele começa a tentar tatear minha bunda.

Ergo as mãos para trás tentando impedi-lo, mas ele enfia a mão nos
meus cabelos e bate com a minha cabeça novamente na pedra do banco,
minha visão treme e meu corpo estremece com a dor da pancada.

— Fica quieta, vadia gorda, facilita aí para nós dois!

A minha visão fica meio turva mais uma vez, mas tento espernear e
junto toda a força que tenho para me mover, ele pressiona minhas costas
com todo o peso da perna mais uma vez e meus pulmões são esmagados
com força fazendo com que eu solte um gemido alto de dor.

Dói tanto pela pressão quanto pela falta de ar.

Rapidamente minhas vistas escurecem e vou sentindo que a força do


meu corpo vai sumindo, vou desfalecendo e mesmo que minha consciência
diga que tenho que conseguir ficar acordada, isso me impede.

Fecho os olhos entregue a semiescuridão, sentindo que a mão desse


monstro se enfia novamente dentro das saias do meu vestido. Um zumbido
toma meu ouvido, um suor frio percorre todo meu corpo trazendo arrepios
ruins e medonhos.

O medo, o pavor, tudo ao mesmo tempo.


Meu Deus, por favor, me salve desse monstro ruim! Por favor! Não
quero isso, eu não quero!

Em algum momento o peso se torna denso até que rapidamente se


torna leve, como uma sensação imediata de alívio, logo sinto a lufada de ar
entrar pela minha boca e começo a tossir vendo que as minhas vistas se
tornam mais claras, como uma explosão de estrelas.

O zumbido no ouvido vai passando enquanto sinto meu corpo mole


caindo sob os braços de alguém, ouço o som de lufadas altas e berros.

— ... Mosés, pare! Pelo amor de Deus! Alguém!

É a voz da minha cunhada.

Está muito perto.

— Se tocar em um fio de cabelo da minha mulher, eu juro, juro que


te mato, seu desgraçado!

Ouço o som de gemidos baixos, o som de um chute e consigo


enxergar entre a vertigem brilhante o Mosés se movendo rapidamente em
luta corporal com o homem. Tento criar forças para me erguer mais não
consigo, olho para cima e Safira está me segurando toda aflita.

— Mosés! — Safira grita nervosa.

Meu marido vai para cima do ruivo com toda força e acerta dois
socos no rosto do canalha, o homem cambaleia, mas não caí, ergue os
punhos disposto a brigar, noto que tem sangue escorrendo pelo nariz do
Mosés e um pequeno corte no canto de sua boca.

Tento me erguer, mas não encontro forças, tudo começa a girar e


girar, então olho mais uma vez para os dois homens que trocam socos e
chutes e vejo que o homem ergue a perna disposto a chutar o meu esposo.
Mosés segura a perna dele no ar e logo em seguida puxa o homem
para si e o ergue para cima, então o joga no chão de vez fazendo com que
ele caia gemendo de dor na grama.

Enquanto ele rola no chão tocando as costelas, Mosés se aproxima


dele disposto a pisar na cabeça dele, nesse instante vejo papai correndo em
sua direção e agarrando-o por trás, puxando-o para longe do canalha.

Mosés tenta se soltar dos braços de papai, mas não consegue, está
arfante e suado, sangrando, isso ainda não parece nem de longe impedi-lo,
meu tio Phelipe vem de encontro a mim enquanto tio Jack e tio Alejandro
ficam de frente para o Mosés.

Tio Jack segura as faces dele com as mãos fazendo com que ele o
fite, Mosés se recusa a olhar no rosto dele e continua a olhar para o homem
que se contorce deitado no chão da grama.

— Ouça, filho, olhe para mim!

Mosés range os dentes e tenta se soltar os braços de papai mais uma


vez sem sucesso, tio Jack segura suas faces e continua a fazer com que ele o
fite, eu vejo todas as camadas de fúria no olhar do meu esposo, mas isso
intensificado por muitas e muitas vezes.

Uma raiva dolorosa.

Uma indignação velada.

Uma fúria incontrolada.

Mas acima de tudo esse medo desolador por trás das camadas dos
mistos sentimentos.

— Filho, ouça, acabou! — tio Jack determina ainda encarando-o


olho a olho. — Acabou!
Mosés o encara por alguns momentos muito sério, ainda furioso, ele
bufa com força, então depois assente em silêncio, o maxilar trincado, as
veias do pescoço saltando, o peito estufado pela respiração forte.

Papai o solta devagar e meu tio Ph me ergue no colo, me sinto tão


mole que parece que estou derretendo dos braços dele.

— Já chamamos a polícia — escuto a tia Gil falando. — Duda você


me acompanha até a delegacia?

— Estou ligando para o meu irmão — tia Duda diz.

Sinto uma mão suave tocando a minha testa e escuto o som do choro
baixo da Safira, pisco devagar e minha segunda mãe está vindo conosco
toda preocupada.

— Você vai com ela — ouço papai dizer para Mosés. — Cuidamos
disso por aqui, fique despreocupado, a Ana precisa mais de você.

— Sim senhor.

Aperto os olhos e me encolho entre os braços do meu tio, um choro


silencioso e lágrimas que se espalham por meus olhos.

Pelo choque, pela dor, contudo, porque sobrevivi.

Acabou.
ALGO ISOLADO

— Ela está bem?

Mosés entra no quarto.

Ele já está sem terno e sem camisa, tem hematomas avermelhados


em seu abdome e o corte em sua testa já parece ter sido limpo, só que ainda
tem um outro hematoma vermelho no canto de sua boca.

— Está sim! — meu tio retira o manômetro do meu braço e se


ergue.

Tive que tirar o vestido e agora estou usando apenas calcinha e


sutiã, não foi a forma como eu imaginei que acabaria a minha noite, só que
nesse momento depois do susto, me encontro exausta demais para pensar
além do que já aconteceu.

Sou grata por não ter acontecido nada pior.

Aquele nojento não teve tempo, graças a Deus, graças ao meu


marido e a minha cunhada que chegaram a tempo.

— Não houve penetração, na verdade ele nem teve tempo de tirar as


calças, você conseguiu quebrar duas costelas e a mandíbula do infeliz.

— Ele teve sorte que eu não gastei o meu réu primário hoje à noite.

Um arrepio ruim percorre meu corpo.

Meu tio se levanta recolhendo os instrumentos de trabalho,


colocando em sua maleta, não consigo me sentir envergonhada de nenhum
dos meus tios em nenhum sentido, estou diante de um dos homens mais
íntegros e respeitosos que já conheci.
Ele realizou meu parto, acompanha até hoje todos os meus exames e
me auxiliar com quaisquer imprevistos que possam surgir com as crianças
assim como o tio Richard ou o papai.

— Trarei os remédios em alguns minutos, Ana, tente ficar de


repouso, ok?

— Tá, obrigada, tio.

— Por nada — ele olha para o Mosés. — E você fique quieto


também, os dois.

— Sim senhor, muito obrigado.

Acho que a tia Gil ficou por conta de ajudar o Mosés.

Meu tio sai do quarto com sua mala, Mosés vai até a porta e depois
de trancá-la vem para a cama com uma cara fechada que só Deus sabe.

Fico triste que tudo isso tenha acontecido nessa noite, pior conosco.

— Sua tia me deu um calmante, me sinto mais relaxado — ele se


senta de frente para mim. — Vamos tomar um banho?

— Ele me disse que você estava me esperando no jardim, o segui


e...

— Amor, você não tem que me dar explicações, ele já está na


delegacia e temos toda a gravação, acho que o idiota esqueceu que toda a
área externa é monitorada.

— Está zangado comigo?

É o que eu imagino, me sinto tão ingênua, tão tola.

— Claro que não, meu amor, estou zangado devido a situação.


Ele olha para os punhos e novo os arranhões nas mãos dele, as
marcas rochas perto dos ossos dos dedos.

— Quando voltei a mesa a Safi estava lá te procurando também,


ficamos sentados por alguns minutos achando que você havia ido ao
banheiro, foi quando o João Lucas disse que te viu no jardim e um “moço
estava te abraçando”.

Franzo a testa, incrédula diante do que ele acaba de falar.

— Fiquei furioso, eu e Safi começamos a ir até o jardim, mesmo


dizendo a mim mesmo que não deveria tirar nenhuma conclusão
precipitada, o João veio correndo atrás de nós dois. Assim que cheguei
perto do banco e vi aquele animal tentando subir seu vestido senti como se
pudesse matar ele com as próprias mãos, Bê.

Se eu tivesse forças eu talvez o matasse, mas infelizmente ele era


mais forte do que eu.

Me abraço tocando os braços, me lembrando disso e só de pensar


que ocorreu há apenas algumas horas atrás sinto outro arrepio ruim pelo
meu corpo.

— Eu o empurrei e começamos uma luta corporal, Safira foi te


ajudar a se virar e acabou caindo com você no colo dela, quando te vi
desmaiada comecei a ficar ainda mais irritado. Apanhei, mas ele muito
mais, aquele desgraçado tinha alguma noção de luta corporal. Safira
mandou o João Lucas chamar o tio Jack e o resto acho que você já sabe.

— Ele pressionou a perna com tanta força nas minhas costas que
perdi o ar e apaguei por alguns instantes.

Mosés passa as mãos no rosto de um jeito estressado.

— Odiei o que vi, amor, de verdade, só mais um segundo e...


— Não quero que se sinta assim, amor.

Sei o que teria acontecido e não gosto de lembrar, a imagem dele tão
fora de si espancando aquele homem, teve que se contido por três homens
para não acabar cometendo uma loucura.

Eu sei que isso seria mil vezes pior para o Mosés, por mais que no
momento da raiva ele estivesse num ritmo frenético quando voltasse a si e
visse o que fez, bem, conhecendo-o bem sei que não se arrependeria por ter
feito uma desgraça com o sujeito, mas por nossos filhos ele lamentaria
muito.

— Não tem como não me sentir — Mosés fala me encarando todo


sério. — Me senti enojado, foi como reviver coisas na minha mente, isso
me machucou demais.

Fico calada, realmente isso nem se passou pela minha cabeça.

Mosés olha para as próprias mãos desviando o olhar do meu e mais


uma vez, depois de tanto tempo tenho vontade de arrancar dele essas
lembranças ruins, a dor, o sofrimento de recordar.

É algo que ele tem feito bem, mas não é algo do qual ele poderia
esquecer jamais, nem com mil anos de terapia.

Estico a mão e coloco sob as mãos dele, quando ele ergue a cabeça
está com os olhos cobertos por uma camada fina de lágrimas, a intensidade
disso me estilhaça mais uma vez, saber que ele reviveu o trauma, que ele
lembrou de tudo o que aquela mulher lhe causou.

Eu sei que ele se sentiu péssimo quando viu aquele homem nojento
me sufocando porque ele também foi uma vítima por anos de muitos abusos
e ele era apenas uma criança muito pequena quando tudo começou.

Aperto as mãos dele sem saber sobre o que poderia dizer de


diferente do que sempre digo, ele sabe que o amo, ele sabe que é importante
para mim, ele também sabe que não tem culpa, que ele é a vítima,
entretanto, em alguns momentos nada disso parece trazer um pingo de
conforto.

Tudo o que o Mosés viveu só reforça para mim todos os dias desde
que eu soube que existem pessoas que deixam marcas tão profundas em
nossas almas e vidas que se não desistirmos temos que sobreviver a todos
os dias pelo resto de nossas vidas tentando costurar todo o dia com agulhas
pontudas e linhas finas, os buracos que causaram.

— Você me salvou. — digo baixinho. — De novo!

Isso não parece surtir efeito nele, seu olhar continua vidrado e sei
que em pensamentos ruins.

— E dançou para mim, fez o tio Jack dançar!

Aos poucos enquanto absorve o que acabei de falar, Mosés vai


deixando que os lábios relaxem e seu semblante se torna mais leve.

— O seu tio é um bom homem, Ana, conversamos enquanto a seu


tio Richard cuidava dos meus arranhões e sua tia Gil o ajudava — ele se
endireita e aperta os meus dedos com carinho. — Ele sabe de tudo o que
passei, me disse que entendia a forma como eu me sentia, fiquei realmente
surpreso.

Eu também estou bastante surpresa em ouvir isso.

Mas, francamente? O meu tio sabe de tudo sobre todos nós, ele
quem cuida da segurança de basicamente todo mundo, ele cuida para que as
coisas fiquem bem, o vovô já está velhinho assim como a vovó também já
está de idade, atualmente Jack quem cuida de tudo.

— Seu tio Richard me disse que lamentava por tudo o que eu passei,
eles dois me deram muitas palavras de apoio, disseram que não devo sentir
medo ou vergonha de nada, que eu não tive culpa e que sou a vítima. Que
isso não mudava a forma como eles me viam e que sou sobrevivente. — ele
faz uma breve pausa e sua voz se embarga. — Fiquei com vergonha, mas
seu tio Jack disse que eu não tenho que me envergonhar com nada, que tudo
o que eu passei não me torna menos homem e que eles se orgulham de
saber que você é casada comigo, confesso que chorei um pouco.

Isso jamais passaria pela minha cabeça.

— Não me senti mal, me senti estranhamente leve de saber que não


havia julgamento, até então achei que só papai, Safira e você sabiam, bem,
isso agora é irrelevante. Depois de tanto tempo, não acho que seja assim tão
ruim que eles saibam, fiquei meio assustado por eles dizerem tantas
palavras positivas.

— Não deve — falo observando nossas mãos juntas. — Eles estão


cobertos de razão, você é nosso motivo de orgulho, é um esposo aplicado e
mesmo com todos os nossos problemas sempre foi um homem exemplar e
de família.

— Sei que tudo isso abalou eles dois, senti isso, acho que por isso o
seu tio tentou me acalmar, tive a sensação de que ele já passou por algo
assim, que o Richard também.

Mosés falando isso agora me faz pensar com cuidado nessas coisas.
Meus tios são homens bastante reservados e de família, são carinhosos e
preocupados, possuem gestos protetores por todos da família.

Eu não posso dizer que são homens super soltos e desinibidos, pelo
contrário, a maioria deles assim como meu pai costumam ser bem na deles,
porém, algo do tipo nunca se passaria pela minha cabeça.

Se aconteceu deve ter sido a muito tempo.

Só que não deixa de ser triste de pensar que passaram por isso
também.
— Não era por mim, era por você, amor, eu nunca, nunca permitirei
que alguém abuse de você. Quando nos conhecemos eu tinha vergonha e
me sentia um fraco, depois que começamos a namorar mesmo com todas as
coisas enfiei essa vontade de te proteger no meu coração.

— Me senti tão inútil e fraca.

— Você não é, ele é um monstro abusador, seu tio Alê está cuidando
de tudo, por sorte foi um caso isolado e não atrapalhou o baile. O Jamie foi
lá na cozinha para conversar comigo, a Sêmora também perguntou por
você, ficou preocupada.

— Eu estava tão zonza que nem sei como o meu tio me trouxe e por
onde passamos, tadinha da Safi, como ela está?

— Mais calma, Sêmora disse que chegou atrasada porque a caminho


daqui se deu conta de que o Jammie esqueceu os convites, então tiveram
que voltar para o hotel onde estão hospedados para buscar.

— Foi tudo tão rápido, me sinto idiota por ter acreditado nele —
lamento com tristeza e certa chateação. — Pensei que você queria me
encontrar a sós, que poderíamos conversar, eu estava tão feliz com nossa
dança que nem pensei duas vezes.

— Você não tem culpa — Mosés reforça com segurança. — A


maldade toda era dele, graças a Deus que o João Lucas te seguiu.

Graças a Deus!

— O Baile ainda está acontecendo lá embaixo.

Dá para ouvir o som de pessoas falando e de violinos tocando ainda


que muito baixo, estamos no terceiro andar.

— Seu pai pediu que um funcionário fosse ao hotel para pegar


nossas coisas, seu tio Jonas insiste que nós passemos a noite aqui, seu pai
também.

Sei que seria complicado ir embora com tantos olhares sob nós.

Meu tio Ph provavelmente deu a volta na lateral da casa para achar


alguma porta dos fundos e entrar na casa, como tem elevador apenas para
os membros da família e a festa é somente no térreo, não foi algo assim tão
difícil de se chegar até aqui sem olhares indesejados.

— Gostou da surpresa?

Essa é uma pergunta que eu não esperava ouvir.

Aperto os dedos entre os dele e faço que sim com a cabeça, Mosés
se inclina e coloca um beijo na minha testa, carinhoso, gentil, bom.

Consigo me sentir bem com o beijo, mas uma onda de culpa me


toma, culpa porque sei que fui errada de ir com o imbecil, mas culpa
também porque em algum momento duvidei dele, ele não merecia isso.

Não mesmo.

— Me perdoa por ter duvidado de você? — indago sentindo uma


vontade enorme de chorar. — Sei que estávamos em crise, que tudo estava
indicando aquilo, porém, eu deveria ter confiado em você, eu sei que errei
nesse sentido.

— Ana, para com isso! — ordena ele e começa a chorar também.

Me ergo e me inclino em sua direção abraçando-o com toda força


que me restou no corpo. Meu coração acolhendo a dor do arrependimento,
do pouco de vergonha que me sobrou, de todas as coisas que restaram por
tudo o que passamos até agora.

Devia isso ao Mosés, não pelo nosso casamento, pela separação, não
por tudo o que houve sobre a suposta traição, mas porque eu não confiei
nele o suficiente para acreditar que ele estava certo.

Mesmo que desde que soube da verdade através da Gisele tenha


justificado minha decisão de não acreditar nele com o fato de que havíamos
nos desgastado, devo esse pedido de perdão a pessoa dele.

Ao homem, ao pai, ao Mosés.

Ele se entrega ao abraço também em apertando forte de volta,


compartilhando comigo o som de choros baixos, os ruídos de gargantas com
soluços quase inaudíveis.

Sabe que seja como for, nunca mais eu irei duvidar dele em nenhum
sentido.

Nunca mais.
OUTRO DIA

Desperto e permaneço por alguns instante parada.

O braço do meu esposo está em volta da minha cintura enquanto sua


mão se enfia no meio das minhas pernas. Ele está grudado em mim e sei
que dorme profundamente porque sua respiração está pesada e vagarosa.

Tento me mover devagar para não acordar ele porque a posição


deixou meu braço dormente, contudo, o esforço de me virar faz com que
minhas costas doam, a mão dele se move e ele aperta minhas partes íntimas
com suavidade se movendo também.

Puxo o braço adormecido enquanto me deito de costas e sinto meu


corpo todo dolorido, como se eu houvesse levado uma queda e tivesse
batido as costas. Mosés se inclina se aconchegando a mim, colocando um
beijo quente no meu seio direito e depois outro no meu seio esquerdo.

Mesmo que ainda esteja quebrada, consigo sorrir.

Ergo a outra mão e toco seus cabelos enfiando os dedos neles, ele
beija a minha barriga e depois espalma meu monte de vênus com mais força
abocanhando meu seio direito novamente, sugando-o com mais intensidade.

Fico quieta puxando um travesseiro e colocando-o embaixo da


minha cabeça, me acomodando, observando-o sugar meu seio com avidez,
sentindo a boca úmida e esfaimada tomando a minha pele enquanto a língua
toca o meu mamilo devagar.

Ele esfrega o nariz no meu seio enquanto o chupa e fica quieto


apertando minha intimidade, todo a vontade. Toco o pequeno corte em sua
testa com a pontinha do indicador e depois a mancha roxa em seu maxilar.
Mosés fica por alguns instantes agarrado ao meu seio em silêncio,
me tocando a intimidade de forma carinhosa, depois quando larga esse seio
abre os olhos e ergue a cabeça me fitando todo calmo.

— Bom dia — digo e toco sua face com afinco.

— Bom dia, meu amor.

Estou satisfeita de notar que ele dormiu a noite toda mesmo com
todos os acontecimentos de ontem, não gostaria que o Mosés ficasse tão
machucado emocionalmente ao ponto de perder a noite de sono.

Os lábios dele tocam os meus num selinho e logo sem seguida, ele
me abraça colocando metade do corpo em cima do meu de forma natural.

— Que horas são? — ele indaga baixinho.

— Também acabei de acordar, eu não sei.

Estico a mão e pego meu celular em cima da mesinha de cabeceira,


aperto o botão lateral e observo as horas, arregalo os olhos indicando a tela
do aparelho para ele.

— 14:52?! — constata ele arregalando os olhos também.

Acredito que fomos dormir por volta das 00:30 por aí.

— Deve ter sido a surra — Mosés diz e pega meu celular então
começar a digitar na tela. — Vou mandar mensagem para as crianças e para
a Dulce, quero saber se a Nina está se comportando bem.

— Acho que ainda não almoçaram — começo a me erguer. — E


sobre a Nina, você sabe que ela está bem, né amor? Ela está com a Dulce.

A Dulce é uma pessoa maravilhosa.


— Seu pai disse que estão todos no jardim tirando o dia para passar
na piscina — responde ele com voz enfadonha. — E que não devemos nos
preocupar que tudo está sendo resolvido.

— Eu não duvido disso — me estigo fazendo careta e me sento toda


torta.

Meu esposo se inclina para trás e toca o meio das minhas costas, faz
cara feia.

— Muito feio?

— Está roxo, aquele animal te machucou, minha Bê!

— Só estou com as costas doloridas, como se tivesse levado uma


queda, e você?

— Um pouco dolorido, mas nada que eu não supere.

A última vez que eu o vi brigando assim com naquela boate, nossa!


Faz tanto tempo! O Trev e o Mosés não guardam mágoas daquela briga,
contudo, ainda é estranho de pensar que quase se mataram por besteira.

— Minha neném precisa de muito carinho e cuidado para ficar bem


logo — ele diz e coloca alguns beijinhos nas minhas costas.

Acabo rindo da voz manhosa que ele faz, mas decido fazer uma
brincadeira.

— Meu neném também precisa de cuidados — aviso e me inclino


na direção do negócio dele abrindo a boca.

— Opa! — Mosés abre as pernas se inclinando para trás. — Muito


dodói, tá doendo muito, Bê!
Gargalho e esse bobo acha graça também, beijo seu abdome e as
marcas roxas que surgiram nesse local do corpo do meu esposo.

Escuto batidas firmes na porta do quarto e Mosés puxa os cobertores


nos cobrindo, não consigo não revirar os olhos porque ele mesmo trancou a
porta ontem.

— Acordaram pelo visto, se vistam e venham almoçar, estamos


assando carne e vegetais — é o papai. — Ana, o papai separou um queijo
para você, pedi que levassem café, vocês têm dez minutos. As malas estão
aqui fora no corredor.

É tão fofo quando ele se refere a ele mesmo como “papai”.

— Tá — respondo e suspiro.

— Empata foda pior que a coruja — murmura Mosés baixinho.

— Eu ouvi isso, moleque! — papai avisa ainda do outro lado da


porta.

Rio de novo nesse momento, Mosés fica calado todo constrangido.

Saio da cama ouvindo os passos do meu pai se afastando para longe


da porta do quarto, não deixa de ser engraçado que o meu marido mesmo
sendo bastante adulto e dono de sua razão ainda tenha medo do meu pai em
alguns sentidos.

Mesmo que na frente dele tente parecer só respeitoso.

— Pego as malas — ele avisa saindo da cama também, se


envolvendo em um dos cobertores. — Confesso que estou receoso depois
de ontem.

— Por que? — vou caminhando até o banheiro.


— Talvez seu pai tenha perguntas.

Suspiro enquanto vou para o vaso.

— Ele não é assim, amor!

— Eu não quero ser tratado diferente por conta do meu passado. —


ouço ele falar do quarto.

— E não vai.

Duvido muito que papai fale qualquer coisa que seja, não é muito do
tipo que age assim, porém, entendo meu esposo.

Me sento no vaso e começo a fazer xixi, não acredito que o Mosés


possa ter motivos para ter medo de que papai fale qualquer coisa. Entendo
seu motivo de sentir-se envergonhado, mas isso para mim jamais será
motivo para que a minha família o recrimine.

Eles nunca fariam ou falariam nada para que ele se sentisse mal
nesse sentido.

Porque todos procuram se apoiar, apesar de que são pessoas um


tanto reclusas socialmente em diversos sentidos.

Ele entra no banheiro já absolutamente nu com a minha necessaire e


a bolsa dele, dou descarga me erguendo e vou para o box, olho para a
banheira enorme e até me bate uma vontadezinha de poder ficar horas e
horas dentro dela, entretanto agora é inviável.

— Não precisa ter medo — abro a torneira da ducha. — Ontem foi


uma noite maravilhosa apesar de aterrorizante, eu não quero transformá-la
em algo pior nesse sentido, prefiro me lembrar do fato de que obrigou meus
tios todos a dançar.
— Pedi ao seu pai que os convencesse — ele entra no box e se enfia
debaixo da ducha. — Você gostou mesmo da surpresa?

— Eu amei tanto — suspiro pegando o sabonete líquido. — Não


chega nem aos pés do que eu queria te dar depois da festa.

— E o que era, hein?

— Ah, uma trepada bem dada em qualquer canto dessa casa!

Ele sorri e me segura o pulso, então me puxa para junto de si,


despejo sabonete líquido nas nádegas dele e começo a passar a mão com
gentileza sob a pele.

— Eu quero uma trepada bem dada em qualquer canto dessa casa —


exige ele e sorri.

— Agora não tem mais graça — justifico e faço bico. —, mas posso
pensar nisso até a noite.

— Eu aceito!

— Algo de diferente no grupo da família?

— Só fotos e mais fotos das suas irmãs com as crianças no parque


se divertindo, sua mãe dando bronca no meu pai, nada que não tenhamos
visto antes.

— Parece justo.

Mosés se inclina e coloca um beijo suave nos meus lábios, suas


mãos seguram minhas faces com carinho, me sinto tão bem com isso.

— Eu não quero que lamente por nada do que houve ontem, tá?
Nem que se martirize! — digo entre o beijo. — Você não deve se sentir mal
por nada do que houve na sua infância, você não teve culpa de nada.
— Não é uma coisa que eu possa esquecer, amor — justifica, mas
calmo.

— Eu sei que não, mas quero que se lembre de todo o carinho que
aquele menininho merece, de todo amor e de toda compreensão. Eu sei que
em algum lugar dentro do seu coração você sabe que ele merece muito isso.

Ele faz que sim com a cabeça, sei que isso é muito importante para
ele, mesmo que esteja em seu passado e que hoje ele seja bem resolvido
com isso, algumas feridas em determinados momentos sempre se abrem.

— Amo você, você é o meu herói, você me salvou em todos os


momentos em que mais precisei quando nos conhecemos. Me aceitou e me
ajudou a sarar aquelas feridas feias em diversos sentidos. Eu amo você
demais, Mosés, se fiz parecer que não o amo por favor, quero reafirmar isso
todos os próximos dias da minha vida.

Ele me beija, tenho minha resposta.

Espero que tudo fique muito bem.


EM FAMÍLIA

— Achei que vocês dois não iriam mais sair daquele quarto!

Faço uma pequena careta, acabei de acordar, só que o tom


insinuativo na voz do meu primo faz com que eu até deseje que tivesse
ficado lá por esses motivos.

Coloquei um vestido leve com estampas de flores cor de rosa chá,


chinelas, Mosés vestiu um calção de malha preto e uma camiseta azul
escura, também está de chinelas.

É bom olhar em volta e ver tantos rostos conhecidos, familiares e


com sorrisos.

Nando abre os braços e sorrio abrindo os meus braços também, ele


me abraça com carinho e o aperto me sentindo definitivamente uma das
pessoas mais baixinhas da família.

Sei que sou, ainda mais com primos tão altos.

— Tudo bem, né? — Nando indaga e coloca um beijo gentil na


minha cabeça.

— Sim.

Esse homem moreno de cabelos longos presos num coque nunca me


deixa de encantar, sempre gentil, olhos castanhos claros como os da minha
tia cobertos de leveza, há sempre um sorriso doce nos lábios do Nando.

— Nós nem nos vimos ontem! — Lucinda sua esposa fala dando um
abraço caloroso no Mosés e depois vindo me abraçar. — Tudo bem,
querida?

— Estamos bem sim. — eu a abraço também.

Sou espremida, Lucinda é uma mulher de longos cabelos loiros de


olhos azuis claros, é irmã de Dominic, o que mais eu poderia esperar?
Linda, educada, doce e em alguns momentos uma mulher engraçada e
extrovertida.

— Depois de ontem eu entendi porque inventaram a palavra limite


— Nando fala dando dois tapas firmes no ombro do Mosés. — Você, meu
amigo, não sabe brincar!

Não é engraçado, porém, bem, é o Nando fazendo uma piada ácida


sobre qualquer coisa, ele é assim desde que o conheci. Não é diferente do
Tom, eles sempre mantêm esse tom de brincadeira quando se reúnem.

— Ora, deixem as crianças respirarem! — escuto mamãe falando e


ela abre caminho vindo até nós. — Venham tomar café, o seu pai já está ali
com a cara na churrasqueira derretendo queijo para você.

— Bom dia, mamãe!

No começo parecia estranho, depois ficou tão estranho porque, quer


dizer, ela é a esposa do meu pai, só que fui conquistada, então isso foi
ficando bem normal, natural, saber que o meu pai escolheu alguém
maravilhosa e receptiva para se casar no passado.

Ela sempre fez questão de me incluir, a mim e a Ayla em


absolutamente tudo, esteve conosco em todos os momentos mais
importantes, faz questão de participar de todos os aniversários dos nossos
filhos, de organizar as festas ao lado de mamãe e do Phill.

Eu aprendi a amar a Bea do mesmo jeito que ela aprendeu a me


tratar como filha desde o primeiro momento em que me recebeu em sua
vida.
Ela me abraça e tenho essa sensação indescritível de segurança, os
cabelos dela são de uma cor castanha clara com madeixas brancas por entre
elas, os olhos azuis — que é nossa característica forte, afinal, ela também é
uma Carsson — e finas linhas de expressão nos cantos dos olhos.

Quando ela se afasta noto as pequenas lágrimas surgindo entre os


cílios longos, seguro suas faces e sei que a noite de ontem a abalou de
algumas formas, porque a conheço o suficiente para saber que mamãe é
cérebro, mas é muito mais coração.

Papai é parecido com o Mosés, expressa seus sentimentos com raiva


contida, se zanga, sente vontade de quebrar alguma coisa e depois xinga, ela
não, ela ainda é a pessoa que eu só conheço há quinze anos e chamo de mãe
porque conquistou esse lugar na minha vida.

Aparecendo na minha casa com bolos numa tarde de sábado ou me


convidando para sair e tomar um chá enquanto me ouvia falar sobre os dias
difíceis.

Ela é um pouco mais da mãe que sempre desejei ter desde pequena.

— Ela está bem, meu amor, não precisa se preocupar — papai diz se
aproximando todo nervoso. — Você sabe como ela é, não sabe? É chorona!

— Eu sei, papai — afirmo e limpo as faces delas com as pontas dos


dedos. — Não chora.

Estou emocionada.

— Seu genro samurai resolveu o problema — papai diz com certo


humor. — Esse moleque atrevido, só falta me chamar de “corujo”!

Mamãe sorri, sei que se preocupa muito conosco, que sabe das
minhas dores, por mais que nos últimos meses eu a tenha afastado assim
como afastei a todos. Ela não deixou de me enviar mensagens ou me ligar,
tentar aproximações.
Eu me afastei de todos da família porque foi o que pude fazer,
porém também por conta da vergonha que senti devido a exposição, ainda
que eu soubesse que não haveria julgamentos, sei que seria complicado ter
que ver todos por perto e agir como se fosse normal.

— O menino Mosés sempre pronto para defender os seus — tio


Jonas vem segurando um copo de suco entre os dedos. — Me diga, rapaz,
agora que provou o seu valor, o que pretende fazer com o processo que
ganhamos nas costas?

— Eu fiz valer cada centavo — Mosés responde tranquilo. — E


faria tudo de novo se eu tivesse a oportunidade.

— Ele não sabe brincar — tio Alejandro fala sorridente. — Jonas


você está assustando o garoto!

Eu acho engraçado que eles falam como se fossem verdadeiros


idosos, são homens tão bem cuidados, tão naturalmente bonitos e elegantes,
acho que é como minhas tias falam, vão envelhecendo e vão ficando cada
dia mais charmosos.

— Estou brincando, garoto — tio Jonas abre os braços. — Venha


aqui, preciso de um abraço para te perdoar por ter deixado um pedaço de
merda no meu jardim.

— Jonas! — tia Patty berra perto da piscina toda séria.

Sei que todos estão rindo muito com a cara de cachorro medroso
que ele está fazendo, Mosés inclusive o abraça com riso aberto.

Também sei que não é de rir, contudo, depois de ontem a última


coisa que as pessoas da minha família querem talvez seja reviver o trauma
conosco.

Foi algo isolado, sei que em algum momento todos foram voltando
para a festa, disfarçando, fingindo que nada havia acontecido.
Outro escândalo envolvendo a mim e ao meu marido é algo do qual
nenhum de nós queremos.

Graças a Deus e ao João Lucas não aconteceu o pior.

— Dá para acreditar que ele nos fez dançar? — tio Richard indaga
perto da mesa. — Levei muito tempo para construir a minha moral e ela ser
destruída assim.

— E eu a minha reputação — tio Jack diz deitado em uma rede com


um livro de bolso na mão.

— Como se ela fosse das melhores — tio Ph está deitado em uma


espreguiçadeira com óculos escuros.

— Os rapazes amam trocar demonstrações de afeto — tia Sarah


aparece na varanda usando um maiô preto e entrada de banho transparente.
— Gente, nesse calor e ninguém vai entrar?

É muito a cara dela, parece uma personal trainer da terceira idade e


ela que não me ouça pensando isso, me mataria.

— Venham tomar café logo antes que esse bando de bebum comece
a beber — mamãe aconselha e vai me indicando a mesa do terraço coberto.

Tio Alejandro vai indicando uma das mesas perto da piscina para
que Mosés vá para lá, vejo meus tios e primos irem andando também para
esse rumo, papai vai para a churrasqueira enquanto minhas tias vão indo
para o rumo da mesa enorme do terraço.

Acho que agora vão conversar e eu sei que essa conversa será
fundamental para que saibamos o que aconteceu com aquele monstro.

Só espero que o Mosés não fique irritado com essa conversa.


— Você está mesmo bem?

Olho para a minha tia Maria e faço que sim com a cabeça.

Estamos sentadas à mesa.

Faz tanto tempo que não me reúno com as minhas tias e com a
minha mãe. Sinto falta de alguém.

— Cadê a Safi? O Tom?

— Onde você acha que eles estão? — Lucinda responde erguendo


as sobrancelhas toda maliciosa.

Bebo mais um gole do meu café e minhas bochechas vão ficando


quentes.

— Eles foram com o Dom e a Lottie buscar mais bebida — tia


Sarah responde.

— E as bebidas da festa?

— Foi incluído no buffet, então levaram o que sobrou.


— Ah, e como estão os rapazes, tia?

— Ótimos, estão na casa dos meus pais! — tia Sarah sorri.

— Eu não vi a tia Juh!

— Ela, Sávios, Maddie e Aidan foram buscar comida.

Sei que não estava nos planos de ninguém ficar, todos tecnicamente
voltam para suas casas ou hotéis depois dos bailes. Nem mesmo o tio Jonas
fica para dormir porque essa casa não estava pronta para isso.

— Não precisava de tanto, tia, sei que vocês têm suas vidas...

— Mais um pretexto para deixar as crianças com os outros avós —


mamãe justifica e coloca mais uma fatia de pão integral diante de mim. —
Coma!

— Queremos que saiba que nós lamentamos por tudo, meu amor —
tia Maria diz e passa a mão nas minhas costas. — Você pode contar
conosco, se quiser conversar estamos todas aqui.

— Eu cheguei! — escuto a voz da tia Joane ecoando por todo lugar.

A tia Helena vem logo atrás usando uma saia longa de estampas
claras e uma blusinha de alças, meu tio Nickolas entra carregando sacolas
enquanto tio Dani vem carregando mais sacolas, ambos usando calções de
banho coloridos e camisas folgadas e leves.

— Ah, minha bebê, você está bem? — tia Joanne questiona se


aproximando toda preocupada.

— Eu estou sim, tia — respondo vendo-a dar a volta na mesa e me


dar um meio abraço.
— Nem tivemos tempo de nos falar ontem, me pegaram de conversa
e eu só fiquei sabendo depois que você já estava no quarto — tia Helena
também vem me abraçar.

— Ela ficará bem — mamãe troca beijinhos faciais com tia Jô.

As três são irmãs, mas são tão diferentes em todos os sentidos e


camadas que fico meio perdida algumas vezes de pensar.

Tia Joanne é loira, toda elegante e automaticamente autocrítica,


mamãe é morena e apesar de ser meio exigente ainda é mais humilde, mas a
tia Helena ainda consegue ser das três a mais simples, ela e mamãe tem os
mesmos tons de pele, mas os cabelos da tia Helena são pretos.

— Podemos começar os trabalhos? — tio Nick questiona indo até o


freezer guardar as caixinhas de cerveja que trouxe. — Você está bem,
querida?

— Estou sim, tio Nick, você nem se juntou aos meus tios para a
valsa.

— Ainda preservo minha integridade de macho beta.

— Ouvi isso — tio Jonas berra de onde está.

Os homens juntaram três mesas redondas com guarda-sóis e estão


sentados em cadeiras conversando perto da piscina, parece ser uma
conversa descontraída.

— A sua tia não pode vir — tio Nick guarda a última caixa. — Na
próxima pode deixar que eu venho.

— Viemos todos no voo das 14:00, Helena tinha muito a fazer


também — tio Dani explica e leva as frutas e verduras para a geladeira. —
Eu trouxe chocolate para você, viu? Se quiser, está tudo aqui, o tio sabe que
você adora chocolate meio amargo.
Ah, é por isso que eu te amo, é por isso que a minha tia te ama e é
por isso que todas aqui estão suspirando nesse exato momento.

Eu gosto tanto de estar com a minha família, porque diferente dos


meus parentes por parte de mãe sempre tentam me agradar, me tratam como
se eu fosse uma criança e me mima.

Sei que é tolice, tenho quarenta e quatro anos, sou adulta demais
para isso, mas é tão bom saber que meus tios me tratam bem ao ponto de
saberem o que eu amo comer. Se isso fosse na família da minha mãe
provavelmente me mandariam emagrecer.

Nunca fui criticada por minha aparência ou meu peso, aqui sempre
foi local de acolhimento e carinho.

— A Ester está grávida então, já viu! — tia Helena diz arregalando


os olhos. — Ela e a Luiza estão insuportáveis, eu não tolero que ela esteja
grávida pela terceira vez e fique de frescura. A outra fica reclamando o dia
todo de dor para não ter nem que pegar um copo de água.

— Você fica fazendo as vontades dela, eu já disse para parar — tia


Maria argumenta secamente.

— É a nossa deixa, Dani — tio Nick se afasta depressa levando a


caixinha de cerveja.

— Eu preciso dizer que eu não tenho nem idade para ser avô, quanto
mais pela terceira vez — tio Dani o segue levando várias vasilhas com
petiscos.

— E como o Mosés está? — tia Patty questiona sentada do outro


lado da mesa. — Ele está bem?

Sei ao que ela se refere.

Não me sinto estranha de falar disso, não com a minha família.


— Ele estava meio sensível ontem à noite, foi um gatilho, acho que
passou um filme inteiro na cabeça dele e na minha também, fiquei nervosa
e apavorada com tudo o que houve.

— Graças a Deus que tudo foi resolvido da melhor forma — tia Gil
bebe dois goles de sua água com gás. — Você ainda está sentindo muita
dor?

— Um pouco tia, ele pressionou o joelho com muita força nas


minhas costas.

— Vou pedir ao seu tio algumas amostras para passar no local a


noite antes de dormir.

— Seu tio disse que ele foi indiciado por tentativa de estupro, claro,
ele está no hospital tendo todos os cuidados devidos, tem um policial
esperando-o para levá-lo preso assim que tiver a alta. — tia Sarah revela. —
Espero que ele não saia tão cedo.

— Não parece ter sido a primeira vez — concluo triste.

— E não foi, o Alê disse que ele já tem passagem por tentativa de
estupro e que já foi preso algumas vezes por vandalismo. Só que desta vez
ele se deu muito mal.

— Temos que verificar isso com cuidado, achei que o buffet só


contratava pessoas que não tivessem passagens pela polícia. — tia Helena
se senta a outra ponta da mesa.

— Jonas conversou pessoalmente com o dono do buffet, ele soltou


os cachorros — tia Patty justifica. — O homem não cobrou pelo serviço e
pediu desculpas, disse que não entendeu o que houve, acreditam que foi um
erro na contratação.

— Ele armou uma emboscada para mim, como se... já me


conhecesse por mais que eu fosse estranha.
— Não fique lembrando disso, você venceu e está aqui agora, você
é forte e é a sobrevivente — tia Duda mais uma vez passa a mão nas minhas
costas com carinho.

Afasto os pensamentos ruins e suspiro sentindo incomodo nas costas


com isso.

— Agora nos fale, como está sendo a vida intensa de sexo depois
que reataram? — Tia Sarah indaga fazendo uma cara de malícia que só ela.

— Me lembro das quatro horas em que expulsei o Nick de casa,


bons tempos! — tia Jô comenta perdida em pensamentos. — Hoje é duas
vezes por semana e olhe lá.

— Isso tudo? — tia Gil arregala os olhos. — Sabia que depois que o
Blaise nasceu eu e o Ph nunca mais tivemos liberdade para nada?

— Três vezes por semana, garotas, hum-hum, não fico sem! — tia
Sarah nega com a cabeça.

Todas começam a rir repentinamente e comigo não é diferente.

Ela é engraçada, mas quando fala de sexo fica ainda mais.

— E você, hein Duda? — tia Patty questiona toda maldosa. —


Ainda andam quebrando os quadros da sua casa?

— Meninas, por favor, não quero tornar isso constrangedor para


vocês! — tia Maria acha graça.

É, eu sei tia, eu sei!

— Todo mundo sabe que a pessoa que mais transa aqui são a Helena
e o Dani — tia Jô cochicha arrancando mais risadas de todas.
— E você que transou semana passada atrás do carro na garagem?
— tia Helena protesta escondendo o riso. — Quase que foram pegos pelos
cachorro do vizinho.!

— Helena, você é a minha vizinha!

Escuto as gargalhadas das minhas tias se espalhando para todos os


lados e não resisto em rir também. Olho para o rumo das mesas onde os
incríveis homens da família Carsson bebem e riem e noto um olhar azul
direcionado para mim.

Ele me dá uma piscadela e sinto minhas bochechas ficando


vermelhas.

Não sei se seria assim tão incorreto dizer as minhas tias que a minha
vida sexual anda bem agitada, mas vou deixar que usem a imaginação, no
momento parece muito mais interessante desfrutar de cada momento de
forma particular.
PEQUENOS ATOS

— Apleciando a vista?

Safira se senta ao meu lado enquanto exibe seu biquini estampado


de cor lilás com detalhes cor de rosa. Sorrio e me inclino para o lado
abrindo os braços, passando-os em volta da minha cunhada.

Ela sorri enquanto me devolve o abraço, escuto o som de uma


música alta agradável e daqui posso ver o Tom pulando na piscina ao lado
do Nando, jogando água em todo mundo, minhas tias fazendo careta numa
ponta da piscina enquanto a tia Júlia está sentada no colo do tio Sávios
numa espreguiçadeira e começa a dar lição de moral nos dois.

Meus tios estão jogando baralho, meu pai está conversando com o
tio Richard e o tio Ph perto da churrasqueira, eu sei que eles normalizam
muito essa coisa de falar do hospital em qualquer momento do dia, mas
precisava ser perto da churrasqueira?

Quer dizer, tem carne, linguiça!

— Apreciando — indico meu esposo sentado numa das cadeiras


atento as cartas que segura.

— Gostou das minhas peças? — Safi pergunta com um sorriso


enorme nos lábios.

— Eu amei todas elas — respondo absolutamente sincera. — Ele te


pressionou muito?

— Claro que sim — ela acha graça. — É o meu irmão.


Estou feliz de vê-la aqui, de saber que ela é parte de toda a nossa
família, de que hoje ela tem uma vida ativa e que conseguiu com o passar
dos anos realizar todas as coisas que desejou.

Safira mantém os cabelos longos em um tom mais claro nos dias de


hoje, engordou um pouco com o passar dos anos, ela também não tem mais
aquela vergonha excessiva do corpo que possuía quando saiu do hospital.

Ela ainda tem pequenas cicatrizes no corpo devido ao acidente e


uma perninha meio tropeça, ela caminha mais lento, tem dificuldade de
pronunciar algumas palavras e até os dias atuais ainda faz acompanhamento
com fisio e fono.

— Estou feliz que vocês dois voltaram, eu já sabia que isso


acontecelia — ela fala e bate com o ombro no meu. — Soube que ele
ganhou uma nova cadelinha, Dulce me enviou muitas fotos.

— Nos amamos — reafirmo segura e pego minha garrafa de


cerveja. — E sim, acho que ele estava precisando muito disso.

— Lamento pelo que houve ontem, eu quase morri de susto — ela


diz pensativa. — Nunca o vi tão zangado.

— Eu lamento que você tenha tido que ver tudo aquilo, Safi!

— Só queria que acabasse logo — ela fala devagar. — Ana, meu


irmão tem sorte, tem você pala semple cuidar dele.

— Eu sei, bobinha!

Sorrio para ela, mas Safira permanece séria.

— Quando foi que ela chegou?

Fico por alguns segundos absorvendo a pergunta, depois bebo dois


goles da cerveja e me sinto mal de ter que conversar sobre isso com a Safi,
não estava esperando por isso.

— Coly me mandou mensagem — ela diz. — Disse que queria ver


ela, se eu podelia ir junto com o Tom.

— Eu deveria imaginar — falo um pouco chateada. — Lamento que


tenha sabido dessa forma, nós não queríamos te preocupar.

— Eu não tenho medo dela! — a voz de Safi tem uma firmeza


intensa. — Estou pleoculada com ele.

Fico surpresa em acabar de ouvir isso vindo dela.

— Ela pode machucá-lo, como me machucou — Safi fala e aperta


as mãos na madeira firme da espreguiçadeira. — Eu a quero longe dele!

Noto o esforço dela ao silabar cada pequena palavra corretamente.

— Você tem que pegar uma senha e entrar na fila — bebo mais um
gole de cerveja. — Não é a única.

— Vocês vão deixá-lo vê-la?

É notável o quanto isso a incomoda.

No olhar, nos gestos dela, sei que está tensa de pensar sobre isso
assim como o Tom, ela mais do que qualquer pessoa sentiu na pele as
consequências de confiar e acreditar naquela megera.

— Não é minha escolha, Safi, ele quer.

— Mosés aprova isso? — indaga secamente.

— Conversamos e decidimos que não vamos contar.

Ela leva alguns momentos para processar minha resposta.


— Mosés concorda em não falar?

— Sim, foi uma decisão multa, o Tom e o papai estão cientes, ele
será monitorado de perto.

— Eu não concordo, porém se é o que vocês decidiram, eu apoio.

— Safi eu sei que não é justo com você.

— Eu entendo a decisão de vocês dois, se fosse com as crianças


também me sentiria mal.

Não esperava que ela fosse reagir assim, Tom e papai reagiram tão
mal.

— Só não a deixe machucar os sentimentos dele, tá bem?

— Eu não vou deixar.

Safira olha para o rumo da piscina, escolhi uma espreguiçadeira


mais afastada das demais. Ela sorri olhando para o Tom, ele está fazendo
guerrinha de água com o Nando, Lottie está no meio levando enxurrada de
todos os lados.

— Não sei como seria se ele não houvesse aparecido na minha vida,
não quero pensar no passado com raiva ou mágoa. Cheguei tão longe para
me sentir mal por conta dela, ela não irá destruir quem eu me tornei.

Estou tão feliz de ouvir isso.

— Sei o quanto feri você e o Mosés no passado, que isso fez mal,
causei os problemas do papai — ela vai falando devagar. — Não quero
mais ser aquela pessoa, nunca mais.

— Não pense nisso, Safi.


— É que não foi só culpa dela, foi minha também, eu escolhi confiar
nela, acleditar nela, eu queria tanto ser amada pelo meu irmão, desejava seu
tempo e atenção, tanto que acabei me apoiando nas mentiras dela.

Sei o que a Safi quer dizer.

Ela quer dizer que o passado ficou para trás, que está feliz com seu
presente e que não deseja sentir raiva de si mesma ou da Viviane por nada.
Que se perdoou, só que ela sabe que como isso a marcou e como não pode
mudar nada em relação a isso, ela lembra disso como prova de que não se
ressente de nada.

É como visitar lembranças de erros para não repeti-los.

— Não é dessa forma que devemos nos sentir — ela fala e me dá


um pequeno sorriso. — E eu fico feliz de saber que depois de tudo, ganhei
um irmão e uma verdadeira irmã.

Sorrio e abro os braços indo para ela, a abraço sem pensar duas
vezes, porque a Safi é de fato como uma irmã para mim, ela me conquistou
com o passar dos anos, ela me mostrou que apesar de tudo eu poderia se
capaz de amá-la.

— Quero que me plometa que se ele a machucar, você dirá toda a


verdade. — ela me aperta de volta.

— Tem minha palavra que ele saberá de tudo se eu desconfiar que


ela está tentando manipulá-lo.
— Nem me esperou?

— Acho que bebi demais, amor.

É que eu parei de contar na oitava garrafa de cerveja.

Depois que fui submetida a um desfile de moda da terceira idade,


me vi na obrigação de comer e subir. Ainda consigo ouvir as risadas e o
som da música que vem lá de baixo, só que o dia passou muito rápido e já
passa das 19:00, se conheço bem eles vão ficar até tarde e o tio Jonas vai
acomodar todos da melhor forma para passarem a noite aqui também.

Já tirei as minhas roupas, entrei no box e aqui estou apreciando cada


segundo da água quente que caí na minha cabeça pesadamente. Mosés
estava conversando com o papai e o tio Jack sobre a empresa e alguns
outros assuntos dos quais eu realmente não queria interromper.

O vejo entrando no box já sem roupas, parece meio aéreo assim


como eu, o rosto todo vermelho, exalando o cheiro de cerveja de longe,
sinto vontade de rir quando ele solta um arroto baixo.

— Opa!

Não deveria ser assim tão sexy te ver bêbado dessa forma abrindo o
chuveiro do banheiro.

— Quer um café? — indago desviando o olhar para o lado.

Não acredito que estou pensando nisso agora.

— Talvez daqui a pouco — ele responde e passa a mão nas minhas


costas. — Tá doendo, amor?

— Não, só quando forço muito — respondo e pego o sabonete


líquido que eu trouxe para a viagem. — Quer que eu te ajude?
— Acho que estou meio bêbado, então sim.

Meio? Tadinho!

Mosés começou a beber para valer por volta das 17:00 e nem faz
muito tempo, não é algo do qual eu fique interferindo, quando estamos em
família procuramos aproveitar cada momento juntos e nos divertir.

Não cometo excessos nem ele, principalmente quando estamos com


as crianças, mas é bom poder saber que eles não vieram e que nenhuma
criança Carsson estava aqui hoje. Ainda vi as minhas tias dançando a
Macarena enquanto o tio Jack dava sermão no tio Alejandro porque ele
deixou seu tofu queimar na churrasqueira.

Me questionei sobre quem em sã consciência comeria tofu no bafo e


ri comigo mesma.

Desligo o meu chuveiro e me aproximo do meu esposo, coloco


sabonete líquido na mão e depois começo a espalhar por suas costas, ele
relaxa e apoia a mão na parede do banheiro e depois enfia a cabeça dentro
do jato forte de água quente.

— O pior de tudo, é que a cerveja não tinha álcool!

Dou uma risada alta e ele se vira fazendo uma cara de bobão que o
deixa um pouquinho ainda mais viril, eu não sei explicar, nem notei que era
cerveja sem álcool, mas deve ser, é muito a cara do papai e dos meus tios
fazerem isso...

— Acho que por estar tomando remédio o tio PH não quis te dar
cerveja com álcool.

— Enfim, funcionou!

Mosés toca as minhas faces com carinho e logo em seguida me beija


se inclinando para mim, o correspondo, compartilho com ele o gostinho de
cerveja, limão e sal.

— Quero fazer um amor gostozinho com você, Bê.

— Quer, é?

— Quero, me leva para a cama, me deixa chupar minha rosadinha.

— Você parece tonto, amor.

— Você também!

Rio, nego com a cabeça e ele acaba por rir também, me solta e pego
um pouco mais de sabonete líquido, despejo em seu peito rapidamente e
volto a lavá-lo.

— Princesa, senti tanta falta da nossa família reunida, do seu pai me


dando sermão.

Ah, amor!

— Eu também senti, meu amor, acabei me isolando durante esses


meses, foi complicado para mim também.

— Eu adoro estar com a nossa família, meu amor, me sinto querido


e abraçado por todos, sinto que prezam por mim, que se importam comigo.

— Todos adoram você.

— Fazem me sentir especial, sabia?

— Porque você é!

Ele me dá um sorriso todo feliz e me abraça com força, sei que isso
significa demais para o Mosés, todo o contato que ele estabeleceu com os
meus familiares durante esses anos de convivência foi algo que fortaleceu
muito os laços dele consigo mesmo.

Porque ele cresceu sem ter uma família de verdade, foi uma criança
que passou por muitos lares ruins, então isso tem grande importância para
ele nos dias de hoje.

Mesmo que os pais biológicos dele venham visitá-lo uma vez por
mês, que ele mantenha contado com ambos sempre, que sua irmã biológica
venha nos ver a cada quinze dias ou vice e versa, ele ainda sente que
algumas vezes minha família é muito mais presente em sua vida.

Mosés não tem contato com os outros irmãos biológicos além da


Faith, eles basicamente fingem que ele não existe, seus pais são pessoas que
fazem questão de incluí-lo em tudo, em festas de aniversários, feriados e até
mesmo quando se sente à vontade para irem até nossa casa nós os
hospedamos.

— Me casei com você e ganhei tanto, sou grato Bê, muito grato
porque acima de tudo, você me ensinou que devo permitir que as pessoas
estejam perto de mim, que mereço ser amado como sou.

— Merece muito mais meu amor, me sinto da mesma forma.

Beijo seu peito e ele me toma os lábios novamente, agora com


carinho, lentidão, muito afeto.

— Ei, pombinhos! — a voz melodiosa da minha mãe soa de dentro


do quarto. — Fiz café para vocês dois, vou deixar aqui na escrivaninha.

— Obrigado, minha sogra!

— Garoto, você não era tão fraco para bebida assim não, hein?

Rio ao ouvir a risada da minha mãe se afastando pelo quarto, Mosés


sorri todo bobo e jogo sabonete líquido no monte de púbis dele, então
começo a lavar todo o local devagar, com carinho.

— Mais motivos para não descermos — ele diz baixinho.

Será que precisaremos de mais motivos para que eu não faça o que
ele me pediu?

Confesso, estou tão tentada!


INCONVENIÊNCIA

Ouço o som do meu celular vibrando sob a mesinha de cabeceira e


estendo a mão tateando tudo para pegar o aparelho. Quando enfim o pego,
Mosés vai para o lado puxando o cobertor.

Abro bem os olhos analisando o número desconhecido, penso sobre


não entender porque sei que é madrugada, sei que é tarde, porém, também
nem consigo imaginar quem ligaria para mim essa hora e talvez seja
urgente.

— Ana.

— Te acordei, queridinha?

Essa voz.

Levanto o celular e forço as vistas digitando rápido na tela, em


busca da parte de gravação, seleciono ligeiramente e quando o timer se
inicia coloco o celular novamente na orelha.

— Vai fingir que não está me ouvindo? — Viviane questiona do


outro lado da linha.

— Estava dormindo.

— Passei toda a tarde tentando falar com o meu filho e não


consegui, o que houve?

Ele não é seu filho!

— Bem, eles estão viajando com meus pais, não estou junto.
— Eu sei que eles estão viajando com os seus pais, eu só quero
entender porque ele não atende as minhas ligações.

— Eu não sei, Viviane.

Mosés se move na cama e depois vejo o abajur de sua mesa de


cabeceira ser ligado, ele estreita os olhos para mim todo assustado e tenho
essa sensação de que é a vibe oficial que essa bruxa passa para todos nós.

— Não quero ser incomodada de madrugada, quando precisar tratar


de qualquer coisa em relação a ele, basta que me envie mensagens.

— E como está sendo essa sua viagem? Curtindo bastante? Vi nos


jornais que vocês dois reataram.

Reviro os olhos e coloco no viva-voz, faço gesto de silêncio para o


meu marido e ele faz que sim com a cabeça.

— Viviane, tem algo para tratar em relação ao Cory? Do contrário


eu quero voltar a dormir.

— Sinto que você está tentando me afastar do meu filho, bastou


decidir viajar para enviá-lo para outra viagem também? — a voz dela está
cheia de rancor.

— O Cory costuma viajar com os irmãos e os avós sempre que quer,


não o forcei a nada, se quiser pergunte a ele — respondo num tom mais
firme.

— Sei que você se esconde por trás dessa máscara de mãe boazinha,
mas não passa de uma controladora, ele me disse que você não o deixa sair
com os amigos durante a semana, não concordo com isso.

Mosés franze a testa e eu fico do mesmo jeito, tenho essa sensação


de que a inconveniente não vai desistir tão fácil até conseguir me irritar ou
tentará me tirar do sério.
— Eu e o pai dele recomendamos que ele se concentre nas aulas
durante a semana, dinheiro não dá em mato, Viviane.

— Dinheiro esse que ficou numa conta para que ele usufruísse, meu
dinheiro!

— Nós não mexemos em nada seu ou da sua família, todo o


dinheiro que ficou para que cuidássemos do Cory permanece na poupança
que o juiz designou quando pegamos a tutela dele. Toda a herança que o pai
biológico dele deixou para ele está lá, incluindo todos os bens e imóveis.

O pai biológico do Cory deixou um testamento onde o nomeava


herdeiro único e necessário, não deixou nada para a Viviane. Eu e Mosés
pagamos a um advogado para organizar tudo isso na época, sabemos de
números e que o Cory é um herdeiro bastado, só que é algo do qual ele
também não dá a mínima.

Nunca deixamos faltar nada para ele.

— Eu acredito que de todas as formas, ele não iria desamparar a


própria mãe — ela fala devagar como se saboreasse cada pequena palavra.

— Eu preciso dormir, estou cansada.

— Com essa vida de dondoca que você leva, acho meio difícil que
você se sinta cansada, não é mesmo?

Mosés revira os olhos todo cheio de deboche, e, realmente me vejo


fazendo uma careta estranha por conta disso, porque ela definitivamente
ligou para nos encher a paciência.

Acho que subestimei mesmo a Viviane, ela me ligou na empresa e


agora está com meu número particular, algo do qual realmente não pensei
que ela faria, só que já começo a mentalmente pensar que terei que bloquear
esse número dela.
— Ele está aí com você?

— Ele quem?

— Você sabe quem!

A voz dela assume um tom mais baixo e sério.

— O Mosés está dormindo no quarto, vim para outro cômodo.

Eu quero que ela fale bem muito, mas bem muito mesmo, preciso
aproveitar todas as oportunidades porque elas serão evidências para nos
proteger de futuros problemas, bem como o Cory também.

— Você deve estar feliz vivendo a minha vida, mas de uma coisa eu
tenho certeza, pessoas como você que constroem uma família às custas da
felicidade dos outros uma hora ou outra caem.

Eu riria se ouvir isso não fosse completamente absurdo.

Fico um tanto nervosa com a acusação e principalmente com o tom


severo e meio ameaçador por trás da voz do outro lado da linha.

Ela realmente acredita que eu roubei o Mosés dela, que roubei sua
chance de ser feliz, ela é definitivamente a pessoa mais narcisista e
desequilibrada que eu já conheci em toda a minha vida.

— Eu o roubei de você? — indago bastante firme. — Eu tenho cara


de quem precisa roubar o homem de ninguém, Viviane? Éramos solteiros,
você o largou para voltar para o seu marido, Mosés e eu nos apaixonamos.

— Você está distorcendo as coisas — ela diz secamente. — Eu e o


Mosés tínhamos uma história antes de você.

— Já que está tão convencida por que você não telefona para ele e
pede para que ele volte para você? Se o amor de vocês era tão imaculado
assim porque ele me escolheu? Eu não fui obrigação, não! Eu fui escolha,
Viviane, até quando você irá ficar repetindo para si mesma que eu criei tudo
isso?

Ela fica calada do outro lado da linha.

— Você é a mãe biológica do Cory e infelizmente isso eu nunca


poderei mudar, mas já que se quer se reaproximar dele poderia fazer isso
por ele, não pelo Mosés.

— Eu quero o meu direito de ser feliz, fiquei mais de quinze anos


trancada naquele inferno sendo dopada enquanto você viveu todos os
momentos com o meu filho, com o meu homem! — ela berra de um jeito
descontrolado.

— Você sabe o que fez, não sabe? Não pensou duas vezes antes de
dopar o meu filho e apontar uma arma para mim, você não pensou antes de
causar tudo aquilo a Safi e ao Phill.

— Eu não tenho culpa se aquela retardada sofreu acidente, aquela


manca deveria era ter morrido.

Me dói ouvir isso, todo esse ódio novamente, essa crueldade.

Essa sim é a natureza dela, essa é a verdadeira Viviane Bianc.

Mosés toma o celular da minha mão e desliga a ligação, respiro


fundo tentando dizer para mim mesma que são apenas palavra de alguém
com quem não devo ter consideração, que não devo me magoar, mas na
realidade não é assim.

Me magoa, dói ouvir ela falando algo assim.

— Vou enviar uma mensagem a advogada e pedir uma medida


protetiva e de distância — Mosés digita rapidamente no meu celular e
depois se levanta todo chateado. — Essa desgraçada nunca vai mudar.
Sei que não.

Infelizmente quem sempre pagará o preço por tudo isso seremos


nós, porque alguém decidiu que a Viviane está bem o suficiente para ficar
em liberdade e não há nada que possamos fazer para que isso mude.

A justiça é algo do qual se baseia mais em acontecimentos reais do


que hipotéticos e sabemos disso muito bem. Tenho visto com o passar dos
anos principalmente que entre as mulheres isso é algo que não funciona.

O cara só é preso quando consuma algum crime e o fato dele ser


preso também não vai trazer ela de volta. Agora nem consigo imaginar o
trabalho que daria eu ter que tentar provar para justiça que a Viviane merece
ficar presa pelo resto da vida.

Sem falar que isso causaria muita dor no meu filho, machucados
sem precedentes.

Acho que chegamos novamente naquele tipo de situação em que não


podemos sair de qualquer forma, da última vez conseguimos sair porque ela
foi presa, internada, agora ela está novamente em liberdade.

Ela em liberdade e nós presos a ela.

— Vou resolver do meu jeito — Mosés fala e deliga meu celular. —


Vamos voltar a dormir.

— Tá.

Não tenho nenhuma alternativa além desta, tenho?


INFORTÚNIO

— O que foi?

— Acho que preciso de um favor.

Tio Jack me lança um olhar bastante duro, logo em seguida ele


indica um canto ao lado do banco de pedra e olha para o belíssimo e
extenso jardim da mansão do tio Jonas. Me sento nesse banco que é
idêntico ao que fui basicamente jogada antes de ontem, contudo, não me
parece viável pensar nisso.

Acordei agora a pouco, deixei o Mosés dormindo entre os


cobertores e decidi vir dar uma caminhada aqui no jardim. Minha tia Duda
estava na cozinha ao lado da tia Patty preparando o café e havia muito
silêncio em todo o lugar.

Depois alguns votos de “bom dia” vim para cá, avistei meu tio de
longe, sentado no banco de pedra lendo um livro, tomando uma caneca de
chá, parecendo perdido em pensamentos profundos, tão calado ou até mais
do que de praxe.

— É sobre a Viviane?

— Preciso saber sobre ela, acho que dessa vez preciso estar munida
para que ela não acabe destruindo nada de novo.

Tio Jack me lança um olhar pensativo e fica em silêncio com seu


livro de bolso numa mão e a caneca de chá na outra, olhos verdes mais
claros nessa manhã, os fios grisalhos evidentes dos lados das orelhas. Ele é
um homem grande assim como papai, bem, como todos os homens da
família, é meio forte, tem um porte razoavelmente atlético, não deve ser tão
mais velho que eu porque é um dos mais novos dos meus tios.

É estranho ver que tenho tios jovens e um pai também bastante


jovem, também, ele foi pai na adolescência, o que eu queria?

— Preciso que entenda algo e sei que isso vai te custar muita
paciência e compaixão — tio Jack ergue a caneca e a leva até a boca então
bebe um gole curto de chá. — Viviane tem problemas mentais sérios.

— E isso é motivo para que ela aja como vem agindo?

— Não é motivo, mas justifica o comportamento dela. Eu e seu pai


tivemos acesso ao prontuário dela e olha, é de dar pena. Esquizofrenia
paranoide, borderline, ansiedade e depressão.

Franzo a testa até meio surpresa, sempre soube que ela tinha
problemas mentais, mas não tantos nesse sentido.

— Eu não quero que sinta pena dela, mas acho que você sabe que
todos nós sofremos muito com problemas emocionais durante a vida. — tio
Jack olha para os arbustos mais adiante e parece distante. — E eu entendo
muito seu sofrimento, mas nesse sentido talvez não haja muito o que se
fazer.

— Então só porque ela tem problemas mentais eu terei que aguentar


ela pelo resto da minha vida. — concluo com chateação.

— Isso só significa que talvez ela se comporte assim justamente por


ter esses problemas, eu imagino que ela não esteja se medicando porque
acredita que será o melhor para si mesma. No prontuário dela dizia que sua
internação no hospital penitenciário foi muito tranquila, que ela teve um
excelente comportamento.

Acreditaria muito pouco nisso se não fosse meu tio a me falar.


— Viviane tem muitos problemas por conta da infância dela...

— Aí você vai me dizer que ela sofreu abusos e que por isso ela é
daquele jeito!

— Ela foi estuprada diversas vezes pelo padrasto com apenas dois
anos de idade, Ana!

É muito forte ouvir isso, forte demais, é algo do qual eu não


esperava ouvir jamais, não a Viviane que eu conheci.

— Não espero que tenha pena dela, como eu já disse, eu sei que o
melhor para ela talvez fosse ficar internada, só que não é a realidade agora.
Sei também que te machuca muito saber disso e ter que lidar com o fato de
que ela é genitora do seu filho, só que eu sei o quanto é difícil lidar com
problemas emocionais.

Engulo a seco, tio Jack bebe mais um gole de seu chá.

— Não há nada que possamos fazer em relação a isso além é claro


de aguardar, esperar que ela faça qualquer coisa que possa dar algum
motivo para que ela seja internada novamente.

— Ela está me assediando.

— Lamento que esteja passando por isso, mas foi um risco que
decidiram correr quando adotaram o Cory.

Não esperava por essas palavras por parte do meu tio, mesmo que
me doa saber sobre o passado da Viviane porque nenhum ser humano
merece ser submetido a nada disso, achei que o meu tio me ouviria e que
não seria tão duro ou faria vista grossa.

Junto as mãos e começo a me erguer, tio Jack pousa a mão no meu


ombro e me lança um olhar hesitante, como se dissesse que não acabamos
nossa conversa. Por mais que eu saiba que isso não me levará a nada porque
ele provavelmente vai começar a usar os problemas mentais e emocionais
dela para justificar as ações dela, sei também que devo terminar de ouvir o
que ele tem a dizer.

— Sei que é difícil, quer falar como se sente?

— Acho que o senhor não precisa de saber como me sinto, tio, é


injusto e sabe disso.

— É injusto que eu te fale a verdade? Que faça com que você veja
que a forma como se sente não vai mudar o fato de que ela também não vai
se cuidar e viverá pelo resto da vida assim?

— Que o senhor ache que eu deva me submeter ao comportamento


dela porque ela tem problemas e traumas como se os dela fossem
justificativas para causar tudo o que causa na vida de todos nós.

— Ana, há problemas na vida que não se resolvem assim. Quando


você se casou com o Mosés decidiu que os problemas dele também seriam
seus problemas, portanto, não adianta que venha até aqui e se sinta a única
pessoa do mundo a passar por algo do tipo. Acha que é a primeira pessoa da
família a ser perseguida por alguém?

Não respondo porque realmente essa linha de raciocínio não entra


na minha cabeça.

— Lamento que esteja se sentindo assim...

— Não, tio, você não lamenta! Eu vim te pedir ajuda e ao invés de


tentar me ajudar você está me dizendo para ter pena dela? Não é muito
justo!

— Sei que não é justo, Ana, só que não posso me comprometer mais
do que já estou me comprometendo. Não há nada que possamos fazer de
diferente além de garantir a segurança de todos vocês. Não é algo que se
faça por vingança, você precisa compreender que não posso mudar nada
nesse sentido.

— Então devo deixar que ela fique me telefonando e me


ameaçando?

— Eu não disse isso!

Eu percebo certo incomodo no jeito do tio Jack de falar, mais para


hesitação mesmo, como se estivesse evitando de ficar bravo ou algo assim,
ponderando.

— Você não deve dar tanta importância para a Viviane, ela não irá
se aproximar de vocês como no passado, te dou a minha palavra de homem
que tudo o que estiver ao meu alcance eu farei.

— Não me sinto segura com suas garantias.

— Então é uma tola.

Nossa!

Tio Jack fica me encarando agora visivelmente zangado, me sinto


um tanto ofendida e nervosa, porém não digo nada, me ergo e decido que
não adianta mesmo ficar tentando conversar com ele sobre isso.

— Sua postura sempre dirá mais sobre você do que sobre a Viviane,
Ana. Não importa o que ela faça, isso sempre te atingirá porque ela sabe
que você é insegura com isso e você não deve ser assim. Não pode achar
que ela vai te deixar em paz porque isso não vai acontecer e enquanto ela
souber das suas fragilidades e dos seus medos ela sempre exercerá controle
sobre você.

— Obrigada por todas as palavras de apoio e afeto, tio. — falo e


começo a me afastar. — Obrigada também por me chamar de fraca e por
dizer que não vai me ajudar.
— Eu lamento que não tenha dito o que quer ouvir, mas nada que eu
fale vai te trazer sensação de segurança ou conforto. — tio Jack fala
enquanto vou andando para longe dele. — A Viviane nunca vai mudar, Ana,
mas você tem essa oportunidade, você é uma Carsson e está nas suas veias.

Ergo a mão e exibo o dedo do meio enquanto vou andando de costas


para ele, ouço uma risada baixa e continuo a caminhar para dentro de casa.

Agora que tenho minha resposta, sei o que não devo fazer.

— Aconteceu algo que eu deva saber? Por que estão fazendo as


malas?

Lanço um breve olhar para papai, ele entrou no quarto sem nem
pedir ou bater, os olhos azuis focados em mim de um jeito duro, imagino
que o Mosés tenha avisado para ele. Subi há alguns minutos e decidi que é
hora de irmos embora para nossa casa.

Pedi que ele tomasse banho e depois descesse para tomar café,
avisei que arrumaria as malas. Quando retornei ao nosso quarto ele já estava
acordado mexendo no celular, imaginei que fosse algo sobre a ligação que
recebemos na madrugada.
Ele também nem questionou, acho que sabe que devemos voltar
para casa e resolvermos isso da melhor forma possível. Fui pedir ajuda do
meu tio e ele se mostrou muito mais piedoso com aquela cobra do que
comigo ou minha família.

É claro que eu entendo o ponto de vista dele, só que eu não posso


também fingir que isso é suficiente para que eu tolere ou aceite o
comportamento da Viviane.

Acabou que mesmo depois de eu ter decidido que não deixaria que
ela atrapalhasse nossos dias, não está funcionando, ela está me afetando
sim, e não tem nem um mês que ela saiu do hospital.

— Decidimos voltar para casa — respondo enquanto vou colocando


as roupas dobradas na mala novamente.

Mamãe desfez nossas malas ontem, em algum momento enquanto


estávamos lá embaixo com a família, ela subiu e arrumou tudo, agora já
estou pegando tudo e colocando novamente nas malas.

— Ana está zangada porque eu disse para ela tentar lidar com os
problemas sem que isso a afete — tio Jack entra no quarto com as mãos
enfiadas dentro dos bolsos do short que usa.

— Ele me chamou de burra! — exclamo chateada.

Meu pai fecha a cara para meu tio.

— Burra não, tola! — tio Jack corrige ainda sucinto.

— É a mesma coisa — papai retruca secamente.

— Eu só disse a ela que não adianta que ela fique polarizando a


situação, que todos serão protegidos, acho que ela queria ouvir algo como
“pode deixar, sumo com o corpo”.
Reviro os olhos e fecho a primeira mala em cima da cama, papai se
aproxima e passa por mim, logo abre o zíper da mala e começa a retirar as
roupas de dentro e ir colocando dentro da cama.

— Você! Pare de chamar a minha filha de burra, ela não é burra! —


papai ordena e lança outro olhar fulminante para tio Jack e depois me
encara. — E você minha filha, por favor, não fique tão magoada assim com
o que esse velho te falou, ele é a ama tanto quanto eu te amo.

— Pois não é o que parece — protesto pegando as roupas e voltando


a colocá-las dentro da mala.

— Ana, pelo amor de Deus! — tio Jack fala sem emoção alguma na
voz. — Eu só quis dizer que não deve se preocupar demais com isso, que
ela sabe que te atinge por isso faz isso e que no momento não há muito a se
fazer por conta dos problemas mentais dela.

— É tão fácil, não é? É o seu filho? Da última vez que a Viviane


esteve perto de mim eu sei o que passei, eu tive uma arma apontada bem
para a minha cabeça, minhas filhas todas no quarto ao lado, meu filho
desmaiado de tanta droga que ela deu para ele, então não, tio! Eu não posso
me dar ao luxo de não me preocupar! — reclamo irritada. — Sabe a
sensação que eu tenho? É que tudo vocês procuram justificar porque é mais
fácil para vocês lidarem com isso do que terem escândalos.

— Eu não estou tentando justificar, querida!

— Ah, tio, uma hora dessas? Pelo amor de Deus, né?

Meu tio caminha até as portas da sacada e fica olhando para o


jardim em silêncio mais uma vez. Sei que por mais que ele tente me
explicar não entra na minha cabeça que devo ser compassiva e receptiva
com tudo isso.

Não serei conivente com a postura da Viviane, mesmo que ela tenha
todos esses problemas, na minha cabeça é algo do qual ela deveria tentar
cuidar, por mais que seja difícil, ao menos se medicar.

— Eu a entendo...

— Você a apoia porque não foi com você! — corto ele.

— Eu a entendo porque a história dela fala comigo, porque eu


também sofri abusos na infância, Ana, eu sei como é ser uma criança que
passou por estupro e abusos físicos e emocionais e o quanto isso me fez mal
por quase toda a minha vida. — revela meu tio e me olha assim de repente.

Engulo minha resposta, sufoco com essas palavras, papai cai


sentado no colchão da minha cama totalmente estarrecido com o que
acabou de ouvir. Me seguro na parede mais próxima e me dá uma
tremedeira nas pernas, isso é tão forte.

— Eu levei um tempo até me curar e levei um tempo para aceitar e


acolher toda a dor que isso me causou a longo prazo. Posso te dizer por
experiência própria que lutei muito contra todas as sequelas, que entrei em
negação e tive resistência com remédios. Eu sei como é difícil cuidar as
feridas de ser estuprado. — meu tio diz profundamente tranquilo. — E sei
que você jamais se sentiria confortável de saber que um bebê foi abusado
por anos por alguém próximo, que essa criança foi negligenciada pela
própria mãe e usada diversas vezes como moeda de troca por dinheiro.

Fico calada, ainda engolindo o som de todas essas palavras,


espantada com tudo o que o meu tio está falando.

— Sei que é difícil e complicado lidar, Ana, ninguém gosta de ficar


sabendo de coisas assim vindas de pessoas tão próximas porque assusta,
mas acredito que como o Mosés também passou por tudo isso, você mais do
que ninguém saiba que ignorar as consequências disso há longo prazo pode
basicamente enlouquecer qualquer um. — meu tio faz uma pequena pausa.
— Eu ainda tive e tenho a sorte de ter a sua tia, ela nunca desistiu de mim,
mesmo que algumas vezes eu parecesse nada disposto a lidar comigo
mesmo. Eu a machuquei por todo esse processo até entender meus
problemas emocionais e traumas de infância. Fui uma péssima pessoa com
ela por diversas circunstâncias, omitia coisas dela por vergonha, por medo.
Acho que se eu não houvesse conhecido ela, basicamente teria morrido
durante o processo.

É tão ruim ouvir isso, em tantas camadas, de tantas formas.

Meu tio sempre foi uma rocha, alguém do qual todos se inspiram e
se orgulham, nunca passaria pela minha cabeça que ele foi abusado também
na infância.

— Acredito que se você se der a oportunidade de ver a Viviane com


compaixão assim como eu permiti me ver, talvez as coisas para você
melhorem. Não há nada que possa fazer para reverter tudo o que ela passou,
mas pode deixar claro que por mais que ela tente te atingir, sempre verá ela
como ela merece ser vista.

— Lamento que tenha passado por isso, irmão — papai fala para ele
com os olhos cobertos por lágrimas. — Foi ele?

Papai parece por dentro de algo que não sei, não faço a mínima
ideia, tio Jack faz que sim com a cabeça em silêncio. Acho que essa é a
primeira vez em muito tempo que vejo meu pai chorando.

— Eu não guardo rancor ou raiva, nem tristeza, sou resolvido com o


meu passado, mas preciso que você saiba que eu nunca, jamais iria
vitimizar a Viviane por mais uma vez, Ana. — tio Jack fita e isso me deixa
um pouco mais triste. — Eu te amo, é filha de um primo que ao longo dos
anos se tornou um verdadeiro irmão. Leal, justo, digno de todo respeito do
mundo assim como seu tio Richard. Só quero que você entenda que mesmo
que ela tenha te feito mal, jamais te diria para tratar ela como ela a tratou.

— Eu nunca faria isso — respondo com vontade de chorar.

Ah, odiei confirmar o que o Mosés disse antes de ontem, odeio


saber que o meu tio passou por isso também. Sei de todo o sofrimento que o
meu marido teve que passar para lidar com os traumas de infância dele.

— Quero que saiba por mim que se ela não houvesse passado por
tanta coisa ruim, eu mesmo providenciaria para que ela ficasse presa, mas
tive o infortúnio de ver os prontuários dela, de saber de sua história de vida.
Não é algo que nenhuma criança deva passar.

— Eu sinto muito que você passou por isso, tio, eu nunca poderia
fazer ideia.

Ergo os braços e vou na direção dele começando a chorar.

Tio Jack retira as mãos dos bolsos e recebe meu abraço passando os
braços em volta de mim, me apertando com força. Me sinto péssima agora,
meu coração até dói de saber que ele passou por isso.

Papai se aproxima e nos abraça também todo choroso, acho que com
a idade essa carga emocional vem para ele vagarosamente. É algo do qual
não costumo presenciar tanto entre os homens da família. Não com tanta
naturalidade.

— O que está acontecendo aqui? Eu perdi alguma coisa?

Olho para o rumo da porta e não solto meu tio, papai também não.
Ali perto da soleira, meu esposo está segurando uma vasilha com pedaços
de melancia, ao lado dele a minha tia Maria, ou melhor, Duda.

Ela sorri e troca esse olhar intenso com meu tio e ele sorri para ela
como se dissesse um segredo só deles, é algo do qual percebo sempre que
trocam olhares, algo realmente lindo e forte que parece fazer um pouco
mais de sentido agora.

Bastante sentido eu diria.


EM UM OUTRO MOMENTO

— E então, o que houve?

O fofoqueiro nem me esperou guardar as roupas no closet e já está


aqui do meu lado me instigando.

É verdade que com o passar dos anos o Mosés foi se tornando


sociável e bastante falante com a convivência com as pessoas da minha
família.

Só que também é um curioso sem precedentes.

— Só conversa de família mesmo.

— Ao ponto do sogrão chorar?

— Ele também é humano, amor.

— É que eles são sempre tão sérios!

— Você também é sério e outra, o papai já é quase um idoso.

— Sei.

Sorrio, meu esposo fica parado ao meu lado com os braços cruzados
como se esperasse que eu dissesse o real motivo por trás da choradeira de
momentos atrás.

— Eu não vou dizer, mas ao menos meu tio me garantiu que vai
resolver essas questões de segurança em relação a Viviane.
— Ah, então foi por conta dela que você fez os dois idosos
chorarem?

— Talvez.

Fungo, meu marido me agarra assim de repente e me abraça cheio


de carinho, começa a beijar meu ombro, meu pescoço. Em momento algum
sequer cheguei perto de me questionar sobre todas as consequências de ter
escolhido ficar com o Mosés no passado.

Mas me trouxe reflexão tudo o que o meu tio Jack falou sobre isso.

De fato, mesmo depois das brigas, da separação, das crises, de tudo


o que passamos, nunca pensei em tudo isso como se fosse algo do qual eu
tivesse que passar por ter escolhido me casar com ele.

Anos atrás eu pensei sim na carga de estarmos num relacionamento


porque éramos muito diferentes em todos os sentidos, tanto físicos quanto
emocionais, hoje não é assim, porque mesmo com meus problemas —
velhos problemas — de baixa estima, ainda me sinto igual em relação ao
Mosés num bocado de coisa.

Acho que só temos cargas de vida diferentes e saber como lidar com
isso para mim no passado foi algo complexo, hoje é algo do qual não vinha
me preocupando tanto até a Viviane reaparecer.

Porque o Mosés veio com uma bagagem maior que a minha, ex-
namoradas, uma infância difícil e muitos traumas, ele tinha tanta
dificuldade de estar perto do pai, da própria irmã, isso mudou bastante em
bons sentidos.

Ele se tornou aberto, carinhoso, mais presente na vida de ambos.

— Eu entrei em contato com a companhia telefônica, pedi que


bloqueassem o número dela e enviei mensagem ao Cory pedindo
encarecidamente que ele fale para ela não entrar em contato conosco.
— E o que o seu saudoso filho disse?

— Que só passou o seu número por segurança, para o caso de ele


ficar sem celular, pareceu meio apático com a bronca, mas mandou uma
selfie mandando um legalzinho com a mão.

— Resumindo, ele foi debochado com você.

— Foda-se o deboche dele, não fomos consultados sobre isso.

— Prevejo as conversas dramáticas quando ele chegar.

Me viro para ele e o abraço encostando o rosto em seu peito.

— O Cory está na defensiva, é normal — Mosés diz e coloca um


beijinho na minha cabeça. — Não gosto de te ver chorando.

— Eu sei que não, posso te fazer uma pergunta?

Parece o momento oportuno para saber disso.

— Claro.

— A Viviane te falou alguma coisa sobre ter sofrido algum abuso na


infância?

— Não, por que?

— Bem, meu tio me disse que teve acesso ao prontuário dela e que
descobriu que ela sofre com várias doenças desde pequena, algumas dela
desenvolveu devido a abusos na infância.

— Ela sempre me disse que sofria bastante com o marido quando


nos envolvemos, como estavam separados ela me disse que ele era abusivo
e que as vezes a espancava e que por isso que ela o deixou.
— Meu tio disse que descobriu coisas ruins sobre a infância dela,
nós discutimos e ele tentou justificar que ela é assim por conta desses
abusos.

— Não tolero muito essa ideia.

Nem eu, mas...

— De todas as formas já é comprovado que ela é esquizofrênica e


que tem borderline, talvez isso explique essa fixação que ela construiu em
cima da sua imagem.

Mosés se afasta me soltando e faz cara feia.

— Entendi, você ficou brava porque seu tio te contou que ela age
assim porque é doente e depois queria ir embora, então seu tio voltou aqui e
disse que tem que aceitar isso porque ela é doente e você decidiu ficar.

— E você está zangado por isso?

— Não zangado, mas estou começando a entender sua reação e sua


hesitação em relação a tudo.

Coloco um beijo leve em seus lábios, Mosés segura a minha mão e a


ergue, coloca um beijo suave nas costas da minha mão.

— Ele não a conhece, por isso está tentando amenizar a situação.

— Eu sei, só que quero que nós saibamos como lidar melhor com
isso e sei que não saberemos se não soubermos de fato quem é a Viviane,
sinto que por mais que você tenha dito sobre ela, ela ainda é uma
desconhecida.

— Não sei mais do que ela sempre falou, a época em que me


envolvi com ela eu usava drogas e bebia, foi um refúgio para toda a dor que
eu sentia por não saber lidar com meus traumas.
É tão familiar o jeito como ele fala em relação a forma como o meu
tio também falou, nunca vai deixar de ser triste. Me vem à mente sobre o
que o tio falou dela, sobre os abusos que ela sofreu ainda bebê, isso é um
pouco mais triste agora.

— Sei que você não gosta de falar sobre esses momentos da sua
vida, mas como era a relação?

— No começo eu achava que me sentia atraído por ela, depois eu


me dei conta que só estava tentando mais uma vez me encaixar.

Ele entrelaça os dedos nos meus e me puxa para fora do closet, sei
que precisamos ter essa conversa porque foi algo do qual fizemos pouco no
decorrer desses anos. O episódio com a Viviane ficou enterrado no passado
e foi algo do qual não temos comentado.

Seu retorno traz à tona toda essa situação, só que também me faz
pensar agora no quanto eu e Mosés pouco falamos sobre ela em si. Me faz
pensar no quanto Viviane foi insignificante na vida do Mosés em vários
sentidos e teria sido na minha se ela ao menos nos desse ao luxo de ter sido
como a Sammy, entretanto, ela preferiu nos marcar.

Caminhamos de mãos dadas para a sacada e Mosés se senta numa


das cadeiras almofadadas, ele me puxa e me sento de lado em seu colo.

— Estive muito empenhado em entender meu papel no mundo, Ana,


isso me custou anos de uma vida superficial e vazia. Eu tinha essa revolta
dentro de mim que me fazia querer provar a todo custo que eu poderia ser
normal, que poderia ter uma vida perfeita, então eu acabei me envolvendo
com a Sammy, depois com a Viviane.

Compreendo o que ele quer dizer.

— Me senti preso a um hiato depois que a Sammy se envolveu com


o Jammie, fiquei só por um tempo, conheci outras garotas, mas não me
envolvi com nenhuma delas. Os encontros terminavam e eu mal conseguia
tocá-las, até que eu conheci a Viviane.

— Ela é muito bonita.

— Não era só por isso, quando nos encontramos pela primeira vez
ela me fez realmente sorrir, foi gentil e divertida comigo, também sedutora.

— Ela te fez se sentir seguro e amado.

— Achava que por ela me dar atenção e me cobrir de elogios estava


sendo realmente amado — os olhos do meu esposo se tornam vagos. — Era
o que eu estava buscando há anos, alguém que preenchesse aquele vazio
sem sentido, por alguns momentos ela me fazia sentir assim. Quando íamos
a alguma balada e bebíamos ou usávamos drogas. No dia seguinte eu me
via acordando numa cama de hotel sozinho com um bilhete onde ela dizia o
quanto eu era especial e o quanto a fazia feliz, pareceu suficiente.

Toco sua face, nutro grande admiração pelo meu marido, isso não é
novidade, mas ouvir esse tom de sinceridade em sua voz é sempre surreal.

— Foi uma anestesia, como que algo que te tira a dor por alguns
momentos, conhecer o Cory sem sombra de dúvidas me fez querer muito ter
uma família. Eu adorava ficar com o garoto, ele era carinhoso demais
comigo desde o primeiro momento em que o vi. — os olhos dele assumem
leveza. — Ainda me lembro da primeira vez que ela o levou para que eu o
conhecesse, ele sorriu para mim, sabe Bê? Ficou meio tímido e depois se
jogou nos meus braços me abraçando.

Ele sorri e devolvo o sorriso, conheço bem aqueles olhinhos lindos


quando ele sorri, desde pequeno o Cory sempre foi bastante carinhoso e
doce, de todos os nossos filhos ele é sem sombra de dúvida o mais afetuoso.

— Pensei “darei ao moleque tudo o que não tive”, passei a visitá-lo


toda semana, Ali escolhia alguns presentes e eu levava para ele, eu procurei
tentar dar ao garoto tudo o que nunca tive. Em minha cabeça o Cory sempre
foi como um filho.

— Na minha também, desde que ele chegou a nossa casa.

— Só que depois eu fui descobrindo essas coisas sobre a Viviane e


sempre que a confrontava, ela ameaçava de me afastar do Cory. — seus
olhos se tornam turvos. — Ela mentia muito para mim, me dizia que estava
separada, mas quando eu a seguia ela estava em restaurantes caros com o
marido. Ela inventava desculpas sobre se divorciar e eu por me sentir
anestesiado ao lado dela e do garoto tolerava tudo isso. Quando eu a
confrontei uma última vez depois de meses juntos, ela disse que não
largaria o marido por mim e me abandonou.

— Na mente dela é tudo tão distorcido que ela fez parecer que eu
roubei você dela, ela disse isso ao Cory.

— Tentei manter contato com o garoto, mas ela impôs condição de


que eu deveria ficar com ela também mesmo ela estando casada, aquelas
alturas ela se aproximou da Safira e começaram uma amizade.

— Ela faz tudo de caso pensado.

— Na cabeça da Viviane as pessoas são sua propriedade, algo sobre


ela dar a última palavra e abandonar, mas que as pessoas devem ficar à
disposição dela para quando ela quiser usá-las novamente.

Exatamente isso.

— E eu demorei um tempo para entender isso, mas decidi que não


poderia jamais permitir que ela me usasse, eu fui muito usado durante toda
a minha infância e adolescência, me senti enojado quando me dei conta de
quem ela realmente era e por isso cortei todos os laços. Me doeu saber que
teria que me afastar do Cory, mas não havia o que fazer. Viviane só me
queria nos momentos de crise, porque assim ela poderia sair e se divertir
por uma ou duas noites e logo sem seguida voltar para sua vida sem mim.
Como se eu fosse algo descartável, como se ela só visse a oportunidade de
se divertir as minhas custas.

— Pessoas não são coisas — dizer isso é tão óbvio, porém


necessário.

— Viviane não vê as coisas dessa forma, ela acha que as pessoas


precisam ficar disponíveis para ela por todo o tempo que desejar. Eu duvido
muito que ela tenha visto o pai do Cory de forma diferente. — Mosés toca a
minha coxa com carinho. — Pelo que eu soube na época em que eles dois
se separaram, a relação deles era baseada em sexo e muitas drogas, não fui
o primeiro “amante” dela, Viviane sempre pareceu se cansar muito fácil de
relações pessoais.

— O marido dela talvez fosse igual a ela também.

— Provavelmente, só que ela mentia tanto sobre tantas coisas que


eu não sei como poderia acreditar por um segundo em qualquer coisa que
saia da boca dela.

— Ela nunca falou da família?

— Só que a mãe era rica e que o pai era falecido, na época eu não
liguei muito para isso, nem cheguei a conhecer a mãe dela, ela não falava
sobre nenhum parente ou familiar.

— Talvez ela tenha seus próprios traumas nos quais não sabia lidar.

— É claro que ela não sabia lidar, ela acordava e já cheirava uma
carreira de pó e bebia um copo de uísque. Teve um dia que acordei e
quando entrei no banheiro do quarto de hotel onde estávamos hospedados e
ela estava cheirando uma carreira de pó na pia do banheiro, o Cory estava
sentado na pedra da pia vendo tudo. Peguei o menino e o tirei dali na hora,
depois quando fui chamar atenção dela, Viviane disse que eu era um
exagerado, que ele só tinha três anos e que não iria lembrar de nada daquilo.
Meu Deus! Nunca achei que havia sido assim!

— Sempre que eu chamava atenção dela para algo voltado a isso,


ela dizia que eu deveria parar com falso moralismo e que eu era um
hipócrita. Do meio para o fim, sempre que ela trazia o Cory para passarmos
algum dia juntos, quando ela queria cheirar, eu levava o menino para longe
dela. Por diversas vezes ela me jurou que não fazia isso perto dele em casa,
mas a Safira me disse que pegou ela cheirando uma vez dentro do carro, o
Cory estava na cadeirinha atrás.

— Ela nunca ligou para o nosso bebê! — concluo meio zangada e


meio infeliz.

— Ela só engravidou porque sabia que o Cory seria o herdeiro.

Eu também penso isso.

— Se o marido dela não houvesse feito vasectomia depois que ela


teve o Cory, Viviane provavelmente teria mais filhos.

— E no caso do divórcio a pensão seria gorda.

Sei que o pai biológico do Cory era um milionário americano do


ramo hoteleiro, ele era dono de uma rede de hotéis de luxo, após seu
falecimento todo o dinheiro foi para o Cory, Viviane foi excluída do
testamento dele e, portanto, não ficou com nada.

— Não sei bem sobre o passado dela, isso é algo do qual eu nunca
procurei saber.

— E sobre o marido dela?

— Sei o que via nos jornais, era um homem com uma notoriedade
incrível, mas também pelo que ela dizia, era abusivo e péssimo marido para
ela.
— Não sei se poderíamos acreditar na Viviane em relação a isso.

— Talvez não por momento, até que se prove o contrário ainda


acredito que ela seja uma pessoa ruim, com ou sem doenças.

Isso é questionável, mas há fatos que comprovam o poder de


manipulação dela tendo ou não relação com as doenças e traumas de
Viviane.

— Eu quero poder resolver isso da melhor forma, sei que ela fez
tudo isso por minha causa.

— Não foi por sua causa, não acredito que seja por você, você foi
apenas um meio que ela encontrou de expor a forma como se sentia.

— Ontem durante a ligação cheguei à conclusão de que ela


realmente é uma pessoa muito sem senso e noção da realidade.

— Ela agiu como se eu fosse uma destruidora de lares.

— Acho que ela quis contar essa mentira para si mesma durante
todo esse tempo para se sentir menos culpada em relação a tudo o que
causou. Parece a desculpa perfeita para fazer o Cory acreditar nas intenções
dela.

— Ou talvez veja as coisas de forma tão distorcida que criou essa


realidade para si mesma e não quer abrir mão disso porque lidar com os
fatos é difícil para ela.

— Sabe porque não acredito nisso? Porque ela teve muito tempo
depois que nos separamos para se reaproximar de mim, estive solteiro por
muito tempo antes de me envolver com você, porque então ela não foi atrás
de mim durante esse tempo?

— Talvez o marido a impedisse.


— Ou talvez ela só achasse que eu era uma coisa na qual ela poderia
possuir quando desejasse e depois deixar de lado.

É, tem isso.

— Eu não acredito que a Viviane poderia agir assim por conta de


uma doença mental, Ana, para mim é clara a intenção dela de querer estar
por perto porque feri o ego dela, porque eu estabeleci limites e porque eu
disse não para ela.

— Não quis estar disponível.

— Exato, ela se acostumou muito com o fato de que eu voltava para


ela mesmo depois de tudo, quando eu não voltei mais e ela viu que eu
prossegui para ela não pareceu aceitável.

Isso diz muito sobre as atitudes dela.

— De todas as formas, não importa, vamos tentar lidar com ela à


distância enquanto ela e o Cory se conhecem.

— Eu só gostaria que ela não tornasse nossas vidas um inferno


novamente, amor.

— E ela não tornará, eu farei o possível e o impossível para que


você fique protegida, Bê.

— Meu herói!

Mosés passa os braços em volta do meu corpo mais uma vez e me


aperta com força. Me encosto nele agarrando-o pelo tronco também, porque
adoro sentir ele juntinho de mim.

— Abraços quentinhos — digo comigo mesma.


— Estou gostando mais que você esteja carinhosa comigo, Bê, mais
atenciosa e fogosa na cama.

— Eu também estou adorando nossos momentos juntos.

— Em relação a Viviane, vamos manter no plano inicial, deixa ela


de lado o máximo que puder, sei que é difícil como mãe do Cory, mas seu
tio tem razão quando diz que não deve se afetar por conta dela.

— Nesse sentido eu concordo.

— Não podemos dar poder para ela, Bê, não dessa vez!

— Não demos da outra vez, amor.

— Demos sim, todas as vezes que ela usava a Safi e isso te afetava.

É verdade.

— Agora mais do que nunca não podemos nos deixar levar por
essas provocações dela.

— Só espero que tudo acabe bem.

— Desta vez tudo acabará bem, amor.

Tomara.
CONCRETO

— Eu cheguei!

Sêmora entra no meu quarto usando um vestido cor de laranja e


sandálias baixas, os cabelos ruivos ondulados soltos, um óculos de sol que a
deixa com cara de uma completa perua. Ela costuma adorar estampas
coloridas e chamativas e isso é algo que combina muito com ela.

— Eu estou me sentindo tãooo chique no meio dessa família


exclusiva! — ela fala e vem toda contente de encontro a mim.

Ela enviou mensagem avisando que o tio Jonas a convidou para


passar o dia de hoje aqui conosco, ela e o Jamie, fiquei feliz de saber que
minha melhor amiga veio para ficar conosco, também que o melhor amigo
do Mosés veio para ficar com ele.

— Fiquei preocupada — deixo o biquíni que escolhi sob a cama e


abro os braços recebendo o abraço forte dela. — Como você está?

— Estou bem dentro do possível — respondo sincera.

— O Senhor Handerson está todo cheio de marcas.

— Ah, eu não aguento você com esse papo de “Senhor Handerson”.

— É força do hábito!

Me sento no colchão e Sêmora se senta de frente para mim, ela tira o


óculos escuros e me olha com um bocado de preocupação e seriedade no
olhar.
— Acho que foi um dos momentos mais estranhos e apavoradores
da minha vida, acho não, depois daquela doida invadir o meu quarto
armada, esse foi um dos piores momentos da minha vida.

— Amiga, eu lamento tanto que você tenha passado por isso.

Só de lembrar sinto calafrios ruins pelo corpo.

— Não quero pensar como seria se o João Lucas não houvesse


conseguido chamar o Mosés.

— Então não pense, não aconteceu, sei que você está abalada,
amiga.

— Estou, mas estou mais preocupada com a Viviane.

— Ah, é, aquela biscate.

— Ela quer essa reaproximação com o Cory e eu sei que não


poderei impedir, estou chateada com a situação porque realmente não há
nada que possamos fazer.

— E o Cory, como está reagindo a tudo?

— Na minha forma de ver as coisas sei que ele está encantado com
a chance de conhecer a genitora dele.

— Esses dias têm sido uma loucura, né? Nem tivemos tempo de
conversar, você nem entrou em detalhes sobre a viagem, estou morrendo de
curiosidade.

— Bem, como eu já te disse a Gisele confessou que armou tudo em


troca de dinheiro, ela sabia que geraria publicidade e vendeu a notícia e as
fotos para os jornais e páginas de fofoca. Ela disse que precisava do
dinheiro para pagar o tratamento da irmã.
— Eu já comecei a selecionar nomes de bons assistentes para me
substituírem, o senhor Handerson disse que eu ficarei com o cargo de
chefona, terei mais duas ajudantes.

— Vamos aumentar o seu salário.

— Olha, só de saber que terei duas pessoas para explorar, já está


ótimo!

Rimos, sei que a Sêmora tem trabalhado muito todos esses anos, de
forma leal e séria, mesmo que sejamos amigas fora da empresa, temos
trabalhado muito bem juntas. Também me dava bem com a Marcy, tive
sorte de ter pessoas maravilhosas comigo na empresa.

— E o que mais aconteceu? Transaram em alguma praia mexicana?

— Nós tivemos alguns momentos de briga e discussões, porém


também tivemos momentos de romance e conversas, acredito que foi bom
apesar de todos os pesares. — suspiro. — Eu e Mosés decidimos que vamos
cuidar mais desse sentido do nosso relacionamento, queremos ter mais
tempo para nós dois e para as crianças.

— Estou feliz demais que você e ele se entenderam, Rainha Bê, sei
que todos esses meses ambos sofreram muito com a separação.

— Eu nem falei com a minha advogada ainda, mas acredito que ela
já tenha noção de que não vou prosseguir com o divórcio.

— Ela enviou mensagens durante esses dias, eu falei que você tinha
viajado e que quando retornasse resolveria.

— E como você está?

— Eu estou muito bem, só meio cansada devido a rotina, também


não é fácil ter a Marcy de volta comigo no balcão, ela não perde as manias,
fica tirando as coisas de lugar isso meio que me enlouquece.
Sêmora e Marcy sempre se deram bem, discussões bobas a parte
faziam uma bela dupla, depois que a Marcy foi promovida e transferida
para outro setor, ela e a Gisele estavam trabalhando juntas e pareciam ter
uma boa conexão também.

É uma pena que a Gisele tenha feito tudo o que fez, nunca duvidei
da competência dela, era uma excelente profissional.

— Antes de ontem ela escondeu meu cactos numa gaveta, levei duas
horas para achar, quando confrontei ela, a safada me comprou com
chocolates e nos convidou para um jantar com o meu irmão e as crianças,
fui basicamente forçada a aceitar.

— Você viu se a Ayla chegou?

— Ela está lá embaixo exibindo o resultado dos 320ml de silicone


que colocou nos seios.

A Ayla é uma mulher extraordinária, mas meio que oposta a mim


em diversos sentidos, o maior deles talvez seja o fato de que ela adora fazer
esses procedimentos estéticos e virou uma rata de academia ao lado do
Vagner.

— Parece que foi ontem que você era a fim do marido dela, né?

— Eu já estou com vontade de vomitar só de lembrar.

Sêmora dá uma gargalhada alta, é claro que no começo era meio


constrangedor, mas isso se foi quando conheci o meu marido. Também acho
que acabou um pouco de tudo o que aconteceu em relação ao Trevor.
Atualmente um é meu cunhado e o outro é casado com uma das minhas
melhores funcionárias.

— Você já conversou com o Cory sobre tudo o que houve?


— Tivemos uma discussão, foi algo bastante acalorado, porém optei
por não falar nada em relação a Viviane porque não quero que ele ache que
estou tentando colocá-lo contra ela.

— Eu já imaginei que você houvesse feito isso porque é muito você


fazer esse tipo de coisa. — Sêmora olha para as unhas da mão direita e as
ergue exibindo o esmalte vermelho carmim. — E, quando eles caem
sozinhos é mais divertido!

— Sêmora! — exclamo horrorizada.

— Escuta essa, o Lion começou a sair com uma garota que tratava
ele feito um lixo há alguns meses, mas na cabeça dele isso iria funcionar
porque ela é bonita, foca nessa parte, ok? Tá prestando atenção?

Me endireito e ergo os ombros pronta para ouvir o desabafo, mas


também porque amo trocar essas conversas sobre as crianças com ela.

— Está começando a ficar interessante, continue.

— Ela é estudante de direito na Universidade local e os pais têm


bastante dinheiro. Só que quando eu coloquei os olhos na garota, sabia que
ela não era do tipo que iria querer nada de sério com ele. Ele notou que o
santo não bateu e ficou me olhando com cara feia durante todo o jantar. —
ela faz uma pequena pausa. — Enquanto eu estava lavando a louça, ele se
aproximou de mim furtivamente e disse a seguinte frase “Seja uma mãe
normal e decente pelo ou menos uma vez na vida”.

Fico boquiaberta ao ouvir isso, arregalo os olhos e mal consigo


acreditar no que ela acabou de me falar.

— Fiquei em choque por alguns momentos, sei que ele percebe


quando eu não gosto de uma situação, mas ela parecia tão apática e mal-
educada. Sabe o que ela fez quando ele a levou pela primeira vez a nossa
casa?
— Não lavou o prato que comeu?

— Ela deixou uma calcinha jogada no banheiro da sala de visitas.

Arregalo os olhos absolutamente chocada.

— Amiga, deixa eu te falar uma coisa sobre essas crianças de hoje,


não! — ela fala toda empolgada. — Daí é claro que eu perguntei para a
Janice e para a Aester se era de alguma delas, porque mesmo conhecendo as
minhas duas filhas e tendo certeza de que não era as calcinhas delas porque
eu mesma as compro enfim, você entendeu, elas disseram que não eram
donas da calcinha.

— Aí você confrontou o Lion.

— Não, eu confrontei o Junior, porque precisava comprovar que ele


também não havia levado nenhuma namorada lá para casa, ele disse que se
tivesse levado alguma garota lá em casa o último lugar onde ela deixaria
uma calcinha seria no banheiro de visitas.

— Daí você confrontou o Lion.

— Mostrei a calcinha para o Jammie e perguntei se ele tinha alguma


ideia de quem poderia ser a dona, ele ficou me olhando com tédio e falou
que não tinha ideia do que eu estava falando.

— Sêmora você é muito melodramática.

— Eu crio primeiro um clima, eu adoro ver o brilho nos olhos


sumindo — Sêmora sorri de um jeito maldoso. — Depois durante o nosso
jantar em família joguei a calcinha em cima da mesa no rumo dele.

— Amiga! — exclamo mais uma vez horrorizada. — Sêmora, o que


está acontecendo?
— Amiga esse menino ficou sem cor, juro por Deus, ficou muito
pálido. Jammie me olhou com cara de cu enquanto as meninas e o Junior
começaram a rir, eu peguei meu prato e me levantei. Olhei bem na cara dele
e disse “Já sou normal e decente o suficiente para ser uma boa mãe?”. Ele
ficou calado e as crianças pararam de rir na hora, Jammie me encarou mais
com choque do que com raiva.

— Aí amiga, por que você acha que ele fez isso?

— O Lion acha que porque tirou habilitação e foi para a


Universidade, pode falar o que der na teia dele. Deixei meu prato na pia e
subi para o quarto, fiquei trancada por horas sem abrir para ninguém.

— Acha que ele transou com ela no banheiro de visitas?

— Não, eles não saíram de perto e quando ela foi ao banheiro, foi
sozinha, para mim pareceu só um aviso por parte dela para me provocar,
para dizer que meu filho agora tinha uma dona.

— Amiga, que complicado!

— Jammie e eu conversamos naquela noite e eu chorei bastante, me


senti mal com a situação. Ele me pediu mais paciência com o Lion e disse
iria conversar com ele. No dia seguinte o Lion me procurou e se desculpou.
Disse para ele que não queria ter parecido que estava implicando com ele.
— ela faz uma pequena pausa. — Depois eu disse para ele que não entendia
porque ele havia insinuado aquilo sobre eu não ser uma boa mãe.

— E aí? — estou morta de curiosidade.

— Ele disse que ficou magoado porque nenhuma garota com quem
ele saía me agradava, que eu o fazia se sentir mal e que não tomava boas
escolhas. Eu disse para ele que não era obrigada a gostar de nenhuma das
garotas com quem ele saia, mas que eu nunca tinha dito nada para ele sobre
isso e que não quis parecer rejeitar a ideia de que ele namorava, só que ele
sempre levava garotas que eu sabia que não iriam levar ele a sério.
— O Cory nunca levou nenhuma namorada lá em casa, mas está
tendo um crush com a filha de um congressista — revelo pouco empolgada.
— Republicana!

Ela faz uma careta.

— Mas, continue! — peço depois da minha observação.

— Ele disse que eu nunca disfarçava então eu prometi a ele que


tentaria controlar a minha cara — Sêmora faz cara de tédio e isso me faz rir.
— Apenas três dias depois ele a levou novamente lá em casa para passar a
tarde, ficaram à tarde toda trancados no quarto dele, eu não disse
absolutamente nada.

— Isso é constrangedor!

— Pois é, amiga, o Jammie pensou sobre pedir que ele deixasse a


porta do quarto aberta, disse para ele não falar nada, nós ouvimos do
corredor o barulho deles dois transando.

— Que vergonha alheia!

— Ana, vai por mim, fica pior. Por volta das 19:00 ela desceu as
escadas já vestida dizendo que precisava ir, me pediu na cara lavada que eu
pedisse um Uber para ela, eu chamei e ela foi embora. Alguns dias se
passaram e ela não voltou a nossa casa, não precisei dizer nada.

— Você enrola demais para chegar aos finalmentes.

— Uma boa história precisa ser contada de forma elaborada e


coerente...

— Conta logo!

— Ela deu um perdido nele, ele descobriu que ela tem namorado e
de quebra ainda recebeu um e-mail dela pedindo que parasse de ser
“inconveniente” e parasse de mandar mensagens para ela ou ela iria
processar ele.

Fico boquiaberta com o desfecho da história.

— Advinha no colo de quem ele veio chorar?

— E você não perdeu a chance de jogar na cara dele, não é mesmo?

— Passei a mão na cabeça dele com todo carinho materno do


mundo e disse o quanto o amava, mas que esse era o preço que se pagava
por se envolver com pessoas pela aparência.

— A escola em que a gente estudou, essas crianças nunca vão passar


nem perto.

— Pedi ao Junior para fazer uma pesquisa sobre ela, ele descobriu
que ela é filha de um advogado respeitado na cidade e que tem esse
namorado desde o colegial. Enviei a calcinha dela numa caixa para o
escritório do pai dela com um bilhete que dizia “Sua filha anda perdendo
muitas calcinhas, com os meus cumprimentos, Sêmora R.G.Cartier.”. Reza
a lenda que até hoje ela está enviando mensagens para o Lion pedindo
desculpas por tudo.

— Você não presta mesmo — estreito os olhos para ela. — E eu te


amo por isso.

— Eu sou ruiva meu amor — Sêmora ri mexendo nos cabelos toda


debochada. — Ninguém mexe com um filho meu, é ingrato? Mas é meu
filho, ninguém mexe com ele além de mim.

— E o Lion, como está?

— Ele ficou bem, disse que ficará solteiro por uns tempos, o
Jammie conversou com ele também, acho que agora ele aprendeu a lição.
— Mas que ela é desaforada, ela é!

— Aquela moleque que nem aprendeu a lavar o rabo direito.

— Amiga parecemos duas velhas amarguradas trocando confissões!

— Não é um barato?

Mais que isso.

Nos abraçamos e me sinto tão bem e reconfortada, é bom contar


com a minha melhor amiga. Eu e Sêmora somos amigas há mais de vinte
anos, apesar de todos os altos e baixos que nossa amizade passou, posso
dizer que ela ainda é uma das minhas pessoas preferidas em todo universo.

— Ah, vamos abrir vagas para novos diretores, pensei sobre te


oferecer a vaga...

— Estou ótima no meu cargo, prefiro passar os fins de semana com


as crianças e com o meu esposo. Eu não quero ter que ficar viajando quase
toda semana também.

— Mas se você quiser, será uma ótima oportunidade de ser


promovida, se você desejar uma vaga é sua, sei da sua competência e
adoraria te ter como diretora.

— Nós não poderíamos fofocar sempre e eu agradeço de coração,


mas sou feliz sendo sua humilde secretária.

— Humilde de onde, Sêmora?

Rimos meio alto, escuto o som de três batidas na porta e meu esposo
coloca a cabeça para dentro do quarto lançando um sorriso forçado para
nós.
— Desculpem incomodar, garotas, o Jammie disse que precisa de
você Sêmora.

— Ele vive precisando de mim — ela revira os olhos e vai ficando


de pé.

— Me espera, vou só colocar o biquíni e já descemos.

— Não demore muito, vamos jogar na quadra, sua irmã já perguntou


por você mais de quatro vezes.

É a Ayla sendo a Ayla.

— Já estamos indo, amor, lindão!

Ele fica ligeiramente vermelho e puxa a porta sumindo no corredor,


troco um rápido olhar com a Sêmora e acabamos rindo novamente.

Afinal de contas, estou mentindo?


EM FAMÍLIA

— Amei o biquíni, mas acho que não fui a única, não é mesmo?

Analiso o jeito sugestivo na voz da minha irmã gêmea, depois ela


olha para o rumo do Mosés e quando sigo a mesma linha de raciocínio
percebo que ele está me olhando fixamente, isso me faz ficar vermelha feito
um tomate, porque né?

Ele não sabe disfarçar.

Só que ao mesmo tempo me sinto lisonjeada porque sei que em


outras épocas ele não me olharia assim, talvez nem demonstrasse assim
tanto interesse no meu corpo.

Mosés me dá uma piscadela enquanto se apoia no taco de sinuca e


fico ainda mais vermelha. Ele o Vagner e o Jammie estão bastante
empolgados jogando algumas partidas, meus tios estão jogando cartas nas
mesas perto da piscina e minhas tias no terraço preparando almoço.

Papai está preparando as bebidas ao lado da minha mãe, enquanto


meus primos e primas estão jogando partidas de vôlei na quadra que fica há
alguns metros daqui.

— Ai como eu queria estar numa décima sexta lua de mel também


— Sêmora comenta achando graça.

Ela está deitada em uma espreguiçadeira usando um biquíni de cor


vermelho bastante bonito, os óculos escuros no rosto e um chapéu de palha
grande na cabeça. Ayla está na outra espreguiçadeira deitada de costas
também, seu biquíni é azul-celeste celeste com detalhes em recortes
brancos. Escolhi meu biquíni preto, é simples, porém brasileiro, então ele
não é tão grande como de costume.

Fiquei com uma vergonha inicial de tirar o biquíni quando


chegamos aqui, mas logo notei que todos estavam bem à vontade com
roupas de banho, meu pai parecendo um garoto propaganda de sunga, tive
que dizer para mim mesma que não poderia ficar com vergonha de novo do
meu corpo.

Então nos acomodamos nesse lado da piscina, uma música de


pagode ecoa por todos os lados lembrando um pouco das raízes dos meus
tios, entendo bem português por mais que tenha apanhado muito no
começo.

— Eu e o Vagner vamos viajar para o Caribe no final do ano depois


das festas, queremos aproveitar que as crianças ficarão com os pais dele
durante as férias. — Ayla comenta toda relaxada.

Estou sentada sob uma toalha perto da borda da piscina, confesso


que há alguns dias não imaginei que eu e Mosés poderíamos tirar dias para
relaxar, para ficar em família, estava acontecendo tanta coisa que isso seria
a última coisa na qual eu pensaria que acontecesse.

A vida é realmente uma coisa incrível e inesperada.

Só que ainda dentro de mim bate uma onda de gratidão imensa


porque ele não me deixou assinar aqueles papéis, porque mesmo disposta a
não acreditar nele, eu acreditei e agora estamos aqui com toda nossa família
comemorando que voltamos.

Sei que a felicidade de cada um deles é genuína, que cada uma


dessas pessoas aqui torcera por mim, a minha gêmea inclusive quando
decidi me separar do Mosés foi uma das pessoas que mais tentou me alertar,
não quis dar ouvidos, estava magoada e ferida demais com a suposta
traição.
— O que o Mosés anda comendo? — Ayla indaga com um sorriso
nos lábios. — É ração? Se for me avisa, vou dar para o meu marido
também.

Acho graça.

— Será que é o suco mágico dos marombeiros? — Ayla questiona.

— Acho que não, ele tem pedido muita marmita de um restaurante


fitness perto da empresa, eu percebi que ele anda comendo bastante. —
Sêmora insinua. — E não é só a Ana.

— Gente vocês duas andam terríveis! — exclamo, mas estou rindo.


— O tricô dia de domingo anda rendendo mesmo, só perdem para Safira
língua de chicote!

Ambas caem na risada, mas é que eu as conheço tão bem que não
importa o que digam. Sêmora e Ayla também se tornaram boas amigas com
o passar dos anos, só que também são daquele tipo de pessoas que adoram
uma boa fofoca.

— Ela parece muito feliz com o príncipe asiático dela — Ayla


comenta pensativa.

— As crianças deles são tão lindas — Sêmora suspira toda


encantada. — Os da Lottie também.

— Eles misturaram bem — concordo ao lembrar dos meus


sobrinhos.

— O que pretende fazer agora, maninha?

Olho para a minha gêmea, meu oposto fisicamente, contudo, um


pedaço meu em todos os outros sentidos.
— Quero que tudo seja diferente — admito. — Eu e o Mosés
queremos que o nosso casamento seja algo bom e leve para nós dois, vamos
priorizar isso, eu também quero voltar a terapia novamente e lidar com
questões minhas.

— Posso te fazer uma pergunta?

— Claro.

— Achou mesmo que ele havia te traído?

— Eu já me perguntei sobre isso tantas vezes que perdi a conta,


principalmente nos primeiros dias depois do escândalo, queria acreditar que
não, mas tudo indicava que ele havia me traído sim.

— Acho que você não nota o jeito como o Mosés te olha, Ana, é
sério!

— Ele não fez parecer que me via, Ayla, ele esqueceu de cativar isso
em mim, nós estávamos brigando muito e passando por uma crise feia nos
últimos anos. Tudo o que aconteceu para que nós nos separássemos foi o
estopim, sei que falhei de não confiar nas palavras dele, mas sinceramente?
Estava exausta.

— Você nunca me disse que estavam passando por uma crise.

— Não é tão fácil quanto parece, houveram bons momentos, mas as


brigas e as discussões foram desgastando, a rotina tornou nossa convivência
monótona e o sexo, bem, também não é o suficiente.

— Será que não? — Ayla ergue as sobrancelhas toda maliciosa.

Pego a primeira toalhinha que vejo pela frente e arremesso na cara


dela, a vejo rir à beça com isso.
— Eu já tentei escapar do Jammie algumas vezes, todas as vezes
sem sucesso, ele não me dá paz quando quer sexo — Sêmora sorri olhando
para o marido. — Oh saúde, viu?

— Benza Deus! — Ayla diz lançando um olhar maroto para o


marido dela.

Gosto de conversar com a minha irmã e com a minha melhor amiga


porque sempre me tiram um pouco da esfera e do óbvio, mesmo que em
alguns momentos nossas conversas girem em torno de filhos e marido, isso
se torna uma piada engraçada sobre qualquer coisa.

— E no hospital? — questiono.

— Fiz trinta partos essa semana, peguei uma criança grávida,


sinceramente, estou com medo do futuro — ela comenta e seu sorriso vai
ficando meio estranho. — Doze anos de idade, não fala nem a pau quem é o
genitor, tive que chamar a polícia e prestar queixa de estupro.

Quando a minha irmã começa a contar esses casos me deixa triste e


reflexiva, porque sei que minhas meninas e meus meninos são bastante
protegidos em diversos sentidos.

— Independente de quem seja o genitor, foi estupro porque é menor


de quatorze — Ayla continua. — Ela não teve encaixe e fizemos uma
cesariana de emergência, quando fui visitar ela no quarto estava chorando
muito porque não sabia como segurar o bebê. A mãe dela é enfermeira e
trabalha em período integral, não cobrei pelo parto e o seguro saúde cobriu
a internação, não consigo pensar como seria se fosse um filho meu.

— Eu estava conversando com as meninas sobre isso essa semana,


acho que a minha relação com elas é até saudável, espero que só decidam
ter filhos depois da faculdade. — Sêmora concorda mais séria.

— As meninas conversam comigo sobre garotos as vezes, mas são


melhores em conversar com o pai, já os meninos estão naquela fase de falar
de garotas, mas parecer “nojento” ficar trocando saliva com qualquer uma
delas. O Cory também é bem sensato nesse sentido, eu converso muito com
ele desde pequeno.

— Eu não sei o quanto isso afetou a mãe dela, mas imagino que por
ser uma mulher bem orientada isso a abalou bastante. Ela mal estava
olhando na cara da garota quando entrei no quarto, nem chegou perto do
neto. Fiquei me perguntando o quanto sou leiga de achar que não poderia
acontecer comigo e olha que sempre aparecem casos assim, nunca deixo de
me chocar.

— Há uma primeira vez para tudo na vida — afirmo. — Tanto para


amar quanto para odiar, assim como para reagir a cada pessoa de forma
diferente em qualquer sentido.

— Mas ela está inspirada demais — Sêmora comenta enrugando a


testa. — Quanto você cobra para recitar em cerimoniais?

Mostro o dedo do meio para ela e ambas riem quebrando toda a


pequena tensão que se estabeleceu com o relato da minha irmã.

— De todas as formas estamos muito felizes por vocês terem


voltado — Ayla fala toda sorridente. — O Vagner até mandou elaborar uma
cesta de café da manhã para enviar aos pombinhos quando estiverem em
casa.

— Que fofo!

Vejo o Jammie se aproximar bastante tranquilo e depois se sentar na


espreguiçadeira perto dos pés da Sêmora.

— Mosés apostou comigo que você não ganhava da Ayla e da Ana


na sinuca, então vim aqui te implorar que jogue com elas duas para que eu
ganhe minhas cem pratas.

— Só essa micharia? — Ayla se ergue de imediato. — Eu topo!


Começo a rir enquanto me ergo, pego minha entrada de banho e vou
enfiando meus braços nela enquanto Sêmora veste seu roupão e minha
irmão vai se envolvendo numa canga.

— Eu aposto mil pratas como venço as duas — Ayla vai na frente


toda empolgada.

— Aposta aceita — respondo seguindo-a.

Troco olhares com o meu marido, ele pisca para mim de novo e eu
fico um pouco mais constrangida, mas de todas as formas sei que esse dia
em família será mais que especial, será maravilhoso.
MAIS QUE INTENSO

Entro no quarto e caminho devagar ouvindo o som dos passos do


meu marido logo atrás de mim.

Escondo o sorriso, ah, porque eu achei que ele não viria atrás de
mim?

Bebi algumas taças de vinho, porém nada que me deixasse tonta ou


algo do tipo, eu também experimentei um drink que meu tio Jonas fez para
todos os sobrinhos. Ri bastante com as competições entre o Nando e o Tom
para ver quem é o sobrinho preferido.

Vou até a porta da sacada e observo essa belíssima vista, todo o


jardim perfeitamente podado, as palmeiras, a pequena fonte na parte da
frente da entrada da propriedade e um pôr do sol maravilhoso no horizonte.

Sinto a aproximação dele, olho para baixo e depois as mãos grandes


cobrem os meus seios por cima da entrada de banho transparente. Logo em
seguida, Mosés os aperta com força fazendo com que eles subam
espremidos entre os dedos dele.

— Adorei esse biquíni — ele sussurra e me dá uma mordida leve no


ombro direito.

Entrei na piscina por alguns momentos com o meu marido, com as


meninas, adorei poder ter passado esse dia com a minha melhor amiga e
minha irmã, contudo, principalmente sentir que me desliguei dos
acontecimentos de duas noites atrás, que estou mais calma e tranquila sobre.

— Adorei te ver jogando sinuca — a voz dele se torna mais baixa e


grave. — Me deu vontade de te comer lá naquela mesa.
Me arrepio toda dos pés à cabeça com o que ele acabou de falar.

— Teremos outras oportunidades — afirmo.

— Ah, eu espero ansioso por isso.

As mãos apertam meus seios com mais firmeza e depois ele se


inclina e se esfrega em mim, fecho os olhos com todos esses pequenos
arrepios que se espalham por meu corpo. É tão gostoso me sentir desejada
por ele nesse nível.

Me viro para ele e o fito por alguns momentos notando esse olhar
coberto de desejo e vontade, depois Mosés pousa as mãos sob meus ombros
e os toca com delicadeza, ergo a cabeça entendendo o apelo repentino em
seu olhar oferecendo o pescoço para ele.

Ele se inclina enfiando as mãos dentro do tecido fino e o puxa para


baixo tocando meus braços sem pressa, então beija meu pescoço com
bastante cuidado, como se fosse a coisa mais preciosa do mundo.

A Peça cai no chão e vou sentindo o meu coração descompassado


no peito com os pequenos beijinhos que ele deixa por todo o local, minha
respiração também vai se acelerando, os arrepios se tornam contínuos se
espalhando do meu pescoço por todos os pequenos cantos do meu corpo
todo.

Ele segura a minha mão e depois vai me puxando para o rumo do


banheiro, o sigo em silêncio, Mosés me conduz até o box e depois solta a
minha mão, então puxa o calção para baixo levando junto a sunga de banho.

Puxo o cordão da peça superior do biquíni e ele se abre livrando


meus seios, dou as costas para ele e puxo o cordão da parte inferior do
biquíni então a peça cai no chão, retiro a parte de cima e jogo num canto do
box chutando a inferior junto.
Mosés liga o chuveiro e o jato de água morna cai sob minha cabeça,
sorrio e ele me abraça por trás, ainda consigo ouvir os berros de todos
vindos da varanda, as risadas, a música mais baixa, mas ainda é
maravilhoso estar a sós com ele.

Só com ele, meu esposo, meu amante, meu companheiro de todos os


momentos.

Me viro, Mosés passa os braços em volta do meu corpo e me beija


todo apaixonado, ergo os braços passando em torno do pescoço grosso e o
correspondo sem pensar duas vezes. Meus dedos se enfiam em seus cabelos
que escorrem com a água, meus lábios provam do sabor misto de água e um
pouco de limão.

Ele avança explorando minha boca sem pudor, mas também com
paixão controlada, sua língua tomando a minha com força gentil, me sinto
um pouco tonta com o beijo, perco o ar e arfo me afastando um pouquinho.

Seus lábios colocam uma mordida quente no meu queixo, fico da


ouriçada conforme os lábios dele vão deslizando por meu pescoço com
beijos quentinhos e úmidos. As mãos dele me apalpam com ânsia enquanto
ele se inclina para baixo e se esfrega em mim todo duro.

— Me deixa te lavar?

— Sim.

Ainda me surpreendo quando ele me pede as coisas, como espera


que eu dê minha resposta para que faça essas coisas. Eu já tinha entendido o
sentido da palavra “consentimento” para o Mosés há anos, hoje isso é algo
do qual tenho certeza de que é uma das coisas mais importantes para ele.

Ele pega o sabonete líquido e despeja na mão, então coloca o frasco


na parede embutida e estende a mão para a minha intimidade começando a
me lavar cuidadosamente. Abro as pernas observando a mão hábil me
lavando com gentileza, os dedos tocando minhas dobras femininas
vagarosamente.

— Você está tão carinhoso e atencioso esses dias.

— Tenho que cuidar do que é meu com zelo e carinho, me


acostumei mal.

Toco seu peito observando esse punhado de músculos, o peitoral


definido, o abdome bem malhado, os braços mais grossos e torneados.

Ele me enxágua me olhando como se comtemplasse algo importante


demais, me questiono sobre como em diversos momentos supervalorizei
meus complexos, como me deixei levar pelo medo de rejeição e troca.

Porque quando mesmo em todas as vezes que ele disse que me


aceitava e me amava como eu era eu me autossabotava e só estava tentando
me convencer do contrário. Como se eu ainda não fosse digna ou
merecedora dele.

Afinal, um homem padrão, milionário com uma contadora gorda


que não tinha nada a oferecer.

Quem mais acreditaria que daria certo nesse mundo? Quem mais
levaria a sério? Ninguém levou no começo, quando toda aquela merda
aconteceu fui ridicularizada por conta do meu peso. Como se em algum
momento durante todos os meus anos de casamento todo o resto da
sociedade estivesse torcendo para que eu me divorciasse dele só para terem
o prazer de dizer “sempre soube que era fachada”.

Só que o Mosés não desistiu de mim, nem mesmo quando eu já


havia desistido, ele provou mais uma vez que eu tenho muita importância
para sua vida, que todo o resto do mundo e até eu mesma estávamos errados
sobre ele.

E eu o amo tanto por isso.


Ergo os braços e o agarro com força dizendo a mim mesma que
nunca mais farei isso novamente, nem comigo e nem com ele, não mereço
isso, não posso me odiar e não devo duvidar mais dele em nenhum sentido.

Ele se inclina mais uma vez e me beija com ardor, me inclino para
frente e o agarro mais uma vez pelo pescoço, Mosés abaixa as mãos e me
segura as coxas, assim de um jeito fácil me ergue do chão puxando minhas
pernas para cima.

É uma sensação muito boa.

Sou suspensa do chão enquanto minha língua se enfia toda na boca


dele, nossos lábios molhados trocam um toque saboroso e intenso, minhas
mãos se enfiam em seus cabelos e meu marido morde meus lábios por vez
com vontade.

Sorrio entre o beijo, gosto muito disso, adoro na verdade.

Ele me joga mais para cima e logo em seguida se abaixa puxando


minhas ancas para baixo. Sinto sua quentura encostando toda em mim,
enfio uma das mãos na frente de nossos corpos e seguro seu pênis duro.

Eu o toco por toda a extensão com as mão fechada, deixando que a


água caia nessa brecha entre nossos corpos. Minha boca abandona seus
lábios e coloco a língua para fora, vou lambendo seu maxilar e descendo
por toda a barba bem-feita até alcançar seu pomo de adão.

Ele engole a saliva respirando pela boca, as mãos apertando minhas


nádegas com as pontas dos dedos, aperto as pernas em volta dos quadris
dele e subo um pouco mais puxando-o para baixo de mim, assim quando
desço os quadris ele vem me penetrando lentamente.

Minha língua sobe traçando um curto caminho até seu pescoço, me


encolho sentindo uma bela estocada e meu corpo sobe com a força dentro
de mim, abafo a vontade de gemer muito alto, de soltar um grito e mordo
seu pescoço como punição automática.
Mosés solta um gemido baixo e observo a fumaça morna que sobe
por todo o box enquanto ele começa a se mover fazendo com que eu suba e
desça com ele. Seu movimento quente e latente só faz com que eu me sinta
ainda mais úmida, quente, viscosa.

Estendo a mão e seguro na parede do box sentindo que as minhas


pernas amolecem com a penetração intensa, elas tremem rapidamente,
como uma leve fraqueza prazerosa. Arfo agarrada a ele com um braço e
com a outra mão me seguro na parede do box.

Aperto as pernas em volta de seus quadris e subo e desço com ele


dançando rapidamente, Mosés solta as minhas nádegas e aperta os meus
seios abocanhando um por vez feito bicho faminto e guloso.

Levo uma metida vigorosa, meu corpo vibra nesse instante e


estremeço desejando quebrar qualquer coisa que possa aparecer pela frente.
Observo seu corpo molhado, a água escorrendo por suas costas largas e
descendo até a bunda musculosa e bronzeada.

Ah, que delícia!

Mosés segura os lados da minha cabeça e faz contato visual, então


começa a meter com mais potência, sua dedicação é tão extensa que faz
com que eu bata com a bunda na parede do box fazendo um som alto.

Me sinto fora da esfera, fora da realidade que sempre foi, mas tão
dentro disso tudo que não sei como explicar para mim mesma. Todas as
vezes são aventuras únicas, mas essas desde que voltamos estão de fato
muito mais potentes, como algo multável, mas em sua essência
imutavelmente poderoso.

É quente e sinto como se não pudéssemos controlar ou parar.

Não consigo pensar em querer nada além dele bem enfiado em mim,
de sentir seu olhar caindo sobre o meu como agora, de sentir sua respiração
forte e masculina soprando de encontro ao meu rosto.
Meu corpo estremece a beira de um colapso a cada metida firme,
mas implora por mais todas as vezes que ele vai e volta. Agora gosto muito
mais de ver, o toque tem significado único e o olhar tons diferentes, algo
próximo a um cintilante.

Algo como ácido prestes a derreter todo quando ele pousa os olhos
em mim.

Gemo baixinho observando o pequeno “o” que seus lábios formam


enquanto ele me come assim, arreganhada, suspensa e segurada com suas
mãos, enquanto ele me fode de forma despudorada e barulhenta.

— Você é toda minha, ordinária! Eu vou te comer todinha, quero te


deixar toda gozada só para mim. — a voz dele está baixa e mais grave.

Mosés me empurra todo bruto contra a parede do box e isso me faz


soltar um gemido alto, minha pélvis estremece e aguento o rápido orgasmo
durante a penetração severa, chega a judiar de ser tão bom, tão gostoso.

Ele me beija, estremeço cravando as unhas nos ombros dele,


gostando muito disso, adorando na verdade. Movo meus quadris
aproveitando cada segundo do prazer que me proporciona, então o abraço
com toda força em mim deixando que meu corpo aos poucos se acalme.

Arfante e com as gotas de suor escorrendo entre a água morna.

Mosés me libera e depois sai me dando as costas, respirando com


dificuldade desliga o chuveiro, então ele abre a porta do box e indica o
banheiro para que eu saia, vou andando com as pernas meio bambas, ainda
fora de órbita.

Espremo meus cabelos antes de sair do box, ele me abraça


novamente e me beija, vai me puxando para o rumo da porta do banheiro,
fico na pontinha dos pés correspondendo-o, toco suas costas enquanto
nossos passos se atrapalham, piso no pé dele e ele ri, isso também me faz
rir.
Seu corpo escorregando no meu, seus beijos longos e languidos,
como dois namorados que encontraram um momento só deles, com um
mundo de descobertas e prazer mútuo. Minhas pernas encontram o colchão
da cama e caio para trás, Mosés vem por cima de mim rindo tanto que me
faz querer gargalhar.

Bem, isso é tão diferente, mas tão familiar!

Como todas as vezes que em nosso começo dávamos boas risadas


depois de um sexo mais quente, como quando em nossa lua de mel haviam
mais sorrisos de ambos, mais toques, um carinho recíproco e um pouco de
diversão.

Os anos foram nos deixando preso a rotina de um sexo pouco quente


e sem que ouvisse nenhuma risada amistosa, nem troca de olhares ou
gentilezas. Foi algo que se tornou prático e até meio monótono em diversos
sentidos.

Ele me fita com olhos eufóricos e esse sorriso lindo nos lábios,
tirando de mim algo que havia adormecido e esquecido em algum lugar
bem distante mais uma vez. Como quando eu perco algo dentro de casa e
não noto o quanto estava bem diante dos meus olhos.

O amor é uma coisa tão estranha.

Hora esfria com a velocidade de um inverno rigoroso, hora ele


esquenta feito vulcão que jorra larva e faz estrago. Hora é como montanha
que não se move, mas há tempo em que é mutável como vento que não
para, que é levado para qualquer lugar.

Talvez seja como as pessoas dizem, é tudo e nada e tudo bem.

— Eu te amo como nunca amei e nunca amarei ninguém em toda a


minha existência, meu Ordinário Moshe!
Ele me dá esse sorriso contido e depois me abraça feito uma criança
feliz que nunca tive o prazer de conhecer, que ele antes nunca foi capaz de
ser. Como o homem maravilhoso que tem sido para mim, acolhendo minhas
palavras e absorvendo-as com felicidade.

Quando ele se ergue estamos com lágrimas nos olhos e me sinto tão
bem, mesmo assim aliviada, confortável, feliz.

O beijo e compartilho com ele o gosto de algumas lágrimas, ele


procura minha perna e enfia o braço embaixo dela puxando-a para cima
enquanto encontra meu corpo mais uma vez. Toco suas costas, meus dedos
deslizam por seus ombros enquanto ele se ergue e me penetra com lágrimas
nos olhos.

Isso talvez seja dramático demais, meloso para quem quer que seja,
mas é a soma de tudo o que sentimos pelo outro.

Houveram momentos em que chorei demais por pensar que não


havia mais amor, que nunca mais poderíamos ficar juntos porque ele havia
quebrado o que havia de mais sagrado na noção relação, mesmo que tudo
estivesse literalmente uma merda.

Queria acreditar que Mosés foi incapaz de me trair, mas não


acreditei e paguei para ver, isso causou imenso sofrimento a ambos, mas sei
que mais a ele porque enquanto eu sempre tive todas as oportunidades de
tentar escolher ser feliz ele foi condicionado a um bocado de coisa ruim no
passado que o impediram de ter uma felicidade plena em diversos sentidos.

Talvez também porque fui idiota o suficiente por querer acreditar


que ele fez isso quando na verdade, ele não fez e não importa o quanto já
tenha passado, eu também sei que foi um obstáculo recente, algo que nos
machucou tanto e que não poderemos só ignorar.

O abraço agarrando-o com as duas pernas mais uma vez enquanto


nós fazemos amor devagar, me sinto comtemplada por essas sensações
relevadoras e inexplicáveis novamente. Algo que me liga ao infinito, a uma
beleza na qual começo a apreciar de novo.

Ele se apoia nos cotovelos me beijando, enfiando as mãos nos meus


cabelos, colocando beijos por toda a minha faces, beija minhas bochechas e
depois meu nariz, então fecho os olhos e ele beija as minhas pálpebras,
minha testa, depois os cantinhos perto das minhas orelhas e então volta para
minha boca.

Meus sorriso se transformam em risos e me derreto na cama me


entregando mais uma vez ao meu único amante, ao amor da minha vida.

Meu Mosés, meu Moshe.

— Já acordou, Bêzinha?

— Ainda não, Mozão.

Ele se esfrega na minha bunda e coloca um beijo quentinho no meu


ombro. Estou deitada de bruços e ele em cima de mim, bem, não é difícil de
chegar à conclusão de como adormecemos assim ontem, quer dizer, foram
tantas posições...

— Bom dia, minha linda! — ele diz baixinho e me beija a bochecha


todo carinhoso.
— Bom dia, meu amor! — respondo com um sorriso enorme nos
lábios.

Ele pousa a mão sob a minha e enfia os dedos entre os meus com
afinco, então encosta o rosto no meu de lado e ficamos em silêncio olhando
para as portas da sacada, as cortinas entreabertas. O sol lá fora já parece
bem alto, o vento desses lados é mais forte, enquanto toda a claridade toma
nosso quarto fico desejando ficar um pouco mais aqui com ele.

Só que nosso voo nos espera e temos que voltar para a nossa casa,
para nossa vida real.

As crianças chegarão amanhã pela tarde e, portanto, também temos


algumas reuniões agendadas para amanhã de manhã. Só que me sinto muito
grata por ter conseguido tirar esses dias com ele, com meus pais e família.

— Gostaria de ficar mais uns dias aqui com você — ele fala e beija
o cantinho da minha boca.

— Eu também quero, podemos ver com o tio Jonas uma data mais
para frente, o que acha?

— Mais que aprovado.

— Adorei nossa noite de ontem — confesso sincera. — Esses dias


estão sendo maravilhosos.

— Estão sim, meu amor e se depender de mim teremos muitos


outros dias assim.

— Quero que tenhamos nossos momentos a dois, sinto que nossa


antiga conexão voltou mais forte, que temos tido uma intimidade mais
aguçada.

— Faz mais sentido agora, você está desinibida e segura de si


novamente.
É verdade.

— Não devemos deixar nosso casamento de lado em nenhum


sentido, muito menos a sexual.

— Tão pouco a sexual.

Os lábios dele se abrem em um sorriso preguiçoso e Mosés desliza


para o lado ficando de frente para mim, nu, os cabelos bagunçados e o
semblante de sono. Acredito que fomos dormir pouco depois das 02:30 da
manhã, brincamos muito antes de nos entregarmos a exaustão.

Estendo a mão e toco alguns fios brancos entre os escuros, esse


homem fantástico e lindo está bem diante de mim sorrindo com uma cara de
preguiça que me faz refletir sobre o quanto deixei passar tantas coisas sobre
nosso casamento.

É tão singular perceber que compartilhei desse sentimento mútuo


com ferocidade no começo, mesmo que tivesse sido um presente
inesperado, mesmo que eu não esperasse que desse em nada e achasse uma
loucura e até alguns meses atrás tudo se apagou.

Agora tudo está novamente aceso, com a intensidade de uma tocha


em chamas, mas também como a beleza de uma pequena vela.

— Você toda arreganhada para mim...

— Ah, estava demorando, não é?

Os olhos dele são brandos, só que os lábios denunciam uma malícia


tremenda porque ele sorri.

— Apreciei a vista, adoro quando fala putaria no meu ouvido,


quando me deixa no controle, minha rosadinha ficou toda vermelha ontem.

— Também, né?
Eu sei que foram basicamente uns seis meses sem sexo no total,
porque antes de tudo aquilo acontecer nós dois estávamos há alguns dias
sem ter relações, antes disso nós só estávamos fazendo sexo casual.

Agora que voltamos temos tido essa vida sexual fora da realidade
onde algumas vezes quando o meu marido me olha já me vem uma vontade
louca de dar para ele.

— Eu gosto mais de nós assim, diga o que quiser, nada mais me


excita do que te chamar de ordinária enquanto eu te como.

Sorrio ainda meio constrangida e vou para cima dele, Mosés se deita
de costas apoiando a cabeça no travesseiro, eu o beijo de leve e ele toca
meus cabelos puxando-os para o lado.

— Eu também adoro te chamar de Moshe, me excita muito


descobrir esse mundo com você, amor, é maravilhoso que você tenha me
mostrado esse seu lado. Me sinto excitada e mais disposta, acredito também
que por termos tirado esse tempo só para nós dois.

— A empresa toma muito tempo, sei disso, também estava


sobrecarregado com as viagens — ele segura uma mecha dos meus cabelos
e começa a fazer caracóis entre o indicador. — Depois que tudo aconteceu
com a Gisele, prometi a mim mesmo que não iria me dedicar mais ao
trabalho do que a você e as crianças, sei que isso te desgastou muito.

— Seu investigador não disse mais nada sobre ela?

— Ele só me enviou as notas fiscais de prestação de serviço e todas


as evidências via e-mail e numa pasta que está guardada no nosso cofre.

— Você ficou zangado pela forma como meu pai está cuidando de
tudo nesse sentido?

— Ele tem os momentos dele e eu os meus, mas entendo que depois


de tudo ele queira proteger a imagem das crianças e a sua.
— A sua também.

— Ao menos ele se mostrou muito feliz por termos conseguido nos


reatar, sobre as questões midiáticas, acredito que ele consiga lidar com isso
assim como estamos tentando de todas as formas cuidar mais de nós nesse
sentido.

— Eu fiquei abalada demais no começo, mas principalmente por


não ser a primeira vez que as pessoas usam qualquer coisa para dizer algo
como “é um casal de fachada”, como quando disseram que eu era barriga de
aluguel.

— Você acha que eu fiquei bem nas fotos? Seja verdadeira, adorei
ver a minha bunda estampada na primeira página do site “Alfinetada dos
Famosos”.

Acho graça do tom debochado na voz dele, é que o Mosés é tão


autêntico e sério nesses sentidos, assim como eu, procura levar a vida de um
jeito prático e bastante pé no chão, mesmo que especulem muito sobre ele
em eventos, mesmo que já tenham tentado assediar ele como homem com
perguntas constrangedoras em algumas entrevistas para jornais
universitários e a nós dois como casal.

Eu sei que para todo o resto do mundo sempre serei apenas “a


mulher gorda de fachada do milionário”, só que assim como sempre foi, é
um termo do qual não ligo. Chorei sim pela dor da falsa traição, pela dor da
humilhação de ter sido supostamente enganada, pela superexposição da
minha imagem, só que em outros termos eu não costumo ligar tanto.

Meus problemas sempre são sobre mim comigo mesma.

— Os dias foram um verdadeiro inferno longe de você e das


crianças, descontei na comida e na bebida nos primeiros dias, depois
quando seu pai me ligou e me disse para reagir tive que procurar um
investigador para ir atrás daquela bisca...
— Amor!

Ele revira os olhos e realmente concordo com ele, mas...

— Enfim, eu estou tentando entender esse lado da Gisele desde que


tudo aconteceu e eu soube da verdade, porém, ainda sou humano.

— Eu só lamento pela irmã dela.

— Não acho que isso justifica se quer saber.

— Algumas pessoas não sabem ou estão prontas para lidar com


situações extremas amor.

— Isso não faz dela uma vítima, ela quase destruiu nosso
casamento, nossa família, eu dei um duro danado para construir uma boa
imagem para o seu pai, até isso ela quase me roubou, eu estava assim de
conseguir participar das reuniões do fim de mês e descobrir o que tanto seu
pai, tios e primos escondem de mim.

— Será que é um culto secreto dos Carsson’s?

— Eu não quero saber, ela me roubou o direito de ser parte de algo


maior, da fundação, da seita!

Gargalho olhando para esse bobo exagerado.

Escuto batidas leves na porta e Mosés puxa os cobertores depressa


nos cobrindo, vou para o lado ainda achando muita graça.

— Ei pombinhos, estamos esperando vocês para o almoço —


Sêmora avisa do outro lado da porta. — Iremos querer uma carona.

— Já estamos indo — respondo indo para cima dele de novo,


colocando beijinhos em seu pescoço.
— Não demorem!

— Não iremos demorar — Mosés responde e começa a me beijar.

— Gente é sério! — Sêmora reforça.

Rolamos na cama rindo e escuto uma risada vinda do lado de fora


do quarto enquanto os passos dela se afastam pra longe.

Ela sabe que não demoraremos... muito.


EM CASA MAIS UMA VEZ

— Que cheiro maravilhoso!

— É risoto espinafre com carne de panela, receita da tia.

— Mais um bom motivo para abrir outro vinho.

Mosés se aproxima secando os cabelos com uma toalha de rosto,


usando apenas um short de dormir, só pelo jeito como o volume balança
dentro do short sei que ele não colocou nenhuma cueca.

Nego com a cabeça e volto a minha atenção para a carne de panela,


já pegou pressão e já está quase pronta, agora estou refogando a cebola para
fazer o risoto. Tomei banho primeiro enquanto Mosés teve que atender a
uma ligação da Marcy. Desci e aqui estou preparando nosso jantar. Vesti
uma calcinha e um camisão folgado, me sinto relaxada e bem assim, estou
descalça.

Foi um voo relativamente rápido e muito divertido, com direito a


um jogo de baralho acalorado entre o Jammie e o Mosés e a Sêmora e eu
sentadas nos bancos da mesa ao lado jogando Uno, perdi de três a um e
entre cafés e biscoitos a vi contar piadas sem graça e reclamar mais uma
vez da coisa que mais gostamos, pessoas da empresa.

Mosés vai até a geladeira e pega um vinho tinto e depois duas taças
no armário, ele fica parado ao meu lado abrindo a garrafa de vinho, olhando
para dentro das panelas, depois pega um tomate cereja e enfia na boca
mastigando.

— Eu não gostaria de imaginar que essa casa tem reboco caindo.

— Engraçado que você não reclamou ontem quando eu te joguei na


parede do box.
Gargalho mais uma vez e ele me abraça por trás enquanto enche as
taças de vinho com a mão livre.

— Algum problema na empresa?

— Os mesmos de sempre, você decidiu se vai dar o aumento que os


diretores querem? O corporativo me formalizou um e-mail reforçando a
urgência da sua decisão.

— Eu não vou dar aumento, só estou pensando em bons argumentos


para dar na reunião de amanhã, já consegui até pensar em alguns.

— E seriam...

— Vocês ganham muito bem.

Agora meu esposo quem ri bastante com o que acabei de falar.

Adoro o cheiro desse vinho, ele é tão docinho, é um dos vinhos que
bebemos aos domingos a noite ou em algum almoço com as crianças. Pego
a taça com a mão livre e a trago até a boca, bebo dois goles curtos adorando
o sabor.

— Eu pensei em aumentar os benefícios e estender o seguro saúde...

— Sabe que eles não vão aceitar, eles sempre querem mais.

— Ok, então faça o que desejar.

Ele sabe que eu vou fazer.

— Melhor não falar de negócios agora — ele conclui e pega sua


taça então bebe um pouco do vinho e beija a minha cabeça. — O Cory
acabou de me ligar, disse que estão todos bem e que está ansioso para
voltar. Pedi a Dulce que fique mais uns dias com a Nina lá, acho que ao
menos até as crianças chegarem e resolvermos essas coisas na empresa.
Não tenho o que discordar em relação a Nina, já em relação a
cobra...

— Ele quer mesmo é se encontrar com aquela lacraia.

— No fundo, no fundo eu o entendo, passei anos da minha vida me


questionando sobre a minha mãe biológica, quando a reencontrei me sentia
um dos caras mais felizes e realizados do mundo.

Eu lembro bem da sua crise de estrelismo perto daquela sua mãe.

— Algumas coisas nunca mudam — mexo a colher na panelinha e


depois jogo o espinafre batido no liquidificador. — Quer dizer, hoje eu
entendo mais a quem você puxou.

— Amor, não vamos começar a falar mal dos nossos pais nem os
culpar por nossas personalidades maravilhosas.

Ele se encosta na pedra ficando ao meu lado, segura sua taça de


vinho todo relaxado, ainda noto essas marcas roxas pelo corpo dele, em seu
rosto, mas sei que o Mosés é bastante resistente também.

— Estive pensando bastante sobre o Cory, sobre a situação com a


Viviane, só estou querendo dizer que entendo as dores dele, por mais que
ele nunca nos tenha reclamado ou pareça infeliz em ser adotivo.

— Eu também entendo.

Em um momento quando o Cory era criança eu até cheguei a pensar


que ele seria um adolescente rebelde em relação a isso, que fosse se revoltar
por ser adotivo porque algumas crianças quando crescem se comportam
assim, entretanto, graças ao bom Deus ele se tornou muito tranquilo e
rompeu com qualquer receio sobre isso.

É um filho amoroso e compreensivo, tem sido educado e bastante


obediente sobre basicamente tudo, mesmo que em alguns momentos tenha
seus repentes como qualquer outro filho.

— Safira me enviou uma mensagem bastante sutil sobre isso, achei


que o Tom não diria para ela, mas pelo visto ela já sabe e parece lidar bem
com isso.

— Ele não poderia esconder isso dela por muito tempo, acho que
nos esquecemos que ela basicamente criou o Cory como se fosse seu filho.
Ele cresceu indo para a casa dela aos fins de semana, é com ela que ele fala
sobre jogos e torneios de vídeo games.

— Até hoje eu não entendo como funciona esses jogos de torre, Safi
domina bem o assunto ao lado do Tom.

— Como acha que eles sobreviveram aos primeiros anos de


casamento?

— Gosto de outro tipo de jogo.

Despejo o arroz na panela e mexo rapidamente a colher, isso me faz


rir.

— Depois que li a mensagem dela, notei que a subestimei, ela disse


que não quer ser protegida de nada e ainda me deu bronca dizendo que eu
deveria ter dito para ela.

— Ela quer ser incluída porque o ama, quer protegê-lo, mas não
entende que isso também é perigoso porque a genitora dele foi a
responsável por ela estar assim hoje.

— Entendo a Safi, disse para ela que era algo do qual não havíamos
pensado muito bem sobre como contar, ela entendeu e disse que me ama,
que sou um ótimo irmão e que não devo superprotegê-la, que o marido dela
faz isso muito bem.

— Ela se sentiu excluída e sufocada.


— Queria ter sido superprotegido assim por alguém na minha vida.

É ruim ouvir isso, mas também entendo o que ele quer dizer com
essas palavras.

— Ela compreende que você a ama o suficiente para cuidar dela e


esse não deve ser nosso foco agora, aquela lacraia está armando e nós
devemos nos concentrar nisso agora.

— Ela é atrevida, confesso, achei que isso havia mudado com o


tempo, não achei que seria tão desaforada de ligar no seu celular.

Isso é que eu nem te disse que ela ligou na empresa.

Despejo vinho branco que deixei separado em um copo dentro da


panelinha e desligo a chama da panela da carne.

— O seu tio me indicou um excelente advogado para cuidar disso,


caso a Viviane esteja perto demais de nós, ele disse que vai cuidar para que
ela fique definitivamente presa.

Sei que ela é uma ameaça, mas meu coração de mãe, ah, ele é mole.

— Não me olhe assim! — ele ordena meio sem graça.

— Não quero o meu filho indo visitar ela num hospital psiquiátrico
— dou de ombros e desejo o queijo ralado no arroz misturando bem. —
Tempera a rúcula e os tomates por favor?

— Você não acha que ela vai simplesmente deixar tudo como está,
não é? Você a ouviu durante aquela ligação!

— Eu ouvi bem, mas acho que vou seguir o conselho do tio Jack,
daí se não houver recursos vou apelar para o tio Alê.

— Ela não merece que tratemos ela com tanta paciência.


— Não era você que queria que eu não me preocupasse com ela?
Que não desse ibope para ela?

Ele arregala os olhos para mim, depois pega as folhas de rúcula e


coloca na bacia de salada, então despeja os tomates e puxa o gavetão onde
ficam os temperos.

— Eu só disse aquilo para te acalmar porque eu sei que você ficou


magoada com o fato do Cory não ter nos dito que já estava conversando
com ela há algum tempo.

— Eu não me importo com ela, desde que ela não chegue perto de
você ou das crianças. O direito dele conhecer ela é algo que pertence a ele,
isso é algo que eu não posso mudar, mas como o meu tio disse que ela
passou por essas coisas na infância, vou relevar essa questão da
convivência.

— Vou respeitar sua vontade, mas se ela continuar com essa postura
eu mesmo vou cuidar para que ela vá presa, não vou colocar a vida de
nenhuma das minhas crianças ou a sua em risco novamente. No começo eu
a ignorei, eu recusei ligações, eu ignorei os sinais da Safira, agora não será
assim.

Não mesmo.

Desligo a chama do risoto e coloco nos pratos que deixei separados


num canto da bancada, também coloco a carne de panela com bastante
molho. Ele pega as taças de vinho e vai na frente para o rumo da sala.
Coloco os dois pratos em cima de uma bandeja com talheres, guardanapos
de tecido e a bacia de salada. Levo tudo para a sala e me sento ao seu lado
na chaise colocando a bandeja em cima do centro perto do sofá ao lado das
taças.

— Eu não sei como cheguei a acreditar que ela nos deixaria em paz
quando comecei a me relacionar com você, ela me ligava basicamente todos
os dias, tive que mudar de número e pedir que meu advogado resolvesse
tudo.

— Acho muito complexo tentar entender a Viviane agora que sei os


problemas que ela tem.

— Ainda estou dizendo a mim mesmo que não devo morrer de


arrependimento por ter me envolvido com ela porque ao menos eu consegui
tirar o Cory das garras dela.

— Ele é um ótimo filho.

— E merece todo amor do mundo.

— Acha que ela não teria mudado por conta dele?

— Ela nunca mudaria por nada nem ninguém, amor, não é da


natureza dela.

— É que depois que eu fui mãe tanta coisa mudou, até mesmo meu
jeito de ver as pessoas, sinto que me tornei mais protetora e forte, pronta
para tantas situações.

— Nem todas as mulheres nasceram para ter filhos, Bê.

— É mãe, mas não é materna.

— Exato.

Pego o prato dele e entrego, coloco salada por cima do risoto com
carne e depois pego o meu fazendo o mesmo, recebo um cheiro gostoso no
pescoço e dou um beijo nele de volta.

— Tudo ficará bem, Bê.

— Sim!
Eu sei que no fim, tudo acabará bem.
PATROA

— Bom dia, pessoal!

Eu tenho essa nítida impressão de que hoje não terei a manhã mais
gloriosa da minha vida, porém, não há outro lugar onde eu gostaria de estar
nesse exato momento.

Vejo o meu corpo de diretores me cumprimentando com breves


acenos de cabeça e sorrisos, com alguns “bom dia” enquanto outros só
parecem ter que estar aqui. Como quaisquer outros funcionários que não
saem da empresa por comodismo ou por conta do dinheiro.

Assumi o compromisso de não permitir que a empresa passe por


nenhuma situação de riscou ou delicada quando peguei meu cargo de CEO
e é isso o que eu tenho feito há anos.

Estar afastada fisicamente da empresa não me impediu de trabalhar


da melhor forma que eu podia nos últimos meses, contudo, estar aqui agora
me dá plena ciência de que como é importante que eu não me afaste tanto
assim da empresa em algumas ocasiões.

E essa é uma delas.

Sêmora vem entregando as pastas do alinhamento que eu vou propor


para os diretores, são no total vinte diretores. Me sento o lugar central da
mesa da sala de reuniões. Mosés ainda não chegou porque teve que ir
buscar as crianças na casa dos nossos pais, mas já avisou que chegará em
alguns minutos.

Como no carro do Cory não cabem todos, ele sempre tem que
deslocar para buscar quando preciso ou algum motorista que o Ali
disponibiliza de sua empresa.
— Bem, vamos aos pontos, quero chegar em casa antes das 17:00.

Tive tempo de acordar e montar isso hoje pela manhã, acho que é
uma proposta justa, eu não tenho intenção de demitir ninguém, mas preciso
que todos esses homens entendam que as coisas não podem ser só como
eles querem que sejam.

Essa é uma das piores coisas de se estar no comando, não tem como
ponderar na maioria das vezes, o que vale para um vale para todos.

— Eu montei esse contrato baseado em suas exigências durante


nossa reunião virtual há alguns dias — começo abrindo minha pasta
também. — Antes de tudo, preciso dizer que sou grata demais a todos
estarem conosco por todos desses anos, têm sido anos de aprendizado e
muito enriquecimento profissional.

— Você pensou bem sobre nossa proposta? — Hunter Potter


questiona folheando a pasta.

Uma das funcionárias entra empurrando o carrinho do café e


Sêmora se prontifica de ir fechar a porta da sala de reuniões.

— Sim eu pensei.

— E o que decidiu? — Scott Herman pergunta me olhando


fixamente.

É claro que tinha que ser a dupla dinâmica a primeira a me


perguntar qualquer coisa antes de ler o que eu propus no contrato.

— Não haverá aumento? — Owen Walters conclui e se endireita. —


Achei que havíamos acertado isso na reunião passada.

— Não dei nenhuma resposta — respondo sincera.


— Acho injusto que não tenhamos aumento — Joel Simmons
responde num canto afastado da mesa.

Não me intimido com os olhares.

— Você conversou com o senhor Handerson? — Owen Walters


analisa o contrato sob as lentes pequenas de seu óculos de grau.

A maioria dos meus diretores são homens na casa dos quarenta e


poucos até sessenta e tantos anos, eles são homens que trabalham há muitos
anos na Handerson e já passaram por diversas filiais no passado, alguns
inclusive já trabalharam até com a Bonnie e o Phill.

Só que ainda custa entrar na minha cabeça que eles ajam sempre
como se eu Co dependesse do meu marido para tomar algumas decisões, é
claro, muitas das reuniões o Mosés quem participa, eu fico mais com a
outra parte, só que agora eu quem irei tratar dessa parte.

Sei também que para eles é muito mais cômodo trabalhar com o
Mosés justamente por eles serem homens, porque já o conhecem a muito
mais tempo que eu, eles estabeleceram esse contato com ele porque ele é
dono da empresa a mais tempo.

Por isso que quando eu decidi tomar essa decisão, optei por dizer a
mim mesma que deveria ter mais paciência e calma, eu sei que eles não
poderiam reagir bem a isso.

A moça do café começa a encher xícaras e ir colocando diante de


cada um dos diretores, Sêmora vem colocando o saquinho de biscoitos e a
garrafa de água para cada um deles logo em seguida.

— Eu não acredito que devo consultar o senhor Handerson a


respeito disso, senhor Walters — respondo tranquila.

— Creio que ele concordaria com nosso aumento — Joel diz. —


Não é muito justo que não tenhamos um aumento decente.
— Defina decente, senhor Simmons — peço juntando as mãos
enquanto me encosto na cadeira.

— O justo, é o mínimo já que esses novos promovidos irão ganhar


basicamente o mesmo que nós — ele alega todo ereto. — Temos que ter
uma equiparação em relação ao tempo de trabalho.

— É um bom argumento — admito.

— Eu não vejo porque não aumentar já que os lucros da empresa


estão aumentando ano após ano devido a toda nossa dedicação — Lucas
Miller alega, está sentado a minha esquerda.

— Você não acredita no nosso potencial? Trabalho nesta empresa


desde que o senhor Handerson tinha dez anos de idade. Comecei como o
rapaz que serve café assim como essa moça. — Eliot Blake diz com ênfase.

Eliot é um dos diretores mais velhos que temos na empresa, acho


que ele já está com o pé nos setenta, é um senhor grisalho e de barba
robusta que sempre usa gravatas de cores azul ou preta, acho que ele e Phill
mantém algum nível de amizade devido aos anos de servidão.

— Eu acredito muito no potencial de cada um de vocês, senhor


Blake — respondo com bastante paciência.

— Acho que está passando da hora de elegerem algum presidente


mais presente para que possamos ter melhores condições de trabalho. —
Lucas fica me olhando enquanto abre sua garrafa de água, cheio de
acusação e soberba.

— Eu concordo que precisamos de um intermediador e que esteja


sempre na empresa. — Joel fala bastante sério.

— Eu gostaria de entender os motivos que levam a vocês acharem


que precisam de um intermediador — digo pensativa. — E que eu sou
ausente pelo fato de estar afastada das minhas atividades fisicamente, mas
que eu estava participando de tudo ativamente de forma remota.

— Com certeza essa é uma reunião na qual o senhor Handerson


deveria participar, durante esses meses ele quem tem administrado essas
questões — Hunter retruca sucinto. — Ele provavelmente entenderia
melhor nossas questões.

— E por que eu não entenderia também? — aceito a xícara de café


que a moça me oferece. — Muito obrigada.

— Por nada — ela me dá um rápido sorriso e vai conduzindo o


carrinho para o outro lado da mesa.

Sêmora coloca meu pacotinho de biscoitos sob a mesa e a garrafa de


água também, trocamos olhares e sei que ela se entedia fácil com esses
dizeres.

— Acredito que essa reunião é desnecessária, temos coisas a fazer,


nada que inclua ficar dançando em bailes ou viajando de férias — Scott fala
com humor na voz.

Alguns diretores dão risadinhas, outros permanecem sérios e só um


deles faz cara feia.

— Sabemos que você está passando por essa crise no casamento, e


olha, eu entendo mesmo, mas o que nós temos a ver com isso? Só queremos
um aumento, nada mais justo! — Owen faz uma careta meio vaga.

Provo do meu café observando mais risadinhas baixas, vejo Sêmora


revirar os olhos, acho que chegou o momento de eu acabar logo com essa
conversa desnecessária.

— Eu concordo que nosso sistema hierárquico não facilita muito


essas questões de intermediação, portanto estou disposta a colocar mais dois
cargos na cadeia hierárquica da empresa. Um de presidente e outro de vice-
presidente.

Eliot parece aprovar a ideia.

— Quem quiser se candidatar as vagas basta que entregue seus


currículos atualizados para a minha assistente, ela irá enviá-los para mim e
Mosés analisar. Em relação as questões voltadas para o meu casamento,
espero profundamente que isso não aconteça novamente.

— Eu não entendi — Hunter comenta.

— Me deixe ser mais clara, hum, hum! — limpo a garganta. — O


meu casamento e a minha vida privada não dizem respeito a nenhum de
vocês e na próxima vez que qualquer um de vocês decidirem que querem
comparar a pessoa que eu sou na empresa com a pessoa que eu sou fora
dela, terei que penalizá-los de acordo com o código de ética e conduta da
empresa.

— Olha, Ana, parece que você voltou disposta a mostrar serviço e a


reconquistar o seu marido, mas será que essa postura é realmente adequada?

Todos dão risadas mais uma vez, me sinto ridicularizada.

— Que postura? A da pessoa que te paga todo mês? A da mulher


que faz com que você sustente a mulher que te odeia e os seus filhos que te
odeiam e suas idas ao clube onde todos os outros homens te odeiam?

Hunter fica calado me olhando boquiaberto.

— Qual é o problema de entender que eu sou dona da empresa? Eu


não vou aumentar os salários de vocês, se quiserem promoções façam por
merecer! Vocês não fazem cursos há séculos, acho que a última vez que
você se atualizou, as Pirâmides de Gisé estavam sendo construídas! —
determino olhando-o de cabeça erguida. — Ainda estou me questionando
sobre todos os motivos que mantêm cada um de vocês aqui, porque se a
empresa é tão ruim assim, tenho certeza de que adorariam trabalhar para a
concorrência.

Todos ficam calados, uns começam a tomar seus cafés, outros


parecem constrangidos, Owen abaixa a cabeça enquanto Hunter desvia o
olhar para o lado.

— Eu trabalho nessa empresa tanto quanto cada um de vocês


trabalham, passei por um problema pessoal e precisei me afastar para cuidar
de questões que não dizem respeito a nenhum de vocês. Agora porque estou
tentando melhorar as condições de trabalho de todos nós, querem aumento?
Sabe quem precisa de um aumento? Pessoas que tem um currículo com
bons cursos, quem se dedica e mantém ao menos um pingo de ética
profissional.

Mais silêncio.

— Eu sempre tomei excelentes decisões em relação a essa empresa,


não é pelo fato de eu ser mulher que as minhas decisões devem ser
invalidadas. Eu não vou me prestar ao papel de ficar vindo aqui repetir tudo
isso com frequência, estou sendo bastante clara nessas questões de
reestruturação e se eu não tomei a decisão de demitir nenhum dos senhores
é porque conheço a competência e confio em cada um dos senhores!

Sêmora puxa uma cadeira e se senta ao meu lado esquerdo, a moça


do café se afasta empurrando o carrinho indo até um canto então se senta
em silêncio.

— Sou muito transparente com o meu trabalho, portanto, agora


quem não aceitar esses termos peço encarecidamente que me diga se precisa
do emprego, posso providenciar uma demissão ou uma transferência, não
irei insistir com pessoas das quais não querem trabalho sério comigo.

— Eu até agora não entendi porque essa decisão de aumentar a


quantidade de diretores — Scott fala e me lança um olhar cheio de
sarcasmo. — É para salvar o seu casamento? Dizem que você vai fazer uma
bariátrica!

Sêmora faz menção de se erguer toda séria, seguro seu ombro e


depois me levanto, fico de pé.

— Dizem também que a amante dele já se mudou para a sua casa,


que estão esperando as coisas se acalmarem para ele te abandonar. Todos
sabemos que no fundo, no fundo você não passa de uma gorda mimada que
vive um casamento de aparência. Que só tem o que tem porque seu pai
comprou tudo para você, incluindo o seu marido.

— Eu não aceito que a minha capacidade seja reduzida pelo fato de


que eu sou mulher ou casada, por que afinal de contas isso importa tanto
para um bando de homens de meia idade?

— É o que se comenta por toda a empresa!

— Acha que isso se trata de você só porque não vai ganhar um


aumento? — pergunto escondendo dele toda a minha raiva. — Se acha
especial ou melhor porque não passou por nenhum problema conjugal ou
familiar?

— Eu penso que você não passa de uma gorda desesperada pela


atenção do seu marido infiel.

Alguns diretores expressam horror enquanto Sêmora leva as mãos a


boca toda chocada. Absorvo cada uma dessas palavras horrendas, mas não
sinto tanta dor quanto achei que poderia sentir sob quaisquer circunstâncias
que envolvessem algo assim.

— Suas palavras dizem muito mais sobre você do que sobre mim,
Scott, o que é uma pena! — falo sincera. — E que pena Scott, você não é
uma gorda bilionária, você é só um homenzinho medíocre que acha que vai
machucar mulheres porque pensa que isso faz de você alguém superior
quando na verdade não passar de um homenzinho pobre de espírito que não
tem nada a oferecer. Tenho pena da sua mulher, aquela coitada não tem bom
gosto, tenho pena das suas duas filhas, da sua mãe, da sua avó, ah, e até
mesmo daquele cachorro que você carrega para cima e para baixo quando
sai para correr de manhã no seu condomínio classe média baixa.

Scott fica paralisado com a minha resposta, mas não paro.

— Eu acho que a maior diferença entre eu e você é que eu nunca


precisei me submeter ao ridículo para me sentir bem, eu sempre soube que
estou ótima e sabe porquê? Porque além do fato de que sei que você nunca
vai ganhar nem um terço do que eu ganho de mesada do meu “papai”, eu
também sei que você é medíocre o suficiente para viver o resto da vida
achando que humilhar pessoas vai te levar para algum lugar.

Ele continua a me encarar todo incrédulo. Decido dar o assunto por


encerrado.

— Tem mais alguém que deseja sair do cargo de diretor?

— Eu agradeço a oportunidade, mas fica inviável para mim —


Lucas responde.

— Eu também agradeço — Hunter arruma a gravata no pescoço.

— Eu também — Owen diz.

— Eu. — Joel fala.

Então nenhum deles se pronuncia.

— Eu só irei aumentar o salário dos diretores que começarem a


fazer cursos extras ou pensarem em participar de iniciativas da empresa.
Sobre outras questões, na página sete há uma nova clausula que inclui um
aumento em bonificação para fins de viagens e férias, alimentação e seguro
saúde. Claro que não é como ganhar só cinco mil já que só irá beneficiar
vocês e suas famílias inteiras.
— Como? — Scott questiona e folheia a pasta rapidamente.

— Preciso dos contratos assinados até as 16:00 na mesa da minha


assistente.

— Aumentou o vale alimentação em mais de 20%? — Eliot indaga


boquiaberto. — Ainda bem que eu não quis sair!

— Estarei na minha sala caso precisem para tirar dúvidas, ah e só


deixando claro, a partir de hoje durante as nossas reuniões não serão aceitos
comentários do tipo. Aqui é uma empresa, não é um clube de fofoca.

Eles pegam as pastas e me afasto em silêncio, quando me aproximo


da porta, noto que Mosés está parado aqui me olhando em silêncio.

— Formalize as demissões — aviso para Sêmora.

— Amei! — Sêmora sai da sala dando pulinhos.

— Quer acrescentar mais alguma coisa? — pergunto ao Mosés.

— Não, acredito que você já conseguiu o que queria.

Saio da sala e ele vem comigo passando o braço em volta da minha


cintura.

Eu diria que consegui até mais do que eu queria.


INCONVENIENTE

Fiz um bolo de chocolate.

Também uma torta de morango com cerejas, preparei café e fervi o


leite, fiz chá de camomila ­— o predileto das meninas. — e fiz suco de
abacaxi com hortelã — o predileto dos meninos.

Meu esposo montou pequenos sanduíches de rúcula, tomate e


queijo, e logo em seguida deixou alguns somente com queijo temperado
para o Cory, ela ama misto quente.

Tivemos um resto de dia tranquilo em casa depois que voltamos da


empresa, decidi que queria preparar um bom lanche de fim de tarde para as
crianças. Me vi aumentando o volume do sistema de som da sala e ao lado
do meu marido separando todos os ingredientes para preparar todo esse
lanche.

Deixei a irritação causada pela acalorada reunião que tive com meus
diretores ou melhor ex-diretores de lado e preferi não dar ouvidos aquelas
coisas, as palavras de ódio e optei por conviver com as sensações ruins e
acolher isso só para mim.

Porque todas as vezes sei que de alguma forma isso irá me atingir,
mas como todas as outras vezes ninguém precisará saber que passei por
esse momento. Agora eu penso que me sinto mais forte para lidar com
críticas maldosas do que antes, mais resistente.

Quando eu era mais nova por diversas vezes eu chorei, eu me sentia


péssima, tive essas recaídas meses atrás e sei que não adiantaria eu fingir
que nada aconteceu ou ficar repetindo para mim mesma que não sou nada
daquilo o que ele falou.
É cansativo demais pensar no ódio que as pessoas sentem por mim,
então agora só estou deixando que meu coração acolha as sensações ruins
sobre os comentários e que passe no momento que deve passar.

Mosés não disse nada sobre o que eu falei na empresa, sei que ele
não gostou nada de ter ouvido aqueles caras falando tudo aquilo para mim,
porém gostei muito dele não ter se intrometido e tomado partida, até mesmo
pelo fato dele não ter me defendido dessa vez.

Porque ele sempre me defende em muitas circunstâncias.

Toma a frente de situações, sempre parece pronto para me proteger


de determinados tipos de pessoas, só que agora ele parece ter me dado esse
voto de confiança e de acreditar que posso me defender sozinha.

Como no restaurante semana passada e como hoje na empresa.

Eu sei que haverá momentos em que ele vai me defender, como na


festa do tio Jonas e sou muito grata a ele por isso, porém, não em todas as
situações como era quando nos casamos.

Ele talvez agora saiba que preciso dar esse passo na minha vida para
que as coisas fluam melhor na minha relação comigo mesma e isso possa
refletir na nossa relação. Porque eu me tornei a mulher que me tornei pelo
amor que ele sempre dedicou a mim, só que durante nossa separação isso
foi algo que me fez ver o lado ruim de me sentir extremamente amada e
protegida por ele.

O tornei meu mundo, o tornei mais importante do que qualquer


outra coisa ou pessoa na terra.

Eu sei que ele é, sempre será a pessoa que mais amo, só que isso
nunca poderá ser mais importante do que eu preciso ser para mim.

Não como quando me vi comparando meu corpo com o da Gisele,


de todos os choros desesperados porque eu queria acreditar que ele preferiu
a ela do que a mim, não o suficiente para que eu pensasse que ele nunca me
amou de verdade e eu havia tornado ele meu mundo.

É verdade que ele se tornou meu universo, eu o amo tanto, tanto, só


que isso nunca mais poderá ser motivo para justificar o jeito como
poderíamos viver nosso relacionamento.

— Cansada?

Saio dos meus pensamentos.

Mosés sobe na nossa cama e vem para junto de mim, ele se deita
com a cabeça em cima do meu seio e coloca metade do corpo sob o meu.

— Não muito, algum sinal dos seus filhos? Da sua nova cadela?

— Ah, você está falando do fato da sua mãe ter feito eu ir buscar
eles no aeroporto e ter me informado o horário errado do voo?

— Eu acho que deveria mudar o apelido dela, corujas costumam ser


metódicas e pontuais.

— Eu não sei o que o meu pai viu nela.

Rio, ele sorri relaxado.

Tomamos um banho há poucos minutos, coloquei um vestido que


não usava há meses, um preto floral de manguinhas com cordão no decote.
Mosés vestiu um calção de malha preto e uma camiseta folgada de algodão
na cor azul.

— Olha a minha Nina aqui — ele saca o celular e me mostra a


imagem da cadelinha deitada no sofá da casa da Dulce. — Olha como ela
está bem cuidada! A Dulce disse que ela está se alimentando muito bem,
fiquei enciumado.
— Ela é mesmo a sua cara, come tudo o que vê pela frente e só quer
viver deitada — digo preguiçosa.

Ele ri, deixa o celular de lado.

— Está tudo bem? — ele pergunta baixinho.

— Sim.

— Que bom.

— Talvez mais que isso.

Enfio a mão nos cabelos dele e toco seu couro cabeludo, ele se
treme todo e isso me faz rir mais uma vez, sou apertada, só consigo me
sentir grata acima de tudo.

— Acho que estou com um pouco de fome — ele fala e enfia a mão
dentro do decote do meu vestido, então aperta meu seio. — Preciso comer
alguma coisa.

— Ah, mas nem pense nisso! — rio mesmo assim. — As crianças


chegarão daqui a alguns minutos.

— Nem uma rapidinha? Você ficou me devendo uma, lembra?

— Eu sempre fico te devendo uma, não é?

— Dívida eterna.

Ele aperta meu seio direito por baixo do vestido e beija meu
pescoço, fecho os olhos dizendo a mim mesma que se eu não for firme, vou
acabar dando para ele de novo e agora não é o momento.

— Fiquei muito excitado de te ver falando aquilo na empresa,


inclusive me segurei muito para não te arrastar para nossa sala e não te
comer todinha na minha mesa.

Nossa!

— Te excito nesse nível?

— Ah, amor, você não tem noção do quanto me excita por coisas
pequenas.

— Então me fale algumas delas.

Ele puxa o cordão que prende o decote do meu vestido e meus seios
se espalham debaixo do tecido, depois puxa o tecido para os lados e toca
meus seios devagar, observando-os com adoração.

— Sempre há algo em você que é interessante, Bê.

— Acho que meu corpo mudou muito no decorrer desses anos


depois das crianças.

— Eu adoro seu corpo.

Você é maravilhoso!

Ele toca minha coxa e depois começa a puxar a saia do meu vestido
para cima, é tão gostoso me sentir observada assim por ele, mesmo depois
te tanto tempo, mesmo por trás de toda a vergonha que me provoca.

Começo a tocá-lo por cima do calção, é automático, é algo que eu


adoro, eu ainda não sei como poderia negar a ele esses momentos de prazer,
não por agora porque eu também quero.

Agora é diferente e que merda, tão magnético!

— Eu também adoro o seu corpo — digo e beijo seu maxilar.


Mosés puxa a saia do vestido até a altura da minha cintura e logo em
seguida começa a puxar a minha calcinha para baixo. Ergo as pernas juntas
facilitando seu trabalho. Ele se ergue e fica de joelhos diante de mim
puxando a calcinha para fora dos meus pés, os segura e começa a colocar
pequenos beijinhos neles.

Sinto a corrente forte de tensão sexual se expandindo por meu corpo


nesse instante, algo se espalha ligeiramente com arrepios fortes conforme os
lábios dele tocam a pele dos meus pés.

As mãos dele descem por meus tornozelos, depois minhas canelas,


então tocam meus joelhos e minhas coxas. A boca dele vem descendo junto
colocando mais beijinhos por minhas pernas, trilhando um caminho quente
e maravilhoso.

Seguro as pontas da camisa dele e a puxo para cima, ele ergue os


braços segurando o tecido pela gola e tirando de seu corpo, minha boca se
enche quando o vejo sem camisa. Meu pé toca seu abdome e a sola se
esquenta toda, o outro desce de forma ousada e toca seu membro rijo por
cima.

Os olhos azuis percorrem minha seminudez por alguns instantes, até


que ele abre as minhas pernas e se inclina ficando de bruços entre elas,
sorrio e me contorço toda quando ele me abocanha. Seguro o travesseiro e
meus quadris se movem frenéticos de um jeito rápido e automático.

A boca dele em mim... ah, que delícia!

O meu marido é ótimo nisso, sempre foi, mas quando ele quer, se
supera.

Eu fico observando-o me chupar enquanto meus lábios se abrem


com lufadas de ar causadas por meus suspiros intensos, meu coração
disparando, minha respiração ficando acelerada.

É uma sensação maravilhosa.


Ele sabe que me agrada, sabe cada cantinho pequeno da minha
intimidade que me causa mais prazer.

Mordo o lábio inferior quando a língua dele provoca meu clítoris


rapidamente, os braços dele passam por debaixo das minhas coxas e ele
segura meu monte de vênus me deixando mais aberta para ele.

Minha sensibilidade já aflorada faz com que eu me trema toda, a


quentura da língua úmida e ágil faz com que meu clítoris tensione e meu
corpo vai ficando mais rijo conforme a boca dele me explora.

Ele morde meu monte de vênus com carinho e desce mais uma vez
me lambendo toda de cima abaixo. Estendo a mão enfiando em seus cabelos
mais uma vez e me movo conforme sua boca me suga de cima para baixo.

O prazer vai se intensificando rapidamente, meu corpo todo treme


com a força da tensão causada pela chupada. Ele pressiona os dedos para os
lados me abrindo um pouco mais e começa a enfiar a língua em mim como
se me penetrasse.

O prazer excessivo faz com que um orgasmo mais potente ainda me


tome toda a intimidade, me enxarco toda enquanto meu clítoris vibra
depressa me deixando agoniada. Como se explodisse de dentro para fora e
meu corpo fosse junto.

Ele se ergue ligeiro e puxa o calção para baixo se enfiando dentro


das minhas pernas enquanto me deixa de lado. Segura minha perna
mantendo-a para cima e fica de joelhos enquanto me penetra com força.

Me apoio nos cotovelos agarrando os lençóis da cama com força,


finando as unhas no colchão, rangendo os dentes como se quisesse destruir
algo. O prazer é descomunal, mas é igualmente denso para nós dois.

Para mim que recebo o orgasmo, mas para ele que adora me
penetrar enquanto gozo.
Ele vem metendo numa firmeza viril, beijando meu pé, minha perna,
meu joelho. Estico a perna e meus dedos dos pés aguentando a metida
severa, ouvindo o som do sexo como batidas altas e sons de palmadas.

Toda a minha pele arrepia com seus olhares, com as sensações


imensas de prazer, mas porque sinto também que dou a ele muito prazer
também. Assim, com desespero e muita vontade.

Ele se inclina atacando meus seios e as estocadas se tornam mais


fortes, apoio meu pé em seu ombro enfiando a mão dentro da cueca e
apertando sua nádega, me sinto gananciosa, quanto mais ele mete, mais
quero.

Sorrio enquanto aperto a nádega dele e a outra mão se enfia em seus


cabelos puxando os fios com severidade, ele me pune com uma metida
profunda e seu pênis vibra dentro de mim me dando mais um rápido
orgasmo.

Me tremo toda sem tempo para pensar, porque ele continua vindo e
mordendo meus seios, chupando os bicos como se chupasse algo de comer.
Isso me faz sorrir, isso também me faz ter lágrimas nos olhos devido a dor
que o prazer causa.

— Minha boceta é só sua, Moshe — sussurro de encontro a sua


orelha e minha mão escorrega até sua outra nádega apertando-a. — Você
gosta de me comer assim?

— Gosto — ele sussurra de volta e morde meu seio direito com


afinco. — Adoro te foder, adoro o som que meu pau faz dentro de você,
ordinária!

— Eu adoro que me coma assim — mordo o lóbulo de sua orelha


com dedicação. — Me come mais forte, come sua boceta com mais força,
Moshe, ele é toda sua e de mais ninguém. Era virgem quando você comeu,
lembra? Bem apertadinha só para você!
— Ah, Anaaa! — ele geme e vem mais rápido.

Eu nunca pensei que ele fosse gostar tanto de me ouvir falando essas
coisas, é como se algo feroz o despertasse.

Me ajeito recebendo o pênis duro, aguentando cada metida com


prazer, risos altos e gemidos, como a mulher que nunca fui realmente para
ele, como uma nova amante desesperada para dar prazer para um homem.

— Fode sua boceta, amor! É só sua essa bocetinha molhada!

Ele se ergue e me acerta um tapa forte na cara, isso me motiva de


um jeito que não sei explicar, me ergo e saco a mão na cara dele também,
ele empurra minha perna para o lado e abre as minhas pernas empurrando-
as para cima.

Me apoio nos cotovelos encostando o corpo no travesseiro, assim


ele se levanta e fica de pé na cama, então puxa meus quadris para cima e
segura minha cintura me deixando apoiada apenas nas costas.

Rio arfante presa a aventura gostosa da posição.

Nós nunca fizemos algo assim na cama.

Ele fica me penetra mais uma vez e vem metendo em pé enquanto


estou soltando gemidos altos basicamente suspensa da cintura para cima,
com as pernas dobradas e completamente aberta para ele.

Como num filme pornô.

Tento me equilibrar e ele me dá um tapa servido na vagina enquanto


me penetra assim, estremeço mais uma vez e meu clítoris salta de um jeito
violento.

— Fode essa porra com força, caralho! — grito. — Fode essa boceta
com força.
— Vou encher sua boceta de porra, Bê, vou te deixar toda gozada,
Bêzinha!

Sou obedecida, ele olha para minha boceta todo concentrado, faz um
excelente trabalho estocando fundo em mim, subindo e descendo, não
consigo imaginar que faria isso anos atrás com tanta facilidade.

Ele começa a me masturbar com o polegar enquanto me penetra


com força, cospe nela e me toca rapidinho provocando minha intimidade
toda, isso me excita e me faz me contrair ainda mais.

Levo alguns minutos para entrar no frenesi e ele sente isso, minhas
contrações e vibrações enquanto seu firme pau me estoca, é uma sensação
inigualável e densa. Começo a chorar quando um orgasmo mais violento me
toma e ele vem gozando dentro de mim enquanto o polegar toca meu
clítoris rapidinho.

Ele nega com a cabeça enquanto o rosto está vermelho, as veias


saltam em seu pescoço e um choro baixo se forma em sua garganta.

Franzo a testa tolerando o orgasmo com lágrimas nos olhos, acho


que de todas as gozadas que ele me deu, essa sem sombra de dúvidas é a
melhor, mais excitante e prazerosa relação que temos em anos.

Não há muito tempo para pensar.

Começo a ver estrelas, meu corpo a tremer, toda suada, gozada,


gozando!

Ah, sim! Isso eu quero!


— E aí como foi o baile?

A pergunta do Cory me tira dos pensamentos.

Não ouso olhar na direção do meu marido, é que todas as vezes que
eu olho, sinto que uma parte de mim adora chegar a essa conclusão, mas a
outra morre de vergonha.

— Foi bom, aproveitamos muito com seus tios e o vovô.

— Ano que vem vocês poderão ir sem nenhum problema. — Mosés


responde tranquilo.

As crianças chegaram há alguns momentos e agora estamos fazendo


nossa refeição que acabou virando um jantar já que eles chegaram um
pouco tarde. Foi até bom que deu para tirar um cochilo e descansar por mais
alguns momentos.

Mamãe além de ter errado o horário do voo, preferiu pedir que Ali
enviasse algum motorista para dividir o percurso com o Cory, no final o que
importa é que deu tudo certo.

— O vovô mandou algumas fotos de vocês no baile e tem vídeos de


vocês dançando por toda parte! — Sophie comenta e morde seu sanduíche.
— Impagável o papai dançando.
Os meninos riem, as meninas também, mas o Cory só está pensativo
demais, não sei se gosto disso.

— Amamos a parte em que o tio Jack se ajoelha! — Gustav


comenta risonho e bebe um pouco de seu achocolatado. — Melhor parte,
definitivamente!

Eu também cheguei a essa conclusão, no final das contas foi uma


noite muito agradável nesse sentido.

— Eu me senti em uma cena de filme — confesso e corto uma faia


de bolo de chocolate para o Cory. — A mamãe fez o seu predileto, meu
amor.

— Obrigado, mãe, mas acho que já estou cheio!

Ele me dá um sorrisinho sem graça e depois se levanta.

— Preciso descansar um pouco, foi uma longa viagem, com licença.


— e sai da nossa sala de jantar rumo a escada.

Nossa, que abrupto!

Não digo nada, coloco a fatia do bolo no meu prato e fico por alguns
momentos me sentindo estranhamente mal e eu sei porque.

O Cory não está distante de mim atoa, sei que o climinha provocado
por nossa acalorada discussão se passou, só que muito provavelmente a
genitora dele está mais próxima dele em diversos sentidos e isso o faz
acreditar que deve me evitar.

— Ele tá estranho desde ontem, parece que está estressado por


algum motivo — Laisa comenta e coça a nuca. — Parecia meio indiferente
durante a viagem, será que brigou com a namorada?
— Ele não tem namorada — Akim responde. — Se ele tivesse eu
saberia.

— Será que levou um fora de alguém? — Bea indaga.

— O irmão de vocês anda com muitas coisas da universidade para


fazer, por isso ele está agindo assim, não se preocupem. — Mosés comenta
parecendo ignorar a chateação.

— Mãe — Cory chama da escada. — Vem aqui no quarto para


conversarmos?

— Eu já vou.

Mosés se ergue e olha para as crianças na mesa.

— Vocês fiquem aqui e terminem de jantar, limpem a bagunça.

— Sim senhor — Sahara responde curiosa.

Eu até prefiro que o Mosés venha comigo.

Conforme vamos subindo os degraus da escada ele segura a minha


mão e entrelaça os dedos nos meus. Respiro fundo e sei que talvez essa não
seja a conversa mais amistosa do mundo em nenhum sentido.

Entramos no quarto do Cory e ele está em pé perto da porta da


sacada do quarto dele, a cama ainda feita, a mala de viagem num canto e o
Macbook dele deixado num canto em cima da escrivaninha.

— Preciso conversar com vocês sobre algumas questões.

— Claro — respondo e fecho a porta. — O que foi?

— Tenho conversado com a Viviane, ela me explicou sobre as


dificuldades financeiras que tem enfrentado depois que saiu do hospital,
preciso saber se tem como vocês me adiantarem um pouco do dinheiro do
fundo de investimento que o meu pai deixou para mim.

Mosés cruza os braços e sei que ele detesta muito mais o fato do
Cory se referir ao genitor como pai do que em si por ele ter pedido dinheiro,
mesmo que se esforce para entender. Pala primeira vez desde que tudo
começou ele sabe como é sentir na pele o Cory chamando outro homem de
pai.

— Ela me disse que ligou para você e que você se mostrou bastante
hostil a ideia de ajudar ela com o dinheiro.

— Eu não me mostrei hostil, mas se você deseja mexer no seu


dinheiro não vejo problema algum. — digo notando que ele está na
defensiva. — O dinheiro foi colocado nessa conta pela sua falecida avó, os
restantes dos bens estão em seu nome por herança.

— Não desejo problemas em relação a isso, sei que ela precisa do


dinheiro e como ela não aceita que seja dinheiro de vocês, decidi que vou
pegar da minha parte da herança, até porque, nada mais justo, já que ela era
casada com ele.

Por ela ter tentado basicamente matar o Cory e tentando contra a


vida dele, ela foi excluída da linha de sucessão do Cory, o pai dele também
deixou esse testamento onde deixava tudo para ele, não deixou nada para
ela antes de cometer suicídio.

— Por mim tudo bem — Mosés dá de ombros.

— Sei que vocês não gostam disso, mas não quero que ela fique
morando num hotel, é perigoso, quero comprar uma casa para ela e dar uma
ajuda mensal com esse dinheiro.

— Ela não pensou sobre conseguir um emprego também? — Mosés


pergunta.
É a mesma coisa que me vem à cabeça.

— No momento ela não pensa sobre trabalhar, mas me diz aí, o que
o senhor em a ver com isso?

Eu noto que ele está na defensiva, nos olhando de um jeito atrevido


como nunca foi antes, mas que não devemos recuar.

— É engraçado você me perguntar isso, Cory, porque eu tenho


sustentado você há anos sem colocar um dedo no dinheiro que o “SEU
VERDADEIRO PAI” deixou para você, mas já que perguntou vou
responder, sua mãe não trabalha porque ela adora a ideia de ser sustentada.

Cory fecha os punhos e está zangado com a resposta que recebeu do


pai, não consigo me sentir mal pelas palavras do Mosés porque sei que é
verdade.

— E antes que pense mal me deixe explicar que eu não tenho nada
contra ela ser sustentada, eu inclusive durante um tempo sustentei ela,
porém, alguém nas condições atuais dela deveria no mínimo arrumar um
emprego de meio período, não ficar pedindo ao filho que a sustente.

— O que quer dizer com isso? Não faria o mesmo pela sua mãe?

— Eu sempre tive que me preocupar com vocês, nunca o contrário.

— O que o seu pai está querendo dizer é que quem deve se


preocupar com isso é ela, até porque ela é uma mulher saudável e jovem
também.

— Ainda não conversamos sobre essa questão, mas sei que em


breve ela vai tentar alguma coisa — Cory alega. — Só quero poder ajudá-la
a ficar num lugar seguro. Assim que eu conseguir colocar ela numa casa,
penso sobre tocar nesse assunto.
— É porque você não vai ficar sustentando-a para sempre. — Mosés
determina.

— Bem, o dinheiro é meu, minha herança, acho que posso decidir o


que fazer com ele.

Fico tensa em ver que Mosés respira mais devagar, sei que os nervos
dele estão a flor da pele em ouvir isso.

— Vocês não podem me negar o direito de usar o dinheiro da forma


que eu considero correta, sou maior, eu sei muito bem como administrar o
dinheiro.

— Estou dizendo que deve ter cautela e não jogar seu dinheiro fora
com coisas superficiais, conheço sua mãe muito bem para saber que assim
que ela colocar as mãos nesse dinheiro, ela irá começar a gastá-lo de forma
irresponsável.

— Acho que isso é uma coisa que eu preciso decidir sozinho.

— Cory não pode confundir generosidade com desperdício — aviso


me mantendo calma. — Há sim a possibilidade de você pegar o dinheiro e
não temos o dever de te dizer como usar, mas nós entendemos um pouco
mais do negócio, acredito que seu pai tinha propriedades aqui na cidade,
que tal checarmos se havia alguma para que ela possa morar?

— Pode ser — ele desvia o olhar todo receoso. — A outra questão é


que ela não se sente segura de morar sozinha.

Ah, não! Não! Não! Não!

— Não está cogitando ir...

— Acho que vou pedir transferência do meu curso para cá e vou


ficar revezando aos fins de semana, quero poder vê-la e acompanhá-la mais
de perto.
— Está pensando em ir morar com a Viviane? — Mosés indaga
realmente surpreso.

— Por que? Não pode? Ela precisa de alguém e não tem nenhum
familiar, eu sou sua única família — Cory responde de forma intrínseca. —
Ela precisa muito mais de mim do que vocês.

— Cory, o que está acontecendo? Nós fizemos parecer que não te


amamos o suficiente? Você é nosso filho.

— E eu sou grato por isso, papai, mas já sou adulto o suficiente para
decidir o que é melhor para mim, nesse momento é fundamental estar com
ela. Sem falar que serão só por alguns fins de semana.

— E quanto a sua universidade? Você batalhou tanto para entrar lá,


filho! — replico realmente controlando-me ao máximo para não ficar assim
tão nervosa.

— Eu sei o que é melhor para mim, quero tomar minhas próprias


decisões — Cory retruca. — Eu quero poder proteger a minha mãe de
pessoas ruins, ela realmente precisa de mim.

— Nós também queremos você, precisamos de você conosco, meu


amor...

— Só que eu não quero, mãe!

Franzo a testa totalmente incrédula diante das palavras dele.

— Se é assim que deseja, muito bem, falarei com o pessoal do


banco e amanhã mesmo toda a sua quantia estará disponível, poderá ir ao
banco e assinar todos os papéis. — Mosés diz encarando-o de um jeito
intimidador. — Faça o que acha melhor para a sua mãe.

— Eu não entendo porque estão tornando tudo isso tão difícil —


Cory diz com certa raiva. — Eu faria o mesmo por vocês também.
— Começo a ter minhas dúvidas, porque se nos amasse tanto assim,
não seria tão imprudente ao querer nos abandonar para ir morar com uma
desconhecida.

— Engraçado que ela não é uma desconhecida para você, não é?

— Claro que não e justamente por eu conhecê-la que estou deixando


claro que não aprovo isso.

— Você é tão patético, papai!

Meu Deus!

— Fica tentando me dar lição de moral, mas todos sabem que teve
um caso com a minha mãe enquanto ela ainda era casada.

— E ela era tão santinha que sempre vinha atrás de mim, não é
mesmo?

Cory range os dentes e entro na frente do Mosés, ele não se move,


ambos se olham com tanta raiva acumulada que o ar se torna imprevisível.
Começo a ficar com medo.

— Amor, melhor você ir ajudar as crianças com a louça.

— E você, mamãe, fica bancando a boa moça, eu também já sei que


você quem fez de tudo para que ela ficasse presa naquele hospital
psiquiátrico, inventou uma mentira para as autoridades para que ela ficasse
presa lá.

Me viro bastante abalada com o olhar cheio de raiva do meu filho, é


uma sensação horrível perceber que ele me odeia, revive dentro de mim
aquelas velhas sensações que eu tinha sempre que a Safira vinha despejar o
ódio que a Viviane alimentava nela em mim.
Mas se foi uma época sombria em que recuei diversas vezes, poucas
vezes reagi, agora será diferente.

— Repete o que você disse, moleque! Mas seja homem o suficiente


para aguentar as consequências das suas decisões e palavras — peço num
berro tão alto que ele dá um pulo de onde está. — Acha que eu faria isso
com ela? Então não me conhece, não conhece a sua verdadeira mãe, todos
esses anos que cuidei de você, que te criei, te eduquei e você me vem falar
um monte de mentira para tentar me magoar? Acha que passei os últimos
quinze anos da minha vida brincando? Que tudo isso é uma brincadeira?

— Eu só estou dizendo...

— Eu sei muito bem o que está dizendo, você me respeite! Eu não


sou uma vagabunda para ouvir essas coisas, nem seu pai! Desde que a sua
mãe apareceu você está agindo assim, nossa relação nunca, nunca foi assim!
Sempre te respeitamos e se não ficamos falando da sua mãe para você foi
justamente por amor, para te proteger de todas as coisas que ela fez no
passado, mas já que insiste e que ela está tão certa, basta que pesquise com
a polícia o que realmente houve.

Ele não diz absolutamente nada. Fica calado me encarando num


misto de confusão e incerteza, mas também raiva.

— Em segundo lugar, não estamos dizendo que não iremos te ajudar


nesse quesito financeiro, nós não somos assim e acho que sabe disso, nunca
tocamos nesse dinheiro e é algo que nós nunca precisamos recorrer, Graças
a Deus e ao trabalho duro que eu o seu pai fazemos na empresa. Então, não
Cory! Eu não tolero que você fale assim conosco, que ache que só porque
sua mãe biológica apareceu queira dar uma de filho revoltado e credibilizar
ela por coisas que ela não fez! Eu sempre estive aqui por você, sempre fiz
tudo o que estava ao meu alcance por você e agora você acha justo querer
sair de casa assim do nada? Mudar toda a sua vida só porque sua mãe
biológica “precisa”? Acha mesmo que se ela precisasse de verdade não teria
provado com atos ao invés de ficar dizendo coisas sobre nós para te afastar
de nós?
— Nós não queremos te afastar da Viviane, mas essa é a segunda
vez que você vem conversar conosco nesse tom rude, parece que não nos
quer por perto, que quer nos substituir, se é isso o que deseja, vá em frente!
Só que você nunca, nunca chegou perto de ser uma opção para mim, me
tornei seu pai no primeiro momento em que te vi. Sempre fui muito mais
para você do que eu tive das outras pessoas, não espero que acredite em
mim, mas quer saber? Foda-se! Se largar a universidade e sua vida começar
a desandar por conta da Viviane, não responderei pelas minhas decisões,
portanto, arque com as consequências.

— Está me ameaçando? — Cory berra fora de si. — Nossa, vocês


transformam tudo em um grande drama.

— Garoto eu nunca te disse o que fazer nada vida, não será agora
que eu farei isso, mas sou seu pai e se não quiser aprender pelo amor,
aprenderá pela dor! — Mosés aponta para ele e depois gira os calcanhares
indo até a porta.

Cory fica calado mais uma vez.

Mosés sai do quarto dele e bate à porta com tanta força que as
paredes tremem, lanço um olhar duro para o meu mais velho, é doloroso
pensar que ele esteja passando por isso porque nossa confiança foi
quebrada, me dói saber que ele se voltou contra nós dois.

Ficamos em silêncio por alguns momentos, ele com os olhos cheios


de lágrimas e lábios trêmulos, ombros caídos, me lembrando do pequenino
garoto que abracei em todos os momentos difíceis, mas também do homem
que eu acredito que criei e em quem devo confiar, mesmo em todos os
momentos mais difíceis.

— Não farei com que se sinta culpado por querer ajudar a sua mãe,
Cory, faça o que você achar melhor, mas acho que mesmo com tantas
dúvidas dentro do seu coração, você sabe que não poderá se enganar por
muito tempo. — digo engolindo a vontade de chorar. — Eu te amo, mas se
tiver que partir porque acha que é o melhor para si mesmo, faça isso, nós
sempre estaremos aqui para você.
— Tá — responde baixinho. — Me desculpe, mamãe.

— Tudo bem, vou conversar com o seu pai, faça o que achar melhor,
iremos te apoiar, você sabe que ele fala coisas ruins quando está sob pressão
ou com raiva.

— Eu só queria me sentir parte de algo, descobrir realmente quem


eu sou.

— Você é parte das nossas vidas, da nossa família e você é o meu


filho, isso não te basta?

Ele fica calado, estou realmente decepcionada em saber disso.

Achei que ele tinha um sentimento de pertencimento a nossa


família, que havia cultivado amor o suficiente nele, mas agora não tenho
certeza disso e é desolador.

— Vou conversar com o seu pai, pense com cuidado nas suas
decisões, ok?

— Sim senhora, eu também te amo, mamãe.

Suspiro e caminho até a porta em silêncio, precisava de um abraço


vindo dele bem forte, mas se não sou o suficiente para que ele não tenha
dúvidas, não poderei também ser só algo no qual ele se reconforta ou apoia.

Talvez seja melhor assim, se ele quer ficar com ela, que vá, não serei
eu quem irei impedir, só espero que ela não faça um grande estrago como
da outra vez, não sei se aguentaria um sofrimento tão grande.
UM VAZIO

Há um velho ditado que diz que amar é deixar ir.

Bem, eu não sei se isso valeria para mim até o exato momento.

Agora estou olhando para a cama bem-feita do meu menino e ele


não está mais aqui.

A primeira coisa que fiz ao acordar foi vir ao quarto do Cory,


porém, encontrei um quarto vazio sem nenhuma surpresa.

Me vi indo até o banheiro e observei que nenhum de seus itens de


higiene particular estão mais aqui, olhei em seu guarda-roupas e boa parte
de suas roupas não estão aqui.

Sinto uma dor invasiva e tremenda me tomando, passo as mãos nos


braços dizendo a mim mesma que não poderia ter feito nada diferente, sei
que nada o impediria. Nesse momento com a forma como as coisas estão
acontecendo eu duvido muito que ele poderia entender toda a situação e
compreender nosso lado.

Tenho vontade de chorar, mas minhas lágrimas não caem, não


consigo me sentir arrependida pela conversa de ontem e nem culpada, só
que ainda tenho essa sensação de que fiquei a dever em diversos sentidos.

O que eu poderia ter feito de diferente para que o Cory não


acreditasse nela?

Não importa, não mais!


Ele fez as escolhas dele, ele tomou seus partidos e decidiu que seria
assim, sei que é questão de tempo até que ele perceba quem ela é realmente
e algo dentro de mim fala claramente que por mais que deseje entrar em
contato e pedir que ele volte é exatamente o que eu não devo fazer.

Eu o conheço bem para saber que está zangado comigo e com o pai,
sei também que é sensato o suficiente para entrar em contato e depois dizer
que está com ela porque acredito que era isso o que ele queria ter dito
ontem.

Cory tomou todas as decisões que julgou corretas e melhores para si


mesmo e por mais que eu discorde nada poderá mudar o fato de que é o que
ele quer, continuarmos brigando ou evitando qualquer coisa em relação a
mãe biológica dele só tornaria nossos dias dentro de casa insuportáveis.

Foi algo que fizemos durante esses dias desde nosso retorno, em
nenhuma das tentativas de conversa ele parecia disposto a entender as
coisas como elas são e parece muito tarde para remediar ou lamentar.

Eu sei que ele está errado, sei que vai se machucar muito com esse
processo, mas tudo o que poderei fazer é só esperar que ele retorne.

— Ele vai voltar.

As palavras vêm com um abraço forte, um beijo no meu combro, as


mãos grandes que tocam as minhas por debaixo dos meus braços, um apelo
suave e sensato que me faz sentir um pouco confortada.

— Ela não vai conseguir fingir muito tempo.

— Eu também sei disso, amor.

— Sei que está triste, ouvi o som do carro dele hoje cedo, não quis
te acordar e sabia que não poderia impedi-lo.

Suspiro me encostando nele.


— Eu não pensei que as coisas ficariam assim, esperava que ele
fosse sim querer que ela estivesse por perto, acho que subestimei o poder
que ela exerce sobre as pessoas.

— Não temos culpa, Ana, foi escolha dele.

— Não sei se eu gostaria que fosse diferente, eu notei que só esses


dias que ele esteve conversando com ela mudaram a forma dele nos ver.

— Ele vai se dar conta de quem ela é quando começar a dizer não
para ela.

— Eu não duvido disso, só me pergunto se ele poderia suportar.

— Se ele é homem o suficiente para nos sujeitar a dor da rejeição,


então também será homem para encarar as consequências das próprias
escolhas.

É tão duro ter que admitir que o Cory tem sido meio estúpido
conosco e isso não tem a ver só com ela, tem a ver com o fato de que o
criamos muito bem e que justamente por isso nunca contávamos com essa
reação por parte dele.

— Vou falar com o tio Jack — digo. — Quero que ele seja vigiado,
não quero que ele acabe jogando o futuro dele no lixo por culpa dela.

— Se depender de mim, o dinheiro de herança dele vai pegar só o


necessário para se manter, ainda temos aquela clausula que nos permite
controlar os gastos e estipular valores.

— Eu acredito que será o melhor, mesmo que ele nos odeie agora.

— Fiquei muito tentado em dizer a verdade para ele ontem, me


zanguei muito com o que ele falou.
— Tem coisas que só ele deve ver para acreditar, se ele tivesse nos
dito há meses que estava em contato com ela, nós ainda poderíamos
convencê-lo de quem ela era, mas ele escondeu isso de nós.

— Não entendi porque ele escondeu, porque ficou com medo.

— Ele quer acreditar no que convém para ele, nós nunca fomos
abertos sobre nada em relação a ela, então ele está construindo essa imagem
dela baseado no que ela fala. As ações sempre dirão muito mais do que as
palavras.

— Ele vai voltar, amor.

— Assim espero.

E que não doa muito até que isso aconteça.


A INIMIGA

Não está sendo um começo de dia fácil.

Mosés está atrás de mim preparando as panquecas para o café das


crianças, já fiz o café e estou fazendo ovos mexidos, sobrou alguns mistos
de ontem, lavei algumas frutas.

O meu celular toca e vejo a imagem do meu filho estampada na tela.


Logo de imediato atendo a ligação, tento conter meu desespero, me manter
calma, mas fico tão aliviada por ele ter me ligado.

— Oi meu amor, você está bem?

Primeiro ouço o som de silêncio do outro lado da linha, então escuto


uma risadinha baixa que me causa calafrios, coloco o celular no viva voz e
seleciono rapidamente o botão de gravação de chamada.

— O Cory está aqui comigo, ele saiu para comprar algo para o
nosso café — ela responde do outro lado da linha. — Olá, inimiga!

Mosés para de misturar a massa de panqueca e vem para perto todo


apressado, mas silencioso, é preferível que ela não saiba que ele ouve essas
ligações, sei que ela jamais agiria assim se ele soubesse.

— Precisaremos de uma boa quantia para adquirirmos um imóvel na


cidade e para que eu consiga comprar tudo o que preciso — a voz de
Viviane está tranquila e calma. — Ele quer passar alguns dias comigo,
espero que não vejam problemas nisso.

— Nós conversamos e decidimos que foi melhor assim — respondo


escolhendo cada palavra. — Eu e o Mosés iremos verificar a questão do
imóvel para que o Cory more com você o tempo necessário.
— Como se sente tendo que basicamente me sustentar, querida?

— Há algo mais relacionado ao meu filho que você queira tratar?

— Ele não é seu filho, Ana, é meu filho!

Decido não responder, mas é péssimo sim ter que saber que meu
filho agora vai morar com ela e que por isso terei que providenciar uma
casa para que ela viva, por mim ela moraria ao menos há uns mil
quilômetros de distância de todos nós.

Só para eu não ter o desprazer de olhar na cara dela de novo, de ter


que conviver com ela.

— Agora que seremos todos uma grande família eu preciso fazer


algumas exigências.

Troco um rápido olhar com o meu marido. Eu noto a ponta de


estresse no olhar dele.

— Você não está em posição de fazer nenhuma exigência, Viviane.

— Bem, o Cory não vai gostar de saber que vocês estão me negando
auxílio, se só com algumas coisinhas que eu disse para ele, já veio morar
comigo, imaginem o que ele não faria se soubesse de todas as coisas
horríveis que eu passei naquele hospício por sua causa!

— Eu acho que você se esqueceu que drogou o seu filho e apontou


uma arma para a minha cara.

— Você enlouqueceu? Eu nunca fiz isso!

É assustador ver que ela fala com tanta convicção que parece até
estar certa.

— Por que será que você foi presa?


— Você armou para mim, disso ele já sabe!

— Aham, tá bom, vai, continua com suas mentiras, mas elabora


bem, viu? Porque é como você mesma disse, o Cory é seu filho, ele tem a
quem puxar!

Ela fica calada do outro lado da linha, estendo a mão e Mosés dá


uma batidinha nela, ele sabe que eu vou fazer o jogo dela, estamos sem
saída.

— Depois você pergunta a ele porque ele fez tantos anos de terapia
— continuo.

— Ele fez? — a voz dela finalmente se mostra menos confiante.

Consegui!

— Ah, você não sabia? Ele não te disse? Quando ele tinha cinco
anos de idade alguns pássaros começaram a aparecer sem cabeça na nossa
propriedade, tivemos que procurar o auxílio de um médico especializado,
acho que ele herdou de você esse problema.

— Está tentando me assustar? Eu não tenho medo!

Não parece muito confiante disso.

— Eu só estou te avisando que você não o conhece tão bem quanto


deveria, mas se prefere assim, faça!

— Eu quero no mínimo uma empregada para me ajudar com os


afazeres domésticos e um motorista.

— Pode fazer essas exigências ao seu filho, ele vai comprar tudo o
que você precisar.

— Você quem está com o dinheiro, gorda ridícula.


— Ah, minha filha, para de encher minha paciência, eu não tenho
nada a ver com você, agora que pegou seu filho de volta faz bom proveito e
cuida dele, você, já te fiz o favor de criar ele por mais de quinze anos.

Viviane não tem tempo de resposta.

— E outra, acho bom começar a procurar um emprego os dois, o


testamento do pai do Cory só garantia que ele pudesse pegar todo o dinheiro
depois dos vinte e sete anos, até lá é bom que pense em alguma coisa para
fazer.

— Boa — Mosés gesticula com os lábios para mim.

— Você só pode estar brincando comigo, como eu vou trabalhar? De


que? Eu nunca trabalhei na vida!

— Eu não tenho nada a ver com os seus problemas, manda o Cory


entrar em contato para vermos as questões do imóvel e pare de me
incomodar!

— Eu não vou trabalhar...

— Você não conhece o filho que tem Viviane, cuidado, ele é muito
mais esperto do que aparenta, até logo!

Desligo a ligação, solto o ar realmente aliviada de ter acabado esse


pesadelo de conversa, meus ombros até doem com a tensão.

— Você foi muito bem, Bêzinha!

Ele abre os braços e vem me dar um abraço mais forte, devolvo o


abraço. Respiro fundo algumas vezes até ouvir o som dos passos rápidos
dos gêmeos, Akim e Gustav entram na cozinha usando pijamas e meias, os
cabelos bagunçados e as carinhas ainda de sono.
— O Cory saiu? — Akim coça os olhos afastando o sono. — Eu
achei que ele ficaria até semana que vem!

Troco um rápido olhar com o meu esposo e sei que teremos que dar
algumas explicações nada agradáveis para as crianças. É algo do qual
também nunca tocamos no assunto, já que não falamos sobre os pais do
Cory com nenhum deles. Eles sabem sim que o irmão mais velho é adotivo,
mas isso nunca foi relevante demais para eles já que o Cory chegou à
família quando as meninas ainda eram bebês e antes dos meninos nascerem.

As gêmeas vêm também usando pijamas parecidos, meias coloridas,


os cabelos presos por coques desajeitados, cara de quem acabou de acordar.

Eles vão assumindo cantos distintos em bancos diante da nossa ilha


de refeições da cozinha, também temos uma mesa aqui, mas para refeições
rápidas sempre fazemos na pedra da ilha.

— Temos que falar algo para vocês que talvez não seja muito
agradável — Mosés pega a vasilha com massa de panqueca e coloca sob a
pedra ao lado do cooktop.

Eles estão todos de frente para nós, de um lado e nós do lado do


cooktop e de uma das pias.

— O irmão de vocês está passando por um momento mais pessoal, a


mãe biológica dele se reaproximou dele e ele decidiu ir morar um tempo
com ela.

— Quê? — Bea berra chocada.

É, que!

— Sabemos que não será uma coisa muito fácil de se lidar, mas
acreditamos que o Cory virá visitá-los com frequência, ele precisa desse
tempo para si. — Mosés fala e liga a chama da frigideira.
— Mas nós somos a família dele! — Sahara exclama chateada. —
Ele foi embora sem se despedir? Ele nunca faria isso!

Ele fez.

Ele sabe que seria mil vezes mais doloroso se despedir de nós, ele
sabe o quanto as irmãs e os irmãos o amam, mesmo que esteja sendo um
completo idiota em pensar só em si mesmo nesse momento.

— É por isso que ele não saia do celular durante a viagem —


Gustav comenta pensativo. — Achei que fosse por conta de alguma
namorada.

— Acho que está havendo algum engano, o Cory não iria embora
assim do nada — Sophie argumenta mais séria.

— Querida ele foi, lamentamos muito pela situação, mas foi escolha
dele, só cabe a nós respeitarmos — digo com cuidado.

Sei que ela está magoada, assim como Sahara, Bea e Laisa, os
meninos também por mais que tentem esconder suas emoções, só que eu
nunca poderia privar que eles soubessem a verdade.

As crianças passaram por muitas coisas nos últimos meses, sempre


procurei ser transparente como cada um deles sobre a situação sem expor
nenhum a coisas negativas sobre o pai, com o irmão não seria diferente.

E por mais que achem que dói que o Cory tenha ido sem se
despedir, sei que a dor de todos independente de qual seja é algo terrível de
se sentir. Já foi um sofrimento quando ele decidiu estudar fora, agora será
mais um sofrimento ter que lidar com a ausência dele nos poucos dias em
que vem para ficar conosco.

— E vocês, tipo, deixaram ele ir? — Bea faz uma careta. — Não
deveriam.
— Ele já é adulto o suficiente para fazer as escolhas que deseja —
respondo sincera.

— Então, tipo, é isso? Ele vai embora morar com uma completa
estranha e vocês agem como se fosse supernormal? — Sophie dispara super
irritada. — Que tipo de pais são vocês?

— Somos os pais que respeitam as suas decisões, ou você acha que


gostamos de acordar hoje e não ver ele no quarto dele? — indaga Mosés
secamente. — Se acredita que está sendo fácil para nós, pode ir tirando seu
cavalinho da chuva mocinha!

— Eu não me conformo! — Gustav pragueja e faz cara de choro.

Ele troca olhares com o irmão e ambos se levantam e saem da


cozinha rumo a escada.

— Tirem o tempo de vocês — Mosés fala enquanto joga manteiga


na frigideira e então começa a despejar a massa devagar.

As meninas começam a sair da mesa com cara de choro também, sei


que é duro demais ver as crianças em uma posição frágil em um período tão
curto, mas não há nada que possamos fazer, legalmente falando o Cory é
maior e pode ir para onde ele quiser.

Se ele fosse menor ainda iríamos proibi-lo de sair de casa assim, só


que ele não é.

— Desde que vocês decidiram se separar nós nunca mais tivemos


um dia de paz, agora vocês voltaram e o Cory foi embora? — Sophie
reclama se afastando com voz de choro.

Não respondo, Mosés também não.

Sei que minhas decisões prejudicaram as crianças nesse meio


tempo, mas foi o que eu julguei necessário na época, não tem como voltar
no tempo. Eu as protegi da exposição o quanto pude, mas não pude protegê-
las do fato de que estive separada do pai delas.

Sobre isso não há o que fazer e agora tão pouco sobre a decisão do
Cory de ir embora.

A única solução é dar tempo ao tempo.

Ao menos por enquanto.


CONSIDERAÇÃO

— Acha que eles ainda estão muito zangados?

Meu esposo dá de ombros e volta a beber mais um gole de cerveja.

Antes das 14:00 é foda, mas dadas as circunstâncias, nem uma dose
braba de terapia poderia curar todas as dores de decepções que sentimos
nesse momento.

Eu já sabia que nosso primeiro dia sem ele aqui seria doloroso
demais, eu achei que teríamos tempo para resolver tudo direitinho, mas ele
decidiu partir, foi morar com aquela mulher que agora chama de mãe, é tão
difícil.

Mosés está tentando ser forte, sei que sim, mas sabe que também
não há nada que possa fazer, a sensação de impotência e incapacidade veio
com força assim que nós nos demos conta de que agora as coisas não serão
da forma como têm sido.

Nosso café com os meninos foi silencioso e coberto de fungados


baixos, olhos vermelhos e narizes irritados, depois do café as meninas
começaram a tirar a mesa e foram lavar os pratos, limpar a cozinha como de
praxe enquanto os meninos estavam pegando alguns equipamentos de
jardinagem na dispensa e indo para a horta dos fundos.

Eu mesma não tive tempo de olhar nada, sei que na minha ausência
a Dulce cuida muito bem de tudo, só que é algo que eles realmente gostam
de fazer desde muito pequenos.

Mosés pegou um engradado de cerveja e veio para o terraço, armou


uma rede e se deitou pronto para ficar na dele, vim junto e aqui estamos, ele
deitado para um lado e eu sentada de frente balançando a rede feito uma
criança infeliz.
Como se eu estivesse de castigo.

Ok, achei que eles não reagiriam bem, nem tivemos tempo de
ensaiar o que dizer, mas não pensei que iriam nos responsabilizar pelo
irmão ter decidido ir embora, isso não é nossa culpa, foi uma escolha
exclusiva dele.

Eu sei que eles não sabem nem de um pequeno terço da história,


mas não acredito que agir como rebeldes e acharem que as coisas são assim
como eles querem vá facilitar e resolver a situação.

A verdade é que me acostumei tanto com as suas personalidades


calmas que de um tempo para cá não estive pensando que haveriam grandes
mudanças em nosso relacionamento de mãe e filhos.

Que a Sophie tem um pouco de personalidade forte, Sahara é meio


mimada, Laisa é medrosa e Bea é geniosa quando quer eu já estou careca de
saber. Gustav é pouco aberto a mudanças e Akim é curioso na maioria das
vezes. Agora Cory é de todos o mais calmo em muitos sentidos. Os conheço
como a palma da minha mão.

Eles precisam desse tempinho para pensar.

— Eu ainda estou preferindo pensar que ele tomou a melhor decisão


para si mesmo — Mosés comenta e toca a minha coxa. — Que não devo
sentir culpa ou remorso.

— Que fez a sua parte — concluo chateada.

— Ei, pare de adivinhar meus pensamentos!

Sorrio e bebo mais um gole da minha cerveja.

Vejo Sahara entrando pela porta lateral do terraço, usando o shot


jeans e uma camiseta velha toda cheia de marcas de tinta, acho que uma
daquelas que ela usa para pintar seus quadros.
— Espera, eu só não entendi uma coisa, por que o papai está com
esse roxo na testa? — Sahara questiona se aproximando toda desconfiada.

Ah, de novo não!

— Eu caí e bati com a cabeça no trinco da porta! — Mosés responde


com certo deboche.

Ela me lança um olhar curioso e severo.

— Está batendo no papai, mamãe?

Arregalo os olhos e olho para o meu marido toda abismada, Mosés


não evita de rir alto com a pergunta da nossa filha.

— O seu pai se envolveu em uma pequena briga na festa do tio


Jonas — falo, mas sobre isso realmente, não tem jeito, não falarei mais
nada.

— Por causa de...

— Um cara imbecil foi tirar fotos nossas sem nossa autorização,


então tive que dar uma boa lição nele — Mosés inventa entendendo meu
olhar. — Ele me deu uns socos, mas não passou disso.

— Eu percebi ontem, mas não quis parecer enxerida, sei que


algumas vezes se machuca nas aulas de box — ela puxa uma cadeira e se
senta perto da nossa rede. — Sei que não foi culpa de vocês, eu telefonei
para ele agora, ele me disse que está bem e que está cuidando da
transferência dele para cá, chamei ele de doido e desliguei na cara dele.

Típico de uma das minhas filhas.

— Daí ele ligou de volta e se desculpou por não ter se despedido,


disse que virá nos ver todos os fins de semana e que vai mandar mensagens
todos os dias.
— Sabemos que é difícil para vocês, mas essa é uma decisão do
Cory que iremos respeitar. — digo.

— Vocês têm certeza de que irão permitir que ele more com uma
completa estranha?

— O que faria se fosse nós? — o pai dela indaga lançando um olhar


carregado de deboche. — Olhe para nós, estamos velhos demais!

— O Cory precisa que nós o apoiemos — Sahara alega.

— Conversamos ele e essa é nossa forma de apoiá-lo, ele não deseja


que seja diferente, filha — respondo. — Nós não podemos proibi-lo de
conviver com a mãe dele.

— Ela não é mãe dele, você quem é a mãe dele! — a voz de Sophie
esbraveja entrando no terraço.

Ela usa uma jardineira de tecido grosso e está de chinelas, fez


tranças nos cabelos, veio realmente disposta a discutir, ela é briguenta
quando quer.

— Pode dizer isso para ele se desejar, nesse exato momento ele não
quer nos ouvir — falo. — E eu sei que sou mãe dele, só que isso é algo que
o Cory deve fazer sozinho, é a escolha dele, é a jornada dele. Acha que eu
também não chorei quando vi o quarto dele vazio?

— Acho que temos que fazer algo para mudar isso — reclama ela.
— Essa mulher nunca quis saber dele antes, por que isso agora?

— Ela é a mãe dele, ela é mãe! Ela é mãe! — Mosés fala irônico. —
Ela só quer cuidar do filhinho dela.

— Aí, pai, por favor, sem humor ácido! — Sophie continua a


praguejar.
— Não há nada que possa falar para que ele se convença de ficar,
nós tentamos ontem e ele não quis nos ouvir, há coisa que só quando
passamos na pele que sabemos e esse é o caso dele. — Mosés bebe o resto
de sua cerveja. — Eu não dou duas semanas ao lado daquela vaga...

— Mosés! — exclamo interrompendo-o.

— Bem, vocês entenderam.

— Ela deve ser mesmo muito importante para ele nos trocar por ela
— Bea comenta vindo também para o terraço.

— Liguei para ele e nem me atendeu — Laisa vem mexendo no


celular. — Mas a vingança é um prato que se come gelado.

— Não supervalorizem isso, meninas, uma hora as coisas vão se


resolver — respiro fundo. — Então agora, vamos aproveitar que eu e o pai
de vocês estamos em casa o dia todo e vamos fazer algo juntos.

— Vou buscar as cartas — ouço Akim berrando na lateral do jardim.

— Acho que devemos interceder — Sophie reclama. — Eu não


confio nas intenções dessa mulher.

Ah, meu amor, você não é a única.

— Faremos isso no momento certo, agora estamos todos nervosos e


com as cabeças cheias, não vai adiantar brigar com ele por nada — Meu
esposo fala. — Vamos tirar o dia para tentar ficarmos mais leves e unidos,
temos que pensar com calma sobre o que fazer.

— Eu ainda não estou convencida disso —


­ Sahara diz. — Essa briga
aí com alguém da imprensa nem vazou em nenhum portal de fofocas.

— Seu avô estava lá — Mosés alega e me puxa para junto de si. —


Vem cá, Bêzinha, preciso de consolo.
— Que amor, agora vão fingir que estão em uma lua de mel
enquanto o Cory foi embora — Sophie reclama chateada.

— Sophie seu irmão foi embora porque quis — digo com mais
firmeza e ela enrijece. — Queira você ou não terá que conviver com isso
assim como cada um de nós. Também não gosto da situação, mas não há
nada que não tenhamos dito ao Cory que o fizesse ficar, foi uma decisão
dele, não nossa e ele só voltará para esse casa quando ele quiser. Não vou
ficar tentando provar nada para ele, ele quem está perdendo, não nós!

Ela bufa, depois se afasta, faço menção de levantar e meu marido


segura meu braço. Entendo seu olhar e sei que devo ficar, as meninas me
lançam olhares tristonhos, só que isso é algo que não posso fazer por elas.

Dores e frustrações são coisas pessoas sentem e elas não são


melhores do que ninguém para serem poupadas disso.

Nem hoje nem nunca.

— Vamos jogar! — Gustav entra no terraço com a caixa de jogos


nas mãos.

— Chega de tristeza! — Akim determina trazendo uma bandeja com


vários copos de suco.

Eu tenho que concordar com um dos meus caçulas.

Agora ao menos, chega de tristeza.


FINAIS TRISTES?

Estive pensando no quanto tudo aconteceu depressa por esses dias.

Mas isso me fez refletir com zelo sobre como tenho sorte de que
hoje posso dividir isso com o meu esposo.

Foram meses de turbulência e agora que eu achei que poderíamos


encontrar mais paz, me vem o destino e coloca a Viviane de novo nas
nossas vidas.

Seria cômico se não fosse irônico e doloroso.

Agora estou deitada no conforto da minha cama, lá fora o silêncio


da floresta na qual rodeia nossa casa, o som do vento lá fora em
contrapartida com o barulho tranquilo de cigarras em comunhão perfeita
com as corujas.

Não trocaria esse lugar por nenhum outro, bem, trocaria talvez em
alguma hipótese por nossa antiga casa nos Hamptons.

Só que a verdade é que a minha cabeça dá uma volta inteira e


mesmo que eu tente, não consigo parar de pensar em como será essa
primeira noite do Cory dormindo num lugar em que eu não sei onde fica, se
está confortável, se comeu direito.

Mãe é um bicho tão louco e besta.

Eu entendo mais essa frase agora.

Sempre fui uma mãe presente na vida dos meus filhos, sempre fui
informada sobre onde estavam e com quem estavam, nunca ficaram longe
de mim ou de algum familiar meu, eles sempre estão sob meus cuidados
mesmo quando estão de férias com nossos pais.

Agora meu coração se contrai porque sei que o quarto ao lado está
vazio, que ele não ocupa mais o lugar que sempre ocupou na nossa casa e
me dói muito mais de saber que talvez não queira ocupar mais esse espaço
na minha vida.

Afinal de contas, seria uma mãe desalmada se não me preocupasse


com isso.

Meu esposo dorme abraçado a mim, acho que quando ele viu que
estava anoitecendo decidiu parar de se preocupar um pouco com o Cory. Sei
que o Mosés é muito melhor do que eu para lidar com essa situações, ele
esconde bem até quanto pode, depois quando tudo parece prestes a explodir,
ele mostra como se sente.

Ele está sendo movido pela mágoa pelas coisas que o Cory falou
para ele ontem, eu estou sendo movida porquê de uma forma estranha me
senti trocada e substituída com o decorrer do dia.

Peguei meu celular muitas vezes e comecei a digitar uma


mensagem, mas desisti.

Eu sei que não importa o que eu diga, ele não voltará assim tão fácil.

Só queria que meu coração acolhesse essa decisão dele do jeito


como eu estava determinada a fazer hoje cedo.

Me vi tentando animar as crianças mesmo estando destruída por


dentro. Cozinhamos todos juntos, fizemos legumes ao vapor e arroz com
picadinho de carne de soja, mesmo que as crianças estivessem empenhadas
em lidar com nosso dia em família, notei o buraco que o Cory deixou em
cada um deles.
Havia sempre algo que só o Cory fazia, havia alguma coisa que só o
Cory sabia onde estava e algo que ele era bom em fazer, segundo Akim o
melhor.

Me dói saber que meu bebê não está aqui, me dói tanto.

Como ela conseguiu fazer isso com o Cory? Como o convenceu a ir


tão depressa? Será que ele não percebe que ela não está sendo verdadeira
com ele?

Escuto o barulho do som de um carro se aproximando e abro bem os


olhos, Mosés se levanta depressa e se senta na cama, liga o abajur e eu tomo
um baita de um susto quando ele pula para fora da cama.

Saio logo em seguida seguindo-o até a porta a sacada.

Ele abre uma brechinha e colocamos as cabeças na brecha para ver.

Meu coração até salta quando vejo que é o carro dele, salta com
tanta força que me sinto eufórica.

— Eu disse! — ele sussurra.

— Pai, mãe, vocês ouviram? — é a Sophie abrindo a porta. — Ele


voltou!

— Ele te disse algo? — franzo a testa olhando para o rumo da porta.

Sophie já está de pijama, mas não parece com cara de sono.

Não fui a única a não conseguir dormir então.

— Não, mas eu mandei uma mensagem mais cedo e ele disse que
estava pensando com calma sobre. — ela responde contente.
— Volta para o seu quarto e finge que está dormindo — Mosés
sussurra apressado. — Ele tá vindo.

Sophie sai correndo do quarto e Mosés desliga o abajur depressa, eu


não sei para que isso, mas sei que orgulhoso como ele é, jamais admitiria
para o Cory que perdeu uma noite de sono por conta de alguma pirraça dele.

Voltamos para a cama e fico me indagando mentalmente sobre quais


motivos que o fizeram voltar.

Será que ela disse algo que ele não gostou? Será que brigaram?
Tomara!

Aquela lambisgoia vai ter o que merece no momento certo!

Alguns minutos de silêncio se passam enquanto sinto o corpo tenso


do Mosés apertando o meu num abraço em nossa cama, então o silêncio se
rompe com o som da nossa porta sendo aberta.

Sou boa atriz, estendo a mão e apanho o celular primeiro, o lesado


do meu marido já vai logo no receptor ao lado da cama e acende a luz,
enquanto me levanto devagar, o outro já está sentado na cama.

Cory está usando a mesma roupa de ontem, nem parece ter tomado
banho, os cabelos estão bagunçados e ele segura a mala de viagens com
uma mão e a mochila pendurada no ombro com a outra.

Ele foi embora hoje cedo, mas parece que foi dias.

Não é a forma que ele deve sair da nossa casa!

— Desculpe, eu não quis acordá-los, só vim avisar que voltei — ele


fala baixinho.

Seu olhar tem arrependimento estampado, não sei por ter ido
embora ou se porque teve que engolir o orgulho para voltar, mas de todas as
formas isso não importa.

— Quer comida? — Mosés sai da cama todo sério. — Fizemos


salada de batata de jantar.

— Pai, eu não queria que ficasse zangado...

— Não precisa ficar se justificando, sou seu pai e entendo seu lado
— Mosés se aproxima dele e pega sua mala. — Sua mãe vai arrumar um
prato de comida, já jantou?

Ah, Mosés!

— Ainda não, papai — ele responde cabisbaixo. — Me desculpe.

— Depois falaremos disso com calma, sem brigas — Mosés bate


com a mão no ombro dele.

Seu gesto parece frio, mas sei que esconde imenso alívio pelo Cory
ter voltado.

— Acho que preciso de um banho — ele diz todo sem graça. —


Estou faminto, não consegui comer nada o dia todo.

— Claro — afirmo saindo da cama também. — A mamãe vai


preparar o seu jantar, meu amor.

— Obrigado, mãe.

Ele não quer conversar e não acho que seja o momento certo.

Eu não irei brigar com o Cory agora, sei que ele já está sofrendo o
suficiente por ter decidido sair de casa de manhã e ter voltado há essas
horas da manhã para casa.
Me aproximo e não resisto em dar um forte abraço nele, ainda sei o
que outras pessoas pensariam, o que diriam, que ele deve ser punido por
tudo o que nos fez passar no dia de hoje, mas não quero punir meu filho por
uma má decisão.

Eu quero que ele entenda que eu o acolherei sempre que precisar,


que aqui é o seu verdadeiro lar, onde poderá ser amado e respeitado
incondicionalmente.

Ele começa a chorar enquanto me abraça de volta.

Me dá um alívio tremendo de poder abraçá-lo e de saber que ele


voltou para mim.

— Me desculpe, mamãe — ele pede com voz abafada e baixa.

— Tudo bem, meu amor, eu sempre estarei aqui.

E eu nunca deixarei de ser a sua única e verdadeira mãe.

Não importa o que ninguém diga.


ARREPENDIMENTOS

— Ela começou a me cobrir de exigências.

Ele começa.

Troco um rápido olhar com o Mosés e ele se vira para o cooktop


mexendo a panela com arroz. Encho um copo com suco e coloco diante do
meu filho. Me inclino e deposito um beijo em sua cabeça.

Ele já tomou um banho quente e já está de pijamas, mais disposto a


conversar depois de ter chorado muito no meu quarto.

Ainda estou agitada com sua chegada, mas também curiosa.

— Depois disse que precisava que eu arrumasse dinheiro o mais


rápido possível para que ela saísse do hotel. Fiquei muito chateado porque
depois que nos conhecemos pessoalmente hoje pela manhã, ela começou a
agir como se estivesse mais interessada no dinheiro que o meu pai biológico
deixou para mim.

Ah, ela nem esperou os dias se passarem.

Só que sabendo quem é a Viviane e o estilo de vida que ela levava


antes de ser presa, dá para imaginar que ela esteja desesperada para
recuperar rápido sua conta bancária e cartões sem limite. Claro que ela já
havia deixado isso claro para mim e para o Mosés, eu só não achei que ela
fosse ser assim tão explícita com o Cory.

Ele bebe um gole do suco e noto os tons de decepção em seu olhar,


sei que ele esperava muito desse encontro, que ele contava com uma mãe
receptiva e carinhosa, ela tem lábia, mas pelo visto esqueceu que está
lidando com alguém no qual ela se tornou uma completa estranha.
Eu não duvido que ela não contasse com a chegada dele, sei que
haviam marcado para se conhecer e que a Lottie o levaria para que ele não
fosse sozinho. Ela provavelmente não teve tempo de ensaiar o personagem
da mãe boazinha para ele.

Então de repente ele estava em sua porta de quarto de hotel com


uma mala querendo conhecê-la, dizer a ela como ela era importante para
ele, o quanto talvez estivesse feliz de poder estar com ela depois de tantos
anos e ela joga um balde de água fria nele pedindo dinheiro.

Como se estar na presença do Cory significasse muito mais o valor


financeiro do que emocional.

Isso o machucou muito, para ela já não posso dizer o mesmo.

Viviane só ama a si mesma e a tudo o que possuí por pura futilidade.

— Eu saí daqui disposto a ajudar ela, eu queria passar uns dias com
ela para nos conhecermos. Precisavam ver a cara dela quando me viu,
parecia realmente decepcionada, disse a mim mesmo que talvez ela
estivesse assustada com a minha visita.

— Ela não te recebeu bem — Mosés conclui sem nenhuma surpresa.

— Ela pareceu inicialmente surpresa, me pediu que entrasse e


depois me abraçou, mas não havia tanta emoção quanto nas mensagens que
trocamos. Depois ela disse que poderíamos tomar café, mas que estava sem
dinheiro, então eu fui comprar algo para comermos, estava meio eufórico de
poder estar com ela novamente.

Daí ela pegou seu celular e nos ligou.

— Não tenho muitas lembranças de ter estado com ela, são poucas
lembranças de passeios, mas tudo muito embaçado nas minhas memórias.
— ele faz uma pequena pausa. — Quando voltei ela estava meio distante,
começou a me fazer perguntas sobre as questões financeiras, disse que
precisaria de um pouco mais de dinheiro para ter funcionários. Eu disse
para ela que poderíamos resolver isso conforme os dias fossem se passando,
ela não gostou do que eu falei e me chamou de egoísta, disse que eu estava
aproveitando bem a vida com o dinheiro que ela havia ajudado o marido a
conquistar, fiquei em choque.

E eu não duvido, o Cory é um rapaz pacífico e calmo, não é do tipo


de coisa que ele se preocupe no dia a dia ou nunca, ele não é ligado em
dinheiro ou coisas caras demais, é algo do qual ensinamos para ele aos seus
irmãos.

— Durante o café ela ficou falando das coisas que precisaria,


montou uma lista de compras que eu deveria fazer e falou o bairro onde
desejava morar. Eu disse a ela que ok, que faríamos isso, ela falou que
precisaríamos mudar para um hotel melhor até eu conseguir comprar a casa.
Disse a ela que eu não tinha condições imediatas de fazer isso, ela me
chamou de mesquinho, disse que enquanto ela estava dormindo num lugar
sujo e pequeno, eu estava morando numa mansão com cama confortável.

Ela achou que tinha encontrado outra mina de ouro. Ela não o vê
como seu filho querido, não sabe da oportunidade de ouro que é ter o Cory
como filho.

Engraçado, ela me vê como inimiga, mas criei seu filho como meu,
o amo como meu, faço tudo por ele porque sei que é meu e o mais irônico
de tudo isso é que ela só afirmou isso ao tentar afastá-lo de mim.

Ela só está dizendo o quanto o Cory não precisa ter que conhecê-la
ou lidar com ela, o quanto ela não é necessária na vida dele, o quanto ela
sempre foi e sempre será uma grande egoísta por deixar ele em segundo
plano na vida dela.

— Eu disse para ela que estava ajudando-a como eu podia, que iria
providenciar tudo assim que o banco liberasse as quantias, ela fez parecer
que eu não fazia na hora que ela queria porque eu não queria. Me senti
bastante pressionado, ela acabou com a minha saúde mental em menos de
doze horas de convivência. Só falava de dinheiro, de uma casa com bons
móveis, de carros de luxo, de procedimentos estéticos, parecia um filme de
terror do século vinte um.

Queria não sentir vontade de rir, meu filho faz cara de cachorro
triste, mas meu marido ergue a cabeça e oprimindo o sorriso em silêncio, é
como se dissesse silenciosamente “bem-feito”, e é, mas o Cory não precisa
saber disso.

— Eu saí no horário de almoço e comprei as coisas que ela me


pediu no mercado, não achei ruim, quando voltei ela estava reclamando da
minha demora. Depois agradeceu como se nada houvesse acontecido. Então
passamos a tarde toda no quarto de hotel, eu a convidei para sairmos e
almoçar fora, ela aceitou e eu sugeri um restaurante perto do hotel, parecia
ter boa avaliação no Google, um local aconchegante. Quando mostrei a ela
o restaurante ela disse que não queria mais ir porque eu estava querendo
comer num lugar de pobre.

— Eu não achei que ela fosse assim — minto sentada ao lado dele.

— Eu achei — Mosés diz trazendo o prato com mexidão de arroz


com picadinho de carne e a salada de batatas num canto.

— Eu passei o dia todo basicamente com o café da manhã porque


ela não quis ir almoçar fora e não me deixou ir, mas também não me deixou
nem tocar nas coisas que eu comprei com o meu dinheiro para ela. Guardou
todas as sacolas de compras nos armários do quarto dando a entender que
eu não iria comer nada. — revela ele.

Não deixo de sentir um pouco de pena, mesmo que ele não mereça,
isso só reforça o fato de que ela está mais desequilibrada mais que tudo, sei
que nem está tomando os remédios porque se estivesse não teria agido
assim, bem, talvez tivesse, quem sabe?

É a Viviane!
— Sempre que eu fazia menção em sair do quarto com alguma
prerrogativa ela dizia algo como “vai sair e me deixar aqui sozinha?” ela
conseguiu me sufocar em menos de um dia de convivência. — explica
chateado. — Quando eu fui ao banheiro, ela me seguiu, ficou me esperando
na porta parecendo paranoica, tive a sensação de que depois que voltei para
a sala do quarto, ela foi ver se eu havia pegado alguma coisa no banheiro.

— Ela é assim mesmo — Mosés se senta ao lado esquerdo dele.

— Ela fazia eu me sentir mal com pequenas coisas que eu falava,


tentei ser o mais agradável possível, comecei a falar sobre a universidade,
sobre os meus barcos prediletos, as coisas que eu gosto de fazer,
infelizmente não deu. Ela parecia entediada com o que dizia, foi bastante
evasiva quando fiz perguntas sobre meu pai biológico, quando perguntei
como ele era ela mudou de assunto falando de si mesma.

Eu acho que ela fez com ele assim como fez com o Mosés quando
ele fazia perguntas a respeito do marido dela.

— Teve um momento em que eu questionei sobre os pais dela, as


coisas que ela gosta de fazer, ela disse que a mãe dela havia morrido e o pai
também, portanto, não importava o que ela dissesse sobre eles, nada
mudaria.

Fico atenta a essa fala, talvez explique algumas coisas que o tio Jack
falou.

— No final da tarde eu já estava com muita fome e com vontade de


ir ao banheiro, ela comeu um pacote de biscoito com refrigerante e me deu
dois que sobraram no pacote, sorrindo como se fosse a coisa mais normal
do mundo.

Isso é realmente surpreendente até mesmo para o meu marido, ele


está tão ou mais surpreso que eu.
Noto o exaspero na voz dele, não só raiva e mágoa, mas porque é
mesmo algo absurdo, nenhum dos meus filhos tiveram que passar por nada
do tipo em nenhum sentido comigo ou com o pai, com nenhum familiar.

Sempre dividimos tudo por igual com eles, entre nós dois, tentamos
dar o nosso melhor aos nossos filhos, se não damos a todos, não damos a
nenhum.

— Acho que na cabeça dela estava me fazendo um favor. Notei que


ela realmente em esses problemas psicológicos pessoalmente, por telefone
eu jamais saberia.

E se talvez ele houvesse ido encontrar ela com a Lottie, os desfecho


fosse diferente, porque ela fingiria para a Lottie. Acredito também que
nossa conversa de hoje cedo tenha feito toda a diferença em diversos
sentidos, ela provavelmente caiu na minha armadilha quando insinuei para
ela que não seria tão fácil arrancar dinheiro do Cory.

Ela se sentiu pressionada e tentou pressionar ele também sob a


ameaça de não ter o que queria.

É a primeira vez na vida que tiro alguma vantagem de alguém que


me fez tão mal e não sinto um pingo de remorso por isso.

Se eu tivesse que fazer mil vezes eu faria mil e quinhentas só para


que ela não tivesse a oportunidade de estar perto o suficiente do meu filho.
Também nem foi uma mentira assim tão grande, exceto pelos pássaros
decepados tudo foi verdade, Cory foi a terapia quando criança, foi um
cuidado que tomamos durante um pequeno período da vida dele por
recomendação da Beth, em segundo lugar nós também não iríamos dar
dinheiro de mão beijada para ela.

Se o pai biológico do Cory quisesse que ela ficasse com o dinheiro


não teria deixado um testamento dizendo que todos os bens dele ficariam
para o Cory.
— Assim que ela dormiu, peguei as minhas coisas e sai do quarto
correndo, fingi que estava dormindo no sofá, ela me deu boa noite e agiu
como se nada tivesse acontecido durante o dia, ainda me disse que
desligaria o ar-condicionado porque não tinha culpa se eu era muquirana
demais para pagar um lugar melhor para nós ficarmos.

Meu Deus!

— Deixei todo o dinheiro que eu tinha na carteira para ela e vim


para casa, ainda pensei sobre arrumar algum lugar para passar a noite, mas
sei que ela iria me ligar e tentar me convencer a voltar para lá, ela é muito
narcisista.

Que bom que você percebeu, meu filho! Bem a tempo!

— Não quero mais ter que lidar com ela, darei o dinheiro para ela e
pedirei ao advogado que ela assine um acordo para que não fique me
pedindo dinheiro. Bloqueei ela em tudo, eu não aguento mais um segundo
perto dela.

— Você tentou, faz parte — Mosés toca o ombro dele de forma


companheira.

— Pode dizer, eu mereço.

— Nós não vamos te punir por ter decidido passar esse dia com a
sua mãe biológica — afirmo colocando a mão sob a dele. — Você é nosso
filho independente de qualquer coisa.

— Ela é muito estranha — ele nega com a cabeça. — Pelo telefone


sempre pareceu tão gentil, amorosa, me enviava muitos áudios dizendo que
estava ansiosa para me conhecer, pessoalmente agiu diferente demais. Eu só
fui porque achei que era o certo, porque ela falou tantas coisas, acreditei
nela.
Sei como se sente, é a forma como a Safi se sente por ter confiado
nela.

— Eu acreditei muito que poderia ter um vínculo maior com ela, ter
uma sensação nova de pertencimento. Achei que nós dois teríamos alguma
relação de mãe e filho, só que ela não é nada do que eu pensei. — Cory está
bastante magoado. — Eu pensei que poderia ajudá-la, que ela poderia
contar comigo para o que precisasse porque sei que se fosse vocês dois
iriam se sentir da mesma forma.

Nada justifica a forma como ele agiu em relação a nós nesse sentido,
mas ele tem um coração gigante e isso é algo que eu entenda porque o
conheço.

— Depois de tudo eu só queria poder estabelecer uma amizade com


ela, eu também me senti muito mal por ter acreditado nas coisas que ela
falou, me senti tão idiota, pensei “por que fiz isso com meus pais?”. Era
evidente que eu tinha que conhecer ela pessoalmente para saber que nada
do que ela falava era verdade.

— E o que ela te disse? — estou ainda mais curiosa.

— O que eu já havia dito, mamãe, ela disse que você causou a


separação dela e do papai, que você armou para ela ficar internada num
hospital psiquiátrico. Ela disse que você a detestava e que nunca aceitou o
fato do papai gostar dela, no começo tive resistência, mas pensei, ela não
inventaria nada disso.

— Eu te disse que ela mente muito — Mosés alega todo sério.

— Eu sei que disse, mas ela me mandou o contato do advogado


dela, ele me mostrou laudos, disse que está movendo uma ação contra o
Estado por terem internado ela compulsoriamente.

Ela ainda conseguiu ludibriar até o advogado?


Todos os dias uma novidade diferente.

— Eu não poderia desamparar ela também, verdade ou não, ela não


tem dinheiro para nada. Só que todos os dias desde que ela entrou em
contato comigo, ela tem dito essas coisas, ela diz que nunca quis ficar longe
de mim, que só ficou longe porque internaram ela e eu não procurei pensar
muito sobre isso, só senti no meu coração que deveria dar a ela uma
segunda chance.

— Eu entendo você ­— digo sincera. — Acima de tudo ela é a mãe


biológica...

— Ela não é minha mãe, cometi esse erro, mamãe, nunca mais me
deixe sair dessa casa, pelo amor de Deus!

Mosés sorri e finalmente o abraça, meu coração se expande com a


cena. É maravilhoso ver nosso menino em casa novamente, graças a Deus
que ele voltou, que abriu os olhos a tempo.

— Nós somos sua família, garoto, por favor, não faça mais isso!
Seus irmãos choraram o dia todo, Sophie quase que me mata!

— Não farei papai — a voz dele se enche de tristeza de novo. —


Estou tão magoado, comigo mesmo e por ter feito isso, eu sei que vocês não
merecem.

— O que importa é que você voltou — digo dando a volta na pedra


da ilha e o abraço também. — Meu bebê.

Cory funga, choroso, mas sei que nesse momento ele deve sentir
muita dor por tudo o que vivenciou perto daquela cobra. Ela não o merece
em nenhum sentido.

Só que isso já era esperado, não achei que seria tão rápido, enfim,
ainda bem que não demorou.
Viviane agora já sabe que as máscaras dela caíram, agora ela não
terá nenhum argumento para estar perto de nós e nem do nosso filho.

Graças a Deus que foi algo que durou só um dia, não quero pensar
se duraria mais que isso.

Fim da parte II
BÔNUS * SAFIRA

— Eu cheguei.

Ah, não, de novo não! Você não! NÃO!

Vejo Antônio Carsson entrando pela porta da frente da casa do meu


irmão usando uma calça de jeans velha e uma camiseta toda suja de tinta, os
cabelos dele estão soltos e a barba feita, ao mesmo tempo essa centelha de
emoções brota dentro de mim e reprimo.

Porque ele é tão lindo.

E porque eu não devo me sentir assim.

Na minha cabeça é sempre tudo nítido, mais rápido, como um


computador com bites novos, mas na prática não é bem assim que funciona,
me sinto como algo quebrado em constante conserto ou reconstrução.

Para algumas coisas levo mais tempo para pensar, é incrível como
para achar ele um gato eu não levo.

— A minha prima não está?

— Não.

— E a sua babá?

Vou buscando na mente as palavras certas e escolhendo enquanto


falo.

— Ela não é a minha babá!


A Polônia é a minha babá basicamente, é eu sei, mas precisa mesmo
dele ficar repetindo isso?

Já não basta o meu irmã e a minha cunhada me tratarem como uma


criança ainda tenho que aguentar o único cara que tenho um crush
chamando minha cuidadora de babá?

Ok ela é, mas merda!

— Ela saiu e te deixou aqui sozinha? — ele fica diante da minha


cadeira escondendo um sorriso maroto. — Ah, que triste!

Droga!

O que eu poderia dizer que fizesse mudar as ideias de Antônio de


estar perto de mim? Eu já cansei de pedir que ele vá embora, já pedi ao
Mosés que não faça isso, a Ana que não finja que não entende quando faço
cara feia para ela.

Mas nada funciona.

E hoje é mais um dia que todo mundo saiu intencionalmente para


me deixar a sós com ele mais uma vez.

Aposto que a safada da Polônia estava lá nos fundos só esperando o


carro dele aparecer para dar partida no dela e vazar daqui o mais rápido
possível, ela acha que eu não sei que usa essas escapadas para ir para algum
bar beber e conhecer mulheres.

Parecendo uma caminhoneira desesperada para sair dos Hamptons e


ir para o Queens toda mal-intencionada.

— Então, eu pensei em irmos para a piscina.

Piscina, não! Piscina definitivamente não!


— Não — seleciono a pequena palavra em minha mente.

— Então que tal um filminho, hein? — ele se senta no braço do sofá


ao lado da minha cadeira. — Podemos ver algo sobre moda, algum desfile?

— Não — é fácil escolher essa palavra.

Antônio coça a nuca e se endireita olhando para o teto, parecendo


um dissimulado enquanto finge pensar numa desculpa para fazer qualquer
coisa que me mantenha a menos de meio metro de distância dele.

— Embola, você — digo antes que ele abra a boca para falar.

— Eu não vou — ele sorri e depois se inclina na minha direção.

Arregalo os olhos e o vejo passar os braços por baixo das minhas


pernas e depois das minhas costas, é difícil não me sentir diferente de uma
boneca de pano desde o acidente, mas às vezes quando alguém me suspende
ou levanta eu não consigo me sentir tão segura.

É imprevisível e inquietante a sensação de ser levantada do chão.

Ainda não sinto minhas pernas e os órgãos da cintura para baixo,


mesmo que ainda tenha pouca sensibilidade nas costas e nos braços, estou
desenvolvendo e reaprendendo a pegar as coisas e a me mover com a
fisioterapia.

Mas não tenho força o suficiente para mover tanto os braços, para
erguê-los, me canso com frequência, sem citar o fato de que minhas mãos
também não me obedecem sempre.

Minha cabeça cai para trás e meu braço cai para o lado enquanto ele
me carrega, então ele ergue mais o braço puxando minha cabeça de
encontro ao seu peito, inspiro o cheiro forte de incenso em um misto de
suor e perfume oriental.
Ele tem esse cheiro que lembra um estudante desleixado, mas tão
aguçado, sinto que depois do acidente sinto melhor o cheiro das coisas, até
mesmo o gosto, por mais que alguns outros sentidos tenham ficado
defasados devido as sequelas.

O doutor Haddad disse que a expectativa é que até o ano que vem eu
recupere toda a mobilidade dos membros superiores e dadas as
circunstâncias em que cheguei a essa casa eu acredito muito na melhora.

Confesso que tenho visto o tratamento com um pouco mais de


seriedade, de forma otimista, não é como quando saí do hospital e me sentia
uma alma morta habitando apenas uma capa imóvel.

Já tem um ano e meio que eu estou em tratamento e recuperei boa


parte da mobilidade da boca, fala, movimentos da cabeça, já consigo sentir
as costas e em alguns momentos tenho reflexos em relação aos pés.

Semana passada eu consegui mover dois dedos dos pés, eu quero


que num futuro próximo eu consiga ao menos andar na cadeira sozinha,
sem que seja motorizada, quero tentar conquistar o mínimo, nem que seja
minha independência.

Antônio entra na sala de vídeo e me coloca sentada na chaise, ele


me ajeita e pega o controle, logo em seguida tira o par de tênis e se senta ao
meu lado, enquanto ele vai ligando a tv, fixo minha cabeça da melhor forma
e tento me concentrar para que consiga ficar parada.

Eu tenho controle, eu consigo, eu consigo...

E lá vai a minha cabeça para o lado oposto ao da tv.

Eu não consigo!

Antônio se dá conta a tempo e logo em seguida pousa as mãos sob


meu pescoço com cuidado, todo preocupado, reconheço esse olhar, é o jeito
que ele me olha quando sente pena de mim num misto de preocupação ou
algo do tipo.

— Você embola! — falo encarando-o fixamente. — Tem pena de


Safila.

É Safira com r!

— Eu não tenho pena de você — responde e seus olhos verdes se


fixam nos meus. — Nunca mais diga isso, entendeu?

Prefiro não responder, por mais que note toda sinceridade do mundo
em seu tom de voz.

Ele pega uma almofada e depois faz com que eu me deite de costas
apoiada com a cabeça na almofada, logo em seguida puxa as minhas pernas
e ajeita os meus braços dos lados do meu corpo, fica me olhando assim todo
sério por alguns momentos.

— Eu adoro você, mas tem que parar de me tratar assim, tem que
me deixar ficar perto, estou me cansando do seu comportamento.

Ah, meu comportamento?

Me irrito, porque esse garotinho mimado com certeza não sabe nem
de um por cento do que passei para estar aqui hoje, acha que com essa
desculpa esfarrapada vai me convencer de que gosta de mim?

— Não.

— Eu não ligo para o que você possa pensar, Safira, vou ficar e
ponto final.

Lanço um olhar severo para ele e de alguma forma isso parece


diverti-lo, me irrito ainda mais porque sei que não importa o que eu o diga
ou fale irá ficar.
Esse homem é teimoso feito um jumento.

Vou ignorá-lo da mesma forma que tenho feito desde o primeiro


momento em que ele apareceu aqui em casa com essas ideias e
pensamentos sem fundamento.

Ele se senta na ponta do sofá ao lado dos meus pés e logo em


seguida se encosta no sofá todo a vontade, olho para tv, ele selecionou um
filme antigo de romance, algo que eu sei que não assistiria com um cara
antes do acidente.

Antes do acidente eu ainda era a garota bonita e super desejada que


qualquer homem desejaria ter por perto, agora não e não há muito o que se
pensar sobre além do que já é, uma merda.

Um grande e incrível pedaço de bosta.

Eu ainda tenho muitos flashs na cabeça sobre como era a minha vida
antes, outras coisas são distorcidas e meio apagadas, mas eu tenho quase
todas elas em minha mente reservadas para qualquer momento que me traga
conforto e um pouco de revolta.

Existem sim esses dois lados, um lado é aquele que é coberto de


gratidão por ter tido uma segunda chance o outro é esse lado incontrolável
que eu não consigo muito fazer com que me sinta cômoda ou grata, é mais
como uma raiva acumulada de todas as péssimas decisões que eu tomei
desde que decidi ir ao encontro da Viviane pela primeira vez desde que o
Mosés a abandonou.

É claro que eu também gostava muito da pessoa que ela era comigo
porque era a minha única grande amiga até eu descobrir que a única grande
amiga da relação era eu.

Era boba, ingênua e ainda é complexo demais pensar que isso não
tem mais de dois anos, que parece que foi ontem que entrei naquele carro e
fui tomando uma série de decisões erradas que mudaram a minha vida para
sempre.

Não é algo que eu consiga falar ou possa falar com ninguém além da
Polônia ou da minha psicóloga nas sessões de terapia, faz mal, mas também
faz bem.

Às vezes roda esse filme na minha cabeça sobre a mulher que um


dia eu fui, cabelos cumpridos e lisos, cheiro de perfume importado, uma
influencer de moda nas redes sociais, não perdia uma boa temporada em
Paris, comecei inclusive até a fazer alguns esboços mesmo cursando
administração.

Mas a verdade é que eu tinha vocação, eu amava aquilo por mais


que papai e Mosés dissessem que não havia muito futuro, mas é que cresci e
me apaixonei muito por isso, usar boas e seguir tendências era minha
paixão e meu hobbie.

Talvez fosse a única coisa que eu ainda fazia bem e direito.

Acabei arruinando minhas chances de ter meu ateliê e de continuar


meus sonhos por ter sido uma completa infantil, isso é algo que não me
custa admitir porque é a verdade.

Quando acordei do coma todas aquelas imagens me vieram a mente,


todas as coisas que eu disse para o papai, tudo o que causei na vida do meu
irmão, tenho tanta sorte de que ele me ame o suficiente para me deixar
continuar em sua vida.

Ele e a Ana.

Não sei como a Viviane me fez acreditar que o Mosés estava me


trocando pela Ana, que ele não me amava, que eu não era o suficiente, meu
irmão sempre foi duro comigo, sistemático, mas ele já deu mais do que mil
provas de que me amava durante anos, a primeira delas foi sem sombra de
dúvidas ter me resgatado das garras do meu genitor, a segunda delas é
aquela que eu não gosto de lembrar porque me machuca saber que ele
sofreu tanto.

Ele se sujeitou a muita coisa para que nós tivéssemos uma casa e
comida.

Sinto uma pontinha de coceira no pé e isso me traz para realidade,


olho para baixo e noto as mãos morenas e grandes massageando meu pé
esquerdo, eu não sinto o toque por completo, mas sim como quando minha
fisioterapeuta começa a fazer estimulação nos pés durante as sessões.

Como uma coceirinha debaixo da sola.

— Gosto de filmes assim — ele fala atento a tv. — Quando nos


casarmos vamos ter a chance de escolher um tema, quero que seja algo
como Poderoso Chefão, o que acha?

Me dá vontade de rir, primeiro porque, sério? Ele acha que eu me


casaria com um tema tão sem noção? E segundo, por que me casaria com
ele mesmo?

— Não namolamos — respondo selecionando as palavras na minha


mente.

— É claro que estamos namorando, Safira, ninguém fica meses se


encontrando todos os dias basicamente ou se vendo só por hobbies.

— Você é mexeliqueilo!

Começo a rir quando ele revira os olhos, porque ele sempre faz isso
e é tão fofo, admito, é muito fofo e confesso que por mais que eu tenha
unido todas as forças para afastar ele de mim, ao entendimento do meu
irmão e da Ana e até da Polônia desde a primeira visita dele, o Antônio é o
meu namorado.

Talvez só para mim que isso não faça sentido ou não funcione.
Ele solta meu pé direito e pega o esquerdo, começo a sentir as
pontinhas de faíscas provocadas pelos dedos dele, ao mesmo tempo isso me
traz uma sensação estranhamente boa, sei que isso é só reflexo, mas não
deixa de ser bom.

— Será que eu sou ou só estou completamente apaixonado por


você?

Meu coração dispara e quando ele se vira para mim fico pensando
sobre escolher mais palavras tortas para responder, porém, não consigo falar
nada.

Acho que o meu silêncio é uma resposta óbvia de que eu não irei
mais conseguir segurar essa situação por muito tempo, mas será que isso
poderia só por um segundo dar certo?

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